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Meios de comunicação na escola: cultura ou consumo?

2)Projeto Escola Cidadã– (Amazônia)

3) Projeto Comunicação e Cultura – (Ceará)

2.2. Meios de comunicação na escola: cultura ou consumo?

Dentre as muitas iniciativas de incentivo ao uso dos meios de comunicação na escola, destaca-se o programa de motivação à leitura de jornais, promovido pela ANJ - Asssociação Nacional de Jornais – chamado de Programa Jornal e Educação. Contando com a chancela da UNESCO, a proposta é uma parceria entre a ANJ, o programa Todos pela Educação (do governo federal) e a empresa Norske Skog Pisa (única produtora de papel jornal no país) com o intuito de promover o hábito da leitura a formação do leitor crítico. Sobre seus parceiros, segue descrição abaixo, retirada do site da ANJ:

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Figura 6 - Projeto de motivação à leitura de jornais

Projeto que reúne representantes da sociedade civil, da iniciativa privada, organizações sociais, educadores e gestores públicos de Educação com o objetivo de unir esforços para garantir acesso à Educação Básica de qualidade. Seu objetivo é estender esta garantia a todos os brasileiros até 2022, ano do bicentenário da Independência do Brasil. Para isso, criou cinco metas às quais a ANJ dá seu apoio formal por meio do PJE.

Presente no Brasil desde 2000, a Norske Skog Pisa é a única produtora de papel jornal do país. A fábrica pertence ao grupo norueguês Norske Skog, líder global na fabricação de papel para publicações e segundo maior produtor de papel imprensa do mundo. A unidade brasileira está localizada em Jaguariaíva, no Paraná, fornecendo para cerca de 30% do mercado nacional de publicações. Reconhecido pela excelente capacidade de impressão, o papel da Norske Skog Pisa é produzido a partir de florestas plantadas, obtidas por meio de manejo florestal responsável. Desde 2007, a empresa tem sua cadeia de custódia certificada pelo Conselho de Manejo Florestal – FSC.

Fonte: http://www.anj.org.br/jornaleeducacao/parceiros (acesso em 05/07/2012)

Curiosas participações: governo federal e a única empresa privada produtora de papel de jornal no país. Parece que ambas têm interesses claros e convergentes ao apoiarem esta proposta: ao unirem-se à Associação Nacional de Jornais a favor do estímulo à leitura crítica, colocam sobre as mãos dos participantes (lê-se aqui alunos e professores) uma única fonte de informação – o jornal. Quase que uma hegemonia da informação. Ainda sobre este programa, em novembro de 2011, a ANJ descreve o seguinte:

Figura 7 – Sobre o programa de leitura da ANJ

Sobre o Programa

Programas de leitura conquistam novos leitores e estimulam cidadania.

Dentre os associados da ANJ, muitos já criaram programas que levam jornais a escolas, bibliotecas e outras instituições culturais e educativas com o intuito de formar novos leitores e cidadãos mais críticos, contribuindo para que se revertam os baixos índices de leitura e democratizando o acesso a informações do cotidiano, para que cada um possa se posicionar sobre elas e fazer suas escolhas em prol de uma sociedade melhor.

Recente pesquisa feita ao conjunto das empresas associadas revela que, mesmo entre aquelas que ainda não criaram seus próprios programas de leitura e educação, há uma preocupação na aproximação com as escolas, seus alunos e professores. Assim é que verificou-se, por exemplo, que

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é bastante comum a publicação de suplementos infantis e juvenis (até mesmo com conselho editorial formado por adolescentes/ jovens/ crianças); a doação de exemplares a escolas; o recebimento de alunos em visita à empresa; a realização de concursos; a publicação de cadernos (dedicados ao vestibular ou à educação); a orientação a escolas na criação de seus jornais escolares ou mesmo a realização de palestras em instituições de ensino e a busca de parcerias com universidades locais.

Atualmente (Nov/2011) existem 45 Programas de Jornal e Educação, sendo dois de jornais não associados. E as empresas que os desenvolvem estão satisfeitas com os resultados que vêm obtendo com o seu desenvolvimento. Durante 15 anos, até 2009, todos os anos um novo programa era lançado.

Quanto ao tipo de público a que atendem, a realidade constatada é bastante diferenciada e demonstra que cada associado vem encontrando formas originais e criativas de promover suas ações na formação do leitor/cidadão do futuro.

Em 2008, o quadro de atendimento proporcionado pelos Programas de Jornal e Educação era de um alcance bastante significativo. Os números abaixo são aproximados:

Escolas Atendidas - 6.800

Alunos atendidos - 1milhão e 800 mil Professores atendidos - 67.500

Fonte: http://www.anj.org.br/jornaleeducacao/institucional (acesso em 05/07/2012)

Mais uma questão curisosa é o investimento em publicações infantis e infanto- juvenis, visando a formação crítica leitora desde cedo. Talvez possa haver um outro olhar sobre a proposta: a intenção é formar leitores ou consumidores? Constam, abaixo, depoimentos de escolas, professores e alunos participantes do projeto Jornal na Escola que podem elucidar a questão formulada anteriormente:

Figura 8 – Depoimentos sobre o programa Jornal na Escola - ANJ

Escolas

Escola Municipal Professor Orestes Guimarães – Joinville Diretora: Zilvete de Miranda Gonçalves

“A participação dos alunos no AN Escola contribui consideravelmente no projeto de incentivo à leitura e, além de leitores, os alunos tornam-se ‘escritores’”. Os professores são imprescindíveis nesse processo, pois oportunizam e motivam a participação. Os certificados de participação são entregues num momento solene, na sessão cívica realizada na escola, com a presença de todos os alunos e professores.

