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CAPÍTULO II A PRÁTICA REPRESENTA A LETRA

2.4 Entre o público e o privado

O Gabinete de Leitura de Jundiaí nasceu na esfera privada, através de iniciativas particulares, porém, o poder público, especificamente a Câmara Municipal da cidade, sempre destinou verbas para a manutenção da Instituição. Havia uma relação muito próxima entre os membros do Gabinete de Leitura e os políticos de Jundiaí. As trajetórias de vida de alguns sócios, anteriormente descritas, e suas relações com a política demonstram essa proximidade. Contudo, as subvenções dadas ao Gabinete de Leitura, estipuladas nos orçamentos anuais da cidade e o próprio interesse da Câmara Municipal em manter uma instituição desse gênero antecedem o ano de 1908.

Em 1882, através da figura de José Feliciano de Oliveira (1868–1962), foi proposta e aceita, em sessão na Câmara Municipal de Jundiaí, a criação de um Gabinete de Leitura para a cidade. Com seus 14 anos de idade, José Feliciano, ganhava o apoio de 40 sócios contribuintes e um acervo de livros, doado pela Câmara, mais uma subvenção anual, para iniciar o acervo bibliográfico da instituição191. O apoio principal para a fundação partiu de membros da família Queiroz Telles, de importante influência política, proporcionando inúmeras iniciativas de âmbito cultural e intelectual na cidade e o promissor espaço destinado às letras não passou despercebido.

Entretanto, a iniciativa não teve longa duração. Mesmo com esforços, José Feliciano não conseguiu manter a instituição por muito tempo. Os registros de surgimento,

190TOMANIK, Geraldo B. Op. cit., p. 168

191 CASARI, Regina Heloísa Romano. É festa, Rui Barbosa faz 80 anos. Jundiaí, Gabinete de Leitura Rui

desenvolvimento e declínio desse Gabinete de Leitura são muito poucos, há apenas o Livro de Ata da Câmara Municipal de Jundiaí192, contendo a proposta de fundação (1882), votação e aprovação, e uma correspondência entre José Feliciano e Conrado Offa (em 1930), em que o primeiro felicitava o segundo, então fundador de um novo centro literário, e ainda “desejava que desseis informações sobre o Gabinete de Leitura. Sua fundação progresso e condição de estabilidade. Minha antiga experiência na matéria faz-me admirar que essa utilíssima instituição já dure 22 anos”193

.

São instituições distintas, o Gabinete de Leitura fundado por José Feliciano, que chegou ao posto de professor da Escola Normal de São Paulo e a ser membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro em 1903 e o Gabinete de Leitura, fundado pelos funcionários da contadoria da Companhia Paulista. Porém ambos foram beneficiários das subvenções dadas pela Câmara Municipal.

Em Jundiaí, no início dos anos 1900, não havia instituições de leitura (bibliotecas, grêmios e associações literárias) na esfera pública ou até mesmo privada. As escolas, em sua maioria, eram particulares e a circulação de uma cultura letrada certamente era circunscrita. As questões de instrução e de escolarização da população competiam ao poder público. Todavia, na ingerência de tais aspectos, iniciativas particulares, que visassem a romper com as mazelas de uma sociedade iletrada, notadamente seriam favorecidas no âmbito político.

Segundo Felipe Matos, “uma das consequências diretas do desenvolvimento da cultura letrada sobre uma sociedade está relacionada com o consumo de produtos impressos e as mudanças de hábitos”194. Nessa acepção, o Gabinete de Leitura tornava público o consumo de

impressos e possibilitava a emergência de novas práticas culturais. A escola de primeiras letras reafirmava ainda mais as tentativas de tornar a cultura letrada acessível às camadas sociais de Jundiaí.

As subvenções cedidas ao Gabinete de Leitura, pela Câmara Municipal a partir de 1909 tiveram a intermediação de Eloy Chaves.

192 Livro de Atas da Câmara de Jundiaí, Março de 1879 a Março de 1883. Ata da 3° sessão de 29.12.1882, p. 83.

“Um ofício datado de 2 do corrente mes assinado por Joaquim Teixeira Carvalhosa e José Feliciano de Oliveira comunicando que tendo lhes em vista organizar um Gabinete de Leitura nesta cidade, cujo progresso depende desta Câmara, solicitarão as obras existentes no Arquivo para fazerem parte do mesmo Gabinete. Posto em discussão, foi deferido responsabilizando-se os signatários do referido ofício pelas obras que recebessem da Câmara. Em ata posterior, Ata da 4° sessão, de 15.02.1883, p. 92: “A comissão depois de ter tomado em consideração o ofício do Tenente Coronel Antonio Leme da Fonseca Presidente do Gabinete de Leitura desta cidade, é de parecer que se lhe entregasse os livros existentes nesta Câmara de que trata no mesmo ofício, responsabilizando-se porém pelas obras que receber. Posto em discussão foi aprovado.

