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ENTRE A ORDEM DO PAÍS E A BRINCADEIRA DO CARNAVAL:

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2 O CARNAVAL E A REPRESSÃO ATRAVÉS DOS DOMÍNIOS DE

3.1 ENTRE A ORDEM DO PAÍS E A BRINCADEIRA DO CARNAVAL:

O ano de 1968 não começou de fato com as tradicionais salvas de fogos ou os champanhes abertos na à meia noite. Nos primeiros meses daquele longo ano, os fatos que iam se sucedendo logo levaram os personagens daquele contexto social a terem prova de que aquele seria um ano de incertezas, luta por mudanças e busca em torno de novos paradigmas. Caminhar e cantar, seguir a canção, era no Brasil um lema que, inspirado nas transformações que se pretendiam ocorrer na Europa já um ano antes, já demonstravam que aquele janeiro não seria um mês igual aos janeiros dos últimos quatro anos passados. Não bastava mais unicamente levantar-se contra uma forma de governo que restringia importantes instrumentos simbólicos sociais garantidos mediante a ideia de um sistema democrático: levantaram-se, sim, diversas bandeiras que prezavam por mudanças no âmbito cultural, comportamental, racional, sentimental e, sobretudo, ideológico que começaram a se processar a partir das primeiras semanas daquele mês.

Estudantes nas ruas, pátios de colégios e universidades, artistas nos palcos, imprensa ávida por notícias e policiais a postos: o quadro não diferia tanto daquele que viveu o primeiro quadriênio do período militar, embora as aspirações da sociedade fossem outras não tão diferentes daquelas adotadas pós-Golpe e as posturas do governo seguissem inversamente o compasso das reivindicações, sustentando discursos como a manutenção da ordem, da paz social, da família e dos bons costumes como plano efetivo em torno da democratização da nação e, assim, estabelecendo os rumos de um novo Brasil: dessa maneira, estaria garantida a Segurança Nacional prevista antes mesmo do Golpe de 1964 pelo programa da Organização dos Estados Americanos (OEA) e, com isso, obtendo-se uma diretiva que conseguisse estabelecer um maior controle sobre as ações dos grupos considerados pelos donos do poder como subversivos.

Essas mudanças não ocorreram de maneira simples. Ainda em 1967, por conta da mudança de governos no país, as políticas em relação à sociedade também mudaram: saía de cena o grupo liderado por Castelo Branco, conhecido como Grupo da Sorbonne, adepto de práticas mais brandas e entrava o grupo liderado por Artur da Costa e Silva, o chamado Grupo da Linha Dura. O próprio nome deste último sugeria o que seriam os anos a seguir e, em

especial, aquele ano de 1968. Ao adotar uma postura mais rigorosa, Costa e Silva revelaria importantes caracteres de sua personalidade, o que ficaria ainda mais explícito após o segundo semestre de 1968. Até então, o país vivia um momento delicado, com a adaptação à nova Constituição promulgada em 1967, a qual dava respaldo total aos militares em ação e pensamento, além de ratificar a eficácia e eficiência em se conviver com os quatro Atos Institucionais em vigor. As liberdades estavam reduzidas e a sociedade clamava por mudanças estruturais em busca da restauração da sua ordem.

Esta ordem social almejada por aqueles que combateram o Estado de Exceção não leva a uma conotação que nos permita pensar a sociedade fora dos quartéis por apenas uma vertente: não se pode observar unicamente enquanto vítimas do sistema autoritário àqueles que decidiram estar na contramão do Regime Militar, pois havia na sociedade grupos que deram voz ao governo e apareceram como uma segunda força de sustentação deste perante as práticas e o cotidiano social daquele Brasil pós-1964. Entretanto, o grande movimento eclodido na Europa em Maio de 1968 foi um divisor de águas nos paradigmas que envolviam aquele contexto social mergulhado em legislações e determinações de comportamento, ação e pensamento. Sendo assim, um embate intransitivo (MARTINS, 2004) instalou-se buscando, antes de tudo, a destruição da criticidade do indivíduo, onde o principal objetivo era que este tivesse dificuldade na percepção das ações que suprimiam seus direitos e também uma desarticulação com o pensamento não-alienado, assim privilegiando o discurso do poder autoritário (MARTINS, 2004).

