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NUDESE/FURG

2. Corrida para o último peixe: uma análise da dominância do capital na pesca capital na pesca

2.2 Histórico e situação atual da pesca no Brasil

2.2.1 O estado e a pesca no Brasil

Segundo a Constituição do Brasil, cabe ao poder público e à coletividade zelar pela proteção ambiental, sendo que ao primeiro é atribuída a tarefa de administrar o processo de interação sociedade-natureza (BRASIL, 1988), evitando que interesses de setores empresariais com maior correlação de forças no âmbito econômico e político coloque em risco a qualidade de vida da população.

O poder público assume o papel de mediador nos diferentes usos e apropriações dos recursos ambientais, em que se salientam as tarefas de estabelecer padrões de qualidade ambiental, avaliar impactos ambientais, licenciar e fiscalizar atividades potencialmente poluidoras, disciplinar a ocupação do território, promover a educação ambiental, dentre outras (QUINTAS, 2005).

A Educação Ambiental, enquanto participante do quadro jurídico do país, sob a Lei no 9795/1999, regulamentada pelo Decreto nº 4.281, de 25 de junho de 2002, constitui-se como prática política e emancipatória e busca uma nova forma de relação homem-sociedade-natureza.

No presente estudo, conforme comentamos anteriormente, inserimos a proposição crítica da (e na) Educação Ambiental por compreendermos que assim estarão sendo problematizadas as formas de apropriação dos recursos naturais. Desse modo, o conhecimento é tido como uma construção social, realizado historicamente,

sem neutralidade, atendendo a diferentes interesses no tecido social e marcado por profundo desequilíbrio entre poder e saber.

Justificamos tais pressupostos por entender que a situação de desequilíbrio ecológico do planeta está vinculada a uma racionalidade reducionista e mecanicista, apoiada em um sistema de apropriação que extrapola o campo econômico, partindo para uma relação conflituosa no uso e uso-fruto dos recursos ambientais. As relações de poder existentes nesse embate contribuem para a privatização dos lucros e socialização dos prejuízos.

O Brasil, ao participar ativamente do processo de globalização e da proposta neoliberal apontada pelo Consenso de Washington, no início da década de 1990, percorre caminhos delimitados na busca incessante de crescimento econômico. O pretexto da geração de empregos e renda desconsidera os efeitos do aumento do consumo, assim como da desigualdade social existente e suas causas.

O Estado é o mediador dos interesses difusos (e conflitantes) da sociedade e, para tanto, orienta, através de regulamentações, os trâmites legais a serem seguidos pelas partes interessadas na resolução dos mesmos.

O início da intervenção do estado brasileiro na pesca se deu com a criação das colônias de pescadores como estratégia de controle da região fronteiriça e da costa, a partir de 1919. As colônias existem até hoje e são reconhecidas como representantes legais dos pescadores. O vínculo obrigatório dos pescadores com a colônia acabou somente com a Constituição de 1988, embora seja comum, até mesmo na região deste estudo, o uso delas para interesses meramente políticos. Conforme observa Abdallah (2005), durante grande parte da história, as colônias representaram palco de manobras eleitorais, com a ocorrência de intervenções diretas e distanciamento dos interesses reais dos pescadores.

Entre 1933 e 1938, foi instituído o Conselho Nacional de Pesca, o qual deu origem ao Código de Pesca, que a definiu e caracterizou o seu exercício nos diferentes meios aquáticos e considerou os pescadores como profissionais e merecedores de apoio legal.

A partir de 1938, a pesca passou a ser considerada uma atividade de caráter econômico, já com razoável estrutura, tanto física quanto legal. A partir daí, modificações foram introduzidas na lei básica. Entrepostos de pesca foram criados, assim como sistemas de créditos e serviços de amparo à saúde do pescador.

Com o surgimento da Pastoral da Pesca, em 1968, descortinou-se uma relação diferenciada, em que os pescadores iniciaram um processo de reivindicação pelos seus direitos, entre os quais, a aposentadoria e, mais recentemente, o seguro-desemprego. Esse último é também conhecido como seguro-defeso, por ser um benefício pago aos pescadores que paralisam suas atividades em períodos de defeso, o qual, por sua vez, visa à manutenção da vida no ambiente aquático.

Mesmo assim, a categoria de pescadores artesanais convive com injustiças históricas, segundo nos ensina Souza:

a história da pesca no Brasil demonstra o descaso com essa prática geradora de renda e que engloba uma boa parte das populações ribeirinhas marginalizadas ao longo dos anos. Mudanças culturais e tecnológicas ocorreram durante o desenvolvimento dessa atividade, sem alterar as relações básicas de trabalho e produção. (SOUZA, 2005, p. 12).