193 FELICIANO apud CASARI, Regina Heloísa Romano. Op. cit., p. 1-2.

194 MATOS, Felipe. Antigos tipos, novos leitores: a circulação de cultura letrada e emergência da comunidade

de leitores na ilha de Santa Catarina (Florianópolis, século XIX). In: BRAGANÇA, Aníbal; ABREU, Márcia (Orgs.). Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros. São Paulo: Editora UNESP, 2010, p. 471.

O político nasceu na cidade de Pindamonhangaba. Filho de um diplomata formou-se advogado pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco. Foi um dos precursores da eletricidade no Estado de São Paulo, destacando-se não só como empresário, mas também como político. Recém formado, transferiu-se para Jundiaí em 1897 assumindo o cargo de promotor. Em 1898 se casou com Almerinda Mendes Pereira, filha de um influente major da cidade, o que o auxiliou no começo da carreira. Por volta dos vinte e poucos anos de idade renunciou ao cargo de promotor e se enveredou para a política, elegendo-se vereador. Foi presidente da Câmara Municipal de Jundiaí e depois deputado federal pela legenda do Partido Republicano Paulista (PRP)195.

Fez parte de importantes comissões, inclusive a incumbida de reorganizar o quadro do funcionalismo público federal. Em sua carreira de legislador instituiu a chamada “Lei Eloy Chaves”, de 24 de janeiro de 1923, quando criou a primeira Caixa de Aposentadoria e Pensão dos Ferroviários, a base da política previdenciária nacional, da qual resultaria o atual INSS. No executivo estadual, geriu a pasta da Justiça e Segurança Pública do Estado nos governos de Rodrigues Alves (1912–1916) e Altino Arantes (1916–1920)196.

Através de seu poder político, Eloy Chaves determinava, no orçamento anual da municipalidade, uma subvenção mensal no valor de 20$000 (vinte mil réis) ao Gabinete de Leitura de Jundiaí, totalizando uma contribuição de 240$000 (duzentos e quarenta mil réis) por ano. Dentro do período de análise desta pesquisa, as subvenções não cessaram entre 1909 e 1924. Nas atas de reuniões das Assembleias Gerais, ao término de cada ano e no início da administração de uma nova Diretoria, registravam-se os votos de agradecimento à Câmara Municipal pela subvenção doada e em especial à figura de Eloy Chaves.

Além dos valores financeiros, houve também a isenção na taxa de luz, inicialmente para a Escola de Primeiras Letras, em 1910 e posteriormente para toda a sede do Gabinete de Leitura em 1911197.

Pereira de Carvalho Queiroz é outro nome do cenário político jundiaiense frequentemente citado nas atas de reuniões (não foi possível localizar seu cargo público). Contribuía para que o Gabinete de Leitura com uma verba no valor de 1:200$000 (um conto e

195 Informações extraídas do site da Fundação Energia e Saneamento de Jundiaí. Disponível em:

<http://www.museudaenergia.org.br/media/26352/a_relevanciaeloychaves_setor_energetico_paulista.pdf>. Acesso em: 06 jul. 2015.

196 Idem.

duzentos mil réis) no orçamento anual do Estado de São Paulo, para o exercício dos anos de 1910 e 1911198.

Eloy Chaves e Pereira de Carvalho Queiroz fizeram ainda doações para a biblioteca do Gabinete de Leitura, a quantidade de livros não é descrita, porém, segundo os registros em atas, elas ocorreram nos anos de 1910, 1911, 1913 e 1915. E, as relações entre o poder público e as ações privadas dos membros do Gabinete de Leitura não pararam por aí, como se pode perceber na escrita das próprias atas.

A estrutura das atas das assembleias do Gabinete de Leitura, cada vez mais, assemelhava-se à estrutura das atas da Câmara Municipal. Em 1911, já aparecia o termo expediente. Em 1918, o título ordem do dia. Depois de 1920 as atas passam a iniciar-se com o expediente, (geralmente o exame das correspondências recebidas), terminando com a ordem do dia, (discussão dos assuntos em pauta) mesclando as formas de se registrar as questões particulares com o modelo público das atas da Câmara Municipal199.