Contudo, a sociedade brasileira ativa contra o Regime Militar não se fez pautar pelas ações que, por ventura, pudessem doutriná-los mediante uma cultura autoritária (MARTINS, 2004). Percorrendo os mecanismos que se localizavam em torno da mudança de paradigmas, os diversos setores sociais brasileiros que agiram em contraponto com a Ditadura Militar seguiram as transformações que envolveram a cultura, a sociedade, as formas políticas e o mundo em geral a partir de Maio de 1968: estes mostravam a construção de um novo imaginário social. Concentradas especialmente na França, em Praga, nos Estados Unidos ou no Brasil, as repercussões desses acontecimentos surtiram efeitos que se manifestaram naqueles anseios mais desejados pela sociedade: a garantia de seus direitos fundamentais, mais tarde chamados universais, o que a nem todos foi acessível. Nascia ali uma geração que viveu alimentada por sonhos, heróis, ódios, emoções e ações das mais variadas possíveis em torno da concretização de suas ideologias, novas para muitos.

A geração de 1968 viveu uma dicotomia durante aquele ano de tantas transformações: enquanto uns estavam horrorizados com as mudanças propostas pelos movimentos que eclodiam a cada momento, outros buscavam consolidar suas perspectivas diferenciadas com relação a antigos paradigmas como: estrutura social e familiar, lealdades ideológicas e legados culturais. Como já evidenciado, maio de 1968 representou um crescimento dramático de acontecimentos, que na verdade tem suas origens ainda em 1967 e suas repercussões muito vivas ainda em 1969, que só foram possíveis graças a uma sintonia muito grande entre seus principais protagonistas (KURLANSKY apud LIMA; PALMEIRA, 2008). Esse mesmo grupo formado por estudantes universitários, grupos envolvidos nas questões ambientais, manifestantes que lutavam pela formação de um Estado de Direito a partir de legislações adotadas para minorias como homossexuais e feministas, diversos profissionais liberais entre tantos outros foi tomado de consciência crítica, provocando uma grande adesão nas universidades e reunindo condições essenciais para a formação de um pensamento crítico, cultural e, sobretudo, tomados por uma enorme vontade de serem diferentes da geração de seus pais, bem como possuir capacidade de debater sobre assuntos envolvendo política, principalmente.

Mais do que um legado, aquela geração ativa em torno da luta pela construção de ideias em prol da mudança perante a insatisfação de muitos que estavam junto com eles estava preocupada principalmente em fazer de 1968 um ano inesquecível (LIMA; PALMEIRA, 2008). Inesquecível não porque houve grande mobilização de várias esferas sociais em torno de uma causa única: lutar contra a ordem estabelecida, as ameaças reais contra o Estado de Direito ou até mesmo o anseio em construir algo realmente novo. Aqueles que fizeram daquele período o ano que não terminou (VENTURA, 1988) utilizaram instrumentos dos mais variados como cartazes, pichações, piquetes, festivais de músicas (vide Woodstock) e até mesmo seus próprios corpos para estabelecer a luta movida pelas paixões, onde buscaram encontrar a si mesmos em cada momento que saíam às ruas em busca da realização de seus anseios. Ainda, segundo Dosse (2001), era uma ruptura brusca e, como toda ruptura, buscou no passado a memória necessária para um novo presente, estabelecendo caminhos novos totalmente independentes da inércia existente, rejeitando a verticalidade e a delegação de poder.

Assim, as manifestações não se restringiram à Passeata dos Cem Mil em São Paulo, mas dinamizaram-se por diversas capitais brasileiras. Em Pernambuco houve algumas mobilizações voltadas para a Praça Dezessete, Praça Maciel Pinheiro e Independência,

piquetes na Rua do Príncipe, todos feitos por estudantes universitários, mas nada que realmente se comparasse a passeata que saíra em frente à UNICAP, congregando vinte mil manifestantes contra as decisões do Congresso Biônico em relação aos casos Márcio Moreira Alves e Edson Luís. Recife já vivia um clima de protestos, tensões, repressão, busca por maiores espaços de Democracia que promoviam embates encabeçados especialmente pelos estudantes vinculados à UNE31. Todavia, apesar do movimento de maio de 1968 ter se apresentado como um divisor de águas nas concepções daquela época, alguns sentidos são mais fortes na Europa, a exemplo da reforma universitária e o movimento ambientalista, rebatendo secundariamente no Brasil. Neste sentido, as repercussões negativas que atingiram as manifestações, assim como os resultados práticos das ideologias contidas no movimento, também foram inesperadas. O Governo Costa e Silva, alegando ameaça ao Estado de Segurança Nacional, decidiu promulgar a 13 de dezembro de 1968, uma verdadeira sexta- feira macabra, o Ato Institucional nº 5, decretando um silêncio temporário de sete anos em muitos instrumentos legais previstos na Constituição da Democracia brasileira.

