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3. A Unidade de Ensino

3.4. Estratégias de ensino

As estratégias de ensino adotadas na lecionação desta unidade tiveram em conta não só os objetivos estabelecidos pelos documentos curriculares, como também o objetivo do estudo desenvolvido com base na intervenção, a importância da Geometria para a aprendizagem dos alunos e as suas dificuldades, quer ao nível da argumentação, quer ao nível da unidade de ensino tratada.

O programa de Matemática do ensino básico dá enfoque às capacidades de comunicação e argumentação matemática, no âmbito da Geometria, enfatizando a formulação de conjeturas e a necessidade de justificação a posteriori (MEC, 2013a). Deste modo, é necessário que se criem oportunidades para os alunos elaborarem raciocínios dedutivos, que constituem o elemento estruturante, por excelência, do conhecimento matemático (Oliveira, 2002).

O programa sugere, igualmente, que os alunos sejam incentivados a expor as suas ideias e a comentar as afirmações dos colegas e do professor, e redijam as suas respostas usando linguagem matemática, apoiando-se em argumentos matemáticos válidos e fundamentando o seu raciocínio. Fundamentalmente, pretende-se estimular, junto dos alunos, a justificação matemática das suas asserções, em todas as atividades que estes realizarem – sejam elas problemas, tarefas de investigação ou exploração – devendo o professor criar, em sala de aula, momentos em que os alunos utilizem de forma adequada, consistente e progressiva, a notação, simbologia e vocabulário específico da Geometria (MEC, 2013a).

No mesmo sentido, o NCTM (2009) recomenda que o professor: (a) resista ao impulso de indicar estratégias de resolução para as mais variadas tarefas; (b) recorra ao questionamento, promovendo o aprofundamento da situação a ser estudada, com questões do tipo “como sabes que a tua conjetura funciona?”, “experimentaste de outra forma?”; (c) dê destaque a explicações exemplificativas e conduza os alunos à reflexão

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da sua eficiência; (d) estabeleça, em sala de aula, um ambiente no qual os alunos se sintam confortáveis para a partilha e crítica de argumentos. Estas ideias são igualmente salientadas na literatura. Por exemplo, Boavida (2005) defende:

O discurso desejável numa aula com uma cultura de argumentação envolve a apresentação, pelos alunos, de argumentos em defesa das suas ideias, a análise crítica de contribuições dos colegas, a discussão da legitimidade matemática de cadeias de raciocínio, a expressão de desacordos quando existem e sua resolução, a fundamentação de posições com argumentos de carácter matemático, a avaliação de se é, ou não, apropriado usar um determinado raciocínio na resolução de um problema, a formulação de conjeturas e a avaliação da plausibilidade e/ou validade destas conjeturas. (p. 96-97)

Tendo em conta o descrito, e o objetivo deste estudo, as aulas foram dinamizadas de acordo com as três fases seguintes: (a) apresentação das tarefas a realizar; (b) trabalho autónomo desenvolvido pelos alunos; (c) discussão e síntese dos resultados (Canavarro, 2011; Stein, Engel, Smith & Hughes,2008), com enfoque nos argumentos e contra-argumentos produzidos pelos alunos.

Durante a apresentação das tarefas, as mesmas foram distribuídas aos alunos, em papel, explicitando-se o tempo que estes teriam para as realizar e que recursos dispunham para o fazer (Stein et al., 2008). Dado que em algumas tarefas foram apresentados os enunciados de certas definições, foi pedido, nesses casos, a um aluno que lesse o enunciado das mesmas para a restante turma, com posterior discussão, de forma a tentar minimizar a estranheza dos alunos face a estas. Durante estes momentos foram salientados, por mim, aspetos relevantes do enunciado e esclarecidas eventuais dúvidas que decorressem da sua leitura (Canavarro, 2011).

