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4. DO DIREITO DO TRABALHO AOS CONDENADOS

4.2. DO DIREITO AO TRABALHO

Dentre os direitos elencados na Lei de Execução e na Constituição Federal, o direito ao trabalho deve ser considerado um dos mais importantes, já que possui um papel ressocializador.

O trabalho é um direito social previsto no artigo. 6º, da Constituição Federal, por ser considerado um direito fundamental deve ser garantido a todos, inclusive para aqueles que estão privados de liberdade.

Além de estar previsto no ordenamento jurídico brasileiro, está previsto em diversos tratados e convenções internacionais, dentre eles a Declaração Universal dos Direitos Humanos14, que em seu artigo 23, dispõe “Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego”. Também está previsto Protocolo De San Salvador15, em seu artigo 6º, que dispõe que “Toda pessoa tem direito ao trabalho, o que inclui a oportunidade de obter os meios para levar uma vida digna e decorosa por meio do desempenho de uma atividade lícita, livremente escolhida ou aceita”.

Destaca-se que o destinatário desse direito é a pessoa humana, assim, o trabalho é um direito social do preso, onde o Estado tem o dever de criar mecanismos para a concretização desse direito.

14 ASSEMBLÉIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Disponível em <https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000139423> Acesso em 16 de outubro de 2021.

15 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Protocolo Adicional Sobre Direitos Humanos em matéria de direitos econômicos, sociais e culturais, “protocolo de san salvador”.

Disponível em <http://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/e.Protocolo_de_San_Salvador.htm>

Acesso em 16 de outubro de 2021.

4.2.1. O trabalho do preso.

O trabalho prisional é aquele que pode ser realizado dentro do estabelecimento (trabalho interno) prisional ou fora (trabalho externo), que está sujeito a uma remuneração, conforme artigo. 41, da LEP.

Possui uma dupla face em relação ao apenado, porque ao mesmo tempo se apresenta como um dever, também, se configura como um direito. Da leitura do artigo 28, extrai-se que o trabalho do preso como um dever social e condição de dignidade humana, constitui duas finalidades, a educativa e a produtiva.

Com relação à finalidade educativa, esta se refere a habitualidade do trabalho, para aqueles que já tinham o hábito de trabalho ao ser recolhido continuará a mantê-lo, para aqueles que não o tinham, o exercício regular contribuirá para que sua conduta seja disciplinada gradativamente, e conseguirá aprender um novo trabalho que poderá ser mantido fora do cárcere.

Quanto a finalidade produtiva está desenvolve um grande papel para que a ociosidade seja evitada, garantindo a oportunidade de o preso realizar algo útil que poderá lhe render uma remuneração.

Alexis Brito (2020, p. 169) traz que que “a finalidade de submeter o condenado ao trabalho não é a de agravar a pena, mas a de respeitar a dignidade humana daquele que possui capacidade para exercê-lo”. Continua argumentando que “na atividade oferecida pelo órgão estatal atribui-se ao preso uma profissão, reincorporando-o e reinserindo-o como força produtiva na população ativa da sua comunidade e da nação”.

Diante da obrigatoriedade, ao condenado que se recusar a prestar as atividades poderá ter por consequência a aplicação de uma sanção disciplinar pelo cometimento de falta grave, conforme prevê o artigo 51, VI, da LEP. Deve-se distinguir a obrigatoriedade do trabalho forçado, o qual é vedado pela Constituição Federal, em seu artigo. 5.º, XLVII, alínea c.

Além disso, proíbe-se o trabalho forçado, dependendo exclusivamente da vontade e aceitação do recluso, não podendo o Estado forçá-lo de forma coercitiva.

Inclusive, Rodrigo Roig (2019, pg. 185) traz que a punição pela não realização do trabalho é inconstitucional, e que fere a autonomia de vontade individual.

O trabalho penitenciário deve seguir as mesmas exigências de higiene e de segurança. Para atribuir o trabalho ao recluso deve-se levar em consideração a

capacidade e as aptidões físicas, mentais, intelectuais e profissionais, de cada preso de forma individualizada. Diante dessa determinação a LEP traz que os maiores de 60 anos poderão solicitar ocupação que seja de acordo com sua idade e que os deficientes físicos e os doentes somente exercerão atividades apropriadas a seu estado.

