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O tema enfocado é o relacionamento entre níveis hierárquicos distintos em uma empresa. A matéria explica um tipo de relação que tem sido identificado pelas empresas – o patrocínio corporativo - que acontece quando um líder apoia um funcionário, ajudando-o a “crescer” na empresa, seja por meio de promoções ou defendendo seus projetos.

No decorrer do texto, fica mais explícito que se trata de mostrar como e por que cultivar relações no trabalho, escolhendo pessoas que podem auxiliar nesse crescimento; esse é o gancho para atrair a atenção do leitor.

Trata-se, pois, de enfocar as redes sociais (termo não empregado pelo texto). A questão da reciprocidade e da confiança são destaques no texto, conforme os trechos a seguir: “Essa relação informal (...) traz benefícios para todos” (p. 68, grifo

nosso) e “Esse relacionamento depende obviamente do estabelecimento de um

vínculo de confiança entre os dois lados: o patrocinador precisa acreditar na

capacidade do funcionário e em seu projeto de carreira” (p. 68, grifo nosso).

A matéria também é composta por um quadro (Siga o mestre: como conseguir

um apoio importante), dividido em três partes: 1. Identifique o patrocinador; 2. Como

manter o relacionamento; 3. Hora de acionar.

Apesar de ressaltar que se trata de uma relação informal, a reportagem preparou um “passo-a-passo”, bastante sistematizado, demonstrando, portanto, que as redes podem compreender uma ferramenta administrativa eficaz.

Outro aspecto visível no texto é o trabalho por projetos que, apesar de não ser detalhado, é representando como uma tendência atual e consolidada, típica do modelo de produção e gestão flexibilizados. Os trechos seguintes mostram essa característica: “(...) o patrocinador é aquele chefe experiente, que defende o nome

do seu protegido diante de projetos (...)” (p. 68) e “Mirela Arroyo Torselli, de 29 anos,

líder de projetos na Everis (...) e Marcos Galáz, de 40 anos, sócio diretor da empresa, se conheceram enquanto trabalhavam em um projeto por um curto período” (p. 69).

Intertextualidade

Na reportagem estudada, a intertextualidade explícita fica por conta das entrevistas realizadas com fontes (entrevistados). Há duas categorias principais.

Uma delas são as fontes autorizadas, que representam uma categoria profissional e/ou alguma instituição importante e que têm o objetivo de esclarecer, dando legitimidade ao processo. É o caso das seguintes vozes:

- Uma professora e integrante da Fundação Instituto de Administração (FIA) e integra também a equipe do guia da Você S/A – As melhores empresas para você trabalhar.

- Uma integrante do Ibmec do Rio de Janeiro

- Um especialista em gestão de pessoas do Insper, de São Paulo.

Esses são os entrevistados que mais se manifestam no texto (e também no quadro paralelo à matéria). São representantes de organizações, portanto, são vozes institucionalizadas.

Nota-se, inclusive, que a sigla da empresa Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa) não é desdobrada, o que gera um efeito de naturalização, pois se espera que o leitor já saiba essa informação.

A segunda categoria de fontes identificada na matéria remete à função ilustrativa, que comprovam e exemplificam concretamente o fenômeno abordado pela reportagem. No texto, consistem em dois executivos da empresa Everis (o sócio-diretor da empresa e a líder de projetos). A escolha das fontes indica que a revista privilegia uma representação do mundo do trabalho dos executivos, dos cargos mais altos da gestão.

A revista explicita o setor da empresa Everis (empresa de consultoria espanhola de negócios e tecnologia); esse aspecto vai ao encontro da força e importância das novas tecnologias de informação e comunicação na representatividade do mundo do trabalho contemporâneo, pois são empresas que dão apoio estrutural às novas relações de trabalho. Além disso, consistem em um segmento do mercado no qual essas relações são desenvolvidas, por estarem mais afinadas às relações flexíveis de gestão e produção.

Interdiscursividade

O termo “patrocinador”, logo na manchete do texto, traz à tona uma esfera discursiva mercadológica, ligada à promoção de eventos, realização de projetos com movimentação financeira e à publicidade, atividade na qual o patrocínio é fundamental para a sua sustentação.

O discurso tecido pela reportagem traz, de maneira implícita, a esfera pedagógica, no sentido de que busca instruir e educar o leitor a partir de dicas e com apoio de um quadro complementar ao texto, que divide as etapas de um processo (no caso, o patrocínio corporativo) de modo didático e claro. O discurso também conta com breves referências implícitas às formas tradicionais de ensino, mais antigas, através das palavras “mestre” e “discípulo”.

