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3 (RE)ADMIRANDO A PRÁTICA: BUSCANDO NOVOS CAMINHOS

3.1 ENSINO DE FÍSICA EM TEMPOS DE MUDANÇA

O rápido desenvolvimento científico e tecnológico que vem ocorrendo nas últimas décadas atribuiu ao conhecimento acerca da ciência e tecnologias o sentido do progresso. Em virtude disso, a vida em sociedade se modificou de tal modo que tanto o conhecimento científico quanto o saber tecnológico transformaram-se em referências de poder no meio social (MACHADO; SANTOS, 2004). Assim, sendofundamental que as pessoas compreendam a realidade que as

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cerca, amplia-sesobremaneira o papel que a escola deve assumir quanto à formação de sujeitos que pensem criticamente sobre essas questões, sobre os problemas pelos quais a sociedade vem passando e que tenham condições de enfrentá-los da forma mais coerente e consciente possível. Para isso, é necessário que o ensino de ciências alcance práticas mais eficazes quanto à formação de sujeitos críticos e investigativos, que sejam levados a refletir sobre o papel da ciência, dassuas aplicações tecnológicas e de suas consequentes implicações na sociedade atual.

Castells (2001) argumenta que conhecimento e informação foram fatores centrais em muitas, se não em todas, as sociedades historicamente conhecidas, no entanto, percebe como novo, no período atual, ―a tecnologia do processamento da informação e o impacto dessa tecnologia na geração e na aplicação do conhecimento‖ (CASTELLS, 2001, p.140). Nesse contexto, as transformações tecnológicas provocadas pelas Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDIC) apresentam novos desafios. No campo educacional, novas formas de organizar o trabalho pedagógico estão sendo exploradas. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) já apresentam as Ciências da natureza e matemática associadas às suas tecnologias. Isso ratifica a influência das tecnologias no currículo e, portanto, no processo de ensino e aprendizagem (CUSTODIO; JÚNIOR, 2007).

Para Medeiros e Medeiros (2011), por mais que fiquemos fascinados com os avanços e as possibilidades de uso das TDIC na educação, é conveniente lembrar que os seus desdobramentos fazem parte de um ciclo histórico de Tecnologias da Educação compromessas e expectativas ousadas, seguidas, entretanto, por certo desencanto no qual os insucessos ocorridos e as dificuldades ematender às expectativas iniciais foram sempre creditados ao despreparo dos professores, àsinadequações das escolas, à falta de verbas e a outras ocorrências do gênero, o que faz os autores reforçarem a ideia da premência de uma análise crítica de seus horizontes.

As TDIC provocam mudanças nas maneiras de pensar, trabalhar e se comunicar (PRETTO, 2005; ALONSO, 2008; ALMEIDA; SILVA, 2011; MORAN, 2012), integrando-se às práticas sociais e criando nova cultura, assim entendida como cultura digital. Nesse sentido, a escola, sendo o principal espaço de formação e transformação, precisa problematizar o papel que as TDIC podem exercer na vida das pessoas e promover uma apropriação crítica e criativa, não para aceitá-las ou negá-las, mas para mediar seu uso consciente. Em se tratando do contexto escolar, a integração crítica das mídias configura-se como um dos desafios deste tempo. Uma integração, nessa perspectiva, não

significa simplesmente a inclusão de novos recursos tecnológicos, mas a superação do uso meramente instrumental, com práticas pedagógicas que instiguem novas leituras das mídias e favoreçam novas maneiras de aprender, pensar e agir. Nesse sentido, o universo virtual apresenta-se como um espaço propício a interações, busca de informações e viabilidade para a construção coletiva do conhecimento, oferecendo novas possibilidades para o processo de ensino e aprendizagem da Física.

O professor de Física, nesse ínterim, deve estar atento tanto às mudanças demandadas em sua prática docente, quanto às mudanças com a própria Física, enquanto ciência e disciplina curricular. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (PCNEM, 2000), as Ciências Naturais e a Física em particular, enquanto áreas de conhecimento construídas, possuem uma história e uma estrutura que, uma vez apreendidas, permitem uma compreensão da natureza e dos processos tecnológicos que permeiam a sociedade. No entanto, temos percebido que, por vezes, o ensino de Física não tem contribuído com essa compreensão, sendo ministrado amiúde de forma linear e dogmática, na qual o conteúdo é apresentado como produto final, não oportunizando ao educando a reflexão, o questionamento e a construção do seu próprio conhecimento. Além disso, não costuma explorar o potencial das TDIC para enfrentar determinados problemas presentes na prática. Isso porque muitas vezes o professor não conhece outra maneira de ensinar, não é instigado a buscar e/ou não tem tempo para planejar novas estratégias.