Nossa percepção a esse respeito é a de que o ensino formal, no país, é ausente para as referidas populações, que vivem no limiar de sua sobrevivência, conduzidas à marginalização por processos econômicos estruturados a partir de uma lógica individualista, que pouco ou nada contribui para o desenvolvimento humano. Um ensino que se esconde na estrutura da organização social pretensamente ‘equilibrada’ do capitalismo, quando, na realidade, o que sentimos é um completo desequilíbrio. Por isso, a Educação Ambiental como a que defendemos, a partir de sua posição crítica e alicerçada na teoria marxista, cujo intuito é o de reconstituir o sentido (enquanto percepção) da totalidade dos fenômenos, em suas relações internas e com o exterior, representa uma transformação no modo de fazer pedagógico que erroneamente entende o ser humano como passivo e passível de ser adestrado pela organização produtiva preponderante e, no caso, dos pescadores artesanais, relegados à condição de fornecedores de matérias-primas para o setor industrial/capitalista. Isto é, desconsidera a ontologia do ser humano, ao negá-lo como sujeito histórico e da práxis.

Retornando ao que vínhamos comentando acerca da história da pesca no país, em 1961, foi criado o Conselho de Desenvolvimento da Pesca (CODEPE), com o objetivo de alavancar o setor pesqueiro. Em 1962, é criada a Superintendência de Desenvolvimento da Pesca (SUDEPE), a partir da fusão de três órgãos: Divisão de Caça e Pesca, Caixa de Crédito da Pesca, ambos vinculados ao Ministério da Agricultura, e o CODEPE (DIAS NETO, 2002).

Com a criação da SUDEPE, iniciou-se uma nova fase na administração da pesca no país, definindo os rumos a serem tomados a partir de uma proposta desenvolvimentista, que parte do estado, e alicerçada na industrialização forçada desse setor. O que motivou a entrada, no setor pesqueiro, de empresários (capitalistas) que antes não possuíam qualquer vínculo com a atividade de pesca e cujo objetivo era o lucro máximo e imediato, passando a ser essa a lógica dominante na pesca, praticada sem uma regulamentação que pudesse frear o processo de exploração desordenada dos recursos pesqueiros que, ao contrário, se amplia com a promulgação, pela SUDEPE, do Decreto-Lei no 221/67. Esse Decreto, portanto, concede forte impulso à atividade pesqueira brasileira, ao instituir o programa nacional de incentivo à pesca.

Os principais objetivos do programa citado era de aumentar a produção de pescado, fortalecer o setor pesqueiro nacional, ampliar os postos de trabalho e melhorar as condições dos pescadores artesanais (DIAS NETO e DORNELLES, 1996).

Cabem algumas considerações relativas aos objetivos traçados pela SUDEPE, até mesmo porque percebemos que, passado quase meio século dos incentivos ao setor pesqueiro provenientes do Decreto-Lei no 221/67, ainda impera no país o desenvolvimentismo nacional/capitalista sob a administração do MPA.

A maior parte dos incentivos concedidos foi destinada à atividade de pesca em si, à industrialização de camarões voltada ao mercado externo e à captura de peixes demersais, através da frota de barcos que realizam a modalidade de pesca de arrasto, aumentando consideravelmente o número de embarcações e fábricas ao longo da costa brasileira.

Segundo Abdallah (1998), o volume empregado via incentivos fiscais foi de R$ 1.015,8 milhões (valor de agosto de 1994), investidos em sua maioria entre os anos de 1967 e 1973, sendo que a região sul do Brasil captou aproximadamente 25% do volume total do crédito concedido ao setor pesqueiro.

A região sul do país se destacou devido às condições naturais propícias à realização da pesca, além da existência de centros consumidores de importância e da acumulação de capital, o que possibilitou o surgimento, na região, de uma pesca empresarial-capitalista (DIEGUES, 2004).

Os resultados alcançados com a política de incentivos fiscais à pesca no país não foram satisfatórios, devido a fatores relacionados tanto à captação de recursos por empresários não vinculados à pesca, quanto à inadequação do aumento do esforço de pesca e das estruturas industriais de beneficiamento de pescado a capacidade de suporte

dos cardumes de pescado, o que levou à sobrepesca. Por exemplo, quando a sobrepesca causou a redução dos cardumes de camarão na região sudeste-sul do país, diminuindo a rentabilidade das empresas capitalistas aí instaladas, essas empresas se mudaram para a região norte, implantando aí um novo parque industrial para explorar os recursos pesqueiros marinhos.

