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2.3 O contexto do problema da violência doméstica contra crianças

2.3.6 Escola e violência doméstica contra criança na contemporaneidade

Convivemos em um mundo de comunidades entrelaçadas de trocas, parcerias, pactos e empréstimos, apesar do afastamento das culturas. Essas comunidades comungam de experiências além das conjunturas locais, seguindo linhas de condutas, padrões culturais ou determinados traços de outros. Na realidade mundial, o que ocorre em uma sociedade ecoa

nas demais como redes entrelaçadas. É nessa rede que sociedades, espaços, culturas, pessoas, economias, misérias, políticas e conflitos se conectam.

Essa rede de comunidades entrelaçadas é definida por Gimeno Sacristán (2007) como o mundo globalizado, que tem estabelecido mudanças de paradigmas à escola e, consequentemente, suscitado novas demandas ao trabalho docente. No processo de globalização, as condições econômicas, sociais e culturais são afetadas diretamente por um conjunto estratégico de decisões que incidem sobre a sociedade mais amplamente. Como a educação se institui a partir dessas realidades, é inevitável o efeito da globalização no ensino, na aprendizagem, no âmbito das práticas educativas e das políticas públicas educacionais.

Diante do contexto da atualidade, Gimeno Sacristán (2007) elenca três significativos efeitos da globalização sobre os sistemas educacionais, quais sejam:

1) O primeiro efeito significativo da globalização: a sombra da direção ideológica e a política neoliberal, que têm o mercado como sustentáculo e parâmetro; “o esvaziamento do Estado posto a serviço da satisfação dos direitos básicos das pessoas e, em particular, o da educação em condições mínimas de igualdade” (GIMENO SACRISTÁN, 2007, p.30). Defende o autor que o “economicismo”, fruto de políticas neoliberais, é o definidor do que se entende por qualidade em educação. Destaca que as políticas educacionais de Estado são determinadas pelo sistema privado;

2) O segundo efeito consiste que, com a instabilidade do mercado de trabalho, as pessoas que possuem pouca escolaridade, ou seja, “menos capital”, são descartadas desse mercado. Dessa forma, o autor destaca que a escola tem como desafio preparar os discentes sem saber para que, visto que os conhecimentos e as “competências rentáveis” para o futuro são verdadeiras incógnitas. Salienta que o sistema educacional, ao ser cobrado para disponibilizar atenção e adequação às necessidades da sociedade, está, de fato, beneficiando a competitividade e a produtividade – metas dos mercados globalizados. Assim, o autor aponta que diante de mudanças tão instantâneas, o sistema educacional fica sem objetivas referências;

3) Por último, a ação da globalização incide sobre a educação, porque influencia os indivíduos, os conteúdos do currículo e os modos de aprender. Destaca que “o conceito e a demarcação do que se entende por cultura nas escolas no novo modelo de mundo tem que ser ampliado para que todos se sintam incluídos” (GIMENO SACRISTÁN, 2007, p.31). Aponta também que esses dois requisitos têm efeitos diretos na organização do currículo e na formação de professores, o que precisa ser crescentemente crítica, intensa e vasta. Assim, o professor precisa se informar mais e melhor na sociedade da informação. Os professores não

serão substituídos pelos aparelhos tecnológicos, mas precisam saber mediar, orientar, instituir critérios, propor e integrar a informação necessária para a educação formal dos alunos.

Tal estudo denuncia o “preço” social da politica neoliberal que atingiu diferentes realidades econômicas de vários países, inclusive o Brasil, fomentando desemprego, subemprego, diminuição dos postos de trabalho e o aumento de pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza. No Brasil, a politica neoliberal, desde a década de 90, apesar de controlar a inflação, aumentou a dependência a outros países credores, recessões sucessivas e um alto número de desemprego, sem contar com as limitações dos direitos trabalhistas. Nessa realidade, as taxas de homicídios teve um relevante crescimento, ao passarem de 24,4%, nos anos 80, para 33%, na década de 90, ou seja, 369.068 homicídios foram registrados na década de 90 (BRASIL, 2005).

