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Essa palavra é usada aqui enquanto sentido de englobar diversidades.

No documento S: F AZER ES TE ATR AIS EM BR AS ÍLIA (páginas 113-116)

Com Hugo Rodas

6 Essa palavra é usada aqui enquanto sentido de englobar diversidades.

e a uma central de poder de comandos políticos.

Diante de várias possibilidades de interpretações visuais para essa cidade, contidas nas falas de Hugo, creio que ele não tenha sido enlaçado diretamente e linearmente pelas sinuosas linhas geográficas de Brasília. Em minha avaliação, ele foi envolvido pela provocação contida na jovem cidade que se mostrava aos seus olhos, mas que também a provocou, ao mesmo tempo, naquela época e hoje, como um lugar propício a conceber e realizar criações ousadas. São poucos os trechos que vêm ao encontro desta minha interpretação, mas sua qualidade significativa é expressiva na fala abaixo:

Naquela época, eu era meio intransigente com Brasília. Eu dizia “Argh!!!! Pra que balé clássico nesta cidade? Pra que lutar pelo balé clássico, quando não se precisa? Não se precisa! O balé clássico está morrendo em outros lugares, e por que diabos estamos tentando manter um balé clássico, aqui? Brasília precisa é de uma orquestra de rock, de cinqüenta músicos juntos, ou sei lá o quê”. Eu era intransigente desse jeito... porque eu achava que Brasília era uma cidade moderna que não precisava de velhos. Nem de costumes velhos. Como se fosse uma tribo nova. Eu achava... e havia muita gente que pensava isso, na época. Sei que é muito doido, mas a gente pensava isso mesmo. (...) E agora (...) eu estou na terceira idade, não é?!

Depois de trinta e um anos estando aqui, digo que a linguagem que a gente trabalhava era de uma modernidade e de uma liberdade que não se perdeu em nada. Não se perdeu nenhuma característica. (...) Era uma característica de se tentar colocar em um cotidiano que permitisse a todos “reflexionar”. Desenvolvendo um trabalho onde sempre me permita “reflexionar”, (...) sobre o que eu realmente necessito para ser um homem feliz. Eu e todos mais.

Essa parte do tratamento dispensado ao que se chama de velho, abordada por uma temporalidade homogeneizante e progressivamente linear foi interpretada no início deste capítulo. No entanto, nesse trecho, é possível também evidenciar o fato dessa Brasília de Hugo ser atribuída de um espaço propício para extravasar criações de dança e de teatro. Isso porque se, por lado, tenho, até o momento, verticalizado e adensado as questões acerca de temporalidades contidas nas falas de Hugo, por outro, necessito horizontalizar as que abordam sentidos de espacialidade, pois, essa, também, é um dos pontos que se evidenciou ao longo de nosso encontro. Para ele, Brasília é um lugar feito para ‘desenvolver uma linguagem de modernidade e de liberdade’, talvez, aqui, liberdade possa ser entendida como um lugar que não se tenha que pensar só em dinheiro e/ou de poder permitir o exercício de ‘reflexionar’ suas idéias, suas experiências acumuladas, suas inquietações artísticas e suas leituras. Leituras essas bem ao estilo dos

Tenho livros marcantes na vida... tenho Walt Whitman... Total. “Canto a Mim Mesmo”, do Walt Whitman... eu passei doze, treze, quatorze anos com esse livro ao lado da minha cama e Herman Hesse também, com aquele Demian... era outro que estava ao lado da minha cama sempre. E... isso define bastante coisas em mim, não?! Eu lia muito Sartre, quando era criança. Quando eu tinha 14 anos. Eu lia muito Sartre. Lia Whitman que era o meu preferido. E lia... bom, eu lia todos os espanhóis, Garcia Lorca e todos esses. Mas (...) André Gide foi um cara que me pirou totalmente. (...) André Gide é um escritor francês que tem um livro que se chama “O Imoralista” que, pra mim, foi absolutamente marcante. Marcante. Marcante. (...) Ah... Não me lembro mais direito da história, mas fala sobre uma conduta que eu tento manter até os dias de hoje. Entendeu? Assim, como, apesar de ser como você é, como você se retrata. (...) Como você pode contornar a sua própria história pra não virar um burocrata de qualquer coisa. Um burocrata do amor, do trabalho, da fé, de qualquer coisa. Ainda mais em uma época dessa em que só se pensa em dinheiro...