Percebe-se que o trabalho é um importante direito do preso, que deve ser fornecido pelo Poder Público, porém na realidade há uma insuficiência de recursos, que acabam impossibilitando o fornecimento dessa atividade aos reclusos.

4.2.2. O trabalho interno.

O trabalho interno é aquele realizado dentro do estabelecimento penitenciário, que podem ser o industrial, agrícola ou intelectual. Consiste no aproveitamento da mão de obra dos condenados na construção, reforma, conservação e melhoramentos do estabelecimento prisional, e serviços auxiliares, tais como o atendimento em enfermarias, cozinhas e lavanderias.

Outra possibilidade de se prestar esse serviço é através de convênios celebrado pelo Poder Público com empreendedores privados, neste caso quem remunerará o preso será o privado e ele que irá fornecer os equipamentos e materiais necessários ao exercício da atividade.

A LEP, em seu artigo 31, traz que a obrigatoriedade do trabalho, mas estabelece que o trabalho deverá ser de acordo com a aptidão física e mental do condenado.

Há exceções quanto a obrigatoriedade do trabalho, a primeira está prevista no parágrafo único, do artigo 31, com a seguinte redação: “Para o preso provisório, o trabalho não é obrigatório e só poderá ser executado no interior do estabelecimento”

e a outra no artigo. 200, da LEP, que determina que o preso político não está obrigado ao trabalho.

Com relação ao preso provisório, fundamenta-se na presunção de inocência, uma vez que esses presos aguardam o julgamento. A privação de liberdade nesses casos acontece por força de lei, conforme artigo 312, do Código de Processo Penal, os motivos são a aplicação da lei, a garantia da ordem pública e o regular andamento do processo. Em que pese não seja obrigatório, configura um direito cabendo ao

Poder Público fornecê-lo, porém a lei determina que esse trabalho poderá ser executado apenas dentro do estabelecimento penal.

Como mencionado anteriormente, o trabalho deverá ser de acordo com a aptidão física e mental do condenado, em complemento a essa determinação, o artigo 32 estabelece que deverão ser levadas em conta a habilitação, a condição pessoal e as necessidades futuras do preso, bem como as oportunidades oferecidas pelo mercado. O §1º estabelece que deverá ser limitado, tanto quanto possível, o artesanato sem expressão econômica, salvo nas regiões de turismo.

Sobre o artesanato Norberto Avena16 discorre:

[..] Quando desenvolvida sem qualquer controle da atividade e dos períodos supostamente trabalhados. Evidentemente, não se está dizendo que a remição pelo trabalho artesanal seja proibida, mas sim que, para tanto, sua prestação deve ser devidamente comprovada pela autoridade responsável do presídio – que, inclusive, deve viabilizá-la, muito especialmente nos casos em que o estabelecimento não possua infraestrutura suficiente para oferecer outro tipo de qualificação profissional ao recluso.

Nos demais parágrafos desse artigo traz determinações acerca dos trabalhos a serem desenvolvidos pelos maiores de 60 anos e os doentes ou deficientes físicos.

Com relação aos idosos a Lei se preocupa com o determinado no Estatuto do Idoso (Lei 10.741, de 01/10/2003), que em seu artigo 99, determina que constitui crime a conduta que expõe a perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica do idoso, sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado. Com relação aos doentes ou deficientes físicos a LEP determina que essas pessoas somente exercerão atividades apropriadas ao seu estado.

4.2.3. O trabalho externo.

O trabalho externo, ao contrário do interno, é aquele realizado fora do estabelecimento penal, está previsto nos artigos 36 e 37, da LEP.

O artigo 36, dispõe que “o trabalho externo será admissível para os presos em regime fechado somente em serviço ou obras públicas realizadas por órgãos da Administração Direta ou Indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina”. Assim, quando a pessoa está

16 AVENA, Norberto. Execução Penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. P. 255

cumprindo a pena no regime fechado ela está autorizada a realizar o trabalho externo, desde que siga as regras determinadas nesse artigo, com a observância direta para que seja prevenida a fuga.

Também, deve ser observado o limite de apenas 10% de presos em relação ao total de trabalhadores, a finalidade dessa disposição é a diluição do grupo de presos entre os trabalhadores para que seja efetivado da melhor forma possível a reintegração social, mas também permite que haja melhores condições de controle e vigilância.

O artigo 37, da Lei de Execução Penal traz que cabe à direção do estabelecimento prisional deliberar sobre o trabalho externo. Nesse sentido, o entendimento de Renato Marcão, observando que “a autorização para o trabalho externo não se insere no rol das atividades jurisdicionais, não estando incluída no art.