Durante este processo, centrei-me no apoio à compreensão do (s) enunciado (s), e do que era pedido, auxiliando os alunos a envolverem-se na resolução das tarefas, não fornecendo orientações específicas que lhes mostrassem que estratégia utilizar, ou procedimento seguir, uma vez que tal poderia anular o potencial da (s) tarefa (s) proposta (s).

Em relação ao trabalho autónomo, pretende-se que os alunos sejam ativos na resolução das tarefas, na interpretação das questões colocadas e na construção de estratégias que lhes permitam resolver o pretendido mobilizando conhecimentos, aprofundando a sua compreensão dos vários conceitos matemáticos envolvidos e desenvolvendo representações, procedimentos e ideias. Nesta fase, o trabalho foi

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desenvolvido a pares, não só por este ser o modo de trabalho com o qual os alunos da turma estão familiarizados, mas também porque promove a constante trocas de ideias e argumentos, permitindo a sua envolvência nas atividades propostas. De facto, o trabalho em conjunto contribui significativamente para a aprendizagem dos alunos, uma vez que permite um constante feedback por parte dos próprios colegas, e uma partilha de pensamentos, tornando a aprendizagem em algo que é construído mutuamente (Canavarro, 2011). A interação entre os alunos é, pois, fundamental para desenvolver a capacidade argumentativa, porque promove uma interação mais significativa entre eles (Ponte & Serrazina, 2000) e contribui fortemente para o seu envolvimento na construção e crítica de argumentos (Boavida, 2005), permitindo também que os alunos expressem as suas ideias e dúvidas com os seus colegas, num ambiente mais restrito, isento de exposição para toda a turma.

Um aspeto tido em conta, durante este momento, foi a forma como auxiliei a resolução das tarefas. Uma vez que estes foram momentos de trabalho autónomo, circulei pela sala de forma a monitorizar o trabalho realizado, o progresso dos alunos e as diversas estratégias utilizadas pelos mesmos. Em momentos em que os alunos solicitaram o meu auxílio, incentivei-os a recomeçar os seus raciocínios, a explorarem diferentes caminhos, tentando não validar ou contrariar o seu trabalho (Stein et al., 2008). Ao longo do trabalho dos alunos, quando se verificava que a mesma dúvida era evidenciada por diversos grupos, esta era devolvida à turma para que, em conjunto, se pudesse esclarecer a mesma, de forma a retomar o trabalho (Tudella, Ferreira, Bernardo, Pires, Fonseca, Segurado & Varandas, 1999).

Uma vez que este estudo se foca na argumentação, e como nem sempre os alunos têm as ferramentas matemáticas necessárias para construir argumentos fortes, cabe ao professor dirigir os alunos à concretização desse processo. Para tal, foram realizadas discussões em grupo turma, assumindo-se a professora como a principal mediadora das mesmas, a fim de se estimular a interação entre os alunos, e com a professora, reforçando atividades como o questionamento, a comparação, a justificação e a explicação (NCTM, 2000).

Nesta fase, questionei os alunos acerca dos diversos processos de resolução, alertando para o vocabulário científico utilizado e desenvolvendo uma abordagem positiva face ao erro, como um meio de aprendizagem (Santos, Canavarro & Machado, 2006). Efetivamente, o erro constitui uma forma provisória do saber. Assim, cabe ao professor encará-lo como algo construtivo, analisando e evidenciando fatores que o

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produziram, a fim de conseguir auxiliar o aluno a ultrapassá-lo. O professor deverá procurar compreender a lógica por detrás do erro cometido, pedindo ao aluno que explique o seu raciocínio, orientando-o, através do questionamento, a uma reflexão cuidada e estruturada do seu próprio raciocínio e, sempre que possível, envolvendo a turma nesse processo (Abrahão, 2004).

As discussões matemáticas foram divididas em três fases: (a) apresentação dos resultados obtidos e conjeturas formuladas; (b) comparação e avaliação dos resultados e conjeturas apresentados, com recurso à justificação e à explicação; (c) sintetização das principais ideias (Sherin, 2002) e posterior demonstração/prova das conjeturas formuladas.

