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4.1 Domínio-Fonte das metáforas económicas: ECONOMIA É GUERRA

Em face da vasta bibliografia produzida no âmbito do paradigma cognitivo desenvolvido desde 1980, serão focados apenas alguns conceitos teóricos fundamentais para a análise dos cartoons económicos.

Gostaríamos de sublinhar, de novo, que a abordagem cognitiva encara a linguagem como um sistema de categorização e estruturação do mundo, pelo que os linguistas cognitivos investigam o conhecimento do mundo e as representações linguísticas que lhe são indissociáveis. A categorização linguística constitui uns dos temas centrais do paradigma cognitivo, pelo que se depreende que a semântica se arroga como a área central da linguística cognitiva. Por um lado, no plano semasiológico, a linguística cognitiva envereda, num primeiro plano, pelo estudo das categorias polissémicas, sendo que, por outro, no plano onomasiológico, dedica-se ao estudo das representações linguísticas (as quais se incluem as representações terminológicas das linguagens especializadas, cf. Faber 2012), bem como ao estudo produtos artísticos e criativos da mente humana, nos quais incluímos obviamente os cartoons enquanto montagens criativas de tipo multimodal.

Como vimos anteriormente, as metáforas servem principalmente para estruturar domínios abstratos ou delineados de forma pouco clara relativamente aos domínios de partida concretos e motivados por domínios da experiência física. Vários estudos empíricos mostram a ubiquidade das metáforas conceptuais em diferentes tipos de domínios conceptuais, partindo de conceitos de chegada como o tempo (Johnson, 1987), a raiva, o orgulho e o amor (Kövecses, 1986), até domínios altamente complexos, como a economia (Jäkel, 1997, Brône/Feyaerts 2005), as ciências ambientais (Larson 2011), a política (Lakoff, 2012), a religião (Howe/Green, 2014), entre muitos outros. O exemplo (1) mostra alguns casos, tirados de Jäkel (1997), que podem ser reduzidos a uma única metáfora conceptual: a competição económica é uma guerra.

a. “(…) a maior batalha pelo poder na história empresarial da América.” b. “A Sears (…), a competir com a Grattan, admitiu a derrota.”

c. “Ele começou com uma pequena fábrica e agora é o dono de um império industrial gigante.”

Nos três exemplos, o conceito de chegada da competição económica é estruturado ao ser extraído do domínio muito mais concreto da GUERRA. Ao usar este domínio de partida, a rivalidade entre as empresas concorrentes é conceptualizada como uma “batalha” na qual os adversários “competem” por um objetivo específico e tentam “derrotar” os outros. Ao derrotar os adversários, uma empresa consegue alargar o seu “império”. Repare-se que a conceptualização metafórica não funciona apenas como estratégia estética para ornamentar o discurso.

A TMC comprova através de diversos estudos que os domínios abstratos do conhecimento (como, por exemplo, a economia) não podem ser conceptualizados sem o recurso a imagens metafóricas. Em suma, os mapeamentos metafóricos dos domínios-fonte para os domínios-alvo são indispensáveis na conceptualização dos conceitos abstratos, como, por exemplo, o desenvolvimento económico.

Nos três exemplos, o conceito de chegada da ECONOMIA, concretamente a competição económica é estruturado a partir do domínio muito mais concreto de GUERRA. Ao usar este domínio de partida, a rivalidade entre as empresas concorrentes é conceptualizada como uma “batalha” na qual os adversários “competem” por um objetivo específico e tentam “derrotar” os outros.

A TMC (teoria da metáfora conceptual) evidenciou várias vezes que os domínios- alvo abstratos (como por exemplo, a economia) não podem ser conceptualizados sem o uso de metáforas conceptuais. Em suma, os mapeamentos metafóricos dos domínios-fonte para os domínios-alvo são indispensáveis na conceptualização dos conceitos abstratos, como por exemplo, o desenvolvimento económico.

Integração conceptual enquanto mecanismo de compressão nos cartoons No âmbito da teoria da integração conceptual é posto em destaque o facto de se registar uma compressão de elementos de diferentes espaços físicos e

face da coerência imprescindível entre os espaços de input incluídos nos processos de mesclagem. Dado que esta questão não é fulcral à nossa análise faremos apenas uma breve abordagem da mesma.

