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1. CONTEXTUALIZAÇÃO

1.4. Educação ambiental crítica

Como pudemos observar, faz algum tempo que os sinais de degradação apontaram para a existência de uma crise ambiental. Da década de 60 até a atualidade, passaram-se mais de quarenta anos que revelam a possibilidade de o próprio ser humano estar ameaçado de extinção em face da agudização dos problemas ambientais que se intensificam. Em certa medida, as pessoas já ouviram falar que o planeta Terra está passando por um período turbulento, tornando- se tema de domínio público.

A partir deste consenso, sobre a gravidade da temática ambiental, a educação se torna instrumento importante para a transformação socioambiental e para a alteração do quadro de degradação ambiental existente. (CARVALHO, 2004).

A necessidade da educação ambiental para tais transformações da crise e seu caráter complexo consolidou a idéia de que a mesma não deva ser uma disciplina, mas sim uma temática presente em todas as áreas de conhecimento na escola. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais PCN´s, documento que orienta a prática educativa na escola, a questão ambiental deve ser trabalhada obrigatoriamente de maneira transversal nas disciplinas:

nos Parâmetros Curriculares Nacionais os conteúdos de Meio Ambiente foram integrados às áreas, numa relação de transversalidade, de modo que impregne toda a prática educativa e, ao mesmo tempo, crie uma visão global e abrangente da questão ambiental, visualizando os aspectos físicos e histórico-sociais, assim como, as articulações entre a escala local e planetária desses problemas. Trabalhar de forma transversal significa buscar a transformação dos conceitos, a explicitação de valores e a inclusão de procedimentos, sempre vinculados à realidade cotidiana da sociedade, de modo que obtenha cidadãos mais participantes. Cada professor, dentro da especificidade de sua área, deve adequar o tratamento dos conteúdos para contemplar o Tema Meio Ambiente, assim como os demais Temas Transversais. (BRASIL, 1997, p. 193).

Assim, a transversalidade proposta nos PCN´s é enfatizada pela lei n. 9.795, de 27 de abril de 1999, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental e proíbe a criação de uma disciplina de educação ambiental na escola, exceto aos cursos de pós-graduação, extensão e nas áreas voltadas ao aspecto metodológico, quando se fizer necessário.

Deste modo, o caráter transversal da educação ambiental escolar exige que professoras/res desenvolvam ações educativas relacionadas ao meio ambiente, independentemente da sua área de conhecimento. Apesar da unanimidade em torno da importância das questões ambientais, nem todas as pessoas têm a mesma idéia de natureza, advinda de tradições e interesses distintos. Por isso, a busca pelo cuidado com o planeta pode assumir inúmeras feições completamente opostas.

Acreditamos que a definição da educação como ambiental é um primeiro passo importante para validar um fazer educativo “diluído” na narrativa da educação. Porém, este é insuficiente se quisermos avançar em práticas que superem o esvaziamento dos conflitos socioambientais, das injustiças e das desigualdades presentes no sistema.

Segundo Sato e Carvalho (2005, p. 16) podemos pensar o atributo “ambiental” da educação como marcas e desejos socialmente compartilhados inscrevendo algo que não estava presente desde sempre:

é uma nova maneira de dizer, interpretar e validar um fazer educativo que não estava dado na grande narrativa da educação. Trata-se, assim, de destacar uma dimensão, ênfase ou qualidade que, embora possa ser pertinente aos princípios gerais da educação, permanecia subsumida, diluída, invisibilizada, ou mesmo negada por outras narrativas ou versões predominantes.

O respeito às diferenças de idéias e modos de viver são fundamentais e coerentes com a visão de ambiente e natureza enquanto complexidade do mundo. Entretanto, ao se defender o diverso não se pode cair num pluralismo indiferenciado, em que as vivências pessoais e as lutas sociais se dêem numa história diluída e desconexa. (LOUREIRO, 2006. p. 22).

A idéia de que tudo é válido desde que se almeje proteger o ambiente, ignorando o modo como este se constitui, não colabora para alcançarmos novas relações sociais e formas sensoriais e perceptivas de nos compreendermos e nos sentirmos como parte da sociedade e de uma vida planetária.

Diante das disparidades de visões de mundo que informam os princípios e as práticas da educação ambiental, destacamos, no Brasil, autores como Loureiro (2006), Layrargues (2004), Gadotti (2004), Quintas (2000), Guimarães (2000) entre outros, que reúnem em suas obras conceitos convergentes de educação ambiental, que criticam o modelo social vigente e lutam pela busca de transformação social. No Canadá, temos a Sauvé (2005) que traz interessantes apontamentos sobre a educação ambiental advinda das diferentes formas de entender o ambiente e sobre o conceito nebuloso de desenvolvimento sustentável. (Para que? Para quem? e a favor de quem?).

Concordamos com Layrargues (2002, p. 189) sobre a necessidade de se desenvolver uma tipologia que denuncie ações obstaculizadoras à transformação social. O autor afirma que é necessário romper com a visão de que somente o adjetivo ambiental da educação é suficiente para portar valores contra-hegemônicos em resposta à educação tradicional: “nomear e instituir uma educação como ambiental, no singular, constitui-se na estratégia reformista para diluir a crítica subversiva que invade o terreno da educação”.

Layrargues, entre outros, define feições gerais de dois modelos de educação ambiental, com características peculiares, diferentes visões de mundo, formas de interpretar a crise

ambiental e seus respectivos meios de implementar ações pedagógicas. Estes dois modelos, presentes em quadro explicativo do apêndice II, são apresentados pelo autor como:

educação ambiental convencional: que concebe a humanidade como deflagradora e

vítima da crise ambiental; considera a problemática ambiental como decorrência da falta de conhecimento apropriado do funcionamento dos sistemas ecológicos; volta-se ao ensino da ecologia aproximando-se do conservacionismo;

educação ambiental crítica: que identifica os sujeitos sociais específicos, com níveis

diferenciados de responsabilidade e de exposição aos riscos ambientais de modo inversamente proporcional; entende a problemática ambiental como um desdobramento do processo de apropriação privada dos recursos, tanto humanos como materiais; relaciona-se à reflexão do funcionamento dos sistemas sociais, além dos sistemas ecológicos.

Afirmamos nossa escolha teórica, com base na educação ambiental crítica definida por Layrargues (2002, p. 191), como:

um processo educativo eminentemente político, que visa ao desenvolvimento nos educandos de uma consciência crítica acerca das instituições, atores e fatores sociais geradores de riscos e respectivos conflitos socioambientais. Busca uma estratégia pedagógica do enfrentamento de tais conflitos a partir de meios coletivos de exercício de cidadania, pautados na criação de demanda por políticas públicas participativas conforme requer a gestão ambiental democrática.

A educação ambiental crítica apresenta posições teórico-metodológicas que convergem com as expectativas de todas/os envolvidas/os em nossa pesquisa, na busca por ações educativas como processo de humanização, envolvendo práticas integradoras com o horizonte de formar-(se) sujeitos enquanto seres sociais, intersubjetivos, comunicativos, transformadores e historicamente situados. Diante do percurso realizado, destacamos cuidadosamente alguns conceitos diferentes entre si, que nos permitem escolher e construir eixos orientadores de nossas ações com a perspectiva de transformação socioambiental.