Eis a forma como o capital se apresenta: não existe pátria ou qualquer vínculo cultural com o local, e sim (e apenas) o compromisso com o rendimento de seus proprietários ou acionistas, o que poderíamos traduzir como alta mobilidade e adaptação do capital às alterações no mercado. Esperar que um sistema que possui essa forma de agir tenha considerações éticas para com a natureza ou para com os trabalhadores envolvidos é, no mínimo, uma ingenuidade, pois como bem denuncia Diegues (2004, p. 106), “o limite da exploração de um cardume aparece somente quando o lucro médio já não é mais realizado, o que significa frequentemente a destruição completa ou parcial dos estoques”.

Os recursos captados com o sistema de crédito vinculado ao Decreto-Lei nº 221/67 contribuíram para a sobre-exploração de diferentes espécies de pescado. Conforme ressalta Dias Neto (2002), a intenção do governo de criar um setor pesqueiro forte acabou gerando, na prática, conflitos entre os pescadores artesanais e industriais. Isso porque os incentivos dessa política pública se destinaram majoritariamente ao setor industrial, o qual ampliou bastante o volume pescado de algumas espécies, contribuindo para uma diminuição da possibilidade de capturas pelos pescadores artesanais.

A sobrepesca trouxe consequências a todo o setor pesqueiro, mas o artesanal em particular se viu diante de uma queda expressiva na quantidade capturada, o que influenciou diretamente na sua sobrevivência, pelo maior nível de dependência que possui da pesca. Quanto aos conflitos gerados entre essas duas modalidades de pesca, a industrial/capitalista e a artesanal/familiar, conflitos que se acirraram com os incentivos do referido Decreto, assim comenta Diegues:

[A pesca artesanal] passou a sofrer as pressões da pesca empresarial-capitalista, cujos barcos pescavam em regiões interditadas, dentro de baías e estuários, causando uma enorme devastação de recursos pesqueiros, representado sobretudo pela “fauna acompanhante” (trash fish) do camarão, jogada no mar. Inúmeros conflitos se verificaram entre as duas formas de organização da produção. Além disso, o uso crescente dos ecossistemas litorâneos e costeiros, para a implantação de pólos químicos, petroquímicos, minerometalúrgicos, levou à poluição dos estuários, como o empobrecimento biológico dos recursos tradicionalmente capturados pela pesca artesanal. A especulação imobiliária, expulsando os pescadores

artesanais de suas praias, algumas vezes de maneira violenta, contribuiu para uma desorganização social crescente e para um empobrecimento ainda maior das comunidades dos pequenos produtores litorâneos. (DIEGUES, 2004, p. 131-132 [inserção nossa]).

Portanto, a coexistência entre formas de organização social de produção na pesca, como a empresarial-capitalista e a artesanal-familiar, é uma ‘coexistência pacificada’ pela dependência que possuem uma da outra. A primeira absorve o objeto de trabalho da segunda enquanto excedentes de sua produção, transformando-os em sua matéria-prima e, por isso, se apropria, também, do trabalho do pescador artesanal. A esse último, já historicamente inserido numa prática de trabalho cujo objetivo é o próprio sustento, ao transformar seu objeto em alimento, mas também como objeto com valor de troca, que mediará sua compra de outros produtos no mercado, caracteriza uma relação de dependência, mas cabe salientar, com dominância do setor empresarial-capitalista sobre o artesanal-familiar e isso, devido, dentre outros motivos, à já comentada mobilidade e adaptabilidade do capital, que pode até mesmo mudar o investimento para outros setores de produção, caso a pesca já não lhe seja rentável. O custo de oportunidade de manter seus investimentos em capital fixo é quem define a continuidade ou não do capital em determinado setor de produção.

Os incentivos do estado a partir do Decreto-Lei nº 221/1967, o qual objetivava a formação de parque industrial pesqueiro, não se preocuparam em dimensionar essas estruturas industriais à disponibilidade da natureza como fornecedora do pescado enquanto matéria-prima. Isso fez nascer uma indústria fadada ao fracasso, com 40% de falência entre as quase 131 empresas capitalistas que receberam incentivos fiscais com o referido Decreto (DIEGUES, 1983).

