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Escolas de Formação Inicial: uma Outra Etapa da Construção da Identidade Profissional

de uma Identidade Profissional

3. Escolas de Formação Inicial: uma Outra Etapa da Construção da Identidade Profissional

Consideramos pertinente analisar a instituição socializadora, isto é, a escola de formação, pois, tal como Dubar (1998), consideramo-la, um laboratório de transformação

30 Também no nosso caso, a opção pelo curso de educação de infância se ficou a dever sobretudo a influências externas e não

propriamente a motivações intrínsecas. À semelhança das entrevistadas Ana e Luisa, também para nós a busca de projectos centrados na formação se tem constituído numa estratégia de combate às fragilidades identitária que nos surgem.

31 Sérgio Niza (4 de Maio de 1994), numa entrevista que serve de suporte ao estudo empírico que Teresa Vasconcelos realizou e que

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que permite a conservação de uma parte da identidade antiga e acompanha a identificação a novos factores significativos, percepcionados como legítimos.

As trajectórias de formação são constituídas por um conjunto de experiências que, no dizer de Nóvoa (1992), são momentos chave da socialização e da configuração profissional. São processos de uma intensa relação onde o indivíduo faz a transação de um simples estudante (socialização primária) para estudante especializado (socialização secundária). Nestes contextos de transição, o sujeito joga um conjunto de peças dispersas, desordenadas sem relação aparente entre si que, depois de ordenadas parecem fazer sentido, contribuindo para o início da construção de um processo de identidade profissional (Dubar, 1998). Interessa, pois, conhecer um pouco do contexto de desenvolvimento da formação inicial para podermos conjugar e contrapor ideias que nos façam produzir conhecimentos úteis à interpretação das influências da formação inicial nessa construção.

As instituições de formação inicial têm vindo a aumentar consideravelmente ao longo dos últimos 22/23 anos. Com efeito, a necessidade de formação inicial tem justificado a criação de instituições de formação específicas, com um carácter qualitativo crescente, quer no que diz respeito aos currículos quer aos docentes especializados. Tendo por referência um estudo conduzido por Costa, em 92/93, pensa-se que nessa altura, existiriam no ensino público catorze E.S.E.s e cinco universidades a promoverem o curso de educadores de infância. Por seu lado, no ensino privado existiam nove E.S.E.s e dois Institutos superiores. Por forma a perceber-se mais profundamente a evolução das instituições de formação, salienta-se que, em Portugal, até há pouco tempo atrás a formação de profissionais de educação de infância esteve entregue quase exclusivamente a instituições particulares, com predomínio das ligadas à igreja católica.

As candidatas tinham de ter vim determinado perfil moral e cívico, qualidades que deveriam ser atestadas pela câmara Municipal, pelas juntas de freguesia ou pelo pároco da localidade de residência, o que revela o perfil de educadora que se desenhava na altura.

Por outro lado, tudo indica que as alunas que frequentaram o curso de educação de infância pertenciam a um estracto social médio-alto, pelo menos até 1980, o que se confirma, por exemplo, no caso das nossas entrevistadas Rute e Luísa.

A partir dos anos oitenta, a elevada procura de certificação profissional, trouxe grandes alterações quanto ao ingresso nos cursos do subsistema do ensino superior. Definiram-se regimes de acesso cujos responsáveis foram, durante algum tempo, as próprias instituições de formação. Só alguns anos mais tarde, com o D e c - Lei n°l98/92,

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se ordenou que as provas de acesso, chamadas provas específicas, passassem a ser de âmbito nacional.

Deste modo, no decorrer do período de tempo em que a nossa amostra se situa, muitas mudanças ocorreram na formação de educadores de infância, principalmente, no que respeita à proliferação e desenvolvimento de escolas, regimes de acesso, mudanças de designação das escolas, etc.

Após esta perspectiva das transformações ocorridas no sistema de ensino, ao nível da formação inicial, consideramos importante realçar os aspectos que as entrevistadas verbalizaram como marcantes, quer sob o ponto de vista de um contentamento ou desencantamento com a escola de formação quer sob o ponto de vista dos modelos de formação cultivados por cada escola. Isto porque estamos conscientes de que as escolas de formação terão marcado vincadamente o início da construção da identidade profissional das nossas entrevistadas.

