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BIBLIOTECA PEDAGÓGICA DE SÍLVIO ROMERO

ESTADOS UNIDOS

Endowment - Washington 1

ARGENTINA

banco Cangallo, 559 URUGUAI

Talleres Graficos A. Barreiro y Ramos Calle Bartolome Mitre, 1467 Montevidéu 2 CUBA

Manoel Ruiz S. Enca. Imprenta Y Papelerie Havana 1

Nota-se que as editoras francesas com maior número de edições foram a Germer

Bailliére e a Félix Alcan, ambas de Paris. A primeira editou 19 textos e a segunda 12. È importante lembrar que nos livros da Félix Alcan aparece a informação de que se tratava da

Ancienne Librairie Germer Baillière et Cie. Então podemos afirmar que a Germer Baillière/

Félix Alcan foi responsável pela publicação de 21 textos da referida biblioteca, que corresponde a 33% das edições estrangeiras.

A Germer Baillière foi fundada em 1863 por Gustave Germer Baillière. A casa editorial era dirigida por Félix Alcan que, depois de algum tempo, tornou-se sócio de Baillière. Funcionava na Rue de L’Ecole de Medecine, nº 17. Com o falecimento de Gustave Germer Baillière o empreendimento passou para os cuidados de J. B. Baillière. Além de novo dono, a editora ganhou novo endereço, passou a funcionar na Rue Hautefeuille, n º19. Em 1882, o herdeiro vendeu a editora para Félix Alcan, que deu seu nome ao estabelecimento. A casa editorial passou a funcionar no Boulevard Saint-Germain, nº 175, endereço das principais editoras francesas - Hachette e Garnier. Uma das características da Germer Baillière/ Félix

Alcan era a edição de obras científicas. Publicava revistas como Revue des cours littéraires,

Revue des cours scientifiques, Revue philosophique e Revue historique e coleções como

Bibliotheque Scientifique Contemporaine, Bibliotheque d'Histoire Contemporaine,

Bibliotheque de Philosophie e Contemporaine, Bibliotheque Scientifique Internationale210. Uma das missões da Germer Baillière/ Félix Alcan era atender a sede de ciência dos leitores franceses e estrangeiros.

Conforme Chartier, para fazer uma História dos Impressos é preciso mais do que traçar um perfil dos impressos, mas analisar a materialidade dos textos. Para ele, o texto não existe em si mesmo, independente de qualquer materialidade, não há texto fora do suporte no

210 TESNIÈRE, Valérie. Le Quadrige: un siècle d’édition universitaire (1860-1968). Disponivel em: <http://h-

france.net/vol3reviews/keating.html>. Acesso em: 28/08/2005.

qual ele está inscrito, não há compreensão de um texto que não dependa das formas nas quais ele chega ao leitor. Cada suporte, cada forma, cada estrutura da transmissão da escrita interferem na construção do sentido.

Ao longo da história os textos tiveram vários suportes: o rolo, o códice e a tela. Chartier defende que ao mudar o suporte do texto o entendimento também é modificado. Por essa razão ao estudar o impresso é preciso estar atento às particularidades do seu suporte. Eles estão inscritos em códices, objetos compostos de folhas dobradas certo número de vezes, o que determina o formato do livro, da revista ou do jornal. O uso do códice permite uma maior aproximação entre o leitor e o texto. Ele pode colocá-lo diante de si sobre uma mesa, virar suas páginas ou então segurá-lo quando o formato é menor e cabe nas suas mãos.211

Os impressos assumem também diversas formas. Na sua construção os produtores lançam mão de diversos dispositivos formais para definir o público que irá consumi-lo e garantir uma determinada leitura. Por essa razão, faz-se necessário analisar a materialidade dos textos da BPSR, compreender as especificidades do suporte e os dispositivos formais empregados tanto pelas editoras estrangeiras quanto pelas editoras nacionais.

Uma das estratégias empregadas pelos editores foi a das coleções. Roger Chartier definiu as coleções como impressos com a função de atender um público amplo212. Elas surgiram no século dezessete, mas se proliferaram no século dezenove. Ao idealizá-las os produtores de impressos possuem como objetivos; baratear o custo de produção, uma vez que adotam um padrão único, e oferecer livros atraentes e diferenciados para o leitor. As principais estratégias dos responsáveis pela coleção são: selecionar autores e textos que possam interessar ao leitor visado e criar um aparelho crítico que visa apoiar a leitura e controlá-la. A intenção é que ao adquirirem a obra os leitores confiem na qualidade da seleção operada pelo editor.213 Na biblioteca em questão, existem livros da coleção Bibliothèque de

211

CHARTIER, Roger. A aventura do livro: do leitor ao navegador. São Paulo: Editora UNESP, 1998, p. 14,

212 CHARTIER, Roger e MARTIN, Jean. Histoire de l’édition française. Le temps des éditeurs. Du romantisme

à la Belle Époque. Paris: Promodis, 1990, p. 78. Tomo 3.

