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1 A OBRA, O AUTOR, O JORNALISMO

1.2 Erico Verissimo e os jornais

A biografia de Erico Verissimo acompanha paralelamente alguns dos principais momentos das transformações da imprensa brasileira. Nascido em 1905, Erico Verissimo foi educado num ambiente cercado de livros e jornais. Seu pai e seu avô eram leitores obstinados e Erico aprendeu desde cedo a folhear as páginas dos jornais, principalmente o Correio do Povo e o Diário de Notícias, que formavam a vanguarda do jornalismo no Rio Grande do Sul à época.

Essas publicações de fato mexiam com o imaginário do menino, que por volta dos 10 anos de idade já andava às voltas com seu próprio periódico, mais precisamente uma revista, “A Caricatura”, que consistia em pequenos desenhos e notas escritos em duas folhas de papel almaço. Conforme ele conta em suas memórias, o tema destas “edições” girava em

contexto político brasileiro pós-golpe de 1964 fez com que escritores buscassem na informação um “curativo romanesco” para as divisões na sociedade brasileira. Esse caminho alternativo teria originado uma literatura marcada por um forte neorealismo, em que ficção e jornalismo tornam-se termos inseparáveis. “A representação do jornalista como herói ou narrador privilegiado no romance brasileiro dos anos Setenta funciona, nesse sentido, como compensação simbólica, tanto para os leitores, sem acesso à livre informação, quanto para os próprios autores-repórteres, amordaçados pela censura.” (p. 177) Ver também: GONÇALVES, Marcos Augusto; HOLLANDA, Heloísa Buarque de. Política e literatura: a ficção da realidade brasileira. In: ARMANDO, Freitas Filho (Org.). Anos 70: literatura. Rio de Janeiro: Europa, 1979. p. 7-81.

torno da Primeira Guerra Mundial, contendo caricaturas do “odiado Kaiser” e retratos a bico de pena de “generais franceses como Joffre, Pétain, Weigand, Foch” (VERISSIMO, 1995a, p. 100-1, OEV). Em “A Caricatura” o conflito era tratado com “espírito maniqueista. O Bem contra o Mal. O Direito contra a Tirania. Bandidos contra Mocinhos, como nas fitas de cinema. Até Castro Alves colaborou no meu periódico” (VERISSIMO, 1995a, p. 101, OEV).

Para elaborar essa revista, Erico Verissimo baseava-se no perfil editorial dos jornais e nas publicações de propaganda que o governo inglês distribuía na América do Sul, em versões em espanhol. Afirma o escritor lembrar-se até “do cheiro de tinta de impressão desses panfletos”, e que jamais esqueceu “um poema contra o Kaiser Guilherme II em que, entre outros insultos, se dizia que ele era “sanguinario cual elefante” (VERISSIMO, 1995a, p. 102, OEV). Ainda nas palavras do escritor (1995a, p. 102, OEV), “A Caricatura” morreu antes do fim da guerra porque esta passou a tornar-se uma rotina,

já que ela nos chegava transformada em escrita, através da imprensa. Nós lhe víamos apenas a parte heróica, esquecidos ou ignorantes dos sofrimentos e da destruição de vidas humanas e de cidades inteiras, sob os bombardeios. A guerra do papel era excitante e bela, principalmente a aérea.

Ainda houve motivos para um “número póstumo”, em que o redator pede que o Brasil declare guerra à Alemanha após os submarinos alemães torpedearem os navios brasileiros. Quando os Estados Unidos anunciam a entrada no conflito, o jovem redator noticia a novidade em uma nova publicação, batizada de “Iris”. Outra experiência semelhante ocorre durante a adolescência, no ambiente do internato. Em 1922, em meio às festas comemorativas do primeiro centenário da Independência do Brasil, Erico Verissimo cria a revista “O Pindorama” para dedicar um número especial ao tema (1995a, p. 150, OEV).

A elaboração destas revistas artesanais é um exemplo pouco desprezível da importância dos jornais na formação intelectual de Erico Verissimo, muitos anos antes de começar a carreira de escritor. Membro de uma família que dispunha de boas condições financeiras, onde todos sabiam ler e a convivência com livros e jornais era algo comum, Erico Verissimo foi uma testemunha da evolução dos meios de comunicação no segundo decênio do século, período em que novas tecnologias – telégrafo, prensa rotativa e fotografia, entre outros – favorecem novas relações entre jornal e sociedade.