Segundo Morales et al. (1976) apud Diegues (1983, p. 140), os erros mais comuns dessa política de incentivo à criação de uma forte indústria capitalista na pesca foram:

Inversões consideráveis em fábricas de processamento, sem se saber da existência da matéria-prima. O resultado é que, em 1976, as empresas de enlatamento funcionavam com 72% da capacidade ociosa no Rio Grande do Sul, 87% em Santa Catarina, 44% no Rio de Janeiro. A utilização das instalações de congelamento não ultrapassa os 20% em São Paulo, Rio Grande do Sul e Santa Catarina;

Desequilíbrio nas inversões: entre 1967 e 1972, cerca de 51% dos investimentos foram canalizados para a industrialização, 29% para a captura, 13% para a administração, e somente 7% para a comercialização, onde se situa um dos pontos de estrangulamento do setor pesqueiro;

Captura seletiva de espécies de alto valor no mercado internacional, o que levou à rápida predação dos recursos naturais. A destruição contínua de espécies marinhas, situadas num nível intermediário da cadeia alimentar, poderia ter causado a escassez alimentar para outras espécies que dela se alimentavam.

Outras considerações à promoção de um setor pesqueiro industrial, através dos incentivos fiscais, foram assim proferidas por Dias Neto e Marrul Filho:

A tentativa de se modernizar a pesca, iniciada no final da década de 60 e que se estende até o início dos anos 80, estava atrelada ao modelo econômico vigente, concentrador de capital, exportador, superdimensionado, tecnologicamente intensivo e ecologicamente predador. O capital estatal, via incentivos fiscais e creditícios, teve, neste processo, enorme papel e importância. A aplicação deste modelo para o setor pesqueiro no Brasil enfrentou rapidamente sérios problemas relacionados com a sustentabilidade dos recursos explotados. (DIAS NETO e MARRUL FILHO, 2003, p. 21).

Podemos salientar ainda que foram poucas as espécies de pescado que receberam o foco das pescarias com os incentivos do Decreto-Lei nº 221/1967, com destaque para o camarão, muito apreciado no mercado externo, espécie que entrou em declínio rapidamente, haja vista o esforço de pesca a ela destinado.

As espécies de menor valor comercial pescadas no sul abasteciam os mercados do norte e nordeste do país, enquanto parte do que era pescado nessas regiões, quando não era exportado, abastecia o maior poder de consumo do mercado do sudeste. Os pescadores artesanais praticamente foram esquecidos na política em questão, ficando apenas com 12% dos valores concedidos via subsídios (DIEGUES, 1983).

Nesse período, a exploração se deu para além dos recursos pesqueiros, mas também sobre a categoria de pescadores embarcados na pesca industrial, atingindo indiretamente os pescadores artesanais (devido ao decréscimo nas suas capturas). Além disso, continuou privilegiando os capitais comerciais, que monopolizavam a compra do pescado nos portos pesqueiros do país, revendendo-o com grandes lucros.

O choque do petróleo (1973) e a consequente alta desse importante insumo para as pescarias, somados à proibição da pesca, promovida pelos governos da Argentina e do Uruguai, para embarcações brasileiras em suas zonas costeiras, fizeram com que as empresas de pesca ampliassem a compra da produção dos pescadores artesanais. Fato que estimulou, principalmente, a pesca de camarão, conduzindo a uma intensificação da mesma, com consequência para os ambientes estuarinos, locais das capturas dos pescadores artesanais.

A depredação desses ambientes, ocasionada também pela atividade de pesca artesanal, ao atender a demanda das empresas, contribuiu para a pauperização dos pescadores artesanais, que sentiram a degradação de seus locais de trabalho.

A desestruturação dessa política de incentivos, na década de 1980, com as poucas empresas que restaram, levou a uma nova configuração na comercialização do pescado, com maior nível de concentração de compra e, por conseguinte, de poder de barganha, por parte das (poucas) empresas restantes.

Os incentivos fiscais promovidos com o Decreto-Lei nº 221/1967 não contribuíram eficazmente para um aumento na produção total de pescado no país, visto que a taxa de crescimento anual da produção pesqueira no Brasil, entre 1967-1977, foi de 5,4% ao ano, sendo que no decênio anterior (portanto, antes do Decreto), foi maior: 7,7% ao ano.

