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A organização na educação dos trabalhadores para Gelbcke e Capella (1994) é abrangente, de modo que possam possibilitar a inter-relação dos aspectos humanos e técnicos no mundo do trabalho, sendo que as capacidades de formação através do processo educativo possam transcender a necessidade de adaptação social, ao possibilitar a construção integral dos sujeitos. As ações educativas em serviços de saúde necessitam estar organizadas de forma que possam interligar qualidade e segurança na prestação dos serviços com a melhora na assistência dos usuários e satisfação e motivação dos sujeitos-trabalhadores, pelo desafio de participar, interagir, aprender-ensinar a transformar e transformar-se e

transcenderem-se.

O olhar sobre a educação no trabalho, entende-a como dinâmica, destinada a enfrentar novos desafios, ao exercitar o diálogo entre os sistemas formais e não formais, ao instigar a criatividade, a crítica e a flexibilidade. Isso porque a educação permite um contínuo processo de percepção da realidade, ao formar uma concepção mais abrangente e crítica do contexto no qual o sujeito está inserido, das políticas de saúde e de suas repercussões no processo de cuidar.

Conseqüentemente, na organização do trabalho, as ações educativas necessitam transcender para além de espaços e momentos restritivos à educação. Nesta maneira de ver, a responsabilidade pela educação e cuidado passa a ser de todos os profissionais, nesta forma projeta-se uma situação em que os sujeitos são cuidadores e cuidados, educadores e educandos, independente da função exercida. Esta forma de conduzir o processo educativo pode constituir-se uma forma de evitar-

se a compartimentação e a sobreposição de uma atividade sobre a outra. Nesta, a forma de conceber saber e fazer, ao associar teoria e prática, poderá vir a constituir em uma práxis transformadora.

Em algumas organizações a educação no trabalho se destina quase que exclusivamente à qualificação dos trabalhadores de enfermagem e de outros segmentos profissionais, com vistas à resolução de problemas pontuais, à redução de erros e de custos, associada à maior produtividade9. Isto ser importante, mas não suficiente. Para tanto, as ações educativas precisam ser suficientemente abrangente, de forma que possam contemplar as necessidades da organização, concomitantemente à possibilidade de desenvolvimento integral dos sujeitos, pois desta forma pode-se contribuir duplamente, ou seja, ao qualificar os sujeitos de forma integrativa, de modo que lhes seja proporcionada capacidade de reflexão e crítica, os sujeitos poderão transformar a si e contribuir para a transformação do seu ambiente de trabalho. Gelbcke (2002, p.193) salienta que a enfermagem deve procurar espaços para a educação dos trabalhadores, de modo que visem resgatar o ser humano na sua integralidade e multidimensionalidade. Assim, a

[...] a educação continuada deve ser uma premissa da enfermagem, não só no sentido da qualificação da mão-de-obra, mas no sentido de possibilitar ao sujeito-trabalhador um crescimento individual e não apenas profissional, tornando-se cada vez mais crítico, capacitado e consciente de seu trabalho, exercendo, desta forma, seus direitos e cidadania.

Entretanto, necessita-se dizer que a compartimentação nas formas de fazer na enfermagem fundamenta-se em razões históricas e estratégicas. Saupe (1998) menciona que o ensino de enfermagem remonta aos tempos de Florence Nightingale, quando se dá sob a forma de princípios rígidos e claros, provavelmente decorrentes da forma de ver e agir de sua idealizadora e dos austeros costumes vitorianos daquela época. A formação profissional no sistema nightingaleano, destaca Nietsche (2000), se dava de duas formas: as ladies de classe social mais

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No processo de trabalho, o aumento da produtividade relaciona-se à divisão ou ao parcelamento das atividades. Kuenzer (1995, p.27) indica que são três as formas de aumento da produtividade: o aumento da destreza do trabalhador, com a fragmentação do processo de trabalho; a economia de tempo; e a introdução de máquinas que facilitam o trabalho e reduzem o tempo de realização. Esta concepção de trabalho está presente no cotidiano da enfermagem, principalmente no que concerne à fragmentação e à valorização de habilidades técnicas.

elevada e a as nurses, de classe social mais baixa. Constituindo-se já no seu surgimento a divisão entre trabalho intelectual e manual.

Manifestam Almeida e Rocha (1986) que com o desenvolvimento de novas tecnologias e a procura pela racionalidade dos serviços médico-hospitalares, também com a luta de classes sociais por ascensão na escala social, e com a divisão técnica do trabalho, acentuaram-se estas divisões, gerando a criação de novas categorias, tais como auxiliares e técnicos em enfermagem. Presentemente esta divisão tende a se estreitar, com a extinção do atendente em enfermagem e a não formação de novos auxiliares de enfermagem.

Embora diminua o número de categorias, a divisão e o parcelamento das atividades mantêm-se, com a enfermeira desenvolvendo as atividades intelectuais de planejamento da assistência e ao técnico cabendo a execução, em especial, o cuidado. Pires (2000) tem um entendimento semelhante, quando defende que no processo de trabalho em saúde verifica-se o parcelamento das atividades em diversos segmentos, inclusive na enfermagem. Para Pires (2000, p.88) a compartimentação nas “profissões da saúde, o profissional de nível superior detém o poder e os conhecimentos relativos à profissão e delega tarefas especificas aos trabalhadores de nível médio ou elementar”.

A divisão do trabalho repercute também nas ações educativas que privilegiam o tecnicismo, em que os educadores decidem o que deve ser ‘ensinado’. Tais programas utilizam-se de uma forma de ensino com a mecanização repetitiva de informações e com o fazer acrítico, mediante o que buscam o desenvolvimento de habilidades e conseqüentemente maior produtividade. Implementados dessa forma, fecham-se sobre si mesmos, mantendo o existente e estão descompromissados com a transformação.

Bagnato (1999, p.13) lembra que muitas instituições estão envolvidas com a implementação de diferentes programas educativos, contudo, “[...] estas se desenvolvem com alguns limites nas concepções teórico-metodológicas, com uma preocupação de atender principalmente à atualização dos procedimentos técnicos, para dar conta dos procedimentos especializados de interesse das instituições”. Gadotti (1998, p.29) complementa explanando que a educação não pode orientar-se pelo “paradigma da empresa que dá ênfase apenas à eficiência. Este paradigma ignora o ser humano. Para este paradigma, o ser humano funciona como puro agente econômico”.

Conseqüentemente, entende-se que a sistematização no cuidar, educar e administrar na organização do ambiente de trabalho, de forma continua e congregada, em que atividades desenvolvidas de forma integrativa passam a servir de subsídios para novas maneiras de cuidar e educar. A valorização do espaço de trabalho para a educação em enfermagem dá-se como conseqüência de que é no cotidiano dos serviços que surge o inusitado, que aguça a curiosidade e o interesse em conhecer. Assim, é neste momento em que se relaciona teoria e prática que se evidencia a oportunidade de transacionar o conhecimento.