Demonstrando ainda mais o interesse em auxiliar na manutenção do Gabinete de Leitura e caracterizando a forte relação existente entre os políticos da cidade (prefeito e vereadores) e os sócios do Gabinete de Leitura, no dia 4 de agosto de 1921, Benedito de Paula, segundo secretário, registrava em ata uma proposta recebida da Câmara Municipal:

A câmara municipal mandou construir um prédio no valor de 30: 000$000 (trinta conto de réis), para sede deste Gabinete de Leitura, cujas condições impostas pela Câmara são: O Gabinete de Leitura introdusirá em seus Estatutos, um artigo que declare pertencer a Câmara Municipal, prédio, bibliotheca, moveis e todos os bens a elle pertencente, em caso de dissolução da sociedade. Assumirá também o compromisso de pagar a importância de 15:000$000 (quinze conto de reis) no prazo de dez annos200.

A diretoria do Gabinete de Leitura, presidida por Waldomiro Costa, no respectivo ano, “congratulou-se com a sociedade” pelo benefício recebido da Câmara Municipal, solicitando que fosse marcada uma reunião de Assembleia Geral para providenciar a elaboração do novo artigo que atendesse às exigências propostas pela Câmara. Francisco Paes Leme de Monlevade, diretor da Companhia Paulista, participante da reunião prometia ainda “mandar construir as estantes necessárias para a bibliotheca da nova sede”201.

O Gabinete de Leitura de Jundiaí sempre teve suas instalações alugadas. A primeira sede em 1908 – anteriormente citada –ficava na Rua do Rosário número 153. Em 1909, por

198 Livro de Registro das Atas de Reuniões da Diretoria, 19.06.1911, p. 25. 199 Livro de Atas da Câmara de Jundiaí, abril de 1914 a junho de 1916. 200 Livro de Registro das Atas de Reuniões da Diretoria, 04.08.1922, p. 27. 201 Idem.

questões financeiras (possivelmente em decorrência dos custos com o aluguel), transferiu-se para um prédio na Rua Barão de Jundiaí número 69, onde permaneceu até 1913, quando retornou para a Rua do Rosário, porém em outro prédio, no número 61.

O terreno cedido pela Câmara Municipal para a construção de uma sede própria para o Gabinete de Leitura ficava de esquina entre a Rua do Rosário e a Rua Cândido Rodrigues.

A aprovação das condições impostas pela Câmara Municipal fora unânime, durante a Assembleia Geral realizada no dia 21 do mesmo mês. No dia 7 de setembro de 1922, ocorreu a instalação de uma pedra fundamental no terreno onde seria construída a nova sede. Nesse dia registrava-se em ata:

Ás quatorze horas, com a presença de todos os senhores vereadores, diretores do Gabinete, sócios e demais pessoas gradas, aproveitando-se assim essa grande data, que é o primeiro centenário da independência de nossa Patria, para realizar-se essa grata e generosa dádiva com que a Câmara, por intermedio de seus dignos vereadores, vae fazer ao Gabinete este ato, parte integrante do programa, traçado pela digna comissão dos festejos do centenário, Resolveu então a diretoria, que preliminarmente, ficasse constando em acta o seu mais profundo e sincero agradecimento a Câmara e seus vereadores, pelo seu gosto nobre e patriótico, vindo com esse auxilio satisfazer o maior e mais ardente desejo dos sócios e diretores do Gabinete, qual de ver a sede social instalada em um prédio próprio202.

Ainda na mesma data e ata, registrava-se que o “reverendo vigário da Parochia, o cônego Higino de Campos”, fora chamado para benzer a pedra fundamental do novo edifício. Entretanto, os membros Thomaz Silveira e Orlando Belizze, não aprovaram tão medida e solicitaram que sua posição contrária “ficasse constando em ata, pois não acharam necessidade em ser feito esse benzimento”203. De um modo ou de outro, a sociedade estava

em “festejos”, e, com a ajuda da Câmara Municipal, o Gabinete de Leitura passaria a ter sua sede própria. O dinheiro gasto com o aluguel poderia ser revertido em atender outras finalidades, a condição financeira se estabilizaria cada vez mais e o espaço seria adequado aos fins da sociedade.

Entretanto, a sede precisava ser construída e, para tal, levou-se um pouco mais de um ano. Nesse ínterim, várias ações foram tomadas, visando a angariar fundos para a compra do mobiliário necessário às novas instalações. Nessas ações, verifica-se como a relação público/privado interligava-se por meio das práticas sociais.