Com vistas à superaçãodos desafios enfrentados pelo Ensino de Física na atualidade, diversas estratégias foram pensadas e desenvolvidas para dar auxílio ao professor em sala de aula. Uma estratégia bastante investigada, mas ainda pouco explorada em grande parte das escolas, seja por falta de recurso, seja por falta de uma formação que propicie o seu uso,são as atividades experimentais, cujascontribuições de ensino para o desenvolvimento de habilidades em Física são destacadas pelas Orientações Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN+) (BRASIL, 2002):

É dessa forma que se pode garantir a construção do conhecimento pelo próprio aluno, desenvolvendo sua curiosidade e o hábito de sempre indagar, evitando a aquisição do conhecimento científico como uma verdade estabelecida e inquestionável. Isso inclui retomar

o papel da experimentação, atribuindo-lhe uma maior abrangência para além das situações convencionais de experimentação em laboratório (BRASIL, 2002, p.84).

Atividades experimentais podem ser desenvolvidas de diferentes maneiras, por meio de roteiros fechados ou abertos, como demonstração de um fenômeno específico por parte do professor e/ou desenvolvidas pelos próprios alunos, com realização em laboratórios específicos para estas atividades ou mesmo na sala de aula, com kits mais sofisticados adquiridos pela escola ou com materiais alternativos/baixo custo e/ou ainda fazendo uso de simulações computacionais, recurso que aproveita todo o potencial que as TDIC oferecem para este fim e possibilita a realização de experiências antes impossíveis de realizar em sala de aula, seja pela dificuldade em construir os aparatos, seja pelo alto custo ou pelos riscos oferecidos.

Borges (2002) ressalta que não existe uma única forma de organizar o trabalho no laboratório, podendo fazer-se uso de demonstrações, atividades prático-experimentais dirigidas, pelo professor ou indiretamente através de um roteiro. No entanto, para que o trabalho seja efetivo, o professor precisa estabelecer de forma clara os objetivos que pretende com a realização das atividades propostas. Para Araújo e Abib (2003), apesar de existir uma vasta literatura acerca das atividades experimentais, os materiais que estão ao alcance dos professores seguem, muitas vezes, orientações associadas a uma abordagem tradicional de ensino, com demonstrações fechadas e a laboratórios de verificação e confirmação da teoria previamente definida.

O uso da História e da Filosofia da Ciência (HFC) nas aulas de Física também tem sido bastante explorado, seja como conteúdo em si, seja como estratégia didática. Para Silva (2012), os materiais baseados na HFC podem funcionar como um dos vários elementos de contexto possíveis ao revelar que a Ciência está intrinsecamente ligada aos contextos sociais, ecológicos e outros e assim contribuir com a contextualização dos conteúdos escolares defendida nas diretrizes curriculares nacionais. Para a autora, um dos grandes desafios é a produção de material didático que contemple de forma adequada aspectos de uma transposição didática adequada entre os saberes sábio e o saber a ensinar. Embora tenha muitos materiais disponíveis na internet, falta expertise para buscar e também para selecionar os mais adequados. Para Castro e Carvalho (1992), a introdução da dimensão histórica no ensino possibilita que o conhecimento científico, uma

construção gradual e sofisticada da mente humana, possa ser encarado não na condição de produto acabado, algo passível de mera transmissão ou revelação, mas sim enquanto conhecimento a ser elaborado.

Os textos de divulgação científica também têm sido um recurso bastante utilizado, com grande potencial para construir uma visão mais coerente da ciência e da tecnologia. Sendo uma excelente ferramenta de veiculação de informações sobre ciência e tecnologia, ele pode desenvolver no aluno a capacidade de formar sua opinião crítica e entender o mundo científico e tecnológico no qual ele vive (DAMÁSIO; TAVARES, 2013). Entretanto, para fazer bom uso dessa ferramenta, é fundamental que o professor selecione o artigo a ser utilizado, analisando sua linguagem científica, verificando sua adequação ao nível de ensino, bem como o seu tamanho, principalmente em contextos nos quais os alunos não têm habito de leitura, uma vez que textos muito longos tornam-se cansativos e pouco produtivos (RIBEIRO; KAWAMURA, 2006).

Outra estratégia que pode ser trabalhada é a história em quadrinhos. Essa estratégia consiste em uma ferramenta pedagógica popular que abrange um amplo número de jovens em idade escolar, pois atrai a atenção do aluno por ter ilustrações. Para trabalhar com as histórias em quadrinhos, os textos devem ser simples e curtos, e fazer com que o aluno aprenda e reflita com suas próprias conclusões e deduções do conteúdo que foi proposto em sala de aula (GRASSI; FERRARI, 2009).

Além disso, as redes sociais, por estarem cada vez mais presentes na vida dos estudantes, têm se apresentado como apoio ao processo de ensino e aprendizagem (CARITÁ; PADOVAN; SANCHES, 2011). As redes sociais virtuais são um espaço contemporâneo de encontro de diferentes sujeitos e coletivos, sendo lugar de interação social da cultura digital e lugar da aprendizagem. Assim, o professor, para fazer uso das redes sociais de forma efetiva para aprendizagem dos alunos, deve conhecer as potencialidades oferecidas pelas redes sociais, bem como os cuidados a serem tomados.

