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Espaços de Encontro: Confronto e Reconstrução de Identidades

5 2 Formação Contínua: um Referente Identitário

5.3. Espaços de Encontro: Confronto e Reconstrução de Identidades

Neste ponto, procuramos reflectir sobre os espaços de encontro entre pares, onde as entrevistadas visam explicitamente um reconhecimento que é também um auto- reconhecimento dos seus saberes experienciais e que, no dizer de Correia (1998), são atitudes pedagógicas, não de observação, mas de escuta.

A educadora Helena mostra-nos claramente a necessidade destes espaços:

(...) sinto falta do contacto com colegas de trabalho... Há maior isolamento (na função pública)... mas de ve% em quando dou uma fugida ao Jardim de Infância X (pertencente ao sector de educação de infância privado)... Procuro muito esses contactos; tenho muita necessidade de contar e de di^erf^isto, fi% aquilo, etc.. (Helena, Anexo II).

O discurso desta educadora mostra-nos também a necessidade de construir saberes em torno das reflexões que se tecem e das trocas que se estabelecem com os seus pares. Realçamos ainda, o recurso da educadora à estratégia a fugida, do dizer fiz ùi°>fiz aquilo, no sentido de se ir enriquecendo e de ir mantendo o seu equilíbrio pessoal e profissional. São instâncias informais de socialização profissional que desempenham um importante papel nas suas práticas . Está aqui bem patente o princípio da aprendizagem social, através do

Estes saberes têm tendência a ser desqualificados. Na perspectiva de Correia, as alterações introduzidas no sistema de créditos da formação contínua de professores são um exemplo desta desqualificação: Por um lado, ao deslocarem para o espaço de influência do Ensino

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jogo de interacções sociais. Correia (1998) acrescenta que este conjunto de saberes que os educadores accionam nestas trocas informais,

(...) por não serem objecto de uma formação explicita, tendem a ser excluídos do elenco dos saberes profissionais legítimos e a serem integrados nos domínios difusos da «instituição profissional» ou das propriedades dos indivíduos: isto é, tendem a estruturar a face oculta da profissão (Correia, 1998:

10).

Estes espaços de encontro que a formação não explicita, por vezes até a oculta, proporcionam a definição da identidade como conhecimento recíproco, o (...) conheámento do facto que a identidade do eu só é possível graças à identidade do outro que me reconhece, identidade essa dependente do meu próprio conheámento (Dubar, 1997: 81).

Os espaços de encontro, informais e formais, proporcionam, pois, um excelente momento de articulação das identidades especializadas e dos mundos que lhe estão associados. Estes momentos podem constituir-se em factores de fortalecimento identitátio, uma vez que, nestas relações, as educadoras legitimam a reconstrução permanente dos seus mundos especializados - identidade especializada.

O poder de reflectir as acções que permitem um envolvimento numa verdadeira criação institucional e a transformação da identidade, tornando-se visível nas palavras da educadora Luísa, que afirma:

(...) acho que é uma profissão muito exigente, acho que êpreciso estar muito atento, acho que épreciso reflectir sobre aquilo que sefa%... tem que se medir o que sefe%... tem que se medir o que as crianças progrediram... (Luísa, Anexo II).

Esta educadora reflecte individualmente sobre a situação educativa, concreta e vivida no sentido de encontrar as soluções mais apropriadas para um trabalho mais produtivo, e consequentemente, mais satisfatório. Forma-se, assim, um ciclo em que a reflexão sobre as práticas determina novas práticas mais ajustadas que, deste modo contribuem para uma auto-formação do sujeito, como nos fazem crer os relatos das educadoras acima referidas. A reflexão-acção torna-se, assim, num processo gerador de pesquisa formativa.

entre pares, ou seja, contribuem para a criação de disposições para que se considere estes saberes como expedientes práticos que não têm a dignidade epistemológica para acederem ao estatuto de saberes legítimos (1998: 10).

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5.3.1. A Formação Contínua: Como Via de Produção de Novas

Práticas

A terminologia de produção de novas práticas remete-nos, a um tempo, para a noção de intervenção e para uma perspectiva de construção do novo. Como diria Correia (1998: 1)

(...) remete-nos para a ideia de projecto construído numa dinâmica intrínseca, remete-nos para a ideia de produção do novo partindo do existente, ou seja, para um encadeamento original do existente.

