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9 a Quinta da princesa é um bairro

4.18. Entrevista U2 — axana

Perfil sumário

Axana tem 36 anos e é natural de Ternopil. É casada e vive na Charneca com o marido e

com os dois filhos de 16 e 22 anos. É proprietária de uma loja de produtos alimentares em Almada, ganhando em média 500 euros mensais, por vezes um pouco mais. Na Ucrânia estudou até ao 10.º ano e depois tirou um curso de costureira com a duração de dois anos. É católica. Não se interessa por política, em Portugal, e na Ucrânia também não tinha interesse por política.

a história de axana

Antes de imigrar para Portugal, Axana nunca tinha imigrado para outro país. O marido escolheu Portugal como destino imigratório em detrimento de outros países porque, devido ao Euro, havia muito trabalho em Portugal. A motivação foi, pois, de ordem económica. Axana emigrou para se juntar ao marido.

Axana chegou a Portugal, num autocarro, com mais vinte, trinta pessoas, acompanhada pelos filhos no dia 12/13 de Agosto de 2001, com um visto de turismo de três meses, estando em Portugal no momento da entrevista há aproximadamente sete anos. Na decisão não contaram com o apoio de ninguém. A mãe não queria ficar sozinha (o irmão de Axana estava a trabalhar na Grécia), os amigos não queriam e os filhos eram ainda pequenos para apoiar qualquer decisão.

Vive numa casa arrendada, na Charneca. A primeira casa em Portugal, em que moraram um mês, situava -se na Trafaria e era partilhada com outras pessoas. Encontraram, depois, uma casa para a família, no Pinheirinho, na qual viveram um ano e meio. A casa tinha más condições e a renda era elevada. Em seguida, arrendaram um sótão e as duas casas seguintes eram já melhores.

A rede de apoio foi constituida por pessoas portuguesas que ajudaram o casal.

Axana arranjou trabalho no espaço de um mês, mas, na realidade demorou um mês porque não procurou logo de início, reservando algum tempo para se adaptar ao país. Trabalhou nas limpezas durante quatro anos, trabalho duro e cansativo e que tinha dificuldade em realizar atendendo à sua alergia aos detergentes. Decidiu, então, abrir uma loja de produtos alimentares da antiga URSS na cave de um Centro Comercial em Almada. O trabalho é duro, Axana lamenta que o espaço se situe numa cave “sem vistas” e o horário de trabalho é longo. Axana trabalha todos os dias (incluindo aos sábados) das 10 horas da manhã às 20 horas e, aos domingos, entra às 15.30 horas e sai às 19 horas.

Por vezes sente um pouco de preconceito. Em relação à situação profissional anterior Axana ganha mais, mas as suas respostas indicam que, de facto, se sente insatisfeita.

Neste momento os filhos já não são crianças mas quando eram mais pequenos ficavam no ATL da escola.

Com o dinheiro que ganha conseguia ajudar a mãe e os sogros (aparentemente no presente não ajuda, por razões que não ficam claras na entrevista), ajuda que rondava os cem, cento e cinquenta euros mensais.

A imigração não teve consequências a nível da divisão de papéis em casa. Na Ucrânia, apesar de Axana trabalhar mais em casa, o casal dividia as tarefas, divisão essa que continua a verificar -se.

Sente -se integrada. Relaciona a questão com os filhos falarem português, com a sensação de estar em casa, quando chega a Portugal depois de ter estado na Ucrânia e com o facto de, concomitantemente, se sentir mais afastada da Ucrânia.

Na culinária doméstica, Axana integra pratos ucranianos e portugueses. Assiste a canais ucranianos, a cinema ucraniano e lê jornais ucranianos feitos em Portugal.

Não integra grupos que só incluam ucranianos, não tem amigos portugueses: “Não. Só pessoas conhecidas”.

Gostaria de comprar casa, de estar próxima da família e dos amigos, de ter o seu próprio ateliê de costura.

Em termos de viagens à Ucrânia, foi em 2005, para ver a mãe e pretendia ir em 2008. Comunica com a família por telefone. Não tem internet em casa. Antes escrevia cartas, mas agora só o faz no Natal.

Em termos de actividades de tempos livres, gosta de descansar com a família, de ir à praia, de conhecer o país (ainda só conhece Évora mas os filhos visitaram vários lugares de Portugal, através das excursões da escola).