É, a partir de 2004, que vimos surgir em nosso pais uma queda significativa nos números de homicídios no Brasil (BUORO , 2010). Essa queda pode ser compreendida por diversos fatores, como o aumento de número de postos de emprego, o aumento do valor do salário mínimo, a queda do desemprego e o crescimento da renda da população pobre, o que propiciou a saída de mais de 15 milhões de pessoas da pobreza extrema. Na área da educação, Friggoto (2011) destaca, ao fazer um balanço na história da educação brasileira durante a primeira década do século XXI, as melhorias nas politicas assistenciais em relação à distribuição de renda, à retomada dos concursos públicos e à criação de novas universidades publicas e institutos Federais de Educação Tecnológica. Entretanto, esse mesmo autor aponta que o ideário produtivista e mercantilista foi predominante em todos os níveis de educação.

Assim como Gimeno Sacristán, Ball (2004) também destaca que o a educação apresenta uma coligação complexa de relações com e no centro dos processos de globalização. Ele denomina o sistema educacional no contexto globalizado como negociativo, performativo e transformado em empresa que encoraja valores de competência e desempenho, valores individuais, marcados pela competitividade, mercantilização e desempenho.

Antes, a escola era concebida como espaço de formação de seus alunos para inclusão na divisão social do trabalho e vista por alguns como meio de ascensão social e comprometida com a sociedade em relação à isonomia e ao desenvolvimento. Por outro lado, nos dias atuais, está inserida em uma trama, em que cabe à economia e ao mercado determinar os conhecimentos e impor a organização e formação docente, sem a preocupação com as desigualdades ou destino social de seus alunos.

Diante dessa realidade resta à escola ir na contramão dos ditames do mercado e da economia por meio da construção, no interior da escola, de um espaço de leitura crítica e

problematizadora da sociedade, em que a escola se encontra. É deixar de ser um mero ambiente, onde o objetivo maior é a transmissão de informação e trabalhar para "atenuar, em parte, os efeitos da desigualdade e preparar cada indivíduo para lutar e se defender, nas melhores condições possíveis, no cenário social” (PÉREZ GOMÉZ, 1998, p.24). Assim, também, segundo Pérez Goméz, preparar os educandos para refletir criticamente e conduzir- se democraticamente, numa sociedade não democrática.

Dessa forma, a escola só poderá se tornar um espaço de ajuda, defesa e prevenção da violência doméstica para milhares de crianças, a partir do momento em que essa instituição trabalhe para atenuar a violência doméstica sofrida e seus impactos sobre o desenvolvimento de seus alunos

Tal afirmativa permite reforçar que a escola é um local ideal para prevenção e combate à violência fundamentalmente por dois motivos: a) as crianças passam grande parte do tempo no ambiente escolar, principalmente, os alunos das séries iniciais do ensino fundamental; b) geralmente, o principal agressor da violência doméstica encontra-se no ambiente familiar e, dessa forma, os profissionais da escola, no contato do dia a dia com as crianças, podem desenvolver vínculos de confiança e apoio.

Um dos grandes empecilhos para a escola tomar um posicionamento de prevenção e enfrentamento da violência doméstica é a ideia de que esse problema só diz respeito à família. As ações de denúncia aos órgãos competentes, atuações na prevenção e enfrentamento da violência doméstica, via de regra, não fazem parte das atividades da escola.

Nesse sentido, Almeida et al. (2006) afirmam que nem sempre derivam da escola ações e atitudes que promovam o desenvolvimento, saúde e bem estar dos atores envolvidos nesse contexto, sobretudo devido a omissão que é fruto de crenças, opiniões e conceitos equivocados, tendo como base ideias conservadoras, imagens distorcidas da realidade e das condições de vida das pessoas.

Apesar da afirmação de Almeida et al. (2006) de que a escola deva ser considerada como um ambiente significativo no que se refere à intervenção e detecção desse fenômeno, acredita-se que as crenças, opiniões e conceitos equivocados influenciam na tomada de decisões por parte dos profissionais da escola ao “arrogarem para si o direito de resolver ao seu modo” o problema da violência doméstica; encaminhando “a um serviço de atendimento dentro da própria instituição significa tratar o problema em sua dimensão privada, “entre quatro paredes”, o que não constitui uma atitude recomendada pelo ECA e por especialistas da área” (ALMEIDA et al., 2006, p.285).

