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4. RESULTADOS

4.1 Embasamento Teórico versus Delimitação do Campo de Pesquisa

Entende-se, a partir da fundamentação apresentada, que para ser possível alcançar um nível de desenvolvimento sustentável, os atuais modelos de produção e consumo insustentáveis devem ser questionados, levando assim ao surgimento de

descontinuidades sistêmicas, ou seja, reorientações de comportamento rumo à sustentabilidade, oriundas de inovações de sistemas (VEZZOLI, 2010).

Por sua vez, as inovações de sistemas, de acordo com Manzini (2008), só são possíveis por meio de inovações sociais, compreendidas enquanto mudanças na forma como os indivíduos agem para solucionar seus problemas e criar oportunidades (EMUDE, 2006 apud MANZINI, 2008).

Ou seja, as inovações sociais são capazes de revolucionar os sistemas de produção e consumo, causando descontinuidades sistemas e orientando o desenvolvimento para uma perspectiva sustentável, que corresponde ao interesse de todos.

A Horta Comunitária do Cajuru, como já dito, é um caso promissor de inovação social pois possui características comuns a outros modelos promissores, quais descreve Manzini (2008):

a) orienta a expectativa e o comportamento individual para ações coerentes e sustentáveis, especificamente no que diz respeito às expectativas e comportamentos alimentares;

b) Articula interesses individuais, pois se tratando de uma iniciativa comunitária, promove a interação entre a comunidade envolvida, visando um objetivo comum: acesso a uma alimentação de qualidade; e

c) Recupera tradições e valores pré-industriais, com a reorientação do espaço produtivo de alimentos, que volta a ser o espaço local, com a prática da agricultura de subsistência, com a recuperação da interação entre a comunidade, e dos hábitos alimentares saudáveis.

Quanto a característica comum relacionada a recuperação das tradições e valores, Manzini (2008) afirma que as iniciativas locais desempenham papel importante para inovação social, pois rompem com os modelos sócioprodutivos tradicionais, gerando assim descontinuidades sistêmicas.

Nesse contexto, o papel do Design enquanto atividade criativa que estabelece as qualidades dos objetos, serviços e processos, é o de projetar e/ou otimizar sistemas de produtos e serviços ecoeficientes, socialmente coesos e equânimes, capazes de satisfazer uma demanda específica, além de projetar interações entre os atores envolvidos e valorizar o território.

Portanto, na Horta Comunitária do Cajuru, uma iniciativa de inovação social já em desenvolvimento, o designer pode atuar criando cenários para facilitar, otimizar e promover seu sistema.

Para tanto, as abordagens teóricas selecionadas para compor o embasamento teórico do presente trabalho, contribuem com orientações e recomendações para a atuação do designer no contexto da Horta, que serão organizadas em forma de um conjunto de recomendações e indicações para projetos.

O Design para Equidade e Coesão Social, por exemplo, será utilizado a partir das diretrizes listadas por Vezzoli (2010), em específico as orientações para promover um consumo responsável e sustentável e para incentivar o uso e a valorização dos recursos locais, sendo estas:

a) Diretrizes para a promoção do consumo responsável e sustentável:

1) Aumentar e tornar transparente a sustentabilidade social dos atores envolvidos;

2) Fornecer informações e ou/experiências para educar clientes/usuários finais sobre comportamento sustentável e responsável;

3) Desenvolver ofertas que habilitem a participação responsável/sustentável do cliente/usuário final;

4) Envolver o cliente/usuário final na

produção/implementação/customização de seus próprios sistemas de produto-serviço; e

5) Envolver o cliente/usuário final no design/tomada de decisões de seus sistemas de produto serviço em direção ao comportamento responsável/sustentável;

b) Diretrizes para o incentivo ao uso e valorização de recursos locais:

1) Respeitar/fortalecer as características peculiares locais;

2) Respeitar e fomentar as identidades e diversidades culturais;

3) Fomentar diferentes gostos e estéticas;

4) Desenvolver um sistema para fomentar e movimentar a economia local;

5) Reforçar o papel da economia local, criando serviços no mesmo local em que são usados;

6) Favorecer possibilidades de desenvolvimento que melhorem as capacidades locais para a produção colaborativa de bens que contribuam para o bem comum;

7) Melhorar/reformar artefatos sem uso e descartados;

8) Adaptar/promover sistemas usando recursos locais, naturais e regenerados;

9) Promover empresas/iniciativas locais, estruturadas em rede;

10) Promover/apoiar-se em redes distribuídas de energia renovável;

11) Promover/apoiar-se em redes de colaboração de pessoas; e

12) Promover/apoiar-se em redes de colaboração de artefatos.

Essas duas diretrizes foram escolhidas em função de sua proximidade com as questões do consumo, orientando especificamente o papel do designer para promoção de um consumo responsável e sustentável, que no caso da Horta está associado ao consumo de alimentos, e o papel do designer para a promoção do uso e valorização dos recursos locais, já que a Horta corresponde a uma iniciativa local.

O Design para o Território, outra abordagem de Design trazida ao embasamento, também orienta o designer a respeito da importância das iniciativas locais para o desenvolvimento sustentável, bem como o faz Manzini (2008) e Vezzoli (2010).

Seu objetivo é o de promover uma reorientação de comportamentos de produção e consumo, a partir da execução desses processos a nível local. Nesse sentido, o papel do designer é o de identificar as qualidades – de acordo com o conceito de qualidade de Krucken (2009) – dos produtos locais, para assim criar uma identidade a partir destes, comunicá-los e por consequência gerar valorização para o território.

Especificamente no contexto da Horta do Cajuru, o Design para o Território será útil como orientação para a valorização e utilização dos recursos locais, bem como para identificar o capital territorial da Horta, as qualidades dos produtos locais e seus elementos de diferenciação. Ainda, contribuirá com a promoção de novos critérios de bem-estar baseados nas qualidades identificadas, e com a comunicação das mesmas.

No embasamento teórico também foram descritas as abordagens do Movimento Slow Food, cuja função é a de auxiliar na construção de parâmetros para um consumo responsável na Horta Comunitária do Cajuru, um dos objetivos do presente trabalho, a partir da filosofia do movimento.

Seguindo os princípios de Petrini (2009), fundador do Movimento, a qualidade de vida e de um produto alimentar estão relacionados a três fatores: o bom, limpo e justo.

Como forma de orientar a prática destes princípios, o autor (2009) também lista possíveis abordagens de ação, que nortearão as ações possíveis de serem sugeridas quanto aos hábitos alimentares para os beneficiários da Horta do Cajuru.

Já os princípios da Permacultura, também abordados no embasamento, servem para auxiliar na orientação das ações possíveis de serem sugeridas quanto a prática de um cultivo sustentável, em especial as orientações de Mollison (1998) para a permacultura urbana e de pequenos espaços, o que se enquadra às

características da Horta do Cajuru.

Em resumo, o que se pretende com a estrutura do presente trabalho é primeiramente situar o novo campo de atuação possível do designer frente aos desafios do desenvolvimento sustentável, e depois estabelecer as contribuições possíveis desta área em um caso real, a Horta do Cajuru, que como já visto, é uma iniciativa de inovação social e portanto de inovação de sistemas, em que o designer têm a oportunidade de atuar facilitando e/ou otimizando as dinâmicas que ali ocorrem, objetivando sempre a sustentabilidade em todos os seus níveis.

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