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Elementos técnicos e estéticos

No documento irisdearaujojatene (páginas 137-141)

4.2. MOLDURAS EXTERNAS: ASPECTOS DA PRODUÇÃO

4.2.3. Elementos técnicos e estéticos

A análise de elementos técnicos e estéticos para (re)compor períodos históricos na teledramaturgia per se já renderia um estudo complexo, que poderia se desdobrar ao se concentrar em elementos isolados: figurinos, cenários, linguagem audiovisual. Mesmo reconhecendo que esse não é o foco desta pesquisa, é válido ressaltar alguns aspectos sobre tais elementos que colaboraram para a tessitura da narrativa das minisséries aqui estudadas –

Maysa e Dalva e Herivelto.

Ambas as obras tratam de um período histórico que se situa em meados do século XX e, portanto, o cuidado com a reconstituição das trajetórias retratadas deve também passar pelo figurino e pelo cenário – já que tais elementos ajudam produtos audiovisuais a compor personalidades e a contextualizar momentos. São, portanto, importantes para conferir à narrativa maior efeito de verdade, principalmente nesses casos em que se contam as histórias de personalidades públicas da História brasileira.

No making of do DVD de Dalva e Herivelto é ressaltado o esmero com que a vida do casal de artistas foi retratada. Desde os microfones com a logomarca das grandes rádios, até a reconstrução dos famosos botecos da Lapa frequentados por Herivelto nos anos 194034 – segundo o vídeo, tudo foi montado respeitando o que se sabia do período. As apresentações nos luxuosos cassinos daqueles anos também foram um espetáculo à parte: Claudio Botelho, um dos diretores dos shows na minissérie, chega a comparar os shows da época aos musicais da Broadway35.

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Especialmente o Café Nice, local de encontro de artistas da época: para montar o cenário, foram reproduzidos rótulos das garrafas de bebida, os azulejos e o balcão para que se parecesse tal qual o da época. Ver making of nos extras do DVD da minissérie.

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Em Maysa, tal cuidado também é visível. No início do making of, inclusive, é possível conferir, em números, o que produções desse tipo podem mobilizar. Assim, para nove capítulos, foram necessários: ―155 pessoas na equipe. 2.674 figurantes. 30 locações externas. 1 semana em Veneza. 67 dias de filmagem‖. Diferente de Dalva e Herivelto, em

Maysa priorizou-se gravar as cenas em locações em vez de reproduzir ambientes em estúdio.

Assim, lugares que frequentados pela cantora e existentes ainda hoje, como o Hotel Copacabana Palace, serviram de cenário para a obra.

Ainda buscando a representação de uma época, o figurino da obra foi planejado para retratar a cantora ao longo das três décadas que a minissérie perpassa. Vaidosa, Maysa era considerada uma lançadora de moda e, portanto, as vestimentas e caracterização de Larissa Maciel deveriam imprimir à protagonista mais que o passar do tempo – com o processo de amadurecimento, proporcionado por maquiagem – mas também esse caráter vanguardista da cantora diante da moda36. Além disso, segundo a figurinista Marília Carneiro, ―é muito difícil você fazer um figurino de época porque você não pode correr no shopping [...] você tem que programar absolutamente tudo porque nada será encontrado no comércio, tudo será planejado, desenhado, mandado fazer‖ 37.

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Segundo o maquiador Fernando Torquato, unir ambas as características (vanguardismo e amadurecimento) na maquiagem de Larissa revelou-se um desafio. Ver making of nos extras do DVD da minissérie.

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Ver making of nos extras do DVD da minissérie Maysa quando fala o coração.

