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Engajamento cívico dos conselheiros

O conselho pretende ser um instrumento de aprofundamento da democracia. Portanto, se o espaço no qual funciona estiver inserido em uma rede social cívica, ou seja, se o conselho for capaz de potencializar a densidade dos relacionamentos

sociais que possuem os conselheiros, com base nos princípios da reciprocidade e da confiabilidade, a eficiência das deliberações tende a aumentar.

A cultura cívica entre os conselheiros do Comppac é muito alta, principal- mente em relação aos conselheiros representantes do setor “Outros”. Este fato pode ser verificado pelo engajamento do representante com a sua instituição: 85,7% estão nas suas organizações por mais de 5 anos; 71,4% exercem cargos de direção, ou seja, a vinculação dos conselheiros às suas entidades é muito forte. Cabe ressaltar, ainda, que os conselheiros filiados a sindicatos ou a algum órgão de classe participam mais intensamente das reuniões das suas associações.

Já em relação aos conselheiros do Executivo Municipal, apenas 33,3% estão há mais de cinco anos na organização ou no órgão que representam; apenas 33,3% ocupam cargos de direção. Igualmente, sua participação em órgãos de classe ou sindicatos é muito menor. Cabe ressaltar que esses engajamentos não estão vin- culados diretamente a atividades partidárias, uma vez que apenas 23,1% dos con- selheiros são filiados a partidos políticos.

Do mesmo modo, quanto às atividades cívicas (trabalho voluntário, greve, listas, manifestação de protesto), os membros representantes do setor “Outros” apresentam uma atuação mais abrangente, pois todos eles participaram de uma ou mais atividades. Dos representantes do Executivo Municipal, 33,3% não par- ticiparam de nenhuma atividade, 50% tomaram parte de uma atividade e ape- nas 16,7% estiveram envolvidos em duas ou mais atividades. A participação dos membros representantes do setor “Outros” deu-se, sobretudo, no trabalho vo- luntário, em reuniões com grupos locais e em listas e abaixo-assinados.

Foi possível notar que estão fragmentados, tanto entre os representantes do Executivo Municipal como no setor “Outros” os atores políticos considerados como os principais defensores de interesses. Os mais citados foram os vereadores, pelos setores “Outros”, com alguma filiação a órgãos de classe ou profissionais; o prefeito, pelos representantes do Executivo Municipal sem qualquer filiação; e o Presidente da República, pelo setor “Outros” sem qualquer filiação.

A conclusão é a de que nenhum setor político é capaz de congregar todos os interesses do conselho. Essa situação é preocupante, pois, aliada à falta de percep- ção do equilíbrio entre as forças da prefeitura e dos setores privados, demonstra a fragilidade responsiva das instituições políticas. Por outro lado, a não preferência do setor pelo prefeito demonstra que, muito mais que um jogo de vencedores, o

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que ocorre são constantes processos de trade off, o que revela a importância do Comppac enquanto instância política e deliberativa. Os conselheiros do Comppac acreditam que são os sindicatos e as associações profissionais, ou seja, os repre- sentantes da sociedade civil organizada, os que melhor defendem seus interesses. Outra observação importante é que, ao medir o nível de confiança dos con- selheiros que podem representá-los, verificou-se que aqueles que apresentam maior grau de confiabilidade possuem duas características: pertencem aos setores distintos do Executivo Municipal e são sindicalizados ou fazem parte de algum órgão de classe. Neste caso, a hipótese de maior grau de confiança, principalmen- te nos sindicatos e nas associações profissionais, deve-se ao fato de os filiados a entidades desse tipo, ao participarem delas ativamente, experimentarem a possi- bilidade de o poder de organização ser importante para alcançar os objetivos pre- tendidos.

Em relação ao engajamento cívico, a forma como os conselheiros se mantêm informados é relevante, tanto que um dos elementos do índice de comunidade cí- vica, para Putnam (1996), é a leitura de jornais. Ao serem indagados sobre “Quais as principais maneiras que utiliza para se informar sobre acontecimentos políticos em geral?”, as respostas mais pontuadas dos membros do Comppac foram: jornal e televisão, com 84,6%; revistas, com 76,9%; e amigos ou parentes, com 53,8%. Tal relação evidencia como os membros do conselho são bem informados e atua- lizados em relação aos acontecimentos políticos, o que aumenta os elementos de argumentação.

Na análise empírica do Comppac, verifica-se que se trata de um conselho atuante, que vem mudando a imagem da cidade, principalmente com o uso do instrumento da isenção fiscal. Contudo, o Comppac apresenta sérias fragilidades, dentre as quais podem-se destacar: sua natureza consultiva, a vinculação da sua presidência à Superintendência da Funalfa, a forma não participativa na escolha dos representantes da sociedade civil e a falta de suplentes e de sanção para as ausências nas reuniões.

Enfim, o Comppac pode tornar-se mais democrático com a realização de algumas reformas que possibilitem a inserção de mais atores no processo, que possibilitem a publicidade dos seus debates, tendo em vista o aprimoramento da participação ampliada, da representação, fornecendo, via de consequência, mais qualidade à governança local.

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