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2 O PATRIMÔNIO CULTURAL E O DOCUMENTO ARQUIVÍSTICO

2.1 O DOCUMENTO ARQUIVÍSTICO COMO PATRIMÔNIO

Os documentos arquivísticos são produzidos e mantidos por organizações e pessoas para registrar suas atividades e servirem como fonte de provas e informação. Para tanto, eles necessitam permanecer tal qual foram gerados, para cumprirem fielmente sua função ao longo do tempo, fornecerem evidência de suas ações e contribuir para a ampliação da memória de uma comunidade ou da sociedade como um todo.

Para tanto, no caso dos documentos arquivísticos pesquisados que registram as ações governamentais de uma determinada época da história do país e comprovam os fatos que compõem parte da memória, sendo assim, é considerado patrimônio cultural em forma de legado para a posteridade, devido à sua função como documento arquivístico do poder público brasileiro.

A preservação, a classificação ou o tombamento de objetos móveis e imóveis decorre do significado simbólico que atribuímos a ele. Todo o produto material das culturas humanas é dotado de uma funcionalidade, um fim para o qual é executado. O valor simbólico que atribuímos aos objetos, artefatos, é decorrente da importância que lhe atribui à memória coletiva. É essa memória que nos impele a desvendar significado histórico-social, refazendo o passado em relação ao presente, e a inventar o patrimônio dentro dos limites possíveis, estabelecidos pelo conhecimento (CAMARGO, 2002, p. 30).

Assim é com o patrimônio documental, pode ser definido como um conjunto de bens que possui valor próprio, uma representação da sociedade, de valor relevante para a memória do povo, e a herança do passado a ser preservada para gerações futuras.

No que se refere aos acervos documentais das instituições da Administração Pública Federal, ocorre o mesmo, necessitando, portanto, ser preservada e manter-se acessível, para tornar-se um legado para cumprir sua função, a de transmitir a história às futuras gerações.

A Declaração Universal sobre os Arquivos11 elucida algumas questões priorizadas no debate internacional acerca dos princípios e obrigações internacionais no tratamento de arquivos referente ao campo das obrigações estatais, estabelece como um dos objetivos prioritários que “os arquivos sejam geridos e conservados de forma a garantir a sua autenticidade, confiabilidade, integridade e uso”.

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11 CONSELHO INTERNACIONAL DE ARQUIVOS. Declaração Universal Sobre Os Arquivos. 2010. Disponível em: <http://ica.org/em/universal-declaration-archives>. Acesso em: 05/07/2016

Considerando que a informação arquivística, produzida, recebida, utilizada e conservada em sistemas informatizados, vem constituindo um novo tipo de legado: o patrimônio arquivístico digital;

Considerando que este patrimônio arquivístico digital se encontra em perigo de desaparecimento e de falta de confiabilidade, e que sua preservação em benefício das gerações atuais e futuras é uma preocupação urgente no mundo inteiro [...] (CONSELHO NACIONAL DE ARQUIVOS, 2004, p.1).

Entende-se assim, que a preservação digital aplica-se a garantir que as informações sejam conservadas de forma legível e acessível, mantendo simultaneamente as suas características de autenticidade e integridade pelo tempo que se fizer necessário. Dessa maneira, a preservação digital é uma política de contenção as ameaças e riscos, para colaborar com a manutenção de um legado cultural, histórico e científico.

Do mesmo modo, alguns recursos existem cada vez mais em formas digitais, e progressivamente apenas no formato digital, e neste caso, quando um recurso nasce na forma digital não há outro formato além do original em digital. Alguns desses recursos tem valor passado e significativo, abrangendo qualquer área do conhecimento e expressão humana, constituindo um patrimônio que deve ser protegido e preservado para as gerações correntes e futuras. O patrimônio digital é constituído, dentre outras possibilidades, por arquivos de texto, bases de dados, programas de computador, páginas Web, imagens estáticas e em movimento, gráficos, áudio, abrangendo uma vasta e crescente variedade de formatos (LIMA, 2007, p. 15).

Portanto, a técnica da preservação faz com que o patrimônio digital possa ser transposto, considerando que os documentos digitais, além de possuírem características complexas e específicas, são de fácil transmissão, replicáveis, editáveis, acessíveis, dentre outros.

No entanto, diante da arquivística contemporânea, entende-se que a preocupação maior dá-se em função da manutenção dos documentos digitais, e acaba por provocar uma mudança de paradigma, levando à busca por um novo modelo de forma que mantenha o “documento contínuo”, modelo de gerenciamento de documentos, o Record Continuum (RC), desenvolvido por Upward (1996,1997) e demais colegas, que conforme Stefan (2010), trata-se de um dos modelos de gerenciamento de documentos utilizados pela comunidade arquivística internacional, o recordkeeping.

O recordkeeping, definido também pelo criador Upward et al. (2013), como record

keeping, destaca-se por várias características; sendo uma delas, a de abranger todas as

atividades de gestão documental: de criar, capturar, organizar e socializar; outra a de não considerar o documento físico como produto final.

O diferencial dos estudos de Upward et al (2012, 2013), está em função da ausência de referencial teórico-prático recorrente à reciclagem e formação dos arquivistas. A questão ocorre visto a necessidade de tratar o documento enquanto processo em ambiente digital e não

como produto final. Ademais, atribui-se a esse diferencial, a quebra de paradigma do documento analógico em relação ao digital, bem como o aumento e a complexidade das mudanças nas estruturas nas organizações.

Ressalta-se que, diante das inúmeras mudanças que a tecnologia impõe dia a dia não basta a preocupação com a técnica da preservação, ou com a gestão das ferramentas tecnológicas, há que se pensar na responsabilidade de maior alcance dos arquivistas diante dessas mudanças ante a obsolescência tecnológica; a de pensar em assegurar os documentos de forma íntegra e autêntica vislumbrando-os como patrimônio documental.

De acordo com Reed (2013), as práticas profissionais arquivísticas permanecem praticamente inalteradas e essencialmente voltadas para o papel e para atender as demandas atuais; há que entender que, diante da evolução tecnológica desenfreada e do impacto causado nos arquivos não há mais como continuar com as mesmas regras, práticas, modelo de comportamento; alterações profundas estão a ocorrer com a transição do analógico para digital, cenário esse que exige um pensar e atuar mais pró-ativo para assim garantir uma vida longa aos documentos permanentes de modo que assegure a integridade e a autenticidade em longo prazo.