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Capítulo IV Linguagem, tecnologia e mediação

4.4. Do Modelo de “Propaganda” ao Modelo Reticular

Gustavo Cardoso (2008) defende que, atualmente, o modelo de comunicação se baseia na comunicação em rede, que resulta numa alteração significativa dos processos comunicacionais tendo por base a mediação tecnológica, que surge com a invenção da internet. Neste sentido, e segundo autor, mais importante que a mudança tecnológica face ao sistema de media, deve ser considerada mais relevante a forma como os utilizadores nos contextos privados e públicos desenvolvem procedimentos e práticas de consumo dos media, da tecnologia e da mediação. Ou seja, como as pessoas configuram e combinam dispositivos de comunicação interpessoal (ex. telefone) com outros de comunicação de massa (ex. televisão).

Mais que convergência, Cardoso (2008) propõe a análise do sistema de media baseado numa rede estruturada essencialmente em duas redes que se intersetam e que se baseiam nos sistemas de internet e de televisão, articulando-se também com outras tecnologias como o telefone, a rádio, a imprensa escrita, entre outros. A sua proposta passa pelo entendimento de um novo modelo de comunicação no contexto da sociedade de informação, que se explica pelas seguintes características: i) processos de globalização através da comunicação; ii) criação de redes de meios de comunicação de massa e interpessoal e consequentemente mediação em rede; iii) diferentes graus de utilização da interatividade. Segundo o investigador, uma comunicação global é essencial para a criação de um mercado global. Um sistema global de media promove simultaneamente a homogeneização e a diferenciação dos mercados, favorece a centralização e ao mesmo tempo propicia a dispersão do poder enquanto implementa uma integração cultural e o pluralismo (Cardoso, 2008: 597-598).

Apresentadas como duas importantes dimensões do novo modelo de comunicação - existência de diferentes media articulados em rede e de uma mediação em rede – Cardoso (2008) ilustra com os exemplos dos ataques na Gare da Atocha, em Madrid, dia 11 de Março de 2004, e o dia das eleições espanholas dia 25 de Março do mesmo ano. No caso dos ataques, além das emissões de televisão e rádio, o acontecimento foi apropriado pela população através de telemóveis e internet, desenvolvendo um processo de rede, que envolveu mensagens de sistemas de comunicação interpessoal. Defende Cardoso (2008) que a comunicação interpessoal pode ser transformada num media de massas se tiver lugar numa rede eletrónica. Aqui a comunicação interpessoal pode transformar-se num fenómeno de dimensão

coletiva. No que se refere a um sistema de media em rede, as pessoas assistem televisão e leem jornais, mas ao mesmo tempo comunicam umas com as outras e perguntam-se ou não se o que está a ser dito pode ser ou não verdade. Um dos exemplos dados por Cardoso (2008), para ilustrar o sistema de media em rede, foi a combinação de mensagens de email e televisão observada durante o protesto em Seattle durante a Millennium Round da World Trade Organization, em 1999, ou nas manifestações pela libertação de Timor-Leste, no mesmo ano. Os protestos em Seattle foram organizados essencialmente através da internet, maioritariamente através de email e websites de posts, mas que, efetivamente, o fenómeno só conseguiu ganhar peso com a transmissão de imagens pelos canais de televisão. A internet consegue conquistar um lugar tradicionalmente ocupado pelas estruturas pessoais nas redes locais, o que faz com que pessoas com interesses similares mas dispersas geograficamente/ espacialmente possam coordenar as suas ações. Desta forma, os participantes em protestos também concebem a internet enquanto necessária e estruturante das suas ações, mas, apesar disso, utilizada sozinha não consegue obter a legitimidade ou poder necessários para conseguir atingir os seus propósitos, assim, torna-se imprescindível que as manifestações de protesto nas ruas sejam organizadas através da internet, mas continuando a depender fortemente da divulgação através da televisão, para conseguir atingir mais pessoas.

Segundo Cardoso (2008), a interatividade é uma das características do novo modelo de comunicação. Podem existir vários níveis de interatividade, sendo que isso depende dos próprios utilizadores. Segundo dados apresentados pelo autor, retirados do World Internet Project e do Obercom; em Portugal, a mais comum das atividades multi-tasking que se realiza ao mesmo tempo que se assiste televisão é o envio de mensagens SMS ou falar ao telefone, assim como, enquanto se navega na internet as atividades mais comuns são ouvir música e o envio de mensagens instantâneas (chat) através da internet.

A utilização em rede de diferentes dispositivos pode estar relacionado com o grau de interatividade que é conferido às necessidades dos usuários. O novo modelo de comunicação em rede refere-se a um sistema de media em que a interatividade oferece a forma ao modelo de organização. Este sistema de media apresenta dois nós centrais, um centrado na baixa interatividade em que a televisão é protagonista, e num outro em que o centro é a internet oferecendo alto grau de interatividade. Estes diferentes nós de media estão conectados maioritariamente através dos dispositivos de comunicação interpessoal e que também podem ser usados durante, nomeadamente telemóveis (email), ipods, e especiais tecnologias como o Wi-Fi, entre outros (Cardoso, 2008: 598).

Para o autor, observa-se uma tendência para a adaptação e remistura dos vários media, através do seu uso, alterando por vezes a sua natureza de organização, de tecnologia e de difusão, através de sistemas em rede. Esta é a principal razão porque a articulação em rede dos media de comunicação interpessoal e de massas e, consequentemente a mediação está a ser socialmente moldada pela interatividade na nossa sociedade.

Cardoso (2008: 587-630) defende, ainda, que o novo paradigma comunicacional conduziu ao nascimento de uma nova configuração do sistema de media, com base nos seguintes fatores: i) uma retórica assente maioritariamente na imagem em movimento; ii) novas dinâmicas de acessibilidade à informação, iii) utilizadores enquanto inovadores, iv) inovação nas notícias e no entretenimento (2008: 587-630).