Os novos apelos da imprensa, centrados no estilo discursivo do repórter, profissional da imprensa que surge como um agente capaz de gerar “um novo mundo: um mundo que mescla realismo e romance”, nas palavras de Barbosa (2007, p. 50, IM), encontravam

ressonância num público leitor aberto aos relatos que ultrapassavam as fronteiras dos pequenos municípios. Não seria diferente com o futuro romancista. Por vezes, comentários e observações baseados no conteúdo da imprensa são absorvidos pelo menino e, mais tarde, aproveitados na construção de seus personagens e na ambiência de época das narrativas.

O escritor conta que nas rodas de chimarrão discutiam-se as operações de guerra e frequentemente um daqueles homens invocava episódios da Revolução de 1893, na qual havia tomado parte. No entanto, quando o assunto enveredava para a Primeira Guerra, havia no grupo um velho gaúcho que não mostrava interesse pelo conflito europeu. “Por quê? Um dia ele próprio me explicou: 'Menino, não hai guerra nenhuma. Tudo isso não passa duma invenção do Correio do Povo para aumentar sua venda avulsa'. Fiquei pensando, numa confusão de pensamentos e sentimentos” (VERISSIMO, 1975, p. 2, OEV).

Mas Erico Verissimo não tomava conhecimento do noticiário nacional e internacional apenas na leitura de jornais de Porto Alegre ou do interior do Estado. Alimentava também a curiosidade nos almanaques disponíveis na farmácia paterna e em títulos de revistas ilustradas como Eu sei tudo e a francesa L'Illustration, publicação de circulação semanal assinada pelo pai. Apaixonado pela França, considerada sua segunda pátria, Sebastião Verissimo baseava-se no noticiário desta revista para improvisar discursos a favor dos franceses durante a guerra. A L'Illustration serve de inspiração literária e cultural para o personagem Rodrigo Cambará em O tempo e o vento.

Sobre L'Illustration o escritor recorda as caricaturas, os anúncios de automóveis e de chocolate, as ruas e monumentos de Paris. O que mais atrai sua atenção na revista, porém, são as reportagens sobre a Indochina: “Lá estavam aqueles clichês de nativos, magros, descalços, com suas calças a meia canela, seus chapéus cônicos – figuras que sugeriam histórias de crimes, emboscadas, punhais e venenos sutis” (VERISSIMO, 1995a, p. 69, OEV). Muitas imagens e descrições de eventos publicadas nesta revista ficam registradas na memória do leitor e mais tarde são introduzidas em suas narrativas, como a edição dedicada à peça Chantecler, de Edmond Rostand, e as descrições da cidade vietnamita de Hué, cujas características são reproduzias em O Prisioneiro para ambientar a ação do romance.

Ainda tomando suas memórias como parâmetro inicial para observarmos a estreita proximidade entre Erico Verissimo e a imprensa e a influência desta na formação do intelectual, podemos atestar a importância do jornal como instrumento de datação cronológica do tempo histórico referencial, um recurso que acompanha o escritor na produção ficcional.

Quando recorda os momentos de crise na política estadual, geralmente associa os eventos ao que tomou conhecimento pela imprensa. Ao referir-se sobre a Revolução de 1923, Erico Verissimo (1975, p. 2, OEV) afirma:

Foi através do diz-que-diz-que municipal e pelas páginas do Correio do

Povo que 'fiz' a Revolução de 23. Em minha casa éramos todos assisistas.

Dessa vez o meu maniqueismo escolheu como bode-expiatório o dr. Borges de Medeiros. Eu não sabia ainda que essas histórias políticas não são tão simples e claras como parecem à primeira vista, principalmente quando olhadas com olhos apaixonados.

Até mesmo ao relatar o que aconteceu no mundo no dia de seu nascimento, o escritor orienta-se pelos eventos publicados na imprensa. “Nasci a 17 de dezembro de 1905, sob o signo de sagitário. Andavam no ar ecos da Guerra Russo-Japonesa, e os jornais comentavam ainda os horrores do massacre de São Petersburgo” (VERISSIMO, 1995a, p. 33, OEV). Outro exemplo de experiências próprias e lembranças da infância que o auxiliam na caracterização de seus personagens e na relação destes com os periódicos vem do seu avô, Aníbal Lopes da Silva.