A relação com os portugueses é boa, e, quando solicitada a comparar os dois povos, Axana evoca questões relativas à organização curricular (horas excessivas na escola e má orga- nização curricular). Pensa que as ideias dos dois povos são iguais mas aponta como uma diferença o facto de haver um maior número de ucranianos a cultivarem as suas terras. Por outro lado, não sabe como os ucranianos vêem os portugueses. Não sentiu preconceito no lugar de trabalho, mas refere que o marido muitas vezes não foi pago pelos patrões e que outros ucranianos sentem preconceito.

Em termos de dificuldades sentidas, Axana refere o facto de o filho ter perdido um ano escolar ao chegar, por causa da língua, e da falta do verde da Ucrânia.

Axana está satisfeita com o seu projecto imigratório e, se fosse hoje, voltaria a tomar a mesma decisão: “Sim, aqui já está como minha casa”. Tem saudades da sua terra Natal e a Ucrânia é central para a sua identidade (apesar de não concordar com a política ucraniana). Dá como exemplo o festival da canção, que tinha tido lugar na véspera da entrevista e em que a Ucrânia tinha conquistado o segundo lugar, o que a tinha deixado feliz. Os símbolos são importantes. Antes, recordar o país ajudava mais a superar as dificuldades do que no presente. Axana ainda não sabe se regressará à Ucrânia ou se continuará a viver em Portugal. Pondera vários factores, que favoreceriam uma ou outra decisão: Tem uma casa na Ucrânia que está arrendada; em Portugal não tem casa; na Ucrânia é mais fácil fazer amigos porque os jovens passam mais tempo na rua, a escola na Ucrânia é mais difícil, o filho mais novo não sabe escrever ucraniano. Os filhos dizem: “Quando vamos, vamos” o que significa: “A seu tempo se verá, não vale a pena pensar muito nisso”. Quando vieram para Portugal tencionavam ficar um ano e meio, dois anos, mas neste momento não existe uma data de regresso definido (nem mesmo um projecto de regresso definido).

O dinheiro ganho vai sendo amealhado com o objectivo de comprar uma casa. Axana coloca a hipótese de vir a imigrar para Espanha, país em que trabalha o seu primo, que ganha bem e que conseguiu comprar casa e carro. Considera Portugal como espaço de oportunidade para os filhos, atendendo que na Ucrânia, como a maioria das pessoas tem um curso superior, se torna mais difícil arranjar trabalho.

Axana sente que se transformou enquanto pessoa, em resultado da imigração, e considera- -se menos ambiciosa e mais calma que os ucranianos. Sente -se ucraniana e um pouco portuguesa. Se ficar a viver em Portugal, tenciona adquirir a nacionalidade portuguesa, mas se regressar à Ucrânia terá problemas se, entretanto, adquirir a nacionalidade portuguesa.

afirmações mais significativas

[…] Mais anos passa, quando eu passa férias na Ucrânia estou com mesmas pessoas, mas para mim já menos perto e quando volta para Portugal: “Ah [suspira], tá bom, já na casa”. Mais calmo aqui, já está habituada aqui. Quando foi de férias Ucrânia estava muito stressada, pessoas preocupadas com outros problemas. Claro, mãe,…mas já tem distância.

[…] Na minha terra estudo é mais importante. Quando meu filho estudou na Ucrânia, volta da escola e mais cinco horas a trabalhar. Todo o dia na escola para criança, muito, volta cansado, não consegue fazer trabalho de casa, por isso eu compreendo ele. Lá estuda até duas e dez, estuda em casa, mais descanso e melhor. Aqui tem de manhã ginástica, depois às seis da tarde matemática. Por isso criança estuda pior, porque está muito cansada

[…] Ideias iguais. Nós temos mais fazenda para trabalhar na terra, mesmo na cidade, batata, cebola, cenoura, sem químicos. Toda a família cultivam, aqui tem duas vezes por anos batatas, nós só tem um porque tem Inverno, mas quase todos trabalham na terra nos tempos livres, mais os mais velhos do que os mais novos.

[…] Como mãe muito precupada com filho. Mais velho acabou três classes na Ucrânia e dois vezes na terceira classe [repetiu ano] por causa da língua.

[…] Filhos quando chegaram aqui perguntaram: “Por que nós vimos aqui?”. Agora já é habituados, já têm amigos, casa melhor.