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Escolhas no trabalho de pesquisa

No documento marizaconceicaograssanolattari (páginas 33-39)

Quando tentei entrar em campo e começar a buscar aproximações com os jovens que eu queria conhecer, a partir de uma proposta etnográfica que me mobilizava, e seguir com a minha intenção de pesquisa, aconteceram fatos importantes para esta investigação. Fatos que me fizeram ver, logo no início, que eu teria que ter flexibilidade neste percurso, pois dele faz parte um campo complexo e nele estão os jovens, sujeitos e objetos desta pesquisa, com suas liberdades de escolhas. Foram circunstâncias que me fizeram perceber quando foi a hora de mudar as rotas e desviar, escolhendo outro destino, no caso, outro campo. Estes são um dos acontecimentos que discuto neste capítulo.

Preocupo-me, no campo, em tratar a problemática que desenvolvo da forma mais objetiva e coerente que posso. Reconheço a existência da minha presença nesta pesquisa, desde a escolha do objeto, passando pelos olhares, questionamentos e aprofundamentos que fui construindo. Tenho consciência de que faço escolhas em meio aos inúmeros caminhos que poderiam ter se tornado a realidade deste estudo. Diversas vezes em campo e ao analisar o material que obtinha, lembrava os cuidados que deveria ter ao olhar para ele, buscando as evidências mais relevantes que surgissem. Ciente dos limites que existem, tive preocupação em controlar minhas preferências e valores pessoais, desde o início.

Dialogo com a diversidade das visões e das percepções dos jovens envolvidos em suas práticas cotidianas. Meu interesse é aprofundá-las, acredito que elas têm sentido próprio e são articuladas a elaborações e a valores específicos que os pesquisados constroem. Sem desconsiderar, nesse diálogo, as minhas influências no material a ser analisado e as interpretações que realizo, que o diferencia de abordagens tradicionais em que possa haver a intenção de objetividade irrestrita. Em todas as etapas deste estudo, valorizo a objetividade, consciente de que as experiências dos jovens envolvem subjetividade e emoção, assim como minhas formas de analisá-las e descrevê-las.

Preocupo-me em manter o compromisso e a ética nas relações em campo; também o rigor quanto aos propósitos que tenho nesta investigação. Eles se mantêm, e se articulam à procura dos entendimentos das experiências que envolvem jovens que se organizam e se movimentam em grupos numerosos pelas ruas de Juiz de Fora. Práticas que a meu ver são significativas e acontecem de maneira particular.

Percebia aspectos relevantes que chamavam minha atenção na movimentação particular, pelas ruas da cidade, que grupos formados por um grande número de jovens rapazes realizavam. Minha atenção estava na maneira como esses sujeitos se relacionavam entre eles nos grupos e nos grupos entre si. Os questionamentos iniciais que fazem parte da visão e da problemática desses eventos se encontram detalhados na introdução desta tese. Na busca pelas experiências cotidianas, onde eu acreditava estarem contidos dados relevantes dessas manifestações, surgiram acontecimentos que originaram pontos importantes, que discuto neste capítulo. Alguns foram obtidos antes de eu entrar no campo em que se deu a pesquisa, portanto anteriores aos vínculos que construí com os jovens que concordaram em participar desta investigação.

Trato, neste capítulo, da descrição etnográfica a respeito das minhas tentativas e da entrada em campo para iniciar a pesquisa, de breves descrições sobre a cidade de Juiz de Fora e alguns de seus bairros, e de pressupostos teóricos e metodológicos que se articulam na forma como eu escolhi para pensar as questões juvenis problematizadas; sem, no entanto, adotar uma abordagem teórica específica. Dialogo com reflexões teóricas e metodológicas, escolhidas pelas compreensões que proporcionam, para o desenvolvimento do trabalho em campo e aprofundamento e enriquecimento das questões interpretativas a partir dele.

Junto à pesquisa de campo, frequentando o bairro e participando de conversas em pontos de encontro dos rapazes nas ruas e em algumas casas, utilizei também a técnica de trabalho com grupos focais. Aqui, priorizei discutir e aprofundar as questões que havia construído a partir, principalmente, de minhas observações dos grupos de rapazes nas ruas. Acreditei que a técnica, por ser em grupo e pela dinâmica de interações que estimula, favoreceria nossos primeiros encontros e nos aproximaria; isso de fato aconteceu, depois de alguns momentos de inibição entre nós, logo no início do primeiro encontro.

Desenvolvo uma pesquisa em que não me coloco como alguém de fora, imparcial, mas em um lugar que possibilita a interação com os informantes. Escolhi, inicialmente, os debates em grupo porque estes privilegiam o trabalho reflexivo dos sujeitos envolvidos na proposta, favorecendo a troca de opiniões e reflexões entre os informantes e o pesquisador. Após as análises dos dados obtidos nos encontros dos grupos focais, o material tendeu a evidenciar novos questionamentos para próximos encontros em grupo ou individuais. Estes são alguns dos motivos de usar a técnica, inicialmente, e que se relacionam às características priorizadas nesta pesquisa, que é a de buscar dados através das falas e das análises dos jovens e, através delas, podem expor as experiências e sentidos que elas contêm.

Organizei os grupos focais conforme suas características, que consistem na reunião de seis a doze pessoas que, a convite do pesquisador, discutem uma questão proposta, sendo mediada de forma cuidadosa por ele para que o foco não se perca. Ao pesquisador, nos momentos em que ele propõe um tema para o debate, cabe ainda a atenção constante para propiciar situações de interesse, favorecendo o acontecimento das conversas. Lembro outro cuidado que procurei ter, o de não centralizar as falas e as discussões; procurei me controlar e não falar demais.