A formação para a mudança e para a produção do novo implica, contudo novas atitudes, e o envolvimento e empenhamento de cada um na sua própria formação. Os indivíduos desenvolvem as suas aptidões, enriquecem os seus conhecimentos, melhoram as suas qualificações profissionais, fazem evoluir as suas atitudes ou o seu comportamento, reorganizam os seus valores na perspectiva de um desenvolvimento global equilibrado e independente, sempre em interação com o meio social a que pertencem. Como exemplo, podemos reler a discurso da educadora Ana:

Eu tive a sorte de receber e dar formação. Quando trabalhava naquele projecto, ia muitas verges a Lisboa fairer comunicações e também ouvia... Recebíamos muitos convites da Gulbenkian, da Agacan... Por ano ia mais ou menos a de% Formações (Ana, Anexo II).

Após esta fase, perdeu toda esta dinâmica a que estava habituada e sentiu necessidade de arranjar estratégias que lhe permitissem continuar numa rede de afinidades de perspectivas educacionais. Ingressou, por isso, na licenciatura em Ciências da Educação, como referimos anteriormente.

O mesmo se diga das educadoras Rute e Helena, que foram encontrando estratégias de crescimento profissional. Rute, por exemplo, diz-nos:

(...) eu ia a Espanha e aprendia outros métodos... trouxe... Eu modifiquei muito... mesmo eu quando tirei o curso, era mais...quer di%er, tinha que ser tudo no seu lugar... Hoje estou completamente diferente. Tem que haver regras, mas já não é com aquela rigide^... (Rute, Anexo II).

Noutro passo da entrevista, acrescenta:

(...) eu gosto de andar lá na escola, o que é bom eu acato, o que ê mau eu afasto... não tenho raspo de queixa... Quanto ao conhecimento delas (colegas) eu não me sinto menos, acho que tenho acompanhado bem as coisas... tenho feito formação contínua... (Ibidem-').

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Por seu lado, a educadora Helena, faz-nos saber que (...) quando acabei o curso a pedagogia por objectivos começou a cair em desuso, e ouvi falar na pedagogia de projecto e de situação e eu tinha

necessidade de saber como se trabalhava isso... efi%formação...(líele.na, Anexo II).

Podemos efectivamente 1er um crescimento, uma evolução nas atitudes e nos comportamentos, que nos ilustram a mudança de concepções. Há como que uma ruptura das formas de estar em educação, visíveis no antes e no depois da formação que as nossas entrevistadas realizaram.

Tudo isto nos sugere a ideia de que a formação para o desenvolvimento deve ter subjacente a necessidade de, se considerar

(...) toda a pessoa capa% de se transformar em agente de mudança, isto é, de melhor compreender o mundo (...) que a cerca e de agir sobre as estruturas onde vive modificando-as; de trazer a cada um a tomada de consciência do seu poder como agente actuante, de desenvolver seres autónomos no sentido de se situarem e compreenderem o ambiente que os rodeia, de o influenciar e de compreender o jogo relativo entre a evolução da sociedade e de si próprio (Schuartz, 1969: 69).

Neste sentido, faz-se apelo à autonomia da pessoa, reconhecendo-lhe um papel preponderante na apropriação de saberes imprescindíveis à compreensão de fenómenos que a rodeiam e à influência disso na transformação de si próprio e do seu contexto.

Após o cenário traçado, parece-nos que a formação destes profissionais não é um espaço de socialização sem actores, mas um espaço onde,

(...) cada um de nós éportador de normas, de valores, de maneiras de pensar, de agir ou de sentir; cada um de nós participa de forma consciente ou inconsciente(...), no exercício colectivo do controle social... (Lesne, 1997: 25).

Tendo em conta que o indivíduo é educado e socializado ao longo da vida, por via do contexto social a que pertence, ele é também um ser autónomo e criativo, com possibilidade de agência, isto é, com capacidade de produzir (trans)formação (Amiguinho, 1992). Nesta perspectiva, a formação passa a ser entendida como um

(...) processo fundamental capa^ de operar transformações que se pretendem introduzir nos sistemas e nos lugares institucionais onde decorre a acção dos indivíduos, visando optimizar os seus fins (Idem: 23).

Ter em conta o sujeito como actor social, por um lado, determinado, por um lado, por constrangimentos do mundo do trabalho e, por outro, como participativo e interventor na realidade profissional baseia-se numa lógica de construção de inovações pertinentes à singularidade de cada situação. Esta perspectiva de formação assenta sobre o

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desenvolvimento da capacidade das pessoas em proveito do desenvolvimento da comunidade onde se insere.