A educação para a pesquisa também tem sido uma estratégia bastante explorada nas aulas de Física e de Ciências de modo geral. Na concepção educacional denominada ―Educar pela Pesquisa‖, proposta por Demo (1997), essa proposta pode contribuir para um novo olhar sobre as relações estabelecidas no contexto escolar e também universitário entre professor, aluno e conteúdo científico. O autor argumenta em favor da importância da pesquisa na escola, entendendo a educação como processo de formação na competência humana, em que

o questionamento reconstrutivo configura um critério para a pesquisa. São princípios dessa proposta: ―a convicção de que a educação pela pesquisa é a especificidade mais própria da educação escolar e acadêmica; o reconhecimento de que o questionamento reconstrutivo com qualidade formal e política é o cerne do processo de pesquisa; a necessidade de fazer da pesquisa atitude cotidiana no professor e no aluno; e a definição de educação como processo de formação da competência histórica humana‖ (DEMO, 1997, p.7).

Outras questões merecem atenção e cuidado do professor. Em síntese, podemos citar: a realização de uma Transposição Didática (TD) que leve em relação seus objetivos de aprendizagem e o contexto de ensino; um cuidado comas Concepções Alternativa (CA) dos alunos; atenção para a necessidade de uma atualização curricular, que leve em conta a abordagem de tópicos mais atuais da Física; a busca por abordagens mais contextualizadas e por novas formas de avaliação; uma preocupação com abordagens dentro do enfoque Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS); estratégias de resolução de problemas; uso da modelização; abordagens interdisciplinares e a busca por estratégias de ensino que possam motivar mais os alunos, contribuindo com a constituição de espaços propícios para a construção do conhecimento pelo próprio aluno, atribuindo-lhe um papel mais ativo, como sujeito do conhecimento. São questões que resultam em teorias e metodologias próprias, que enfatizam, cada uma a seu modo, aspectos importantes do ensino aprendizagem de Ciências, trazendo em comum uma tendência à ruptura com o modelo tradicional em uma abordagem crítica e reflexiva, com estreita vinculação ao contexto da vida real e social, de professores e alunos.

Trata-se de questões que ainda motivam as pesquisas e que já se configuram como força motriz na busca por práticas inovadoras para alguns professores ou como verdadeiras complicações que ainda não foram percebidas ou precisam ser enfrentadas por outros. Nessa perspectiva:

Para introduzir em suas aulas atividades inovadoras, onde se espera que os alunos tenham uma participação intelectualmente ativa na construção do conhecimento e tempo para pensar e discutir, é necessário que os professores adotem novas práticas profissionais nada habituais para os professores formados ―no‖ e ―para o‖ ensino tradicional. Portanto, é necessário também que

essa formação mude. E mude não somente em termos de acrescentar ou retirar alguns tópicos de conteúdo de Física ou do conteúdo educacional, mas é necessário que mude em termos de atitudes e valores (CARVALHO, 2012, p. 39).

Percebemos um universo profícuo de contribuições das pesquisas das áreas de ensino de Física. Contribuições de grande relevância para o ensino de Física na atualidade, independente do contexto de realização, desde que os professores sejam críticos e reflexivos, quanto àsua utilização e implementação, mas que acabam sem ter muito sentido para aqueles professores que não têm contato e não foram instigados a buscar contato com esse universo de conhecimento construído.

Temos professores em trabalhos isolados, desenvolvendo boas práticas e que também poderiam contribuir, tanto com as pesquisas da área como com a prática de outros professores. Entretanto, por atuarem sozinhos, pela falta de meios que pudessem fomentar interação entre professores, como encontros e cursos de formação continuada ou por falta de conhecimento do potencial de meios disponíveis, como as próprias TDIC ou, ainda, por não se perceberem como autores de suas práticas, como ―produtores‖ de conhecimento, acabam não compartilhando desses conhecimentos e prática. Isso é muito prejudicial para o seu trabalho docente, uma vez que:

Assim como o trabalho do cientista é um trabalho coletivo, ―o trabalho docente tampouco é, ou melhor, não deveria ser uma tarefa isolada, e nenhum professor deve se sentir vencido por um conjunto de saberes que, com certeza, ultrapassam as possibilidades de um ser humano‖. O essencial é que possa ter-se um trabalho coletivo em todo o processo de ensino/aprendizagem: da preparação das aulas até a avaliação (CARVALHO; GIL- PÉREZ, 2011, p. 19).

Nesse sentido, e coadunando com o que preconizam os PCN e a Proposta Curricular de Santa Catarina (PCSC), este trabalho se propõe a provocar um novo olhar sobre o ensino de Física, tendo como meta o desenvolvimento de atitudes reflexivas e investigativas que auxiliem na percepção e enfrentamento de complicações presentes no processo de ensino e aprendizagem de física, com um olhar para o potencial das TDICno que diz respeito ao enfrentamento destas complicações.

3.2 PRÁTICA DE ENSINO DE FÍSICA EM SANTA CATARINA