Como relata Verissimo (1995a, p. 29, OEV):

Assinante dum jornal maragato de Bagé, era admirador fervoroso de seu diretor, cujos editoriais políticos costumava ler em voz alta e bem modulada. Um dia cheguei à casa do velho no momento em que ele vibrava de emoção, lendo um artigo que o citado jornalista escreve sobre Assis Brasil, às vésperas da Revolução de 1923. ‘Que cosa extraordinária!’ – exclamou. E, entregando-me o diário, pediu: ‘Leia alto esse editorial. Obedeci. Não tenho o talento da oralidade. Comecei a ler com voz neutra e sem a menor entonação: “Mas leia com cadência, menino!”. Fiz o que pude, o que não foi muito.

A maneira passional com que o avô relaciona-se com os noticiários da política serve de modelo para a criação do personagem Babalo, de O tempo e o vento. Na representação ficcional da Revolução de 1923, no episódio “Lenço encarnado”, Babalo tem uma reação idêntica a essa relatada por Verissimo em suas memórias. Esse comportamento do escritor confirma as palavras de Benjamin (1994, p. 201, TIB), quando nos diz que “o narrador retira da experiência o que ele conta: sua própria experiência ou a relatada pelos outros. E incorpora as coisas narradas à experiência dos seus ouvintes”.

A relação de Erico Verissimo com o jornalismo estreita-se ainda mais com sua mudança para Porto Alegre, em 1930. Após uma experiência frustrada como sócio principal da Farmácia Central, que pertencera ao pai, Erico Verissimo decide tentar a sorte na Capital. Nesta época ele já havia publicado alguns contos no jornal Correio do Povo e na Revista do

Globo e acaba sendo contratado como secretário da revista pelo escritor Mansueto Bernardi. Na redação da Revista do Globo, Erico Verissimo desempenha as funções de redator, tradutor, paginador, diretor e, como ele conta, “ocasionalmente escritor americano ou inglês, quando por injunções tipográficas não era compelido a ser também poeta oriental” (VERISSIMO, 1995a, p. 254, OEV).24 O trabalho na redação certamente propicia ao escritor o contato com muitos tipos de pessoas e permite treinar a habilidade de observação.

O escritor, porém, lamenta ter necessitado dedicar sua atenção a tarefas de natureza jornalística, pois o trabalho lhe consumia os dias na confecção da revista e as madrugadas na tradução de autores estrangeiros. Para a dedicação aos seus próprios livros restavam apenas as tardes de sábado. O escritor define a experiência:

[…] um tipo de trabalho fútil e não raro idiota, como o de ler e publicar sonetos miseráveis – porque o “poeta”, segundo o gerente da Livraria do Globo, era um bom freguês da Casa e não podia ser “desconsiderado” – ou então reproduzir fotografias de “galantes e inteligentes meninos”, filhos de assinantes da revista ou ainda instantâneos sob títulos como “Aspectos do Último Veraneio na Praia de Cidreira” ou “Ecos do Carnaval em Vacaria. (1995a, p. 254, OEV)

Erico Verissimo insere-se neste sentido no extenso grupo de escritores abrigados pela imprensa. Nessa estreita proximidade entre jornalismo e literatura, a imprensa torna-se uma segurança financeira para os intelectuais e garante a possibilidade de notoriedade com a divulgação de seus escritos. Ainda no início dos anos 60 do século XIX, Machado de Assis já passava pelas redações de revistas literárias e de outros gêneros, nas quais o jovem escritor publicava poemas, crônicas teatrais, traduções e um ou outro conto. Em 1861, Machado de Assis passou a integrar a equipe de redação do jornal Diário do Rio de Janeiro, primeiro como redator do noticiário e repórter do Senado e alguns meses mais tarde como cronista de assuntos do cotidiano, quando começa a exercitar a sua habilidade de prosador.

Por esse caminho segue a maioria dos literatos da segunda metade do século XIX, até chegarmos ao século XX. Pelo menos nessa fase, a relação entre literato e imprensa periódica não era encarada como um desvio de percurso ou algo prejudicial à literatura. Broca (2004, p. 285, TIB) destaca que na virada do século a industrialização da imprensa não prejudica a literatura e que a maioria dos jornais das capitais de províncias continuavam a acolher e a

