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4 CAMINHO METODOLÓGICO

4.3 O CONTEXTO DA PESQUISA

4.3.1 A entrada no campo

Antes de entrar no campo de forma definitiva, fizemos, no mês de julho, duas breves visitas à unidade de ensino escolhida para realização da pesquisa. Na primeira visita, ao nos aproximar da escola, antes de entrar, o agente de segurança que abriu o portão foi logo perguntando se estávamos de volta.

Ao entrar, informamos à pedagoga da nossa visita, e ela logo perguntou quando retornaríamos para trabalhar. Sem nenhuma restrição, sorriu e disse: “Você é sempre bem-vinda. Fique à vontade”. Nesse caso, temos uma “[...] observação participante natural” (MARCONI; LAKATOS,1999, p. 93), situação em que o pesquisador participa da mesma comunidade ou grupo que investiga.

Em seguida, já que teria início o desjejum das crianças, caminhamos para o refeitório, e cada funcionário que passava nos acenava e nos perguntava se estávamos de volta. Dizíamos que estávamos de volta parcialmente e que, em um determinado momento, eles iriam nos ver mais vezes na escola, e que isso não significava o retorno para assumir nossa função. Estaríamos, sim, frequentado o espaço para realizar a pesquisa.

Mediante as perguntas do grupo matutino, dissemos à pedagoga que iríamos retornar outro dia para conversar com as professoras do ensino regular e com as do Atendimento Educacional Especializado do vespertino. Naquela mesma semana, voltamos para conversar com as professoras do matutino, retornando à tarde para apresentar o projeto de pesquisa. Nesse dia o segurança não era o mesmo. Chegamos e nos apresentamos. Pelo corredor, passava uma auxiliar de serviços operacionais e ela logo disse pra ele: “Pode abrir. Essa é a professora das mãozinhas”. Entramos e fomos dar ciência à diretora e à pedagoga informando que estávamos ali. As duas, sempre gentis, deram-nos as boas-vindas e disseram que ficássemos à vontade. Aproveitamos para visitar a sala de recursos multifuncionais e os outros espaços da escola.

O primeiro momento das visitas foi para um contato descontraído com os profissionais e para, de certa forma, conversar com a diretora sobre a escolha do CMEI para a realização da pesquisa e entregar a carta de apresentação. Num segundo momento, ao retornar à unidade de ensino, apresentamos à diretora o Termo de Consentimento Livre Esclarecido e combinarmos com as professoras os dias para realização da pesquisa. Dessa forma se deu o início ao ensaio investigativo. De acordo com Freitas (2002, p. 33 e 34), “[...] precisamos aprender num ensaio investigativo como nos aproximar do objeto [considerando que] numa pesquisa qualitativa o movimento inicial deve ser o de aproximação”; portanto essas visitas, segundo Freitas, seriam um momento exploratório que permitiria um trabalho de campo mais produtivo.

Participar da pesquisa do mesmo grupo ou comunidade investigada exige do pesquisador o que os antropólogos chamam de estranhamento. Esse

estranhamento implica, por parte do pesquisador, o duplo movimento no olhar, “[...] transformar o exótico em familiar e/ou o familiar no exótico” (MATTA, 1978, p. 28). Matta considera essa tarefa uma via de mão dupla, pois o pesquisador deverá estar atento àquilo que não é visível, devendo se deslocar da sua posição para que aquilo que lhe é familiar e corriqueiro se transforme em exótico. Isso exige que o pesquisador “[...]dê inteligibilidade àquilo que não é visível ao olhar superficial e, por outro lado, que se despoje de sua posição de classe e de membro de um grupo social para ‘estranhar’ o ‘familiar’” (MATTA, 1978, p. 28).

Estranhar o familiar exige do pesquisador observar atentamente as práticas naturalizadas pela vivência no cotidiano e, como um garimpeiro atento, fazer emergir desse familiar pistas e indícios que poderão contribuir na produção da pesquisa. Para isso é necessário estar sempre revisitando o eixo da investigação.

Nesta pesquisa, a permanência do investigador no campo teve que ser constantemente negociada, a começar pela conversa com os professores das turmas das crianças sujeito das pesquisas, ver a disponibilidade em nos receber e a possibilidade de respostas, sabendo-se que a aceitação não deve ser por imposição. Após a conversa e a aceitação, os professores assinaram o Termo de Consentimento. Nessa oportunidade também entramos em contato com as mães das crianças que fizeram parte da pesquisa. Esse encontro serviu para apresentar o resumo do projeto e solicitar que eles assinassem um documento autorizando a participação das crianças. Além das informações e esclarecimentos sobre a pesquisa, informamos que o responsável pela criança também seria entrevistado. A pesquisa foi realizada inicialmente às quartas-feiras no Grupo III. Como, nesse dia, a rotina não contemplava planejamento para professora, negociamos a troca para segunda-feira, dia de planejamento, e a professora não se opôs. Dessa forma, além de viabilizar estar junto com o grupo nos diversos contextos, havia possibilidade de participar do planejamento com a professora regente desse grupo. Dissemos à professora que estávamos ali para o que ela precisasse no trabalho com a turma e com Marcos. A pesquisa no Grupo V foi às terças-feiras, dia em que o grupo tinha aula de Artes e Educação Física. Nas segundas-feiras, ficava para dar continuidade à pesquisa no turno vespertino, horário em que ocorria o Atendimento

Educacional Especializado, contrário ao horário de escolarização da turma, conforme prevê a legislação. Entretanto, no dia em que as crianças sujeito da pesquisa de uma das turmas faltavam, havia flexibilidade por parte das professoras para que eu me deslocasse e fosse ficar na sala em que um dos sujeitos da pesquisa estivesse presente.

Dessa forma, entrar no campo familiar exige do pesquisador um exercício constante de negociação, afastamento e aproximação. Requer também que ele tenha discernimento diante dos conflitos que emergem, devendo estar sempre atento para não se desviar do eixo de sua pesquisa. O pesquisador deve exercitar o entendimento, observando até que ponto ele pode ir, para não se envolver em questões que não sejam pertinentes e que possam atrapalhar o desenvolvimento da sua pesquisa.