Mesmo sendo uma diretiva impetrada pelos militares, o AI-5 não representou uma unanimidade entre estes. Em consonância com o que afirma o jornalista Contreiras (2005), alguns militares ligados ao Legalismo e ao Positivismo de Benjamin Constant eram contra esse golpe dentro do golpe, afirmando que não havia necessidade para acionar forças de tamanha repressão a exemplo do que acontecera na época do Plano Cohen de Getúlio Vargas, onde o uso da força de contorno extremo se tornou uma instituição legal pelas mãos do Estado. Nem mesmo ameaças de guerrilha ou qualquer atividade do mesmo quilate pairava sobre aqueles que discordavam do Regime Militar na altura do ano de 1968, de modo que justificasse a implementação de tais leis.

Porém, os militares ligados à Linha Dura precisavam de um pretexto para que suas ideias fossem colocadas na ordem da vez e inclusive, segundo o coronel-professor do Exército Tito de Avillez, ameaçaram o Marechal Costa e Silva juntamente com sua esposa, D. Iolanda, caso o endurecimento do Regime não se traduzisse numa realidade. Sem saída, Costa e Silva cedeu aos planos manipuladores dos representantes do autoritarismo (o que não isenta o

31 Apesar de extinta oficialmente desde o Golpe de 1964, a UNE era vista como um órgão estudantil propenso à

subversão por ter adotado a luta em campo aberto – nas ruas – pela afirmação de seus ideais, especialmente o de uma reforma universitária, bandeira que já havia sido levantada antes mesmo de 1968 (em março de 1964) pelo estudante paulista de Engenharia José Serra, então presidente da entidade naquela ocasião. Com os direitos caçados e seus principais líderes presos, acusados de inimigos veementes do regime, a imprensa passou a designar a organização como EX-UNE, apesar da ideologia ter permanecido intacta e muitos de seus membros continuarem ativamente protestando contra o Governo Militar. Para entender melhor a nomenclatura “EX-UNE”, ver matéria em: REVOLUÇÃO, ano zero: as sextas-feiras 13 da extinta UNE. Revista Veja, São Paulo, n. 15, p. 16-25, 18 dez. 1968.

mesmo de responsabilidades sobre os atos que teria justificado como necessários à condução do país). Nesse caso, não houve um conjunto de ações de fato plausíveis e coerentes para promover um discernimento em torno do que poderia ser feito para conduzir legalmente o país (CONTREIRAS, 2005).

Através, pois, deste dispositivo (AI-5), O Governo Militar acabou por decretar a institucionalização da tortura, da perseguição, da censura, impetrando o medo como arma e promovendo a ampliação dos sistemas de Estado que privilegiavam a informação como um dos elementos primordiais para o estabelecimento do controle efetivo das ações das formas de repressão. Estas maneiras de agir dos órgãos repressores são situadas por Carlos Fico de acordo com o conceito político de subversão:

A subversão atende a uma meticulosa diretiva, manifestando-se em torno das instituições políticas, sociais e econômicas, procurando miná-las da base à cúpula, visando adequar o terreno para que possam disseminar mais facilmente seus propósitos. [...] Tem se observado um movimento crescente que vem se formando em torno do tema „censura‟. [...] A sua revogação daria trânsito livre para as mensagens que pregam a desmoralização das instituições e a contestação à ordem estabelecida, criando o clima desejado para a grande investida pretendida pelas esquerdas (FICO, 2001, p. 79).