3.1. Escola de Formação Inicial: laboratório de Trans/formação de

Identidades Profissionais

Ao estabelecerem as condições de acesso ao curso as escolas de formação inicial de educação de infância, tinham como objectivo selecionar e filtrar e, por conseguinte, desenhar um ideal-tipo de educador. A seleção era feita segundo uma ordem de critérios,

32 Senão repare-se:

1973 - Criação das escolas públicas de educadoras de infância;

1974/75 - Criação de duas escolas de educadoras de infância privadas: Santa Mafalda e a Escola popular de educadoras de infância, no Porto;

1977 - Institucionalização das escolas normais de educadores de infância, em diversos distritos do país;

1979 - Habilitações mínimas exigidas para o ingresso no curso de educadoras de Infância - 2. ° ano do curso complementar (antigo 7o ano)

1981 - Criação de mais uma escola privada no Porto, Escola de educadoras de infância Santa Maria; 1982 - Criação de outra instituição privada, em Lisboa e Porto, Escola de educadoras Jean Piaget, 1983 - Criação da primeira ESE (Escola Superior de Educação) do país, em Viseu

1983/97 - Abrem ESE's do ensino público em quase todas as capitais do distrito do país; 1989/90 - O curso de educadoras passa a ser considerado bacharelato32;

199..._ As escolas de formação privadas passam-se a designar Escolas Superiores de Educação;

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Ao leque de informações que a escola colhia estava subjacente uma seleção centrada na pertença a uma classe social. Ao escolher eram selectivas e, simultaneamente, segregadoras em termos de frequência. Era assim, pelo menos há cerca de 26/27 anos, altura que Rute e Luísa iniciavam o seu curso.

Entretanto, as situações foram-se alterando, ainda que lentamente. A educadora Helena, formada mais recentemente, uma vez que iniciou o curso apenas em 87/88, revela também o condicionamento exercido pela formação religiosa e a idoneidade moral, na entrada para o curso. No entanto, salienta já o facto de o acesso não ser feito só com base nestes requisitos, mas também num exame de admissão e numa entrevista, apesar do facto de a escola frequentada ser de índole católica - Escola de Formação Santa Maria.

Por seu lado, a educadora Ana iniciou o curso em 86/87 e não refere qualquer tipo de pré-requisito exigido pela escola, neste caso, o Magistério.

A educadora Alcina, que iniciou o seu curso em 90/91, refere que a sua entrada na escola se baseou em sistemas de classificação.

Hoje, como podemos verificar, o sistema de selecção perdeu o carácter explícito do vínculo moral e religioso. Tal é visível, por exemplo no discurso de Alcina:

Eu tinha o Piaget ou a Paula Frassinetti, porque eu achava que na Escola Superior de Educação era difícil de entrar, pois a minha média era baixa (13)... e então só me restavam estas duas escolas...; só que eu sabia que no Piaget poderia ter estágio remunerado... (Alcina, Anexo II).

Neste caso, a seleção era feita era feita com base em critérios de ordem intelectual, embora o factor económico pudesse ter uma certa influência. O facto de optar pela escola de formação inicial Jean Piaget, possibilitava-lhe, como refere, um estágio remunerado, facilitando-lhe, assim, o seu percurso de formação, em termos de encargos económicos e, consequentemente, uma certa autonomia face à família.

Assim sendo, é possível afirmar que as escolas de formação inicial, ainda que de uma forma mais ou menos subtil, legitimavam a pertença à profissão com base nos dons naturais e na vocação, o que aconteceu particularmente com as entrevistadas Rute, Helena e Luísa.

Estes factos, só por si, mostram-nos a existência de um ideal-tipo de educadora de infância baseado no talento natural, que coincidia com a visão pura da profissão existente na altura. Como refere Luísa

(...) inicialmente a profissão de educadora, estava um pouco ligada a um determinado estrato social, enfim àquelas meninas que não se casavam e que não tinham entrada na universidade..., muitas delas entravam para a escola de educadores— e eu fui nesse volume de pessoas... (Luísa, Anexo II).

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Agir com as crianças de forma afável, teansmitindo-lhe formas de ser e estar equilibradas, sob o ponto de vista moral, era condição principal para ser educadora de infância.

4. Novos Modelos de Formação em Confronto com Novas