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3 LINGUAGEM: LIBRAS E O ENSINO DE LIBRAS

3.3 A LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS

Ao considerar a Libras modalidade espaço-visual, língua natural dos surdos (BRASIL, 2002), a legislação vem resgatar o direito da pessoa surda em ser instruída em sua Língua, respeitando a particularidade do povo surdo.

A língua de sinais, de acordo com Góes (1999), Goldfeld (2002), Lacerda e Lodi (2006) e Lacerda (2009), é a única língua a ser dominada plenamente, de forma natural, pelo surdo e que atenderia às suas necessidades comunicativas e cognitivas, permitindo a sua entrada na linguagem e sua constituição como sujeito linguístico. Ao considerarmos a língua de sinais como meio, esta, além de permitir à criança surda acessar os conteúdos educacionais, favorece uma melhor relação com o mundo, significando e ressignificando-o. Contribui para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores,8 por intermédio da relação com aqueles que a cercam (VIGOTSKI, 1998).

Em 1960, Willian Stokoe (apud QUADROS; KARNOPP, 2004) confere à língua de sinais status linguístico. Comprovou que a língua de sinais atendia a todos os quesitos necessários para se constituir uma língua, sendo o seu trabalho o primeiro passo nos estudos da língua de sinais. Posteriormente, outras pesquisas realizadas,

8 São funções resultante das interações estabelecidas pelos sujeitos que, ao serem internalizadas, modificam-se para constituir o funcionamento interno.

em sua maioria com ASL9 vêm ressaltar, entre outras características, as riquezas de combinações, favorecendo a ampliação do vocabulário.

Assim como as línguas orais em que cada país tem a sua, excedendo ao regionalismo, a língua de sinais se comporta da mesma forma. Sendo assim, esta não é universal, “[...] uma vez que esta universalização está ancorada na ideia de que toda língua de sinais é um ‘código’ simplificado apreendido e transmitido aos surdos” (GESSER, 2009, p. 11). Dessa maneira, teríamos uma ideia simplista da língua de sinais. O que pode ser denominado de universal é a forma como ela se constitui, utilizando, para se efetivar, o canal gesto-visual e os sinais realizados pelos usuários dessa língua.

Enquanto na língua oral as palavras são formadas a partir de unidades menores, como os fonemas e as sílabas que se articulam de forma linear, na língua de sinais a unidade menor constitui o próprio sinal. Segundo Gesser (2009, p.19), “[...] as línguas de sinais incorporam essas unidades de forma simultânea”.

Como as outras línguas, a Libras é estruturada a partir de unidades mínimas, passando a unidades mais complexas. Possui, também, os níveis linguísticos fonológico, morfológico, sintático e semântico. A palavra ou léxico das línguas orais e auditivas correspondem aos sinais da língua de sinais. Esses sinais são formados a partir da combinação de cinco parâmetros: configuração de mãos (Figuras 1 e 2), ponto de articulação (Figura 3), movimento (Figura 4), expressão facial (Figura 5) orientação ou direcionalidade (Figura 6). Combinando esses cinco parâmetros, teremos as palavras, as frases que se efetivam num contexto (FELLIPE; MONTEIRO, 2007).

A seguir apresentaremos os cinco parâmetros, iniciando pela configuração de mãos, que são as formas (posições) das mãos utilizadas para a realização dos sinais. Entre as 64 configurações, encontramos os numerais cardinais e o alfabeto datilológico que serão apresentados no (Figura 2) para melhor visibilidade.

Figura 1 – Configuração de mãos

Figura 2 – Alfabeto Manual e Numeral cardinal

Fonte: pead.faced.ufrgs.br

Figura 3 – Ponto de articulação

Obs: Local onde é feito o sinal, podendo ser em alguma parte do corpo ou no espaço neutro

GOSTAR

Figura 4 – Movimento

Com movimentos

LIBRAS ESCOLA VERDADE

Sem movimento

PENSAR EM PÉ

Obs: os sinais podem ter movimento ou não

Figura 5 – Expressões faciais ou corporais

RIR SUSTO TRISTE RAIVA

Obs: As expressões são fundamentais para a compreensão dos sinais. A expressão facial dá entonação ao sinal

Figura 6 – Orientação/Direção

IR VIR SUBIR DESCER

ACENDER APAGAR ABRIR FECHAR

Obs: Os sinais também possuem direção – esquerda, direita, para cima e para baixo

Portanto, a junção desses parâmetros formará o sinal na Libras, correspondente à palavra na língua oral. Esses sinais são feitos em um espaço delimitado à frente do sinalizador (FELLIPE; MONTEIRO, 2007).

Sendo assim, a Libras é uma língua natural das comunidades surdas brasileiras, possibilitando a aquisição dos bens culturais e sociais, permitindo a comunicação entre seus usuários. As línguas de sinais são “[...] consideradas pelos linguistas como línguas naturais, um sistema linguístico legítimo e não como um problema do surdo ou como uma patologia da linguagem” (QUADROS, 2004, p. 30).

Considerando a língua como sistema de signos constituído de forma ininterrupta num determinado contexto (BAKHTIN, 2006), a língua de sinais assume papel de extrema importância na educação dos surdos.

Essa importância é apontada nos estudos de Góes (1996), Gesueli (1998), Turetta (2006), Costa (2007), Tenor (2008), Lacerda e Lodi (2009), Rodrigues (2009), Valiante (2009), Merselian (2007) e Florêncio (2009).

Nesse sentido, a educação infantil passa a ser espaço privilegiado para aquisição da Libras e espaço de aprendizagem de conhecimentos diversos, desde que, nesse espaço, existam pessoas que dominem essa língua, como apontam Rodrigues (2009), Turetta (2006) e Tenor (2008), um instrutor ou professor surdos. A presença desse sujeito permitirá à criança se reconhecer positivamente como surda e não como deficiente. A interação interlocutor surdo/criança surda, em língua de sinais, dar-se-á de forma dialógica, potencializando o desenvolvimento do pensamento, visto que, “[...] o desenvolvimento do pensamento é determinado pela linguagem, isto é, pelos instrumentos linguísticos do pensamento e pela experiência sócio- cultural da criança”(VIGOTSKI, 2003, p. 62).

Sendo assim, a interação por meio da língua de sinais contribuirá para o desenvolvimento do pensamento, da imaginação, da atenção voluntária e da memória mediada. Todas as funções psíquicas superiores são processos mediados e os signos constituem o meio básico para dominá-las e dirigi-las.

Nessa via, a Libras não é apenas um conjunto de gestos e mímicas, “[...] visão simplista, influenciada pela ideia da supremacia das línguas orais em detrimento das outras línguas” (RODRIGUES, 2009, p. 34), e sim uma língua com organização e gramática própria. De acordo com os documentos oficiais pertinentes à educação dos surdos, seu ensino deve ser garantido desde a educação infantil.