Figura 8: Larissa caracterizada para as diversas fases de Maysa

Marília Carneiro foi também a responsável pelo figurino de Dalva e Herivelto e, apesar de também compor trajes de época, viu no casal uma realidade diferente a ser representada: Dalva, por exemplo, não deixa de ser vaidosa, mas mantinha uma simplicidade que refletia nos vestidos usados para as apresentações artísticas (muitos, inclusive, comprados pelo seu então marido e ―criador‖ Herivelto). ―[...] a gente tenta fazer uma coisinha a la Dalva, no figurino [...]: o laço um pouco maior do que devia, o paetê, o brilho, um pouco mais do que devia, a joia não é ‗combinandinha‘‖38. Portanto,

O figurino representa um forte componente na construção do espetáculo, seja no cinema, no teatro ou na televisão. Além de vestir os artistas, respalda a história narrada como elemento comunicador: induz a roupa a ultrapassar o sentido apenas plástico e funcional, obtendo dela um estatuto de objeto animado. Percorre a cena no corpo do ator, ganha a necessária mobilidade, marca a época dos eventos, o status, a profissão, a idade do personagem, sua personalidade e sua visão de mundo, ostentando características humanas essenciais e visando à comunicação com o público (LEITE e GUERRA, 2002, p. 62)

Outro aspecto relativo à técnica e à estética da série que vale ressaltar é sobre a própria montagem da narrativa. Ambas as minisséries se iniciam com os momentos finais das mulheres biografadas (Dalva e Maysa) e, por isso, o fluxo dos acontecimentos ocorre como grandes flashbacks39. Em Maysa, as voltas no tempo, contudo, são irregulares: ―As coisas vão e voltam. Estamos no presente, voltamos ao passado, corremos para o futuro‖, afirma o autor Manoel Carlos no making of. O que se percebe em Maysa, na verdade, são lembranças dentro de lembranças, isto é, a partir do acidente que lhe tira a vida, sua vida é rememorada em certa ordem, mas há momentos dentro dessa trajetória revivida em que se retorna a tempos ainda mais distantes40. Para representar visualmente esses momentos de recordação, a personagem

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Ver making of da minissérie Dalva e Herivelto.

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Flashback é o nome dado a cenas anteriores à história contadas a fim de contextualizar os acontecimentos no

presente diegético.

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Para saber mais sobre as representações da memória à luz da televisão, ver a dissertação de Alex Damasceno (2011).

se apresenta pensativa e sua imagem se funde com a cena do passado. Ainda para diferenciar os diversos momentos da cantora, o diretor de fotografia Affonso Beato optou por texturas de luz e cores sensivelmente diferentes ao longo da história de Maysa. Para obter qualidade cinematográfica nas imagens, Beato, fotógrafo reconhecido internacionalmente41, optou usar o que julgava haver de melhor no mercado de câmeras filmadoras naquele momento42.

Dalva e Herivelto representou as diferentes épocas de maneira mais evidente,

destacando cores mais frias (filtro azulado) para os últimos momentos de Dalva e cores mais quentes (filtro amarelo-dourado) para o passado de auge da cantora e de Herivelto43. A ideia de usar tonalidades mais fortes para o passado se mantém mesmo na cena em que o carro de Herivelto é atacado em uma feira após suas declarações contra Dalva no jornal: o preto e branco tomou conta de um Herivelto constrangido enquanto era atacado pelas pessoas com legumes que se mantém em cores.

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Affonso Beato já trabalhou em filmes como Tudo sobre minha mãe (Todo sobre mi madre, 1999) do diretor espanhol Pedro Almodóvar, Água Negra (Dark water, EUA, 2005) de Walter Salles e A rainha (The Queen, Inglaterra/França/Itália, 2006) de Stephen Frears, por exemplo. Ver em: <http://www.affonsobeato.com/>. Acesso em: 23/01/2013.

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Ver em: <http://www.youtube.com/watch?v=nj7pB1OfhWI>. Acesso em: 23/01/2013.

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Assim, a narrativa segue uma cronologia de começo-meio-fim em dois tempos: no primeiro, em agosto de 1972, quando Dalva passa mal, fica internada e morre; no segundo, entre as décadas de 1930 e 60, ela se une a Herivelto, depois se separam e, por fim, prossegue com a carreira e vive novos amores sem ele.

No documento irisdearaujojatene (páginas 137-141)