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Capítulo IV – RESULTADOS E PERCEPÇÕES DO PAPEL DA REVISTA CARTA NA ESCOLA NO ENSINO MÉDIO:

4.1. A percepção do professor sobre o uso da mídia na escola

4.1.1. O espaço da mídia no aprendizado formal

Durante a sessão do Grupo Focalcom os professores, foi pontuada a dificuldade dos alunos quando se pretende trabalhar leitura e interpretação de textos especificamente com a mídia impressa. Em lugar de enfrentar os problemas inerentes a este processo face aos múltiplos estímulos audiovisuais da sociedade contemporânea e motivar os alunos à leitura, os professores terminam optando pelo caminho mais fácil, recorrendo prioritariamente à mídia audiovisual que exige, aparentemente, dependendo da forma como é utilizada, menor esforço dos dois lados, de professores e alunos.

Em primeira instância nota-se o agravamento do problema, visto que a defasagem em leitura e interpretação é identificada, mas não superada. Interessante notar que os professores mostram dúvidas sobre o caminho pedagógico escolhido e o temor pela não execução da tarefa solicitada, abrindo mão de sua autoridade como docente e de sua

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convicção sobre o que é melhor para o aprendizado discente. Não se trata aqui, de condenar o uso dos recursos audiovisuais, mas, sobretudo de não abrir mão do recurso da leitura e da escrita, considerando os problemas apresentados nessas habilidades e competências, em todas as pesquisas nacionais e internacionais. Os depoimentos dos professores de História e de Biologia, abaixo, exemplificam esta situação (grifos meus).

“Mídia televisiva, ou mídia mais visual talvez chame até mais atenção

do que a mídia impressa. (...) Falta base de leitura e interpretação de

texto.” (prof. História)

“Eu uso vídeo projetor, trago filminho que tenha a ver com o assunto, enfim, o que der pra fazer, estamos lá! (...) Agora, eu sei que se o aluno

fosse ler, pesquisar seria melhor, mas ele vai fazer? Não. Não vai fazer.” (prof. Biologia)

Também pôde ser identificada, de acordo com a visão do professor, a alienação dos jovens quando o assunto circunda atualidades de cunho político-social. O docente aponta a fragilidade cultural de seus alunos – como se lê na fala do professor de História, logo abaixo - e, concomitante a isso, não se percebe proposta de intervenção, seja do professor ou da coordenação pedagógica a fim de oferecer outros percursos que apresentem os resultados necessários. Afinal, o papel da escola não seria exatamente o da busca permanente de novas formas e metodologias de ensino para garantir a aprendizagem? Qual seria a responsabilidade do professor no desinteresse dos alunos por temas contemporâneos?

“A maior parte da molecada está se lixando pro que está acontecendo lá (reportagem sobre o euro, na Europa). Ele não consegue estabelecer qual a relação que tem entre a crise na Europa e o que tá acontecendo aqui. Ele tá preocupado em saber o que aconteceu no Big Brother de hoje à noite do que saber se o governo da Grécia aprovou ou não o plano do pacote europeu.” (prof. História)

Quanto à importância do uso da mídia na escola, é perceptível, nas respostas, conceitos diferentes sobre a palavra “mídia”. Ao mesmo tempo em que os professores apresentam convicção quanto à relevância do uso da mídia em sala - não por reconhê-la como recurso pedagógico, mas “para poder ensinar”, para manter a disciplina – eles também apontam o potencial pedagógico da mídia para melhorar o entendimento do conteúdo, assim como elemento motivador da disciplina. Percebe-se, ainda, que o recurso do power point, amplamente utilizado na docência em geral para esta faixa etária funciona mais como efeito sonífero.... Nota-se, por esta dicotomia, que a mídia não é reconhecida – a

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princípio – como parceira e facilitadora do conhecimento, mas como utensílio em si mesma, conforme apontam as seguintes falas (grifos meus):

“A mídia, hoje em dia, faz tanto sucesso... Eu uso pra poder ensinar. Eu uso pra quê? Pra que o aluno consiga entender melhor o conteúdo que eu tento explicar.” (prof. Biologia)

