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ESTADO SOB A ÉGIDE DA RACIONALIDADE E DA BUROCRACIA

4 TEORIA DE ESTADO

4.3 ESTADO SOB A ÉGIDE DA RACIONALIDADE E DA BUROCRACIA

A partir desta seção, o Estado será estudado sob as diversas formas administrativas empreendidas ao longo do tempo, tendo como pano de fundo as revoluções tecnológicas, sociais, políticas e econômicas que determinaram os rumos da administração pública.

A Modernidade foi marcada pela ruptura dos regimes monárquico e absolutista e pelo desenvolvimento do Estado-nação e suas instituições constituintes. Este tipo de Estado é conhecido pela adoção de práticas burocráticas em que as origens podem remontar à Igreja Católica Romana e à organização militar.

O Estado absolutista era caracterizado pela administração da riqueza de acordo com a vontade do soberano. O aparato do Estado era usado como uma extensão da propriedade do soberano. O patrimonialismo era a forma dominante nas relações entre Estado e sociedade. Isso contribuiu para práticas de nepotismo e corrupção. Contudo, o patrimonialismo tornou-se obsoleto diante da expansão do capitalismo, da influência da economia nas decisões políticas e da separação dos papéis do mercado, Estado e sociedade civil ao longo do século XIX. Todavia, nos países latinos americanos, as práticas do patrimonialismo e clientelismo ainda persistem no sistema político.

O Estado liberal surge como oposição ao absolutismo e foi inspirado por algumas ideias oriundas do movimento Iluminista. Os pensadores como Locke,

Montesquieu, Rousseau e Tocqueville tiveram grande influência na concepção do novo Estado e na oposição à autoridade dos reis e em favor do direito da cidadania. Naquele período, surge a ideia de uma nova relação, um novo contrato, onde o cidadão é membro do Estado-nação dotado de direitos e obrigações.

O Estado liberal criou parlamentos, editou constituições e estabeleceu leis e direitos civis. As ideias de Max Weber acerca da legitimação do mando por meio do aparato legal ganharam adeptos. A racionalidade e autoridade legal podem ser empregadas em qualquer instituição com características similares. Burocracia é a forma de organização baseada na racionalidade para adequar os meios aos objetivos e assegurar o máximo de eficiência no serviço público, porém, às vezes, a burocracia é uma organização que se pensa instituição6, como um fim em si mesmo.

A burocracia também foi adotada como uma estratégia para impedir a apropriação dos meios da administração por interesses individuais. Para combater, pois, as práticas de patrimonialismo, clientelismo, nepotismo, oportunismo e corrupção, foram empregados normas, regulamentos, especialização e diferenciação, controle sobre a alocação e utilização de recursos por objetivos e a hierarquia como meio para estruturar a tomada de decisão de acordo com as atribuições dos cargos.

Porém, a literatura demonstra que a burocracia não foi empregada da mesma forma nos países que a adotaram. Silberman (1993) usa dois argumentos para explicar por que os Estados burocráticos tomam formas particulares de racionalização diferentes das idealizadas por Max Weber. A racionalização profissional é caracterizada pela alocação de habilidades, informação e regulações sobre os indivíduos por meio do processo de treinamento profissional. A organizacional é caracterizada pelo controle e supervisão organizacional, alocação de informação e controle sobre seu uso. Devido à ênfase no controle da informação, as organizações criaram setores específicos para tratar de tal finalidade.

Silberman (1993) analisou temas relacionados ao desenvolvimento dos Estados por meio de duas variáveis: sucessão política em ambientes de alta / baixa incerteza, e a responsabilização da liderança política que é delimitada pela natureza

6Para Costa (1997), instituição é um conjunto de práticas coletivas e sociais finalizadas com suas

normas e regras. E cada instituição tem suas formas de organização, sem as quais não poderia exercer suas práticas. Por exemplo: cada escola tem sua organização escolar. Embora este trabalho adote esta distinção, ocorrerá ainda o uso do termo “organização” no sentido de instituição em citações diretas e indiretas em respeito às ideias originais dos autores utilizados e que não fazem esse tipo de distinção conceitual em seus trabalhos.

da organização da qual participa (rede social / estrutura de partido). A escolha do tipo de racionalização é constrangida pelo contexto histórico, político e social e transversalmente recortada pelo poder de cada ator no processo de disputa de sucessão eleitoral. O estudo revelou ainda que a burocratização racional é uma consequência da escolha estratégica feita por aqueles que detêm o poder em ambientes de alta ou baixa incerteza na sucessão política.

As explicações sobre qual tipo de burocracia foi adotada por diferentes países emergem de recorrentes temas que, em alguma medida, limitam ou guiam a decisão (SILBERMAN, 1993), tais como:

1) falhas no sistema de coordenação recursos e conflitos;

2) incerteza relativa à disponibilidade ou adequada alocação de recursos, legitimação de autoridade, custos de transação, ambiente organizacional, estabilidade organizacional, gestão de poder ou status;

3) racionalidade limitada causada por indisponibilidade de informação ou pela capacidade de procurar a melhor solução dentre todas;

4) internalização do processo pelo qual a burocratização ocorre.

O desenvolvimento em larga escala da organização burocrática racional é entendido como uma resposta à necessidade de administração e aos custos de atividades executadas sem coordenação.

Silberman (1993) vincula a incerteza ambiental ao período de mudança de liderança na qual a organização não tem regras específicas que rejam a sucessão da liderança ou tais regras apenas vão aparecendo de acordo com as circunstâncias. Diante dessas situações, a racionalidade limitada do indivíduo leva-o a procurar manter seu “poder e status recorrendo à utilização de regras de tomada de decisão que são apresentadas como objetivas, isto é, decorrentes da organização e não da necessidade pessoal” (SILBERMAN, 1993, p. 21). Essas regras pressupõem hierarquia, obediência, definição de papéis e conhecimento apropriado para a tomada de decisão. O conceito de expertise é visto quase como uma “ideologia na qual os tomadores de decisão clamam por obediência devido ao seu conhecimento sistemático sobre a organização e os meios para atingir os objetivos” (SILBERMAN, 1993, p. 21).

Sob a perspectiva econômica, a racionalidade limitada refere-se às formas como os tomadores de decisão procuram superar o alto custo de transação gerado pela informação imperfeita, a inabilidade de escrever contratos que abranjam todas

as contingências e a tendência de alguns indivíduos em usarem a malícia para perseguir seus próprios interesses. O estudo de Silberman (1993) sintetiza como as “gaiolas” da razão são criadas para justificar o emprego da racionalidade para organizar o mundo.

Em suma, embora a burocracia tenha sido entendida como uma sistemática e apropriada resposta para a administração do Estado, a sua adoção tem caráter político, ou seja, é perpassada por intenções daqueles que detêm o poder em suas mãos. Para Althusser (1985), o aparato ideológico do Estado é um instrumento que assegura os interesses da classe dominante. Esse viés da sociologia marxista evidencia a interdependência entre o Estado, sua administração e os objetivos dos governantes.

O papel da informação na burocracia, cujo objetivo era tornar eficiente a máquina pública, servia para alimentar e controlar os processos de compra de materiais e a sua devida distribuição, a arrecadação tributária, planejamento e uma tentativa de prestação de serviços ao cidadão com mais eficiência.

4.4 ESTADO DO BEM-ESTAR: A RACIONALIZAÇÃO BUROCRÁTICA PARA