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CAPÍTULO 4. CONCENTRAÇÃO SOCIAL E DISPERSÃO EDUCACIONAL:

4.1 PRIMEIRO EIXO – ELEMENTOS GERAIS

4.2.2 Escola Estadual Doutor Alves Torres (E.S.E.D.R.A.T)

A Escola Estadual Doutor Raimundo Alves Torres, fundada em 1983, localizada na rua do Pintinho 601, Bairro Bela Vista, conta com 22 salas de aula sendo a maior instituição em nível Estadual presente no município, em virtude disso, atende em média 1302 alunos (802 no Ensino Médio e 500 no Ensino Fundamental) em dois turnos (manhã e tarde). Pela sua localização admite alunos de diversos bairros (Boa Vista, Bom Jesus,

91 Estes termos foram previamente abordados com os gestores com base nas posições de Bourdieu, composição teórica no qual este trabalho se alinha.

Centro, Fátima) e cidades vizinhas, inclusive o Nova Viçosa, cerca de 78% dos estudantes advém deste bairro.

Nas palavras da diretora, a escola seria a primeira opção das famílias que dependem do serviço público de educação, quando não é ofertada a vaga em escolas próximas às residências destes estudantes, os pais dos bairros mais distantes optam pelo ESEDRAT, pela “fama da escola” e pelo crescimento do IDEB92. Todavia, apesar da sua

centralidade, a escola se posiciona no alto do “Morro do Pintinho”, e, por questões de segurança, e acesso é visto como um fator negativo.

Por oferecer dois níveis e pelo seu tamanho, absorve o excedente de escolares que não tiveram vagas em estabelecimentos de ensino próximos à sua residência. Por significar um estabelecimento de menor reputação na cidade, e localizado em um dos “morros” do núcleo central, famílias de bairros mais homogêneos e melhores posicionados socialmente, mesmo fazendo parte do zoneamento dessa escola, como: Ramos, Lourdes, Belvedere e Clélia Bernardes (Figura 25), direcionam, percentualmente, um número reduzido de alunos ao E.S.E.D.R.A.T., aproximadamente 18%.

Neste julgamento, Christovão (2009, p. 289), ao tratar da homogeneidade do público docente em regiões de favela no Rio de Janeiro, retrata,

o que se observa é uma relação direta entre a proximidade da favela e o grau de homogeneidade do público escolar. Se, numa perspectiva mais global, a opção em massa das classes média e alta pelo ensino privado responde pela formação de um público mais homogêneo para a escola pública, o estigma da favela e do aluno favelado atua como um fator adicional para afastar das escolas públicas próximas dos morros aqueles setores da classe média que ainda poderiam recorrer à rede pública. O resultado é que as escolas de favela apresentam um alunado homogeneamente pobre, mesmo a escola estando fisicamente próxima a um público mais abastado.

Em nível médio a escola recebeu em 2013 cerca de 68 alunos do bairro Nova Viçosa, e 78 no ano de 2014. Na entrevista com a diretora observamos alguns pontos a serem comentados, o elevado número de desistências e evasões pode ser explicado por aspectos financeiros, geracionais, e principalmente, como dito, a saída para o trabalho como a possibilidade de conquista da liberdade de consumo, sobretudo na atualidade com

a disseminação dos bens de consumo juvenis como roupas, tênis, aparelhos eletrônicos e etc.

Figura 25: Área de absorção de alunos da Escola Estadual Doutor Edmundo Alves Torres

Com relação à bagagem cultural e informacional dos alunos residentes no bairro, a gestora não visualizou diferenças substanciais, entretanto, nos alertou para o problema

de grande recorrência, o estigma93, realizados por parte de alguns alunos, são tratados em

algumas situações como: “Ôh Nova Viçosa”. Entretanto, é inegável as contribuições à

escola, “principalmente os alunos do “rebusca” aos projetos que desenvolvemos aqui”.

Mas, ao final nos confessou que até mesmo alguns docentes realizam um pré-julgamento

destes alunos, observando-os com certas limitações de aprendizagem apenas pelo fato de residirem no bairro Nova Viçosa. Nestes termos, ao pensar a escola como estabelecimento social, a vizinhança vem exercendo impactos incisivos sobre as expectativas dos professores, quando “os adultos, nessas instituições, usam distintos critérios de

93 Toma-se a compreensão de estigma enquanto um desígnio social, e não como atributo do sujeito. De acordo com Erving Goffman (1982), estigmatizar é desclassificar o indivíduo, rotulando como incapaz de manter interações sociais efetivas. Tal entendimento e encontrado na obra deste autor, intitulada: Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.

funcionalidade baseados na interpretação dos atributos culturais e no potencial de seus usuários”. (FLORES, 2008, p. 152)

Outro princípio que acarreta esse pré julgamento por parte dos funcionários da escola, é a própria relação que estes possuem com as famílias das periferias urbanas, se restringindo substancialmente ao campo das atribuições de críticas mútuas. Os pais vão à escola apenas em situações de desvio de conduta dos filhos, e por tal, são desqualificados pelos professores, pois não ofertaram aos seus filhos as condições mínimas de respeito, sociabilidade ou “educabilidade”, recaindo novamente em rotulações desmoralizantes aos alunos. O grande infortúnio deste cenário, é o círculo vicioso que é criado, pois se

[...] a escola pode ser pensada como um instrumento de ampliação dos horizontes dos alunos, possibilitando a estes que ultrapassem a condição social dos pais, a estigmatização dos alunos como não educáveis congela esse processo e cria tensões difíceis de serem solucionadas. (CHRISTOVÃO; SANTOS, 2010, p. 291)

Diretores e professores costumam relacionar peremptoriamente as dificuldades que enfrentam com a origem territorial dos alunos. Na opinião deles, determinados alunos não teriam “capacidade de aprender”, justamente por serem “da favela”. Em suma, o problema está no aluno, essencialmente. (IBIDEM, p. 293)

Com relação ao transporte escolar, os alunos não apresentam problemas de atraso para chegar à escola, porém a superlotação e a animosidade do motorista que muitas vezes não para na frente da escola, significam insatisfação principalmente por parte dos pais e próprios estudantes.

No tocante aos benefícios no processo de escolarização em nível médio dos alunos do Nova Viçosa a partir da implantação de um núcleo escolar neste nível no bairro, mesmo reproduzindo o exercício estigma que em outras situações condenou, a gestora acredita que não faria tanta diferença, “seria interessante para ter o perfil da comunidade, contudo, o estigma do bairro e por já conhecerem a escola de lá, poderia fazer alguns alunos almejarem escolas mais ‘centralizadas’”.

Questionada se morar em um bairro segregado e pobre traz consequências negativas à continuidade estudantil dos moradores, admitiu certeza, apesar de ser disponibilizado o transporte, a questão financeira é mais preponderante, “alunos deixam de vir a escola para trabalhar”, ressaltou também a influência intergeracional, “os pais as

Em outro momento de sua fala, admite, “muitos alunos do Nova Viçosa comparecem à escola para se alimentar, essa é a dura verdade, não enxergam nenhuma utilidade nisso”, todavia, essa concepção quando analisada em bases científicas perde

qualquer relevância. De acordo com Sérgio Costa Ribeiro (1991), ao analisar casos de

evasão escolar relata que o objetivo dos pais de crianças pobres ao enviá-los à escola é para que sejam verdadeiramente escolarizados, e não para personificar o comum prejulgamento de que estão em busca de merenda94.