“Pra eles se interessarem e entenderem. Por exemplo, eu passo um

vídeo. Eu uso pra eles esse recurso pra eles terem um melhor tipo de conhecimento, de usar o raciocínio.” (prof. Biologia)

“Usando o vídeo de 4 a 5 minutos, que é um tempo relativamente bem curto em relação à aula, o que eu faço, estrategicamente? Eu vou

pausando e aí eu vou inserindo o conteúdo que eu gostaria. Dá pra usar

até pelo menos durante uns 25 minutos. Mas, se eu jogar no Power Point que seja, dali a pouco um está cochilando, outro está olhando pro

lado...” (prof. Geografia)

Como discurso frequente - inclusive nos Índices de Desenvolvimento da Educação Básica (no IDEB de 2011, a média do Ensino Médio foi de 3,6)- nota-se, também nesta pesquisa, a preocupação dos professores em relação à dificuldade de seus alunos lerem e interpretarem com qualidade; igualmente percebe-se o discurso que aponta para a leitura da mídia impressa como relevante na formação do aluno; apesar deste reconhecimento, muitos professores escolhem o caminho mais fácil e investem nos vídeos e afins para “fisgarem” seus alunos em detrimento do uso da mídia impressa; talvez seja necessário um repensar sobre o equilíbrio entre ambas as ferramentas nos estímulos para uma aprendizagem mais significativa; será que tudo o que os alunos “pedem” como sendo o melhor veículo deve ser seguido, inquestionavelmente pelo seu professor?; não há lugar para todos os tipos de leitura em sala de aula, cada uma com seu perfil e sua intenção metodológica?

Um dos grandes desafios pedagógicos é justamente o de articular, de forma equilibrada, o conteúdo previsto pelos PCN’s tendo como complemento o uso dos múltiplos recursos da mídia, em seus diferentes suportes, para garantir o interesse do aluno e, ao mesmo tempo, o aprendizado, função secular da escola, dos professores, que não pode ser delegada a outros setores, sob o risco de perder sua função na sociedade - como explica o professor de Filosofia, integrante desta pesquisa. Mesmo observando o uso natural da mídia, principalmente a internet, é preciso persistir na busca do conhecimento autônomo, que exige esforço dos professores para melhorar a capacidade de concentração e de aprendizado do aluno. Esta tarefa, sem dúvida, é do professor (grifos meus).

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“Você percebe o padrão de relacionamento que o aluno tem com a mídia, principalmente com a mídia online. Eu li há algum tempo que a capacidade de concentração que alguns têm foi tão reduzida pelo padrão ALT-TAB e isso tá afetando. [...] Até sinto necessidade de que se use para que ele perceba que existe um desconforto em concentrar-se, focar a atenção. Mesmo numa imagem ou num vídeo, daqui a pouco aquilo já

entediou porque na aula não tem ALT-TAB.” (prof. Filosofia)

“Eu, semanalmente, separo um pequeno texto a partir de pré-seleções: tenho pedido que eles leiam, sublinhem, anotem nas margens as reflexões deles e isso tem despertado interesse a ponto de alguns alunos dizerem: “prof., pensei em fazer filosofia, heim?”; e tem sido muito bom quando eles voltam com a leitura feita pra sala de aula e a gente pode discutir. Eu penso que a leitura da mídia impressa deveria ser muito

mais valorizada. Eu tenho uma aula semanal apenas, mas tenho colocado

duas leituras por bimestre.” (prof. Filosofia)

Fica claro que a decisão sobre o uso do texto escrito como um dos recursos didáticos a ser mantido na escola está diretamente vinculado à crença do professor sobre sua importância e a própria seleção do texto que faz, como explica acima o professor de Filosofia. Educar é uma tarefa difícil. Seja em casa, com os filhos, seja na escola com os alunos, manter a persistência e a coerência exige esforço continuado e os resultados alcançados, geralmente positivos, deveriam ser um incentivo a essa prática docente.