Da mesma forma, Silva (2007, p. 69) aponta que este dispositivo em Pernambuco necessitava da ideologia onde

Ter o controle da vida dos indivíduos, produzir, apreender, divulgar, fantasiar e manipular informações reais ou imaginárias passa a ser o principal objetivo da polícia política de Pernambuco, bem como de todos os órgãos de informação da rede, seja do Exército, Marinha, Aeronáutica ou Polícia Federal. As anotações, os registros constituem-se nos mais eficiente argumento de coerção e de controle sobre os indivíduos e de manutenção do instituído. E é através delas que o poder ancorado em saberes prévios produzidos ou apreendido pelos órgãos de informação e segurança, se exerce.

Uma vez que a subversão era uma ameaça crescente e constante na sociedade, as maneiras de agir dos instrumentos repressivos a exemplo do DOPS e do DOI-CODI justificavam uma direção no sentido de se estabelecer uma militarização da sociedade (BRIGAGÃO, 1985) para que cada um estivesse consciente de que a ordem e a segurança seriam mantidas pelo Estado Ditatorial independentemente dos dispositivos previstos na Carta Constitucional aprovada em 1967. O controle, o cerceamento, a vigília e a força eram formas de manter a autoridade e a presença forte e segura no sentido de evitar a perda de referência da ordem social.

No entanto, não somente os órgãos de informação e repressão retratavam a dinâmica do que seria o período designado como Anos de Chumbo. “As contestações dos anos sessenta, depois as retenções do crescimento econômico, revelou, sobretudo temores e medos e, pela mesma maneira, orientou novamente a atenção em direção aos lugares do poder” (BALANDIER, 1999, p. 101). Esta visão pode ser identificada em seus resultados nas palavras de Alves (2005), que com base em relatos de seu irmão, o então deputado cassado Márcio Moreira Alves, ressalta que o AI-5 fora preparado um ano antes de sua decretação (1967), com base em princípios da Agência Central de Inteligência (CIA) e dos projetos da Aliança para o Progresso das Américas praticado em finais da década de 1950, início dos anos 1960 pelo governo John F. Kennedy.

Segundo Fico (2008b) este projeto atendia aos interesses do então presidente norte- americano Lyndom Johnson para as Américas, sem que, contudo, os governos apoiados pelos norte-americanos agissem ancorados em atividades repressoras. O autor chama a atenção para o papel dos Estados Unidos enquanto baluartes da Democracia, mesmo que tenham concordado e patrocinado o Golpe de 1964. O apoio ao Governo Brasileiro durou até a aprovação do AI-5, pois os americanos haviam reagido ao documento suspendendo qualquer ajuda que pudesse colocá-los em concordância com tal ato (FICO, 2008b). As palavras do Secretário de Estado Norte-Americano, Dean Rusk, atestam este posicionamento contrário: “[...] o secretário de Estado sugeria um apelo algo descrente ao governo brasileiro para que abandonasse o AI-5, mas orientava a embaixada no sentido de que essa posição fosse levada com um estilo „calmo, amigável e franco, sem aparência de dramatismo, ameaça, tutela ou dirigismo‟ (FICO, 2008b, p. 204).

A posição contraditória, no entanto, pode ser observada no estudo de Huggins (1998, p. 9), quando esta cita que houve uma burocratização das polícias nos países ajudados pelos norte-americanos durante a Guerra Fria, especialmente durante as décadas de 1960 e 1970, onde um “programa bélico de controle social” foi instalado visando atender aos “interesses e objetivos políticos específicos de segurança nacional dos Estados Unidos” evitando, assim, o nascimento de novas Cubas na América do Sul. Estas duas visões, quando analisadas, podem nos revelar uma possível face da política dos Estados Unidos nas Américas – a de defensora de governos democráticos que seguissem sua ideologia voltada a duas demandas: de um lado, a necessidade marcada por uma negação da repressão em função das reações negativas causadas perante a Anistia Internacional (FICO, 2001) e o Congresso dos Estados Unidos – o que acabou ocorrendo em 1974, com o fim do apoio à militarização das polícias (HUGGINS,

1998, p. 6) – e, de outro lado, a decisão de apoiar negócios no país aproveitando o chamado milagre econômico, o que chegava a surpreender os próprios norte-americanos.