Voltando ao artigo de (Feyaerts/Brône, 2005), a análise de uma série de cartoons e metáforas ilustradas revelou padrões de compressão semelhantes. Isto corrobora a nossa afirmação de que a ligação dupla é fundamentalmente uma estratégia cognitiva aplicada para comprimir informação de forma compacta e expressiva. Por isso, não surpreende que esta estratégia seja particularmente frequente em “tipos de discurso” que são principalmente favoráveis ao discurso. Os cartoons e os cabeçalhos funcionam ambos como resumos atrativos ou optimizadores de relevância (Dor, 2003) e são como resultado particularmente adequados a esta operação de mistura.

Geert Brône and Kurt Feyaerts

Considere o cartoon na Figura (Karl Meersman em Trends Magazine, n.º 13, 2001), que se refere à situação financeira precária da Innogenetics, uma empresa belga de engenharia genética, sob a alçada de uma empresa-mãe alemã. No cartoon, o edifício da empresa Innogenetics recebe uma injeção com uma seringa cheia de notas de 100 alemãs. O texto a acompanhá-lo diz: “Dinheiro fresco dá à Innogenetics espaço para respirar”. Tal como no caso dos cabeçalhos, interpretar este cartoon envolve desenvolver uma rede de integração conceptual de (pelo menos) três espaços de input e um espaço de mesclagem. Os dois espaços de input estão ligados como fonte e alvo de uma metáfora convencional de que as empresas são como pacientes, de acordo com a qual as empresas que precisam de ajuda financeira são representadas como pacientes, que precisam de ajuda e tratamentos, que consistem em, por exemplo, receber uma injeção com medicamentos, vitaminas, etc. (Jäkel, 1997). O enquadramento do espaço de input 1 é projetado na mesclagem: uma mão pega numa seringa, cujo conteúdo é injetado num edifício. Na representação do cartoon, a estrutura metafórica de que as empresas são como pacientes interage com outra metáfora convencional: o dinheiro é um líquido, que é representado por uma mistura local da nota do banco (alvo) enrolada dentro da seringa (fonte). Um terceiro espaço de input é o espaço da Innogenetics, que elabora (contextualiza) o domínio de chegada (segunda introdução) da metáfora convencional de que as empresas são como pacientes. Este espaço de input contém, para além do conhecimento geral acerca da engenharia genética, mais conceitos específicos relacionados com esta firma em particular, tal como a cidade belga de Gent, uma empresa-mãe alemã, problemas financeiros e, a propósito, também esboço do edifício atual da empresa. A partir deste espaço de introdução, o edifício com o nome da empresa é projetado na mesclagem, onde representa a empresa metonimicamente no papel de paciente.

conceptuais envolvidos, o da cura da doença, representada metonimicamente pela seringa e o da economia, representado metonimicamente pelo edifício da empresa. Não será, pois, difícil reconhecer o mapeamento metafórico entre dois domínios conceptuais que vai entroncar nas metáforas conceptuais EMPRESAS SÂO PACIENTES e DINHEIRO É LÍQUIDO. É importante sublinhar que a seringa enquanto instrumento usado em medicina genética também se relaciona metonimicamente com o nome da empresa Innogenetics.

Embora em ambas as introduções a seringa esteja relacionada metonimicamente com o conceito temático (paciente, Innogenetics), há uma diferença fundamental na proeminência entre ambas as estruturas metonímicas, que pode ser explicada como discrepâncias na convencionalidade e na relevância contextual. Num contexto económico em que as empresas têm problemas financeiros, a interpretação metonímica de uma seringa relativamente à introdução de paciente é muito mais proeminente do que a interpretação enquanto instrumento de engenharia genética. Relativamente à introdução de Innogenetics, a interpretação metonímica da seringa enquanto instrumento de pesquisa não faz parte de uma estrutura convencional de significado, nem é suportada pelo contexto económico deste cartoon. A não-convencionalidade desta estrutura metonímica é atribuída à distância relativamente grande entre os conceitos envolvidos nesta metonímia: a seringa representa a empresa Innogenetics apenas através da relação de “um instrumento típico usado em pesquisa”.

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— Análise multimodal dos cartoons de economia à luz do