Quem já leu essas obras citadas ou pelo menos alguns trechos produzidos por esses autores marcantes na vida de Rodas, consegue perceber uma relação entre eles e a força dos trabalhos criados por este uruguaio radicado em Brasília. Diante dessa força criativa e original, Hugo se sente à vontade para afirmar:

Evidentemente você não poderá falar nunca em teatro de Brasília, sem falar de mim. Essa é a única realidade. Sobretudo porque a metade das pessoas que estão nessa cidade, nessa área, trabalharam comigo e sabem quem eu sou. E isso não é uma coisa que eu tenha ganhado pela fama dos jornais, não, isso se ganha pelo próprio trabalho mesmo. É pelo trabalho!

Eis aqui um ponto que reforça minha interpretação em relação a ambigüidade de Hugo em querer fazer parte do passado enquanto status de uma história singular que trata dessa cidade- capital, apesar de querer mostrar-se num tempo presente cheio de sentido de inovação e de dizer mais de uma vez que não costuma se avaliar.

Quando pedi a Hugo que ele se auto-avaliasse mais especificamente, para assim então entender o motivo pelo qual ele se considera chave nesse processo de fazeres teatrais em Brasília, ele me respondeu que não se avaliava e sim que os outros faziam isso por ele, afinal, eu estar sentada frente a ele, entrevistando-o, naquele dia, era uma comprovação, não havia sido ele o autor da análise que me havia estimulado ir à sua casa, mas sim a avaliação de outras pessoas. Mas tanto

mesmo se legitima em alguns momentos usando respaldo de matérias de jornais e prêmios recebidos.

De fato o currículo7 de Hugo chama atenção e sua experiência cênica é destacada por outros

colegas artistas em Brasília e fora dela - inclusive, tendo virado tema de um documentário de Bündchen (2005) e Simon (2005), quando ainda estudantes resolveram fazer como trabalho final do curso de jornalismo, na UnB, o documentário “Palco dos Sonhos – Na companhia de Hugo Rodas”, angulando em suas câmeras boa parte de trabalhos realizados por Hugo, depoimentos de pessoas que trabalharam e/ou conviveram ao seu lado e outros aspectos biográficos que indicam o modo como esse artista gosta de se mostrar, levar a vida e criar suas produções.

No áudio e/ou nas imagens gravadas em nosso encontro, pode-se notar uma entrevista cheia de risos, de colocações fortes, bem humoradas e críticas que ele mesmo faz diante de sua própria história, de situações que o cercam e até mesmo de algumas indagações de meu roteiro, as quais respondia, muitas vezes, impaciente. Advérbios de intensidade e superlativos são presenças constantes e essenciais na linguagem de Hugo que, se por um lado, chama a atenção por seu portunhol (ou um particular dialeto, muitas vezes difíceis de se entender na primeira vez, que chega a ser denominado de huguês, por alguns amigos brincalhões), por outro, remete, a quem escuta, entonações vibrantes de suas palavras, a forma como ele se apresenta ao mundo. Um mundo amplo e diverso, inicialmente, construído em sua unidade familiar que, segundo ele mesmo, era bem especial:

Minha família é muito louca, nesse sentido das artes. São todos italianos, também. (...) A família do meu pai é muito pequena, digamos. (...) Meu avô foi casado duas vezes. Então, existe outra família - que inclusive gostaria que fossem meus parentes, porque eles têm vinhedos em Mendonça,com um vinho que se chama Rodas (risos). Mas isso eu acho que foi do primeiro casamento, segundo contam as histórias de família, que seria do primeiro casamento do meu avô. Um pessoal que a gente nunca se tratou.

Meu avô era o Ramon. Igual ao do meu pai, Rosalro Rodas; eu, Renato Rodas e meu avô, Ramon Rodas. Divertido isso... eu nunca tinha

No documento S: F AZER ES TE ATR AIS EM BR AS ÍLIA (páginas 113-116)