Na primeira fase, foi da minha responsabilidade decidir de que forma se iniciariam as discussões. A título de exemplo, sempre que surgiram resultados, processos de resolução ou conjeturas distintas, foi pedido aos alunos que os expusessem, explicando como chegaram às suas conclusões, justificando os processos utilizados, através do seu conhecimento matemático sobre propriedades, teoremas e/ou enunciados já por eles estudados. Pedir a alunos que tivessem resultados incorretos, conjeturas erradas ou processos de resolução indevidamente justificados, para apresentarem as suas ideias de modo a serem discutidas em aula, tornou-se num processo rico para a aprendizagem dos mesmos.

O programa apela a que, ao longo do seu percurso escolar e em particular no que diz respeito à Geometria, sejam criadas oportunidades para que os alunos elaborem raciocínios dedutivos do tipo “se… então…” (MEC, 2013a), sendo salientada a importância de conduzir os alunos a dar sentido às justificações existentes, pedindo, sempre que pertinente, uma justificação alternativa, salientando o que valida uma justificação e enfatizando a explicação da sua veracidade (Bell, 2011). Deste modo, o questionamento oral assumiu-se como sendo o foco principal da minha atividade enquanto professora, estimulando-se o raciocínio dos alunos, a interligação de ideias e conceitos e obrigando os alunos a pensar autonomamente sem a validação do seu pedagogo, promovendo-se atitudes de reflexão e valorizando-se as ideias próprias de cada um (Tudella et al., 1999). Perguntas como: “porque pensas que a tua ideia permite chegar à conclusão pedida?”, “consegues pensar em outra maneira de resolver o problema e explicar porque funciona?”, “se quisesses convencer alguém das tuas afirmações, o que dirias?”, foram utilizadas como promotoras da argumentação matemática.

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Durante o questionamento oral, o discurso em sala de aula focou-se em três ações distintas: (a) apoiar, como forma de ajudar os alunos a relembrar o que já sabiam ou a considerar nova informação, introduzida por algum colega ou mesmo pela professora, através de questões do tipo: “e se pensarmos de outra forma? Como podemos chegar à mesma conclusão, mas utilizando os resultados obtidos na aula anterior?”, “que teorema podemos utilizar para responder a esta questão?”; (b) incitar como forma de aceder ao pensamento dos alunos e incentivá-los a torná-lo público para a turma, através de questões do tipo: “como pensaste?”, “queres ajudar o teu colega a melhorar a ideia apresentada?”, “queres apresentar outra ideia que sustente ou refute alguma(s) já apresentada(s)?”; (c) ampliar, como forma de encorajar os alunos a irem além dos métodos ou processos de resolução por eles utilizados inicialmente, convidando-os a avaliar as afirmações feitas, e a sustentá-las através de argumentos matemáticos, comparar os diversos processos de resolução apresentados e contra-argumentar as afirmações dos colegas (Cengiz, Kline & Grant, 2011).

Para que o discurso na sala de aula seja promotor da aprendizagem é necessário que o diálogo seja focado na argumentação, tendo o particular cuidado de garantir que a linguagem matemática formal esteja presente - é importante que o aluno compreenda o que se diz em aula, pelo que a linguagem deverá ser acessível aos diferentes alunos mas, progressivamente, deve ser incentivado o uso de linguagem mais formal, para que os alunos se habituem e mais facilmente se apropriem da mesma (Martinho & Gil, 2014). Como é usual que os alunos demonstrem dificuldades nesse processo, e tendo em conta que muitos estudos em sala de aula apontam que devem ser utilizadas estratégias nesse sentido (Canavarro, 2011), utilizei a estratégia de repetir o que foi dito reformulando as afirmações feitas pelos alunos, numa linguagem correta, como forma de as redigir formalmente. Neste processo, embora não se altere o que é dito, pode-se acrescentar ou substituir certas palavras por outras, de modo a introduzir mudanças substantivas que permitem dar lugar às ideias matemáticas que se pretendem ensinar (Boavida, 2005). Por diversas vezes, também dei a oportunidade aos alunos de o fazerem entre si, através de questões do tipo “como explicariam o que o vosso(a) colega disse de forma mais rigorosa?” (O' Connor & Michaels, 1993).