A técnica dos grupos focais faz parte de escolhas metodológicas que se articulam às características das pesquisas de natureza qualitativa. A maneira particular como as procuras e as revelações em uma investigação é tratada nas abordagens qualitativas me interessam por se realizarem através de um trabalho reflexivo dos sujeitos envolvidos na proposta apresentada. Ao investigar as diferentes visões dos jovens quando utilizam os espaços urbanos na cidade, envolvo os aspectos sociais e culturais de suas vidas, que me interessa compreender. Procuro, trabalhando com a metodologia escolhida e o foco nos entendimentos das práticas sociais juvenis, seus sentidos, costumes e crenças; concentrando-me em relações intrinsecamente compartilhadas pelos jovens, envolvendo os grupos que particularizei anteriormente e vou apresentar em mais detalhes, neste capítulo.

Com essa abordagem, articulo-me a possibilidades reais e contextualizadas de explorar as vivências dos pesquisados. São características que me acompanham desde as observações iniciais, as formas de construí-las e apresentá-las como proposta de pesquisa. Retratam a minha maneira de olhar para o fenômeno e para os grupos juvenis que circulam pelas ruas de Juiz de Fora.

Este estudo tem como um dos seus objetivos o entendimento de experiências e vivências juvenis que ocorrem em diversos contextos sociais, culturais e geográficos, que são relacionados a partir do reconhecimento e da análise das vivências cotidianas dos pesquisados. Além disso, quer ampliar e dialogar com o conhecimento pela pesquisa qualitativa, que “renova o esforço para compor uma síntese das possibilidades de explorar a realidade e a vida social, eminentemente, complexas e em permanente evolução” (CHIZZOTTI, 2008, p. 14).

A pesquisa qualitativa torna-se a opção metodológica mais sinalizadora, apontando para um caminho que visa a proximidade, o conhecimento e a análise de um fenômeno visto no interior de seus acontecimentos, em suas especificidades, particularmente visibilizado através das manifestações dos jovens nas ruas de Juiz de Fora. As características particulares da pesquisa qualitativa auxiliam a compreensão e a análise de processos sociais cotidianos

pelas particularidades contidas neles a partir das experiências vividas pelos sujeitos envolvidos. Essas se articulam à visão proposta pelas pesquisas de natureza qualitativa ao considerar os sujeitos e, neste caso dos jovens, que estão, de forma significativa, realizando vivências sociais com usos e apropriações reais em suas práticas cotidianas.

Os métodos e as teorias utilizadas nas pesquisas qualitativas não se enquadram em relações definitivas, como as que se propõem a interligar as causas a seus efeitos, também não se aplicam generalizações. Busca adequar a diversidade das visões e das perspectivas dos sujeitos envolvidos em suas abordagens, sem desconsiderar a existência das visões do investigador no diálogo com a pesquisa. Diferencia-se de abordagens tradicionais que pensavam dar conta de uma objetividade absoluta. Rigor e objetividade são preocupações que fazem parte das pesquisas qualitativas e me preocupo em preservá-las, porém não traduzem nem a totalidade, nem a complexidade da experiência humana.

Há, de acordo com as particularidades de cada pesquisa, a possibilidade de se utilizar outras técnicas em um mesmo estudo, com flexibilidade e coerência, oportunizando ao pesquisador alternativas disponíveis capazes de se ajustarem à abrangência dos sujeitos e dos objetos investigados, assim como dos seus desdobramentos. Alternativas que possibilitaram a realização de dois encontros em grupo para as discussões nos grupos focais e, depois deles, entrevistas individuais, com 14 jovens, incluindo nelas os rapazes que participaram dos grupos focais. Obtive, pelas entrevistas, 39 áudios gravados pelo meu celular; todas as gravações se realizaram com a permissão dos jovens pesquisados. Como procedimentos nesta pesquisa também utilizei as inúmeras observações e conversas informais em campo, indo aos locais em que eles costumavam ficar, como na porta da igreja ou da “padoca” (como costumam se referir à padaria localizada em uma das esquinas do bairro), na porta da casa do K, do N ou do E. Vou tratar das técnicas de pesquisa que utilizei em uma seção específica deste capítulo.

Apresento, abaixo, imagens dos locais onde os rapazes costumam se reunir. Tirei diversas fotos do bairro junto com eles, não apenas com os que participaram deste estudo. Nestes passeios guiados pelos rapazes, ia se formando um grupo maior e mais diverso de jovens. Gostavam de me mostrar os locais do bairro que consideravam significativos para eles, como os que fizeram parte dos momentos da infância, dos jogos de futebol nas ruas ou no campinho. Foram momentos que me possibilitaram conhecer detalhes de suas vidas, do bairro, das ruas, das casas e dos moradores, como conhecer as casas que eles acreditam ser mal assombradas depois da morte de seus moradores. Eu sugeria que eles tirassem as fotos que fossem significativas para eles e passava meu celular para suas mãos. Íamos conversando,

tirando fotos e eles me explicavam suas relações com os lugares. Além das fotos a seguir, vou apresentar outras que tiramos juntos, no decorrer deste capítulo. A maior parte dos rapazes que aparecem nas fotos são os pesquisados. Alguns quiseram ficar junto aos espaços para que fossem fotografados.

Figura 1 – Ponto de encontro em uma rua do bairro.

Fonte: Mariza Conceição Grassano Lattari

Figura 2 – Porta da igreja.

Figura 3 – Visão central da igreja.

Fonte: Mariza Conceição Grassano Lattari

Figura 4 – Esquina usada para os jogos de futebol.

Figura 5 – Porta da “padoca”

Fonte: Mariza ConceiçãoGrassano Lattari

No documento marizaconceicaograssanolattari (páginas 33-39)