213 Cf. OLIVERO, Isabelle. L’invention de la collection: de la diffusion de la littérature et des savoirs à la

formation du citoyen au XIXe siècle. Paris: Éditions de L’IMEC, 1999. (Collection In Octavo) ; TOLEDO, Maria Rita de Almeida. Coleção Atualidades Pedagógicas: do projeto político ao editorial (1931-1981). Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2001.

Philosophie Contemporaine e da Collection historique des grands philosophes da Germer Baillière, da Biliothéque Philosophique Contemporaine da Félix Alcan, da Collection

d’auteur étrangers contemporains de Guillaumin et Cie., da Bibliothèque de Philosophie

Scientifique da Ernest Flammarion214, da Bibliothèque de Sciences Contemporaines da C. Reinwald & C215, da Bibliothéque de l’enseignement dês beaux arts publiée da Maison Quantin C. e Ensino Agrícola Propaganda Popular de uma editora desconhecida do Rio de Janeiro.

Nos livros que integram as coleções há páginas extras no fim do volume com propaganda das outras obras da coleção ou de outras coleções das casas editoriais. A Germer

Baillière, a Félix Alcan, Ernest Flammarion e a Guillaumin et Cie tinham essa prática. Através desse mecanismo visavam conquistar o leitor, fazer com que se interessasse pelos demais volumes. No caso do intelectual sergipano pode-se afirmar que essa estratégia obteve êxito, pois Sílvio possuía em seu acervo diversos títulos pertencentes a uma mesma coleção. Mantinha, por exemplo, diversas obras da Bibliothéque Philosophique Contemporaine da

Félix Alcan216.

Uma outra estratégia empregada pelos editores foi a apresentação de informações sobre os autores. Era comum os editores colocarem logo abaixo do nome do autor, na folha de rosto, ou no verso desta, informações como a faculdade ou instituto de pesquisa nos quais trabalhavam. Ao apresentar o currículo dos autores as editoras visavam obter a confiança do leitor. Apostavam que ao ler tais créditos eles ficariam convencidos de que estariam tendo

214 LE BON, Gustave. Psychologie de l'education. Paris: Ernest Flamarion Editeur, 1902. (Bibliothèque de

Philosophie Sientifique); JAMES, William. Philosophie de l’expérience. Paris: Ernest Flammarion, 1910. (Bibliothèque de Philosophie Sientifique).

215 HAECKEL, Ernest. Origine de l'home. Paris: C. Reinwald & Cie., [S.d.]. (Bibliothèque de Sciences

Contemporaines) ; HUXLEY, Th. H. Leçons de physiologie élementaire. Paris: C. Reinwald & Cie., 1869. (Bibliothèque de Sciences Contemporaines); LETOURNEAU, Charles. La Biologie. Paris: C. Reinwald & Cie., 1877. (Bibliothèque de Sciences Contemporaines); LETOURNEAU, Charles. La Biologie. 12 ed. Paris: C. Reinwald & Cie., 1882. (Bibliothèque de Sciences Contemporaines).

216 SPENCER, Herbert. Principes de psychologie. Paris: Félix Alcan, 1874. (Bibliothéque Philosophique

Contemporaine); RIBOT, Th. La psychologie allemande contemporaine: école experimentale. Paris: Félix Alcan, 1885. (Bibliothéque Philosophique Contemporaine); SPENCER, Herbert. Classification des sciences. Paris: Félix Alcan, 1888. (Bibliothéque Philosophique Contemporaine); SPENCER, Herbert. L'individu contra l'Etat. Paris: Felix Alcan, 1885. (Bibliothéque Philosophique Contemporaine) ; SPENCER, Herbert. De l'education intellectuelle, morale et physique. Paris: Felix Alcan, 1894. (Bibliothéque Philosophique Contemporaine); NORDAU, Max. Psycho-physiologie du génie et du talent. Paris: Félix Alcan, 1897. (Bibliothéque Philosophique Contemporaine).