A crise no setor pesqueiro brasileiro representa uma consequência da ideologia dominante do estado, unido aos empresários da pesca, pois como defendem Dias Neto e Marrul Filho36,

o Estado posiciona-se, face ao conflito, de maneira claramente favorável aos empresários capitalistas, seja se omitindo de uma clara luta entre dois segmentos diferentes e antagônicos, seja colocando as prioridades econômicas acima dos conflitos de classe, reforçando a dominação dos empresários sobre os pequenos produtores. (DIAS NETO e MARRUL FILHO, 2003, p. 14).

Para finalizar e contribuir com a análise crítica elaborada pelos pesquisadores recém-nominados, quanto ao Decreto-Lei nº 221/1967, o qual identifica o forte empenho do estado brasileiro em desenvolver o setor pesqueiro no país, elaboramos a seguir nossa interpretação relativa aos quatro objetivos principais, elencados nesse Decreto: a) aumentar a produção de pescado; b) ampliar os postos de trabalho; c) fortalecer o setor pesqueiro nacional; d) melhorar as condições dos pescadores artesanais.

Quanto ao primeiro objetivo, qual seja, o de aumentar a produção de pescado no país, percebemos que ela está ligada diretamente ao (des)cuidado com a natureza, no sentido de sua “reprodução” ou mesmo da “reconstituição de seu manancial de peixe”. Em 1967, começa a destruição da natureza nos mares e costa brasileira como política

36 Cabe salientar que os dois pesquisadores em questão pertencem ao quadro de trabalhadores do IBAMA, portanto, do estado, ao qual dirigem sua crítica. Fato que evidencia a dificuldade de mudar a estrutura atual do estado, pois o poder político é subserviente ao poder do capital.

pública – não ambiental – em defesa da produção, não de alimentos para a população, mas com vistas ao lucro, à competição, à concentração da riqueza, quando resultou na ampliação da industrialização de peixes e crustáceos, visando ao mercado exterior.

Em contraposição ao incentivo de cooperativas de cunho autogestionário, o plano, por limitar-se ao aumento do número de embarcações e fábricas – provavelmente tais embarcações sejam propriedades dessas mesmas fábricas – não teve resultados satisfatórios, mostrando-nos que a classe proprietária, a classe burguesa, no Brasil, conforme afirma Florestan Fernandes (1976), na obra “Revolução burguesa no Brasil”, está sempre de joelhos, pedindo dinheiro ao governo central para manter seu pseudo

status de produtora de bens de consumo popular ou para a população.

Pensar o cooperativismo, segundo constava no interior da proposta de apoio aos pescadores artesanais (como destacado no quarto objetivo), pensando no lucro, no monopólio e na concentração de renda, é uma contradição muito forte, que anula qualquer política pública com interesse social.

Portanto, a SUDEPE, enquanto órgão público, não atendeu ao público, mas sim ao capital e suas individualidades, haja vista que a industrialização de produtos nobres (como é o caso do camarão) visava à exportação, materializando a possibilidade de o país arcar com seus compromissos vinculados ao pagamento da dívida externa. Além disso, os objetivos desse Decreto eram carregados de proteção financeira ao empreendedor, com garantias somente para a expansão do capital empregado.

O segundo objetivo que constava no Decreto, qual seja, de ampliar os postos de trabalho, se retiramos o fundo social da proposta, aparece (ou transparece) nele, a perpétua ação do modelo capitalista de produção.

Na compreensão de Marx, com a qual concordamos, o proprietário já tem garantido os recursos – salários – a serem pagos aos trabalhadores, antes mesmo que produzam a mais-valia. Essa mais-valia representa o dinheiro para a compra de novas mercadorias – força de trabalho.

Logo, o objetivo de ampliar os postos de trabalho não significa melhorar as condições de trabalho do ‘pescador’, mas atrelá-lo a um patrão, que possui a propriedade dos meios de trabalho subsidiados pelo dinheiro público e legitimados por essa política pública. Novamente assistimos ao Estado protegendo o ‘Capital’ e o ‘Capitalista’, dando-lhes as condições materiais e legais (via concessão de empréstimos) para explorar o pescador – trabalhador social –, cujos recursos públicos reificado como

(recurso) privado, fortalecem o poder dos que se privilegiam do acesso a tais benesses, como os incentivos do Decreto-Lei nº 221/97.

Quanto ao terceiro objetivo do Decreto em pauta, relativo ao fortalecimento do setor pesqueiro nacional, entendemos que também ratifica a proteção do estado, que é burguês, à classe que o originou. O fortalecimento do setor não previu a formação de coletivos para uma produção comunitária, no sentido de favorecer pequenos projetos familiares ou de grupos sociais – moradores da costa brasileira, para organizarem-se em