A diretoria do Gabinete de Leitura tinha como prática formar comissões responsáveis por angariar, junto aos moradores da cidade, o que fosse necessário à manutenção da instituição. Se ela possibilitava a leitura e a instrução para a população jundiaiense, em contra

202 Livro de Registro das Atas de Reuniões da Diretoria, 07.09.1922, p. 31. 203 Idem.

partida, a população poderia retribuir com donativos (materiais e financeiros) contribuindo para o pagamento das despesas.

Após a notícia da doação do terreno e da verba destinada à construção da sede do Gabinete de Leitura, várias comissões foram formadas, visando a desenvolver diferentes atividades para recolher donativos, dentre elas uma quermesse na paróquia Nossa Senhora do Desterro; sessões de cinema e espetáculos de teatro no Polytheama, com a lotação vendida e destina aos cofres do Gabinete de Leitura; um jogo de futebol entre o Paulista Foot Ball Club e o Paulistano de São Paulo, também destinado a reforçar as despesas com a compra de livros, mobiliários e a manutenção de serviços do novo prédio; palestras com personalidades como Cornélio Pires (1884-1958), jornalista, escritor e folclorista, que esteve em Jundiaí, algumas vezes, para dividir a arrecadação de seu espetáculo com o Gabinete de Leitura. Houve ainda a criação de campeonatos de jogos (dama, xadrez, dominó e gamão) com inscrições pagas, angariando mais recursos.

Essas atividades ocorreram no decorrer do primeiro semestre do ano de 1923, enquanto a construção da nova sede estava em andamento, contando com a participação de políticos e civis de Jundiaí.

No dia 13 de agosto de 1923, o presidente do Gabinete de Leitura, Waldomiro da Costa solicitava em uma reunião da diretoria:

Deveria-se tratar agora da sua inauguração, organizando-se para isso um programa mais ou menos grandioso, pois esse fato é digno de ser cuidadosamente festejado, celebrando, mas que o dia oportuno para essa inauguração deverá ser no próximo mez de setembro, por ser o dia sete, feriado nacional coincidindo essa data com o aniversário da colocação da pedra fundamental204.

Novamente o aniversário da independência brasileira fora escolhido como data honorifica para também representar a inauguração da nova sede do Gabinete de Leitura de Jundiaí. Se a memória de um país liberto e independente era escolhida como marco cronológico, somava-se a ela a ideia de surgimento da nação brasileira, representada pelas práticas de seus concidadãos, de criarem espaços para os livros, a leitura e a formação de leitores.

O evento grandioso aconteceu. Moradores da cidade de Jundiaí compareceram à inauguração. Crianças, jovens e adultos estavam presentes conjuntamente com os diretores e sócios do Gabinete de Leitura. A nova sede simbolizava não apenas um novo espaço próprio e apropriado às finalidades pretendidas. Expressava ainda a relevância da Instituição, ante o poder público e a sociedade jundiaiense. O espaço para o “aprimoramento” dos cidadãos

fixava-se na territorialidade da cidade, erigido como símbolo do progresso, para ordenar a sociedade através da educação.

Figura 24 - Inauguração da nova sede do Gabinete de Leitura de Jundiaí. Data 07 de setembro de 1923. Fonte: FERREIRA M., 2014.

A leitura das atas demonstra que, a partir da década de 1920, os alicerces do Gabinete de Leitura estavam assentados. Entre 1920 e 1924, percebe-se que as questões em pauta nas reuniões de diretoria são de ordem administrava e não mais financeira. Inclusive em diferentes atas desse período, registrava-se a crescente solicitação de pessoas desejando se associar, passando a diretoria a analisar e a deliberar sobre a aprovação ou não da entrada de novos sócios contribuintes na Instituição. Certamente os auxílios concedidos pela Câmara Municipal, por intermédio dos vereadores e do prefeito da cidade, Olavo Guimarães, corroboraram esse cenário solidificador.