Acessado a representações autorizadas. 43 das obras da Biblioteca Pedagógica de Sílvio

Romero trazem esse tipo de dispositivo.

O editor francês Gustave Germer Baillière pôs a seguinte informação numa de suas obras:

PIERRE SICILIANI

Professeur de Philosophie Théorique et Chargé du Cours d'Antropologie et

de Pedagogie a l'Université de Bologne217

Um editor brasileiro Evaristo Costa apresentou o seguinte currículo de dois dos seus autores:

A. Ennes de Souza é lente catedrático de metalurgia da Escola Politécnica do Rio de Janeiro. Doutor em Sciencias Físicas e Naturais pela 2ª sessão da Faculdade de Filosofia da Universidade de Zurich (Suissa), engenheiro de Minas, (especialidade metalurgica) pela Real Academia de Minas de Freiberg, na Saxônia, geologo examinado pelos professores Dr. Albert Heim e Dr. C. Mayer da Escola Politechnica Federal Suissa, antigo aluno da Faculdade de Sciencias e da Escola Pratica de Altos Estudos de Paris, membro efetivo das sociedades suissas de Sciencias Naturais e de Chimica em Zurich e correspondente da Sociedade Alemã de Química em Berlim A. J. de Sampaio

Lente substituto interino do curso de artes e manufaturas da Escola Politécnica do Rio de Janeiro. Doutor em Sciências Fisicas e Naturais pela 2ª sessão da Faculdade de Filosofia da Universidade de Zurich, chimico techinico examinado e certificado pela Escola Polytechnica Federal Suissa, com o exame de madureza pela Escola Industrial de Winterthur (Suissa), membro correspondente da Sociedade Alemã de Chimica de Berlim e

efetivo da Sociedade Suissa de Chimica em Zurich.218

217 SICILIANI, Pierre. Prolégomènes de la psychogénie moderne. Paris: Germer Baillière et Cie., 1880.

(Collection historique des grands philosophes)

218 SOUZA, A. Ennes de & SAMPAIO, A. J. de. Reforma da Escola Politécnica do Rio de Janeiro. Rio de

Além de informações sobre os autores, muitos editores forneciam informações acerca dos tradutores. Por intermédio desse dispositivo objetivavam assegurar ao leitor que a tradução era confiável, fiel ao original. J. B. Baillière et fils utilizou esse estratagema:

Ed. Carrière

Lauréat de l'Institut (Academie des Sciences)219

Outros editores optaram por colocar informações sobre outras obras do autor e dos tradutores. Essa estratégia era semelhante à adotada no interior das coleções, visava atrair o leitor, fazê-lo comprar outras obras publicadas por eles caso gostasse das idéias do autor e da tradução. Félix Alcan costumava fazer isso:

OUVRAGES DE M. HERBERT SPENCER TRADUITS EM FRANÇAIS Le premier principes

Classification des sciences La science sociale

Principes de physicologie Ouvrages non traduits

Education intellectual, moral and physical Social statics

Essays scientifics, political and speculative The principes of Biology

Ouvrages du traducteur M. Th.Ribot La psychologie anglaise contemporaine L'Herédité

La Philosophie de Schopenhauer220

219 PARISE, J. H. Réveillé. Physiologie et hygiène des hommes livrés aux travaux de l'espirit ou recherches

sur le phsique et le moral, les habitudes, les maladies et le régime des gens de lettres, artistes, savants, hommes d'État, jurisconsultes, administrateurs. Paris: J. B. Bailliére et fils, 1881.

220 SPENCER, Herbert. Principes de Psychologie. Paris: Félix Alcan, 1874. (Bibliothéque Philosophique

Contemporaine).

Sílvio às vezes se deixava seduzir pelas obras anunciadas, assinalava-as com sinal de adição ou asterisco e, em seguida, tratava de adquiri-las. Várias obras marcadas por ele com lápis preto ou colorido integram o seu acervo.

Para atrair os leitores, os editores, com a ajuda de outros produtores como os ilustradores, procuravam embelezar as obras. Era comum o uso de vinhetas, ornatos tipográficos com motivos geométricos, polimórficos, zoomórficos e antropomórficos. Na

BPSR constam 58 obras com vinhetas. Dentre elas predominam as polimórficas (48), seguida das geométricas (16), das antropomórficas (3) e das zoomóficas (2). Um outro ornato utilizado era a primeira letra do capítulo estilizada. Mas apenas quatro obras da referida biblioteca possuem esse ornato. Também poucas obras apresentam fotografias: apenas 18.