Seguindo neste caminho, enquanto instrumento legal de seus objetivos, o AI-5 era documento que dava plenos poderes aos militares sem que estes precisassem se preocupar com os direitos civis do povo brasileiro. Como ficaram conhecidos de vários estudos feitos sobre o referido documento, as perseguições, cassações de mandatos políticos, exílio e a oficialização da tortura se transformaram nos planos de ação desta legislação, que complementava as disposições contidas na Carta de 1967. Apesar de direcionado para grupos tidos pelos poderes de Estado como subversivos a respeito de Estudantes e militantes de Esquerda (notadamente do PCB e tantos outros grupos que surgiram à medida que o Regime aumentou seu campo de ação), o AI-5 atuou em todas as esferas civis. A maior prova disso é a perseguição a membros progressistas da Igreja Católica e até mesmo a censura voltada a sambas-enredo do Carnaval, principalmente do Carnaval Carioca. De acordo com Kirmeliene (2008), essa foi uma época onde “houve um momento em que as vozes se calaram perante a opressão e a repressão. Tais ações e reação também se manifestaram dentro do „planeta carnaval‟”.

O ano seguinte, 1969, mostra-se como crucial para as novas determinações do Governo Militar: era preciso enquadrar a sociedade como um todo nos preceitos contidos na Lei, para o bem e a segurança de toda a nação, assim como afirmava o discurso dos Manuais da ESG. Contudo, seria pretensioso demais afirmar, conforme o autor supracitado, que a partir de 1969 “todos os componentes do „planeta carnaval‟ pareciam seguir a cartilha ufanista do regime militar” Kirmeliene (2008). Havia dentro dos clubes e agremiações de carnaval membros que estavam apenas preocupados em realizar belos desfiles, não desrespeitando os limites dados, mas sublinarmente ousando através dos temas e fantasias expressar a liberdade até então adormecida, silenciada, negada em várias vertentes pela legislação, embora também houvesse grupos nos quais os temas escolhidos pelos carnavalescos exaltassem vultos da História do Brasil de outros tempos, o que causava o apreço do Governo Militar e uma inclinação à permissividade maior do programa organizacional destes grupos carnavalescos.

Nesta atmosfera, Valle (1970) nos mostra que, enquanto o país vivia o clima de incertezas em relação a como seria o amanhã após o AI-5, em fevereiro de 1969, enquanto a população preparava o espírito para o Carnaval, colocando a fantasia e o estandarte da diversão nas ruas, o Governo Marcial, através do Conselho de Segurança Nacional propunha e conseguira a criação da Comissão de Inquérito Policial Militar, dessa forma fortalecendo o

poder central contra as agitações que surgiram pedindo o seu fim. Era a consolidação do Ato n° 5, que ao final de 1968 selara a unidade militar em torno da política nacional.

Decerto, os carnavais pelo Brasil foram caracterizados de forma particular, entretanto há de se concordar também que existia determinada parceria na troca de contatos, mesmo neste período, para a organização das temáticas e dos sambas-enredos. Mesmo com tal liberdade, os militares mantinham olhos vigilantes nas festas, pois havia a suspeita de encontrar algum subversivo na brincadeira, uma vez que o Carnaval, por ser uma manifestação cultural estendida a diversos segmentos sociais (o que não abre perspectiva para uma leitura de plena Democracia voltada à festa por outras razões que serão discutidas mais à frente), poderia ser usado como artifício para possíveis planos contra o governo vigente.

Esse controle imposto às festividades seguia algumas direções que se assemelhavam àquela voltada para o cinema, a imprensa e a música. Aplicado através das Delegacias de Costumes e Diversões Públicas (DCDP), que passaram a agir com maior efetividade a partir de 1969, apresentando determinações em consonância com a Lei de Segurança Nacional e procurando promover a manutenção da ordem e dos bons costumes, havia uma maior preocupação com o comportamento e as expressões individuais em ambientes públicos. No caso Pernambucano, onde o Carnaval possui ao longo de anos uma expressividade destacada, a preocupação dos órgãos responsáveis pelo policiamento das festividades estava centrada em um objetivo: coibir os excessos. Durante os Anos de Chumbo, as matérias que seguem na imprensa pernambucana mostram que os órgãos competentes como as Delegacias de Plantão, os comissários de Polícia, o Secretário de Segurança Pública, entre outros envolvidos na organização interna ressaltavam a importância da conscientização dos foliões em brincar preservando a ordem, sem cometer os tais excessos, embora essa tecedura não se limitasse apenas a estes aspectos.

Seguindo o curso do tempo, a década de 1970 trouxe a chegada do Presidente Emílio

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