66 da Lei de Execução Penal”.

Traz também os requisitos para a concessão da autorização do trabalho externo, se dividem em subjetivo e objetivo. O subjetivo diz respeito à aptidão, disciplina e responsabilidade do preso. A disciplina confunde-se com o histórico de sua conduta no ambiente carcerário, o prognóstico de bom comportamento na execução do trabalho que lhe for atribuído e a ausência de registros de fugas. A responsabilidade é em relação ao desempenho adequado das tarefas que lhe foram designadas.

O requisito objetivo é o cumprimento de 1/6 da pena quando o condenado cumpre a pena no regime fechado. Há uma discussão se o condenado ao regime semiaberto deve, ou não, cumprir 1/6 da pena para ter direito ao trabalho externo.

Alguns doutrinadores dizem que se deve cumprir 1/6 porque a LEP se silenciou acerca da aplicação do artigo 37 aos presos diretamente condenado ao regime semiaberto.

Acerca do assunto Roig17 leciona.

Além disso, permitir o trabalho externo com a fração de 1/6 da pena para presos que vieram do fechado e negá-lo para os diretamente condenados no semiaberto violaria os princípios da razoabilidade (pois trataria com maior rigor os condenados a regime menos gravoso) e da isonomia (pois criaria duas classes de presos, dentro de um mesmo regime).

17 ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal: teoria crítica. 4. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. P. 194

Há decisões do Supremo Tribunal Federal (HC 86.199/SP) e do Superior Tribunal de Justiça (HC 255.781/RS) afirmando que não se deve exigir o cumprimento de 1/6 da pena em regime inicial semiaberto para permitir o trabalho externo.

Ainda, não existem as mesmas restrições prevista para o que cumpre no regime fechado, podendo ser prestado, portanto, em serviços, em obras públicas ou em entidades privadas.

É necessário, também, a análise das aptidões e capacidade do preso para a realização do trabalho externo, observando a idade e condição pessoal.

Tem a previsão de revogação se o apenado praticar fato definido como crime, ou ser punido com falta grave, ou, ainda, se faltar com os deveres de disciplina e responsabilidade estabelecidos no caput do artigo 37, da LEP.

A prática de fato definido como crime, para Norberto Avena, não é necessária a existência de condenação transitada em julgado, “mesmo porque a causa da revogação não está na culpabilidade do apenado pelo delito cometido, mas sim no seu desmerecimento diante da conduta praticada”.

A punição por falta irá acarretar a automática revogação do trabalho externo. O ato de indisciplina ou falta de responsabilidade seria o comportamento contrário aos requisitos estabelecidos na lei, tanto no exercício da atividade laborativa como em sua vida carcerária.

4.2.4. Da aplicabilidade da CLT e a remuneração do preso.

Uma importante característica do trabalho do preso é que não é possível a aplicação da CLT. Norberto Avena (2019, p. 41) traz que “o vínculo que se institui, portanto, é de direito público e não um vínculo empregatício”, assim quando um preso exerce o trabalho, além dos benefícios da reintegração social, possui um salário que não pode ser inferior a ¾ do salário-mínimo.

Apesar da LEP estabelecer que a remuneração não pode ser inferior a ¾ do salário-mínimo, Roig e Alexis Brito defendem que o preso tem a garantia constitucional de receber ao menos um salário-mínimo. Alexis18 discorre

Sabemos que os direitos não suspensos por incompatíveis com a prisão deverão ser mantidos. Neste passo, embora o trabalho do preso não esteja sujeito à Consolidação das Leis do Trabalho, conforme expressamente

18 BRITO, Alexis Couto de. Execução Penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. P. 175.

dispõe o art. 28, § 2o, da Lei de Execução Penal, estará sujeito aos direitos constitucionalmente previstos e não atingidos pela condenação.

Atualmente no Brasil, somente a Constituição do Estado do Rio de Janeiro determina que a remuneração do preso deve ser igual a remuneração dos trabalhadores livres.

Ainda, sobre a remuneração o artigo 29, §1º, da LEP, traz que o produto deste deverá atender: à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outros meios, à assistência à família, a pequenas despesas pessoais, ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores. Em relação a indenização dos danos causados é necessário que a sentença condenatória estabeleça o dever de reparação do dano.

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