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2. METODOLOGIA E APRESENTAÇÃO DO CORPUS

2.2 Descrição dos principais elementos do corpus

2.2.3 A edição de 2014 traduzida por Terron

Joca Reiners Terron é o tradutor brasileiro da edição de 2014 da Cosac Naify, cujas ilustrações são de Ronaldo Fraga e o posfácio é da professora Sandra Guardini T. Vasconcelos. Esta tradução chega ao mercado 80 anos após a publi-cação do livro em inglês e 50 anos depois do lançamento do filme pelos Estúdios

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da Disney em 1964, em um momento em que a imagem da babá Mary Poppins não povoa o imaginário da maioria das crianças brasileiras, como acontecia na época do lançamento da primeira tradução em 1967.

O tradutor Terron (1968-) é um autor premiado de romances para adultos considerados inovadores, sendo também poeta, artista gráfico e editor, embora não haja uma conexão imediatamente perceptível entre ele e o público infantil. Alguns de seus livros são: Do fundo do poço se vê a lua (Companhia das Letras, 2010), Não há nada lá (Má Companhia, 2011) e A tristeza extraordinária do Leo-pardo-das-Neves (Companhia das Letras, 2013). No final dessa edição de Mary Poppins, há alguns parágrafos sobre Terron, citando dados sobre seus estudos, carreira e livros publicados, embora pouco seja mencionado sobre sua experiência como tradutor (apenas a citação de dois livros que traduziu) e nada seja dito sobre seu envolvimento com os leitores mirins. Nesse sentido, a escolha de Terron como tradutor poderia sugerir a ampliação do público-alvo do livro, passando de infan-tojuvenil para jovens adultos ou adultos. Em uma entrevista13 bastante reveladora, Terron afirma que partiu do zero nesta tradução, ou seja, iniciou o trabalho com pouquíssimas referências sobre o personagem principal. Ele sugere que esta talvez tenha sido uma de suas traduções mais difíceis, pois precisou fazer escolhas voca-bulares que se adequassem à Inglaterra protestante dos anos 1930, sem interferên-cias da sociedade católica brasileira. Tal fato sugere uma valorização do contexto de partida em detrimento do de chegada e uma possível estratégia estrangeirizan-te, assunto que será analisado no capítulo 3. Em artigo para o Valor Econômico Online, em 20/06/2014, Terron sugere que a estratégia por ele adotada foi a de se manter o mais próximo possível do texto de partida, conforme abaixo:

Todo clássico exige um esforço de interpretação (...). É normal e ao mesmo tempo terrível que seja assim, porque ao ler o texto original você percebe justamente aquela riqueza que não passa pelo olhar de outro. Meu esforço foi manter o texto integral, sem adaptações. A única interferência que houve foi mudar o esquema de diálogos, usando travessão em lugar de aspas.(Moraes, 2014, n.p.)

O ilustrador desta edição do livro é o famoso estilista mineiro Ronaldo Fra-ga nascido em 1966. No final da edição, há alguns parágrafos biográficos sobre Fraga, citando seus estudos, prêmios, trabalhos e desfiles de moda, inclusive uma 13 http://arte1.band.uol.com.br/versao-fashion/, acessado em 27/06/2015. PUC-Rio - Certificação Digital 1412284/CA

coleção de roupas voltada para crianças. O trecho informativo sobre Fraga prece-de o trecho sobre Terron, sugerindo que a editora prece-deu uma importância maior ao estilista do que ao tradutor nesta obra específica. Cabe ressaltar, no entanto, que, segundo o artigo do Valor Econômico citado anteriormente, Fraga e Terron não se conheciam durante o processo de tradução e ilustração do livro, tendo se encon-trado pela primeira vez no momento da entrevista concedida a esse meio de co-municação. Assim, surge a pergunta: será que há harmonia entre o texto de Terron e as imagens de Fraga? Essa questão, junto com outras relacionadas às ilustrações, será analisada na seção 3.9.

Em relação ao livro propriamente dito, sua primeira capa cita inicialmente, em letras de tamanho médio, o nome da autora P. L. Travers. Em seguida, vem destacado o título Mary Poppins em letras enormes. Abaixo, há o nome do ilus-trador antes e em letras maiores do que o nome do tradutor, que vem por último na capa. Cabe ressaltar que a capa rosa vibrante, repleta de barquinhos de origami, nuvens e estrelas cadentes, não contém imagens da personagem principal como havia no original. A imagem de Mary Poppins vai sendo construída aos poucos na medida em que as páginas do livro são abertas: primeiro a sua maleta, depois a sombrinha, seguida das botinas e da casa; a imagem da personagem só é vista mesmo nas páginas 20 e 21, dando bastante espaço para a imaginação. Por todos esses motivos, essa capa mostra uma mudança de perspectiva por parte da editora Cosac Naify em relação à obra de 1967 da Record. Esse livro é uma combinação dos trabalhos do autor, ilustrador e tradutor. A capa dessa edição é a seguinte:

Figura 7: A capa da edição de 2014 traduzida por Terron

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A lombada do livro é aberta, mostrando detalhes da encadernação, bem co-mo o título do livro.

A quarta capa desta edição contém um trecho curto extraído do posfácio que sugere uma equiparação de Mary Poppins às obras-primas Alice no País das Ma-ravilhas e Peter e Wendy, elevando, como já feito na tradução de 1967, o status do livro no sistema literário infantojuvenil brasileiro. A última capa também con-tém o nome da editora, número ISBN e código de barras.

O posfácio, anteriormente citado, foi escrito pela professora de literatura in-glesa da Universidade de São Paulo, Sandra Guardini T. Vasconcelos. Doutora em teoria literária e literatura comparada pela USP, Vasconcelos é autora de artigos e livros no Brasil e no exterior. O posfácio insere o livro de P. L. Travers no contex-to dos romances de aventura, comparando-o a clássicos de outros escricontex-tores reno-mados do século XIX, como Sir Walter Scott, Jules Verne, Rudyard Kipling, Ale-xandre Dumas e Robert Louis Stevenson. Assim é que a babá trazida pelo Vento Leste é associada à tradição do romance inglês, em uma tentativa de valorização da obra dentro do sistema literário meta, relacionando-a a livros voltados para o público infantojuvenil. Contudo, Vasconcelos nada fala sobre essa tradução brasi-leira nem sobre as práticas tradutórias adotadas na elaboração da edição de 2014. Nada é dito sobre Terron; seu nome sequer é mencionado no posfácio. O texto de Vasconcelos se volta mais para o contexto literário de partida da obra do que para o sistema de chegada, mostrando uma visão que pouco se interessa pela tradução propriamente dita. De qualquer forma, pode-se dizer que a inclusão de um posfá-cio é uma inovação positiva em relação à outra edição brasileira apresentada ante-riormente.