Os editores também se preocupavam com a legibilidade do texto oferecido. Na maioria dos volumes foram utilizados caracteres simples como o romano, que pertence à família de tipo redondo que se distingue pela variação na espessura dos traços no desenho da letra e pela existência de remates ou serifas. Os editores sabiam que caracteres mais elaborados forçam a atenção dos leitores, distraindo-os e irritando-os, fazendo-os abandonar a leitura.

Os responsáveis pelas casas editoriais também estavam atentos ao tamanho das letras. Tinham conhecimento de que quanto maior a fonte mais legível o texto. Mas era necessário avaliar duas variáveis: legibilidade e custo. Como o público visado era o erudito, que possuía habilidade para ler qualquer tamanho, preferindo, contudo, tamanhos maiores para efetuar uma leitura mais rápida condizente com seu status de homem de letras, os editores optaram por adotar corpo regular, oscilando entre 10 e 12. Na BPSR existem 98 obras com corpo 10, 41 com corpo 11 e 22 com corpo 12.

O entrelinhamento também foi alvo de preocupação dos editores, uma vez que é imprescindível para assegurar a legibilidade do texto. As entrelinhas permitem que os leitores descansem os olhos entre uma linha e outra. Neste sentido, os editores empregaram entrelinhamentos que oscilaram entre 3 a 4 pontos tipográficos do corpo adotado.

Além dos caracteres, do corpo e do entrelinhamento, os editores estiveram atentos às margens, a porção do papel que fica em branco entre a parte impressa e as extremidades da folha. As margens também possibilitam que os leitores descansem a visão. As margens

adotadas pelos editores da BPSR são irregulares. A menor é a medianiz e vai aumentando na seguinte ordem: margem superior, margem dianteira e margem inferior. As obras de luxo, que são poucas, possuem margens mais amplas, oscilam entre 3 e 5 cm. Já as edições mais simples, mais numerosas, possuem margens maiores, oscilam entre 1 e 2,5 cm. No entanto, essas conclusões não são definitivas, visto que muitos impressos tiveram as margens reduzidas durante a encadernação que sofreram ao serem incorporadas ao acervo da Biblioteca Pública Epifânio Dória.221

Mas os editores não lançaram mão de estratégias apenas para vender livros, mas para conformar leituras. Para isso construíram aparelhos críticos destinados a controlar a apropriação dos leitores. Na BPSR há vários desses dispositivos. Há 52 prefácios, 3 notas do tradutor, 48 notas explicativas, 31 notas de referência, 35 obras com resumos recapitulativos, 11 índices remissivos, 77 índices analíticos, 12 bibliografias comentadas, 12 apêndices e 24 anexos. Esses aparelhos críticos procuraram conduzir as leituras, fazer o leitor aceitar as representações elaboradas pelos produtores, mas nem sempre essas estratégias lograram o êxito desejado.

Utilizando a liberdade leitora subverteu o sentido desejado ou imposto pelos produtores. Segundo Chartier “os textos só existem se houver um leitor para lhe dar um significado”. Em outras palavras: “o texto é atualizado a cada leitura” 222.

Porém, o que se quis evidenciar nesse capítulo é que a liberdade leitora não é arbitrária:

contra a representação elaborada pela literatura e retomada pela mais quantitativa das histórias do livro – segundo a qual o texto existe em si mesmo, isolado de toda a materialidade deve-se lembrar que não há texto fora do suporte que o dá a ler (ou ouvir), e sublinhar o fato de que não existe

221 As informações acerca das especificidades das artes gráficas foram obtidas em: PORTA, Frederico.

Dicionário de Artes Gráficas. Rio de Janeiro; Porto Alegre; São Paulo: Globo, 1958.

222

CHARTIER, Roger, Comunidades de leitores. In: ______. A ordem dos livros: leitores, autores e bibliotecas na Europa entre os séculos XIV e XVIII. Brasília: Editora da UNB, 1998.

a compreensão de um texto, qualquer que ele seja, que não dependa das

formas através das quais ele atinge o seu leitor223.

Ao estudar o modo como os leitores se apropriam dos textos e constróem representações do mundo social, devemos estar atentos aos dispositivos empregados pelos produtores para moldar as leituras.

223 CHARTIER, Roger, Comunidades de leitores. In: A ordem dos livros: leitores, autores e bibliotecas na

CAPÍTULO III

No documento As leituras pedagógicas de Sílvio Romero (páginas 95-104)