O ambiente escolar só poderá desenvolver sua função protetora a partir do instante em que o seu olhar traduzir respeito, valorização e reconhecimento social dos alunos, professores e funcionários. O primeiro passo é possibilitar que a comunidade escolar conheça e reflita sobre os atuais planos e documentos legais que apresentam avanços em relação à compreensão da infância e da violência doméstica contra criança. Para tanto, há um conjunto de leis e documentos a serem conhecidos e trabalhados pela escola: a Constituição Brasileira, que trata da concepção de infância e seus direitos; a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, elaborada a partir da Declaração Universal dos Direitos da Criança que aborda, no art. 19, a tomada de medidas de proteção por parte no Estado, na proteção das crianças contra toda forma de violência, abuso e maus tratos; o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH), um instrumento que visa estimular e difundir ações de educação em direitos humanos; o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), lei em prol dos direitos relativos a crianças e adolescentes; a Lei n. 11.525/07 que modifica a LDB/96 e acrescenta como pertinente à escola a inclusão de conteúdos que abordem direitos das crianças e adolescentes, tendo o ECA como diretriz; o texto de referência da Conferência Nacional de Educação de 2014, que destaca nos cursos de formação inicial e continuada de professores a necessidade de trabalhar temas contidos no ECA e na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Posteriormente, esses textos serão tratados e discutidos a sua importância para reflexão nos cursos de formação de professores.

Dessa forma, a escola será considerada um ambiente de grande importância para a construção de estratégias de enfrentamento da violência doméstica e, nesse contexto, destaca- se a importância dos professores por possuírem uma posição privilegiada de contato com a criança e a família.

Acredita-se que esses profissionais por meio de uma formação específica voltada para esse fenômeno possam utilizar os recursos dessa formação para o desenvolvimento de habilidades no enfrentamento da violência doméstica, sobretudo no que diz respeito à identificação e denúncia, especialmente, nas primeiras séries do ensino fundamental, período no qual as crianças permanecem com os professores cerca de quatro horas diárias.

A fim de melhor compreender o campo da formação de professores no enfrentamento da violência doméstica contra criança, serão discutidos no capítulo seguinte os diferentes níveis de formação, com destaque para o enfrentamento da violência doméstica contra criança.

3 FORMAÇÃO DE PROFESSORES E O ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA CRIANÇAS

Ao abordar a função e os desafios da escola na contemporaneidade, Feldmann (2003) afirma que essa escola tem como princípio o professor como seu representante, que assume nos dias atuais o papel de formar cidadãos livres, conscientes e autônomos que respeitem a pluralidade, a diversidade e que intervenham de maneira científica, crítica e ética na sociedade.

Esse professor, segundo Feldmann (2009), no século XXI, passa a assumir um papel diferenciado e responsável não só por mediar o conhecimento sistematizado e as necessidades do aluno, mas passa a ser responsável pela construção e reconstrução da identidade pessoal e profissional dos indivíduos envolvidos num cenário de aprendizagem.

Dessa forma, ser professor é mais que ser habilitado por um curso superior ou ter o domínio de sala de aula; é intermediar a convivência social, as informações com o conhecimento; é compreender seu papel como ser social e político mergulhado em relações e cenários de poder e de desenvolvimento de subjetividades.

Nessa convivência social o professor se depara em sala de aula com a infância brutalizada que, segundo Arroyo (2009), é considerada como um dos problemas mais sérios da sociedade e dos centros de formação. Ainda, de acordo com Arroyo, a formação docente tem se centrado para preparar o professor para ensinar matemática, biologia, física e química, dentre outras disciplinas; entretanto, ele denuncia que os docentes não são preparados para conviver com infâncias negadas e roubadas.

O professor não sabe, por vezes, como administrar e direcionar problemas que seus alunos trazem para sala de aula, como violência, drogas, indisciplinas, exploração sexual, dentre outros, porque não teve uma formação direcionada para essas questões. O foco da formação docente tem sido, em geral, como transmitir conteúdos e fórmulas, em detrimento de temas sobre a resolução de conflitos.