Há, ainda, traços do discurso acadêmico-organizacional, uma vez que o texto explica, diferencia e define termos como “patrocinador” e “mentor”. Esse aspecto é reforçado pelas próprias fontes utilizadas, que representam duas escolas de negócios (Insper e Ibmec).

O mentor insere-se na prática do mentoring, “outra palavra que entrou furtivamente na linguagem comercial. A palavra teve origem na mitologia grega, na qual há o relato de que Ulisses, ao partir para Troia, confiou sua casa e a educação de seu filho, Telêmaco, a seu amigo, Mentor” (WHITMORE, 2010, p. 6). O mentoring é interpretado como uma forma de aconselhamento ou consultoria, mas também pode ser aplicado na melhoria imediata da performance e desenvolvimento de habilidades, a curto e longo prazo (WHITMORE, 2010). Outro assunto relacionado ao patrocínio corporativo é o capital social, que confere redes de acesso que podem contribuir para a empregabilidade do indivíduo.

Figuras de linguagem

A figura de linguagem que predomina em alguns momentos é o eufemismo, que visa atenuar ou criar outros efeitos mais sofisticados à linguagem. Na oração “É o chamado patrocínio corporativo” (p. 68), o enunciador já introduz um novo termo,

explicando-o no mesmo parágrafo. O termo substitui outros possíveis entendimentos do senso comum para a expressão “patrocínio corporativo”, tais como ajuda financeira, proteção, privilégios e outros como “bajulação” e “politicagem”, destacados pela própria matéria.

Há duas ocorrências para a metáfora: “Na época, os dois fizeram um plano e Marco mostrou os caminhos que Mirela deveria percorrer” (p. 69).

Nesse caso, a metáfora, em vez de tornar a situação mais concreta, transformou-a em algo genérico. Os “caminhos” seriam os trâmites, estratégias, ações a serem feitas e a execução dos mesmos é o processo “percorrido”. Nota-se que o substantivo “plano”, sem qualquer especificação também reforça uma

generalização (seria um plano de RH? Um plano de negócios? Um plano de carreira? Formal ou informal?). Assim, o uso da metáfora é ideológico uma vez que a revista não explicita quais foram, exatamente, esses “caminhos”.

A outra incidência da metáfora está no final do texto, em forma de um conselho: “O importante é saber que, para crescer dentro da corporação, é preciso ter uma boa relação com pessoas que ajudem nessa jornada” (p. 69). Nesse

fragmento, a comparação implícita é entre uma viagem e o crescimento profissional, o que pode indicar sentidos de rapidez (uma jornada refere-se a um dia) ou algo mais difícil, que requer mais esforço (como, por exemplo, em uma jornada ou expedição militar).

As metáforas não são figuras predominantes e não estabelecem um eixo que estrutura a reportagem (a exemplo do que ocorre em outros textos jornalísticos da revista, que traçam paralelos mais extensos entre a carreira e os jogos, os esportes, os filmes etc.).

Modalidade

Predomina, no texto jornalístico analisado, a modalidade assertiva, com afirmações enfáticas e categóricas. O tempo verbal mais usado no texto é o presente do indicativo, conforme os exemplos a seguir: “Esses gestores apadrinham o funcionário, dão conselhos, colocam esses discípulos em contato

com as pessoas certas (...)” (p. 68, grifo nosso).

No final da matéria, a modalidade é modificada; o grau de assertividade dá lugar à possibilidade: “Durante a carreira, um profissional pode ter mais de um patrocinador” (p. 69, grifo nosso). Com isso, o discurso muda de tom: se, por um

lado, as dicas são seguras e precisas, por outro lado, os resultados não estão garantidos.

Já na manchete do texto e no quadro, a modalidade usada é o imperativo, tempo verbal que leva a uma ação e possui maior poder persuasivo. Vejamos:

“Procure profissionais que podem influenciar positivamente sua carreira (...)”;

Estabeleça contato com os líderes da companhia que possam lhe ajudar a crescer”

e “Mantenha contato sempre que puder”. (p. 69, grifo nosso).