24 Para tapar “os buracos” e garantir a circulação da revista dentro do prazo, Erico Verissimo escrevia às pressas

poemas, haicais, artigos e até contos e os publicava com pseudônimos. Hohlfeldt (2005, p. 176, SEV) conta que em certa ocasião o romancista escreveu um conto intitulado “Lama nas trincheiras” e o atribuiu a um suposto escritor norte-americano, Gilbert Sorrow, apresentado inclusive com biografia. Uma revista argentina “chupou” o conto da Revista do Globo e o atribuiu ao mesmo escritor inexistente.

pagar pela colaboração literária. Assim, nomes como Olavo Bilac, Medeiros e Albuquerque, Coelho Neto, João do Rio e Euclides da Cunha, por fazerem da imprensa um meio de vida, podiam ser chamados de jornalistas ou escritores, sem que isso implicasse em questionamentos morais ou de valor estético. No entanto, certo despeito quanto a essa relação já era sentido entre os próprios intelectuais.

João do Rio realizou uma pesquisa em 1905, reunida mais tarde em livro (1994, p. 76), na qual busca saber a opinião dos escritores brasileiros a respeito das relações entre literatura e jornalismo. Uma das perguntas da entrevista era a seguinte: “O jornalismo, especialmente no Brasil, é um fator bom ou mau para a arte literária?” Embora cada um tenha interpretado a questão a sua maneira, já que o entrevistador não define com precisão o sentido exato de jornalismo, as opiniões são divididas. Félix Pacheco, Silva Ramos, Frota Pessoa, Sousa Bandeira e Afrânio Peixoto fazem muitas restrições, mas ao final aprovam a literatura feita em jornal, a qual mesmo sendo produzida de maneira apressada lucra por outro lado com a difusão. Sílvio Romero, Olavo Bilac e Medeiros e Albuquerque são favoráveis sem nenhuma restrição. Já Luís Edmundo, Elísio de Carvalho, Pedro de Couto, Inglês de Sousa e Gustavo Santiago são inteiramente contrários por considerarem essa relação incompatível com a arte.

A opinião de Medeiros e Albuquerque reflete a situação vivida por Erico Verissimo:

É certo que a necessidade de ganhar a vida em misteres subalternos de imprensa (sobretudo o que se chama 'a cozinha' dos jornais; a fabricação rápida de notícias vulgares), misteres que tomam muito tempo, pode impedir que os homens de certo valor deixem obras de mérito. Mas isso lhes sucederia se adotassem qualquer outro emprego na administração, no comércio, na indústria... O mal não é do jornalismo: é do tempo que lhes toma um ofício qualquer, que não os deixa livres para a meditação e a produção. (RIO, 1994, p. 76, TIB)

Diferentemente de Machado e tantos outros escritores, o único proveito que Erico Verissimo tira do trabalho na redação é a garantia do salário no final do mês, já que suas obras são publicadas diretamente em livros e os escritos jornalísticos são camuflados. Segundo aponta Hohlfeldt (2005, p. 166, SEV), a produção de Erico Verissimo – incluindo o período de atividade jornalística – destinada a jornais e revistas em 45 anos de vida literária (ficção, crônicas e artigos) revela dois momentos distintos:

• Nos primeiros dez anos de sua existência como escritor, Erico Verissimo publica em jornais para ganhar algum dinheiro e, ao mesmo tempo, divulgar sua própria obra. É ele, pois, quem precisa e busca os periódicos.

• No restante de sua carreira, que cobre, portanto, pelo menos mais 35 anos, ele é procurado pela imprensa, devido a seu sucesso e a seu reconhecimento,

escrevendo artigos de colaboração variados que servem para aproximá-lo do leitor e ainda divulgar sua obra, mas sem terem maior significação para ele. Na verdade, a imprensa é que se vale dele, ao contrário da fase anterior, em que ele se valia da imprensa.

A experiência negativa que o escritor gaúcho enfrenta com as atribuições jornalísticas na Revista do Globo tem a ver, certamente, com os novos padrões editoriais adotados com o processo de modernização da imprensa. Ao contrário do que acontecia com os escritores das gerações anteriores, que participavam das edições com atividades basicamente literárias, Erico Verissimo participa do jornalismo num momento em que as crônicas, contos e romances cedem lugar ao noticiário, reportagens e colunas sociais.25 Se por um lado alguns escritores conseguem adaptar-se a essa realidade, como o próprio João do Rio, que faz da reportagem um gênero literário específico, outros perdem o espaço de outrora. Broca (2004, p. 288, TIB) completa: “Já que o escritor brasileiro não podia dispensar um second métier, era melhor alinhavar notícias, forjar reportagens, como fizeram tantos, a reproduzir aquilo que Silva Ramos chama com finura: o quadro lendário do poeta morrendo de fome”.