É significativa a forma como a esfera política, portanto pública, interferiu nas questões de administração e de manutenção da materialidade do Gabinete de Leitura. Possivelmente, sem os subsídios da Câmara Municipal, a Instituição teria passado por crises financeiras mais agudas e até mesmo poderia ter fechado suas portas. Contudo, cabe ressaltar um importante elemento, que serve como reflexão para se pensar essa intervenção sobre a esfera privada do

Gabinete de Leitura. Conforme citado anteriormente, alguns membros do Gabinete de Leitura eram maçons (Conrado Offa e João da Costa). Desde o Império e durante a Primeira República, muitos personagens políticos importantes participaram dessa associação. O movimento republicano, iniciado em 1870, esteve sob forte influência dos ideais maçônicos205 intensificando os laços sociais e políticos entre os membros da elite econômica brasileira. Em São Paulo, essa relação se deu fortemente através da formação do PRP e da criação de lojas maçônicas. A principal fora a loja América, criada em 1868, foco propagador do ideário republicano em toda a Província206. Segundo Lauê Ribeiro, a loja América utilizava-se da organização maçônica para articulações políticas, dedicando-se em disseminar o projeto político republicano, contribuindo para a abertura de novas lojas maçônicas no oeste Paulista, dentre elas, a loja Amor e Concórdia de Jundiaí (1893), “iniciando novos membros, fundado escolas e bibliotecas populares, sendo pioneira neste tipo de projeto e incentivando outras lojas a fazerem o mesmo”207.

Dentre as iniciativas maçônicas pode-se destacar a defesa e a expansão da escolarização popular, a formação de cidadãos próximos dos ideais liberais, a laicização do Estado e a prática da igualdade e aprendizagem, tendo como estratégia de sua implementação a formação de uma rede de sociabilidade e cultura política208. Em Jundiaí não foi possível mapear as formas de constituição e o modo de socialização da maçonaria e seus membros. Contudo, alguns indícios podem ser percebidos na vida política e cultural da cidade.

Na política, a bibliografia consultada aponta que o vereador Eloy Chaves iniciara-se na loja América de São Paulo por volta de 1899. O prefeito de Jundiaí, Olavo Guimarães, era também iniciado da mesma loja209. Através da política ambos auxiliaram significativamente o Gabinete de Leitura. De acordo com Souza:

A maçonaria configura-se como um modo de sociabilidade próprio baseado na filantropia, na rede de solidariedade entre os pares, nos juramentos e rituais que

205 “A Maçonaria considera a si mesma como uma instituição universal e composta de um corpo de doutrinas

acabadas, que permaneceram imutáveis através dos tempos. Entretanto, foi justamente a realidade idiossincrática, assumida pela ordem nas diversas partes do mundo, que dificultou, por vezes, a tarefa de demarcar o campo conceitual maçônico. Não obstante tal dificuldade é possível buscar no texto primeiro da maçonaria, ou seja, na Constituição de Anderson, e em vários outros escritos, ideais recorrentes que apontam os preceitos fundamentais da instituição. Os componentes desses ideais são o progresso, a razão, a liberdade, a igualdade, a moral e a fraternidade”. SOUZA, Françoise Jean de Oliveira. Organização, preceitos e elementos

da cultura maçônica: fundamentos para a introdução aos estudos da maçonaria. In: SILVA, Michel (Org.).

Maçonaria no Brasil: história, política e sociabilidade. Jundiaí, Paco Editorial, 2015, p. 19.

206 RIBEIRO, Lauê Carregari Carneiro. A maçonaria e a formação do Partido Republicano Paulista. In:

SILVA, Michel (Org.). Op. cit.

207 Ibidem, p. 114.

208 CANDIÁ, Milena Aparecida Almeida. A instrução do povo pelo povo: a maçonaria e o movimento associativista pela expansão da educação popular no Brasil (1870-1889). In: SILVA, Michel (Org.). Op. cit. 209 RIBEIRO, Lauê Carregari Carneiro. Op. cit.

criam laços de pertencimento, percebe-se, na maçonaria, a existência de mecanismos próprios de dominação, constituindo-se em um dos espaços, fora do domínio direto do Estado, por onde o poder circulava e os homens faziam política210.

É certo que, entre os mecanismos da sociabilidade maçônica, personalidades políticas e civis de Jundiaí, dentro de um ideal maçônico comum, partilharam e incentivaram projetos característicos e constituintes de seus laços socioculturais e políticos. A existência da loja, Amor e Concórdia, na região, corrobora a necessidade de se pensar sobre essa questão. Outro aspecto, e já adentrando no âmbito cultural, seria a própria criação do Gabinete de Leitura. Possivelmente, outros membros além de Conrado Offa e João da Costa, eram maçons. A idealização da instituição e suas finalidades, de manter uma biblioteca e promover a instrução de forma gratuita, estavam entre as determinações do ideário maçônico211. O anúncio nos

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