Ao final do quadro, no entanto, as partículas condicionais tomam espaço uma vez que os efeitos das estratégias podem não acontecer: “O patrocinador pode falar

das novidades da empresa e (...) indicá-lo”; “(...) o patrocinador pode ajudar a levá- lo à pessoa certa e promovê-lo”.

Essa transição entre uma modalidade afirmativa para uma modalidade de possibilidade indica que, ao falar dos benefícios, o enunciado é enfático, mas não os garante como resultados efetivos. Para se afastar da responsabilidade do sucesso da estratégia, o enunciador transfere essa responsabilidade a outros.

Ethos

A figura incorporada pelo ethos é de um indivíduo detentor do saber, atualizado sobre as últimas tendências, o que fica evidenciado logo no início do texto com a expressão: “Nos últimos anos (...)” (p. 68). O primeiro parágrafo, sem

qualquer citação ou fonte, reforça essa imagem de um professor ou alguém que está habilitado a falar sobre o assunto. Sua voz se confunde com a das fontes entrevistadas (representantes de institutos educacionais) ao defender e explicar os mecanismos da relação de patrocínio corporativo.

No texto, o ethos dá exemplos, marca diferenças entre situações e perfis e destaca o que é importante. No quadro, ele assume um tom de conselheiro, um consultor de negócios voltados à carreira e seguro sobre aquilo que fala, conforme os seguintes exemplos: “Estabeleça contatos com líderes da companhia que possam lhe ajudar a crescer” (p. 69) e “Se a relação permitir, marque um café rápido ou um almoço” (p. 69).

Dessa forma, o ethos expressa confiança e experiência, dá várias dicas, reforça sua fala com citações breves, quase superficiais. O ethos vislumbra possibilidades e vantagens em um espaço corporativo que oferece chances de crescimento, encarnando, ele próprio, a figura de um líder.

A modalidade, conforme veremos adiante, é outro traço que ajuda a construir essa imagem do ethos.

Campo lexical

A partir da leitura analítica de uma reportagem da Você S/A, é possível identificar alguns termos referenciados para designar o trabalhador. Algumas definições também foram feitas pela própria matéria:

- Patrocinador corporativo: chefe experiente, que defende o nome de seu protegido diante de projetos ou na decisão de uma promoção; dá o aval para que a pessoa alcance cargos mais importantes.

- Protegido: estabelece uma relação de subordinação e dívida - Gestor - Líder - Liderado - Subordinado - Funcionário - Empregado - Discípulo - Mestre Fotografia

Na fotografia da página 68, aparecem dois executivos que são fontes da reportagem e ilustram um caso narrado pelo texto. A legenda da foto identifica ambos e estabelece a relação entre eles: “Marcos Galáz e Mirela Arroyo Torselli: ele patrocinou a promoção dela”. Na imagem, Mirela está posicionada em um plano à frente de Marcos, porém sem esconder Marcos que está no plano intermediário, em pé, e mais acima de Mirela, que está sentada. Ela sorri e inclina a cabeça em direção ao executivo que se mantém em uma postura mais firme, com um sorriso mais discreto e as mãos cruzadas. Ambos vestem roupas formais, com cores sóbrias (preto, cinza e azul). Ainda é possível identificar que Mirela está apoiada na extremidade de uma mesa, cuja borda divide o quadro fotográfico e estabelece uma linha ascendente. Desse modo, a hierarquia entre ambos também está exposta na foto por esse efeito de divisão do quadro fotográfico e, também, porque há diferentes níveis entre os dois na imagem.

Mirela apresenta um sorriso aberto enquanto seu “patrocinador” incorpora uma postura mais séria, com um sorriso mais sutil, denotando sabedoria, conhecimento, mistério (ele é quem sabe e pode revelar os caminhos). Assim como o ethos do discurso, o executivo expressa confiança e experiência. A posição das mãos reforça isso: ela tem as mãos soltas enquanto ele cruza as mãos, no sentido de mais força e trabalho.

Todos esses elementos vão ao encontro do sentido da reportagem, estabelecendo que a ascensão na carreira de Mirela se deve ao fato de que ela se apoiou a outra pessoa, com mais experiência e influência do que ela na empresa.

Na página 69, o quadro “Siga o mestre: como conseguir um apoio importante”, aparecem quatro cenas com ilustrações de executivos em ações reais e outras metafóricas para ilustrar como conseguir um apoio. São imagens de fácil entendimento que acabam tornando quadro com dicas mais atrativo e o assunto mais ameno.