Estudos demonstram que dificilmente se encontra no processo de formação de professores a discussão crítica de temas relevantes, como violência doméstica, exploração e abuso sexual ou tráfico humano. Alguns desses temas, quando trabalhados nos momentos de formação, recebem, por vezes, um tratamento “marginal” por parte da escola, dos centros de formação e das universidades.

Quando as infâncias-adolescências com que trabalhamos põem de manifesto sua condição humana tão precarizada não dá mais para preparar a aula, ou passar a matéria sem nos indagar acerca de suas vivências, traumas, medos, incertezas que levam como gente, não só como escolares (ARROYO, 2011, p.28).

Os cursos de formação inicial e continuada ainda ignoram as tensões, dinâmicas e dúvidas trazidas e vividas em sala de aula. Muitos currículos de formação docente estão fechados para a dinâmica social, para os processos de desumanização que permeiam o dia a dia de muitas infâncias. A partir do momento, em que esses currículos se “abrirem” para as diferentes e desumanizadas realidades de crianças e adolescentes, se enriquecerão e ganharão novos sentidos.

Aprendemos disciplinas sobre que conhecimentos da natureza e da sociedade ensinar e com que metodologias, porém não entra nos currículos de formação como ensinar-aprender a sermos humanos. Falta-nos a matriz pedagógica fundante (ARROYO, 2000, p.55).

No relato abaixo, nota-se que a formação do professor vai além de questões de atualização científica, pedagógica ou didática. A formação deve incutir nos professores a ideia da construção de ambientes coletivos de participação e reflexão para que os futuros professores aprendam e se adaptem à realidade de conviver com as mudanças e as incertezas. O papel do formador, na figura do docente universitário, ganha visibilidade pela sua influência para com os futuros professores, a partir do momento em que são trazidas para discussão na universidade diferentes realidades em que crianças e adolescentes estão inseridos.

Tive uma experiência na formação inicial, uma orientação de como enfrentar determinada situação. Estava no ensino superior e comecei a trabalhar em uma escola numa sala muito complicada. Na graduação tive um professor que “fez a diferença” para mim. Ele era professor de artes... Não era de didática, estrutura nem relacionado a metodologia... Ele sentou comigo ... Conversamos e planejamos minha aula baseada em ensinamentos de artes para ajudar meus alunos... Por isso é que tenho uma formação em artes... Acredito que fui privilegiada ao encontrar esse professor na faculdade... Ele sentou comigo e me fez vê o outro lado da situação, pois eu estava em início de carreira. Acredito que no decorrer de nossa carreira precisamos de professores e momentos como esse... Nossa formação é aprender um com o outro... Isso que é importante (GRUPO FOCAL: PROFESSORA 2, ESCOLA 1)

Imbernón (2006) destaca ser indispensável reconsiderar os conteúdos e a metodologia utilizada pelos formadores de professores, pois a forma como os alunos de graduação aprendem incidirá diretamente na forma como irão atuar em sala de aula. Acrescenta que a formação inicial determinará um conjunto de posturas e valores, que, ao longo do tempo, influenciarão a prática profissional.

Dessa maneira, mais que transmitir informações, o papel do professor é oportunizar a apropriação do saber pelo outro e, para isso, a formação,

[...] deve propor um processo que dote o professor de conhecimentos, habilidades e atitudes para criar profissionais reflexivos ou investigadores. O eixo fundamental do currículo de formação do professor é o desenvolvimento de instrumentos intelectuais para facilitar as capacidades reflexivas sobre a própria prática docente, e cuja meta principal é aprender a interpretar, compreender e refletir sobre a educação e a realidade social de forma comunitária (IMBERNÓN, 2006, p. 55).

No relato da professora 2 da escola 1, acima citado, é possível observar o desenvolvimento desses instrumentos intelectuais que facilitam a capacidade reflexiva, quando o professor universitário, juntamente com a aluna, discutem uma forma de intervir na realidade social pela reflexão sobre o problema da comunidade escolar.

