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3 REVISÃO DA LITERATURA

3.8 TRANSFERÊNCIA DE CONHECIMENTO NA INTERAÇÃO UNIVERSIDADE EMPRESA

3.8.2 As duas dimensões do conhecimento

A nova economia ou como preferem alguns estudiosos a “Era do Conhecimento” tem enfatizado a importância do conhecimento tácito como fator de inovação,

competitividade e sucesso das organizações, o que tem demandado a construção de ambientes mais propícios à aprendizagem e à inovação. Essa exigência atual se dá em função da necessidade de adaptação a diferentes tipos de tecnologias emergentes e ao mercado globalizado, que tem como principal característica o dinamismo e a competitividade.

Neste contexto, Nonaka e Takeuchi (1997) fazem uma crítica à forma com que os ocidentais tratam o processo de criação e compartilhamento do conhecimento, essa crítica recai sobre a ênfase dada à divisão cartesiana entre sujeito e objeto, conhecedor e conhecido, o que na visão dos autores deu origem a uma imagem da organização como mero mecanismo para “processamento de informações”. Nesse caso, os autores criticam, com bastante propriedade, as teorias ocidentais sobre gerenciamento e organização, quando afirmam que elas se preocupam apenas com “a aquisição, acumulação e utilização de conhecimentos existentes; falta-lhes a perspectiva da criação de novos conhecimentos”.

Nessa abordagem, segundo eles, a organização processa informações a partir do ambiente externo para se adaptar a novas circunstâncias. E que, embora tenha sido muito eficaz no sentido de explicar como as organizações funcionam, apresentam uma limitação fundamental: ela não explica a inovação. Afirmam que quando as organizações inovam, elas não só processam informações de fora para dentro – visando resolver problemas e se adaptar ao ambiente em que atua - mas criam novos conhecimentos e informações de dentro para fora, com o objetivo de redefinir tanto os problemas quanto as soluções e, nesse processo criar e recriar seu meio.

Eles propõem uma nova abordagem para explicar a inovação, uma nova teoria da criação do conhecimento organizacional. Essa abordagem é interessante para a pesquisa pois o processo de inovação, conforme já destacado no trabalho, é resultante de um processo complexo e contínuo de experiências nas relações entre Ciência, Tecnologia e P&D nas universidades, empresas e governos.

A principal premissa dessa teoria é que o segredo para a criação e compartilhamento do conhecimento está na mobilização e conversão do conhecimento tácito, destacam que a pedra fundamental consiste na distinção entre o conhecimento tácito e o explícito. Essa teoria contém duas dimensões: a epistemológica e a ontológica, conforme apresentado na figura 23:

Figura 23: Duas dimensões do conhecimento

Na dimensão ontológica, os autores defendem que o conhecimento só pode ser criado por indivíduos, portanto, uma organização não pode criar conhecimento sem a participação dos indivíduos. A organização apóia os indivíduos criativos ou lhes proporciona contextos favoráveis para a criação do conhecimento. Dizem que a criação do conhecimento organizacional deve ser entendida como um processo que amplia “organizacionalmente” o conhecimento criado pelos indivíduos, cristalizando-o como parte da rede de conhecimentos da organização. Acrescenta, que esse processo ocorre dentro de uma “comunidade de interação” em expansão, podendo extrapolar os níveis e fronteiras inter-organizacionais (NONAKA; TAKEUCHI, 1997, p. 65).

Quanto à dimensão epistemológica, os autores baseiam-se na distinção estabelecida por Polany (1966) entre conhecimento tácito e conhecimento explícito. Polany (1966) apresenta uma relação entre tácito e explícito ao descrever o conhecimento como um objeto capaz de ser articulado através das palavras. O conhecimento tácito é pessoal, especifico ao contexto, adquirido através da prática, da experiência, dos erros e dos acertos e, assim, difícil de ser formulado e transmitido de maneira formal. É o conhecimento que temos, mas do qual não temos consciência, envolve fatores intangíveis como, por exemplo, crenças pessoais, cultura, perspectivas, valores, insights, intuições, emoções, habilidades entre outros. É considerado pelos autores como a principal fonte de inovação nas organizações e só pode ser avaliado pela ação. Já o conhecimento explícito ou “codificado” refere-se ao conhecimento transmissível em linguagem formal e sistemática, ou seja, é o conhecimento

que pode ser documentado em livros, manuais, portais ou transmitido através de correio eletrônico ou por via impressa.

Nonaka e Takeuchi (1997) expandem essa categorização apresentada por Polany (1966), que concebia o conhecimento tácito num contexto amplamente filosófico, trazendo-o para uma dimensão mais dinâmica, de interação. Os autores defendem que o conhecimento tácito inclui elementos cognitivos e também técnicos. Os elementos cognitivos centram-se em “modelos mentais”, onde os seres humanos criam modelos do mundo estabelecendo e manipulando analogias em suas mentes, como esquemas, paradigmas, perspectivas, crenças e pontos de vista que ajudam os indivíduos a perceberem e definirem seu mundo. Já os elementos técnicos do conhecimento tácito incluem know-how concreto, técnicas e habilidades.

O conhecimento tácito, segundo Nonaka e Takeuchi (1997, p. 66), é criado “aqui e agora” em um contexto prático especifico e implica num processo de qualidade “análoga”, ou seja, o compartilhamento do conhecimento tácito entre indivíduos através da comunicação. Esse procedimento análogo exige uma espécie de “processamento simultâneo” das complexidades dos problemas compartilhados por eles. Já o conhecimento explícito lida com os acontecimentos passados ou objetos “lá e então” e é orientado para uma teoria independente do contexto.

Assim, a transferência do conhecimento tácito é um grande desafio de aprendizagem para as organizações. Este desafio, de acordo com Carvalho (2005), abrange a identificação, conversão, transferência e disseminação de um conhecimento que nem sempre é passível de explicitação. Mas, de acordo com Nonaka e Takeuchi (1997, p. 62-67) o segredo para a criação do conhecimento está na mobilização e conversão do conhecimento tácito e, que o conhecimento tácito e o conhecimento explícito não são entidades totalmente separadas – conforme defendem as teorias ocidentais - e sim mutuamente complementares. Esses dois tipos de conhecimentos, na visão dos teóricos, interagem um com o outro e realizam trocas nas atividades criativas dos seres humanos.

Reforçam essa idéia ao enfatizar em suas reflexões que a criação do conhecimento “está ancorada no pressuposto crítico de que o conhecimento humano é criado e expandido através da interação social entre o conhecimento tácito e o conhecimento explícito, eles chamam essa interação de “conversão do conhecimento”, esse processo, segundo eles é eminentemente social, acontece entre indivíduos, e não apenas com um único indivíduo. (NONAKA; TAKEUCHI, 1997, p. 62-67)

Para explicar melhor esse fenômeno os autores dizem que a idéia de “conversão do conhecimento” se aproxima de um modelo desenvolvido na psicologia cognitiva – o ACT. Esse modelo, segundo os autores, defende a seguinte hipótese: para as habilidades cognitivas se desenvolverem, todo conhecimento declarativo, que corresponde ao conhecimento explícito, tem de ser transformado em conhecimento processual, que corresponde ao conhecimento tácito, usado em atividades como andar de bicicleta ou tocar piano. Porém, apontam uma limitação desta teoria, “os defensores desse modelo consideram a transformação do conhecimento como sendo, sobretudo, unidirecional, de declarativo (explícito) em processual (tácito), enquanto eles argumentam que a transformação é interativa e em espiral” (NONAKA; TAKEUCHI, 1997, p.68).