Por fim, na fase de síntese, selecionei, quando pertinentes, de entre todas as ideias discutidas, aquelas que tiveram potencial para ser aprofundadas, introduzindo novas ideias, quando necessário, que permitiram analisar ou relacionar com outras anteriormente discutidas e que, ainda, permitiram sintetizar o apresentado. Em

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algumas ocasiões, apoiei-me no software Geogebra, como uma ferramenta de geometria dinâmica, que serviu para o teste das conjeturas formuladas em aula, de modo a que os alunos pudessem retirar conclusões sobre as mesmas. A escolha deste

software recaiu, sobretudo, no facto de a linguagem utlizada ser familiar aos alunos,

aliando a Álgebra à Geometria e potenciando a aprendizagem dos contextos estudados. O software permitiu aceder a uma gama variada de exemplos, uma vez que as figuras se podem movimentar, podendo alterar as suas dimensões (Hohenwarter & Fuchs, 2004), oferecendo um maior suporte matemático aos alunos para dar sentido às suas conclusões e justificações, algo que em registo escrito se revelaria exaustivo e pouco produtivo.

Como evidenciado na ancoragem da unidade de ensino considerada, o programa prevê a prova e demonstração de certos teoremas e propriedades. Posteriormente às argumentações críticas e reflexões, incentivei os alunos a procurar uma justificação para as propriedades e teoremas encontrados, de forma a construir provas e demonstrações matemáticas que permitissem generalizar os resultados obtidos – os alunos foram diversas vezes alertados para a importância da prova da veracidade das conjeturas encontradas, sublinhando-se que a partir da observação de alguns casos particulares não se pode concluir o caso geral sem uma prova que torne essa observação irrefutável. As provas e demonstrações foram maioritariamente realizadas por mim recorrendo ao questionamento oral e com o auxílio da turma, tendo sempre aproveitado as contribuições dos alunos para a construção das mesmas; optei por realizar estes dois processos, em vez de o pedir aos alunos, pois, pelo que pude observar de aulas anteriores, e do contacto com a turma, os alunos não estão familiarizados com os mesmos, sendo que há alunos que desconhecem a sua existência. Contudo, incentivei os alunos, sempre que possível, a tentar provar as conjeturas encontradas, interligando as ideias que estes expunham durante estes momentos, de forma a construir uma cadeia argumentativa.

Embora as discussões matemáticas tenham sido um momento central das aulas lecionadas, existiram outros momentos mais expositivos aquando da necessidade de introduzir algum novo conceito ou definição. Durante estes momentos, foram esclarecidas dúvidas sobre o conteúdo exposto e, uma vez mais, utilizou-se o questionamento oral como forma de averiguar como os alunos compreenderam a informação exposta.

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Da necessidade de se introduzir conceitos e definições, mediar discussões e apoiar o trabalho dos alunos, emerge a importância de: (a) antecipar algumas dificuldades que possam emergir da resolução das tarefas propostas; (b) monitorizar a atividade desenvolvida em sala de aula, recolhendo informações que se considerem pertinentes, selecionando aspetos importantes a salientar durante a discussão e (c) sequenciar as apresentações dos alunos (Canavarro, 2011), de forma a se construir uma argumentação baseada em conceitos, propriedades e/ou teoremas que permitam a sua irrefutabilidade. Stein et al. (2008) referem que a prática de antecipação deverá ser preparada com o máximo cuidado e importa desenvolver todas as práticas aqui descritas, na medida em que o sucesso da aula depende das mesmas.

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