Mesmo descontente com o trabalho e sem se considerar um jornalista na concepção profissional da palavra, Erico Verissimo foi o primeiro intelectual a presidir a Associação Riograndense de Imprensa (ARI), fundada em 1935 com a missão de defender os interesses dos jornalistas, intelectuais e trabalhadores das empresas de comunicação. Editor-chefe da Revista do Globo nessa época, Erico Verissimo recebeu a maioria de votos na eleição que também tinha como candidatos os escritores Viana Moog e Manoelito de Ornellas e o político Raul Pilla.

Três anos antes, o escritor havia assumido a edição de uma “página feminina” de publicação semanal no Correio do Povo, mais como um artifício para aumentar a renda familiar do que por prazer. A página chamava-se A mulher e o lar e trazia “crônicas e versos mundanos, receitas culinárias, modas, tudo sempre com a prestimosa colaboração da tesoura e do pote de grude” (VERISSIMO, 1995a, p. 254, OEV).Outra declaração sobre a página:

Deve ter sido das coisas piores que até hoje fiz em toda minha vida. Para essa meia página, cujo nome era obviamente feminina, eu costumava escrever uma crônica fútil e curta, que assinava com um pseudônimo. O resto eram notícias sobre filmes, artistas de cinema e ilustrações – em geral modas e bordados – pirateadas de revistas italianas e francesas. (1975, p. 2,

25 Não por acaso a Editora Globo, que publicava a Revista do Globo, lança em 1936 a revista A Novela,

dedicada exclusivamente à publicação de literatura de ficção. A nova publicação era dirigida por Erico Verissimo e dura apenas 15 meses, ou 15 números.

OEV)

Reverbel (1990, p. 24, SEV), que trabalhou com Erico Verissimo na Revista do Globo, confirma o desinteresse do escritor pela atividade jornalística. Para materializar o sonho de ser um romancista, o criador de O tempo e o vento teve que “sujeitar-se a recorrer a outros meios de vida, por ele desempenhados a contragosto, mas sempre de modo a resguardar e preservar a dignidade pessoal e a lisura funcional”. Aponta ainda Reverbel (1990, p. 24, SEV): “tenho como certo que Erico Verissimo só gostava de escrever ficção. Tudo que produziu, em outras áreas, não passaria da abertura do caminho que lhe permitiria dedicar-se a seus romances, em tempo integral e sem precisar recorrer a outros meios de vida”.

Após assumir a presidência da ARI, Erico Verissimo não deveria se surpreender, como se surpreendeu, com um convite para assumir a direção de um jornal diário. Esse convite surgiu por ocasião da fundação da Folha da Tarde, um projeto editorial de Breno Caldas, proprietário do Correio do Povo. Embora já fosse um intelectual influente nas rodas artísticas, escritor conhecido e um dos responsáveis diretos pelo sucesso da Editora Globo, o que justificava a proposta de Breno Caldas, Erico Verissimo declinou do convite. “O convite me lisonjeou mas – se eu não estava enganado sobre mim mesmo – eu não era, nunca fui um jornalista. Não podia imaginar-me a escrever editoriais. O meu caminho era outro” (1975, p. 2, OEV).

As experiências do romancista com o universo jornalístico – na leitura lúdica de jornais, na observação dos processos de produção, na própria produção de conteúdo e na percepção da influência da imprensa escrita sobre a vida social – ajudam a explicar não apenas a sua tendência de transpor para a ficção um ambiente – urbano ou rural – inseparável da participação midiática, mas também a verossimilhança e o estilo narrativo de seus romances. É fato que o trato do texto para jornal pode influenciar o estilo do escritor, um fenômeno observado desde as primeiras experiências do romance realista inglês, como bem mostra Watt (2010, p. 111, TIB) em relação a Defoe. Este, por escrever para um público mais amplo no jornal The Review, “tinha de fazer concessões muito maiores à capacidade de entendimento dos leitores”.

As marcas do treinamento na “dura escola do jornalismo” também se refletem num texto leve, de fácil compreensão e sem experimentalismos linguísticos da obra de Erico Verissimo. Neste sentido, os métodos do ficcionista estão intrinsecamente ligados ao fazer jornalístico. Se por um lado este estilo beneficia o autor na aceitação do público e no aumento

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