Para Gatti e Nunes (2009), existe uma relação direta entre a formação de professores e melhorias da educação. As autoras destacam que a formação de professores ganha cada vez mais evidência diante dos desafios da educação. Ressaltam Gatti e Nunes (2009) que investigar questões relacionadas aos cursos de formação docente, planos de carreira, salários e às condições de trabalho nas escolas é ação importante e indispensável para a conquista de mudanças no contexto educacional.

Além do sistema educacional, a formação docente também acarreta benefícios ao sistema socioeconômico e à cultura, partindo do entendimento de que essa ação pode ser compreendida como uma função social de transmissão de saberes, saber fazer ou saber ser (GARCIA, 1999).

Ao considerar a formação de professores, tem-se como principio fundamental que se trata de um conceito de múltiplas interpretações e de diferentes temáticas, como políticas públicas, reconhecimento do magistério, prática pedagógica, dentre tantas.

Ao se considerar a formação de professores como um conceito de múltiplas interpretações e de diferentes temáticas, de acordo com Garcia (1999), há escassas conceituações e “ainda menos acordos em relação às dimensões e teorias mais relevantes para

sua análise” (GARCIA, 1999, p.21). Para o autor, o ponto comum à maioria dos pesquisadores que investigam essa temática está em associar o conceito às questões do desenvolvimento pessoal. Para tanto,

[...] a formação pode ser entendida como uma função social de transmissão de saberes, de saber-fazer ou do saber-ser que se exerce em benefício do sistema socioeconômico ou da cultura dominante. A formação pode também ser entendida como um processo de desenvolvimento e de estruturação da pessoa que se realiza com o duplo efeito de uma maturação interna e de possibilidades de aprendizagem, de experiências dos sujeitos. Por último, é possível falar de formação como instituição, quando nos referimos à estrutura organizacional que planifica e desenvolve as atividades de formação (FERRY apud GARCIA, 1999, p.19).

Com isso, a formação não pode ser compreendida somente como a curta fase do curso de Licenciatura ou atividades de formação continuada, mas é uma extensa trajetória que abarca toda a vida do professor, em que ele próprio é o principal autor dessa formação.

Ninguém se forma no vazio. Formar-se supõe troca, experiência, interações sociais, aprendizagens, um sem fim de relações. Ter acesso ao modo como cada pessoa se forma é ter em conta a singularidade da sua história e, sobretudo, o modo singular como age, reage e interage com os seus contextos. Um percurso de vida é assim um percurso de formação, no sentido em que é um processo de formação (MOITA, 2007, p.115).

Dessa maneira, os significados das nossas experiências são processos formadores que nos deixam marcas e que precisam estar sintonizados com as práticas de formação. E, são esses saberes, segundo Tardif (2011), que o professor traz de suas experiências escolares, extremamente significativos, que prosseguem no tempo; por vezes, sendo difícil transformá- los ou reestruturá-los, mesmo durante a formação universitária.

Porque eu vou dizer a verdade para vocês: eu sou uma filha abusada... Abusada quando criança... Hoje em dia enfrento esse tema com tranquilidade... Eu já chorei muito... Já sofri muito... Lembro quando era criança, esperava que alguém olhasse e parasse meu pai... Eu clamava pela policia... Eu clamava por um vizinho e nada acontecia... Aí vivendo a minha vida; mais mocinha, eu falei: eu vou fazer de tudo para ajudar crianças que sejam abusadas (GRUPO FOCAL: ESCOLA 1, PROFESSORA 1).

Na fala dessa professora fica explícita sua experiência com o abuso sexual e a influência desse episódio na sua carreira docente. Fica evidente que a formação de professores pode ser repensada de forma mais abrangente, como uma sequência de experiências marcadas

por etapas e épocas que são influenciadas por diversas ordens: familiares, políticas, subjetivas e sociais, dentre outras.

Nesse sentido, Cunha (2010) considera que o processo de formação é “resultado do compromisso de cada professor com o seu próprio desenvolvimento pessoal e profissional. São os professores que atribuem ou não sentido ao que fazem e ao que externamente recebem” (CUNHA, 2010, p. 136). Para qualquer plano de formação de professores ter êxito, inclusive sobre o tema da violência doméstica contra crianças, faz-se necessário que os