Inúmeros trabalhos foram divulgados o que deixa a escola e os pais dos alunos felizes, despertando o desejo de sempre participar.A qualidade do jornal e dos trabalhos divulgados é de alto nível. “Enfim, é um projeto que dá excelentes resultados.”

EEB Hélio Lentz Puerta - Bom Jesus Diretora: Euriudes Marmentini

“Os professores utilizam o jornal de forma multidisciplinar trabalhando em forma de projetos. Aqui na escola tem o cantinho do jornal onde os alunos fazem a leitura e com isso tem melhorado a escrita através da leitura. A nossa escola é distante e os alunos só tem acesso ao jornal na escola, para eles é muito importante, pois eles se interessam pela atualidade. Os pais ficaram emocionados

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com a publicação dos trabalhos no jornal. Os alunos ficaram muito felizes. Esperamos que ano que vem continue o projeto, porque é muito importante.”

Professores

Nilma S. de Melo Estrai - Professora da EBM Professora Antonia Gasino de Freitas – Barra Velha

“Diante da realidade do nosso país o NA Escola é o nosso principal incentivador para ampliação de nossas atividades escolares e como forma de debate”. Todos aguardam com ansiedade as edições para verem os trabalhos e o próximo tema. É interessante destacar que um meio de comunicação do nosso Estado se preocupe com projetos educacionais, atuando como patrocinador de idéias e divulgador das mesmas. Obrigada aos profissionais deste jornal pela idéia de ajudar os educadores na árdua tarefa de trazer beleza e criatividade para dentro da sala de aula

Eliane Maria Trevisan Cassol - Professora: EEB Hélio Lentz Puerta

“O jornal veio a somar como mais um recurso pedagógico”. Os professores elaboram o projeto e utilizam o jornal como recurso, como fonte de pesquisa e informação. O jornal coloca o aluno em contato com o dia a dia, com a atualidade. É um registro diário da realidade, é a nossa história, da política, do mundo. O jornal é um instrumento complementar na educação.

A publicação dos trabalhos veio a somar. Os alunos se empenham para trabalhar. “É um incentivo a mais.”

Estudantes

Laís Aline Grossel (7ª série “1”)

“Eu fiquei muito feliz pelo meu desenho ter saído no suplemento AN Escola, pois o que eu queria era transmitir as informações que adquiri nas aulas sobre “Os Tropeiros”, para o conhecimento de outras pessoas”. Assim elas também tiveram a oportunidade de descobrir a importância dos tropeiros no desenvolvimento de nossa região.

Essa é uma forma de valorizar todos os costumes e tradições que eles nos deixaram.

Andréia Aparecida de Paula - EEB Hélio Lentz Puerta

“Desde o começo o trabalho foi ótimo. No dia que a gente soube que o trabalho foi publicado no jornal valeu à pena, valeu o esforço. A gente se esforçou bastante. Minha tia quer fazer um quadro com o certificado que a gente recebeu pra guardar de lembrança. Eu gostaria de ter sempre trabalhos com o jornal.”

Fonte:http://www.anj.org.br/jornaleeducacao/programas/depoimentos/an-escola-sc/ (acesso em 05/07/2012)

Nos depoimentos acima nota-se que são reiteradas as expressões ligadas à supervalorização do jornal como instrumento de divulgação e menos como veículo que fomenta o questionamento e a leitura crítica. Reiterando esta ideia lê-se: “O jornal veio a somar como mais um recurso”; “Os professores elaboram o projeto e utilizam o jornal como recurso”; “Minha tia quer fazer um quadro com o certificado que a gente recebeu”; “Todos aguardam com ansiedade as edições”; “Os pais ficam emocionados com a publicação dos trabalhos no jornal”. Tais declarações proporcionam discussões relativas ao papel do uso da mídia na escola: ela está sendo usada como um elemento cultural, propagadora de ideias e críticas ou como divulgadora do consumo, seja ele ideológico ou mercantilista?

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Segundo a jornalista e pesquisadora Graça Caldas (2006, p.5), os próprios “incentivadores” da leitura crítica apontam dados contraditórios quando o assunto são os resultados da implementação da mídia na escola:

Embora os objetivos educativos anunciados pelas empresas na pesquisa da ANJ sejam legítimos, na prática, a avaliação dos próprios responsáveis pelos respectivos programas indica que os resultados mais favoráveis (61%) estão concentrados na formação de novos leitores, no conhecimento do aluno sobre o processo de produção dos jornais (74%), na aproximação da escola das questões do cotidiano (76%) e na contribuição para que o aluno conheça melhor o mundo em que vive (60%), além de contribuir, também, para o exercício da cidadania (57%). Em contrapartida, a promoção do incentivo à leitura é baixa (24%), assim como favorece pouco a criação do jornal escolar (28%).

Corroborando esta ideia, o texto publicado no capítulo 5 do livro Media and Cultural Regulation5, por Hall (1997, p.4) diz que

Hoje, a mídia sustenta os circuitos globais de trocas econômicas dos quais depende todo o movimento mundial de informação, conhecimento, capital, investimento, produção de bens, comércio de matéria prima e marketing de produtos e ideias (p.2). [...] Por bem ou por mal, a cultura é agora um dos elementos mais dinâmicos — e mais imprevisíveis — da mudança histórica no novo milênio. Não deve nos surpreender, então, que as lutas pelo poder sejam, crescentemente, simbólicas e discursivas, ao invés de tomar, simplesmente, uma forma física e compulsiva, e que as próprias políticas assumam progressivamente a feição de uma política cultural.

Parece que a cultura e o poder, portanto, mesclam-se na atualidade por causa da relevância e vulnerabilidade de ambos. É necessário saber, no entanto, qual o papel da escola e da mídia na produção cultural e política deste contexto. E sobre isso tratará o próximo subtópico.