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Gêneros e Formatos na T

No documento irisdearaujojatene (páginas 53-58)

2.1. BREVE PANORAMA DA TV NO BRASIL

2.1.1. Gêneros e Formatos na T

Aqui, o conceito de gênero é trazido não para torná-lo protagonista dessa pesquisa, pois o interessante não é analisá-lo como ―o objeto final de estudos, mas [como] uma chave de leitura dos processos comunicativos televisuais‖ (FRANÇA, 2009). De maneira sucinta, ―os gêneros são categorias discursivas e culturais que se manifestam sob a forma de subgêneros e formatos‖ (DUARTE apud ROCHA, 2009, p. 271). Entretanto a categorização proposta por Duarte (apud FERREIRA, 2008) para as obras televisivas em produtos da meta-

realidade (referência ao mundo exterior – ―real‖), supra-realidade (sem compromisso com o

mundo exterior - ficcional) e para-realidade (refere-se a um mundo construído no próprio meio – reality shows, por exemplo) – pelo menos à primeira vista – parece não abarcar a possibilidade de hibridação dos gêneros.

Em classificação semelhante, as categorias de modelos de ―promessas‖9

, propostas por François Jost (2007), dividem os programas em arquigêneros que englobam os mundos do real, da ficção ou lúdico. Assim, os gêneros estariam diretamente ligados a esses mundos, procurando respeitar suas ―promessas‖ a fim de garantir a adesão (ou a participação) do espectador a esse mundo, ou seja, dependem intrinsecamente da visão do telespectador. No caso dos três mundos propostos por Jost, pressupõe-se a relação de cada um deles com a realidade, mas, de acordo com o pesquisador francês, a dúvida não ―não é saber a realidade como ela é‖, mas sim procurar saber ―qual o tipo de realidade se procura‖ (JOST, 2012)10

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Seguindo a proposta de François Jost, Simone Rocha lembra ainda que ―nenhum produto, hoje, pode ser tomado como exemplo puro de um dos mundos. No caso da televisão é preciso levar em conta que uma emissora transmite todo tipo de programa, inclusive aqueles que mesclam aspectos ficcionais e não ficcionais‖ (ROCHA, 2009, p. 271). Nesse caso, há uma mescla entre dois mundos (JOST, 2007). Além disso, o conceito de gênero é central em comunicação e está relacionado às ―escolhas do realizador e os horizontes de expectativas do receptor‖ (ROCHA, 2009, p. 270) – o que não garante a reciprocidade de perspectivas. Segundo François Jost (2004, p. 17-18), devemos, portanto, ―[...] considerar o gênero como

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No minicurso Pragmáticas dos gêneros televisivos, ministrado por François Jost,em 12/06/2012, na UFJF, na abertura do XXI Encontro Anual da Compós, o autor explica a opção pelo termo ―promessas‖ em vez de ―contrato‖. Para ele, a ideia de ―contrato‖ prevê uma bilateralidade, em que o produtor exporia suas intenções e o telespectador as aceitaria por já conhecê-las, conforme uma prévia negociação. ―Promessa‖, por sua vez, sugere uma unilateralidade, que pressupõe a confiança no outro, no que promete. Assim, cabe ao produtor seguir as ―promessas‖ incutidas em sua identidade para manter a atenção do público que lhe cobra o ―cumprimento‖ do que lhe é ―prometido‖.

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Minicurso Pragmáticas dos gêneros televisivos, ministrado por François Jost,em 12/06/2012, na UFJF, na abertura do XXI Encontro Anual da Compós.

uma interface, responsável pela ligação entre emissor (televisão) e telespectador‖. Nesse caso, portanto, gêneros podem ser compreendidos como espaços de negociação de expectativas entre autor e público, baseadas em um contexto social e histórico.

Já Maria Ataide Malcher (2001, p. 5), cita Sílvia Borelli definindo gênero como um ―[...] elo de ligação dos diferentes momentos da cadeia que une o espaço da produção,

anseios dos produtores culturais e desejos do público receptor‖. Malcher (ibidem) também

cita palavras de Aluizio Trinta, que define gênero como ―[...] resultante (e resultado) de escolhas convergentes, de vários e distintos autores, pelas quais uma dada classe de temas passa a se constituir. [...]‖.

Nesse sentido, o trabalho de José Carlos Aronchi de Souza, no qual se definiu gêneros e formatos da televisão brasileira, se destaca. Em seu trabalho, ele considera que ―a divisão dos programas em categorias inicia o processo de identificação do produto, seguindo o conceito industrial assumido pelo mercado de produção‖ (ARONCHI, 2004, p. 37). O autor determina 37 gêneros, dentro de cinco grandes categorias, e subdivididos em 31 formatos – para exemplificar, determinado programa pode ser da categoria entretenimento, do gênero da teledramaturgia, no formato de minissérie. Contudo, Souza reconhece que, apesar da essência de seu trabalho, identificar e classificar programas televisivos pode ser bastante complicado, por isso, o número de gêneros e formatos levantados por ele não é fixo. O autor também destaca a possibilidade de formatos típicos de um gênero serem usados em outro, ou ainda de dois ou mais gêneros mesclarem-se, criando um novo gênero.

Ainda segundo Souza (idem, p. 36), a classificação de gêneros não segue um padrão internacional e sim as estratégias de marketing da rede, ou seja, sua flexibilidade está de acordo com os objetivos e públicos almejados pela emissora.

Entre a lógica do sistema produtivo e as lógicas dos usos, medeiam os gêneros. São suas regras que configuram basicamente os formatos, e nestes se ancora o

reconhecimento cultural dos grupos. [...] um gênero não é algo que ocorra no texto, mas sim pelo texto [...].

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Mais ainda no caso da televisão, onde cada gênero se define tanto por sua arquitetura interna quanto por seu lugar na programação: na grade de horários e na trama do palimpsesto. Daí a terceira exigência envolvida na abordagem dos gêneros: a necessidade de construir seu sistema em cada país. Pois, em cada país, esse sistema responde a uma configuração cultural, a uma estrutura jurídica de funcionamento da televisão, a um grau de desenvolvimento da indústria televisiva nacional e a alguns modos de articulação com a transnacional‖ (MARTÍN-BARBERO, 2003, p. 313- 315)

Isto é, os gêneros dependem também das matrizes culturais de cada sociedade. Como visto, gêneros – sejam do cinema, da literatura ou da televisão – são compreendidos de maneira mais produtiva ao se considerar que estes não são categorias imutáveis e que estão em constante processo de redefinição (SOUZA, 2004, p. 38). Talvez parta dessa reconhecida simbiose a grande questão levantada por Arlindo Machado em A televisão levada a sério (2005, p. 68): afinal, ainda é válido se falar em gêneros na televisão ou o modelo de classificação existente não dá mais conta de categorizar as obras? De acordo com o autor, alguns estudiosos chegam a defender a individualidade de cada obra, independentemente de sua classificação.

Para complicar, sabemos que as obras realmente fundantes produzidas em nosso século não se encaixam facilmente nas rubricas velhas e canônicas e, quanto mais avançamos na direção do futuro, mais o hibridismo se mostra como a própria condição estrutural dos produtos culturais. (MACHADO, 2005, p. 67-68)

Segundo Bakhtin (apud MACHADO, 2005, p. 68),

―gênero [nos estudos da linguagem] é uma força aglutinadora e estabilizadora dentro de uma determinada linguagem, um certo modo de organizar idéias, meios e recursos expressivos, suficientemente estratificado numa cultura de modo a garantir a comunicabilidade dos produtos e a continuidade dessa forma junto às comunidades futuras‖.

Machado (2005, p. 68) acredita que tal definição pode perfeitamente ser aplicada a gêneros audiovisuais e conclui: ―mas não se deve extrair daí a conclusão de que o gênero é necessariamente conservador‖. Por isso mesmo não se deve considerar a categorização genérica como algo rígido. Pelo contrário, o gênero tem maior utilidade como ―guia‖, uma

noção, sem amarras, do tipo de produto que será apresentado. É um ―contrato‖ com o espectador, mas sem ―cláusulas fixas‖.

Se a conceituação de gênero televisivo já proporciona tal variedade e hibridez, ao refletir sobre os possíveis formatos, percebe-se que a tentativa de se classificar um programa pode ser muito mais ampla. O gênero da teledramaturgia – no qual se inserem as obras analisadas nessa pesquisa – pode ser tomado de exemplo. Segundo a autora Renata Pallottini (1998, p. 25), para determinar os formatos desse gênero da ficção, é preciso levar em conta a extensão do texto, bem como o ―tratamento do material, unidade, tipos de trama e subtrama, maneiras de criar, apresentar e desenvolver os personagens, modos de organização e a estrutura do conjunto‖. Assim, em uma primeiro momento, a autora divide os programas ficcionais genericamente em unitários e não-unitários (1998, p. 27). Os unitários seriam aqueles que trazem a ficção em apenas um capítulo, tal como os teleteatros do início da história da televisão no Brasil, ou os programas especiais de fim de ano da TV Globo, por exemplo. Com base nisso, os não-unitários podem ser subdivididos em três:

1) A telenovela, normalmente com mais de 100 capítulos, considerada o formato mais industrial, pois é escrita ao longo de sua produção, o que permite alterações na história e na duração, conforme o gosto do público (obra aberta);

2) O seriado, estruturado com episódios independentes, mas que envolvem um mesmo núcleo de personagem, tal como A Grande Família.

3) A minissérie, caracterizada por alguns como uma ―pequena novela‖. Apesar de possuir as mesmas características narrativas, diferencia-se da telenovela principalmente por ser uma ―obra fechada‖, ou seja, que está completamente escrita e produzida no momento da sua exibição, geralmente lhe garantindo maior qualidade técnica.

Vale lembrar que essa classificação de formatos é referente às obras produzidas no Brasil: em outros países, a duração de telenovelas, por exemplo, pode ser menor. Há ainda outros formatos raros na televisão nacional, como as extensas soap operas norte-americanas e ainda os unitários telefilmes. Indo além: no Brasil, existem também formatos próprios que ou inexistem em outros países, ou são denominados de maneira distinta. É o caso das

microsséries, formato em que as obras aqui estudadas se enquadrariam. Segundo Narciso

Lobo (2000a), esse formato é próximo das minisséries norte-americanas e apresenta-se em, no máximo, oito capítulos11.

No documento irisdearaujojatene (páginas 53-58)