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3.4 Estratégias para a preservação digital

3.4.2 Estratégias operacionais

As estratégias operacionais representam as atividades ou medidas concretas de preservação digital a serem implementadas pelas organizações que se dispuserem a preservar informação digital por longo prazo, dentre as quais se podem apontar:

3.4.2.1 Seleção do meio adequado de armazenamento

Para que a preservação digital seja de excelência, o primeiro passo é a escolha adequada da mídia de armazenamento dos dados. Diversos fatores influenciam essa escolha. As condições de acesso à informação irão basicamente determinar a disponibilidade – online, near-line, ou off-line – e a velocidade do dispositivo de leitura. As orientações do National Archives (BROWN, 2003b) no âmbito governamental do Reino Unido propõem seis critérios técnicos para a seleção da mídia:

• Longevidade - A mídia deve apresentar durabilidade mínima de dez anos. Maior durabilidade pode não representar vantagem, uma vez que a obsolescência da tecnologia do dispositivo de leitura/gravação geralmente precede a deterioração física da mídia.

• Capacidade - A mídia deve oferecer capacidade compatível com a quantidade de dados a serem armazenados e o tamanho físico das instalações disponíveis.

Reduzir a quantidade de mídias a serem gerenciadas normalmente proporcionará eficiência e economia de recursos.

• Viabilidade - A mídia e o dispositivo de leitura/gravação devem apresentar métodos robustos para detecção de erros tanto para a leitura quanto para a gravação. A função de teste de integridade de mídia após gravação também é desejável. Técnicas comprovadas de recuperação de erros devem também estar disponíveis em caso de perda de dados. A mídia deve ser somente-uma- gravação (write-once), ou ter mecanismo de proteção de gravação confiável para prevenir contra eliminações acidentais e manter a integridade necessária dos dados.

Obsolescência - A mídia e o hardware e software associados devem, preferencialmente, ser baseados em tecnologia madura, ao invés de inovadora, e devem estar bem estabelecidos no mercado e amplamente disponíveis. Tecnologias de mídia devem, preferencialmente, ser baseadas em padrões abertos, tanto para a mídia quanto para o dispositivo de leitura/gravação, ao invés de proprietárias de um único fabricante.

• Custo - Dois elementos devem ser considerados ao avaliar o custo relativo das mídias de armazenamento: o custo da mídia e o custo de propriedade. Comparações válidas de custos de mídia devem sempre tomar como base o valor por megabyte ou gigabyte. O custo total de propriedade incluirá custos de aquisição e manutenção do hardware e do software necessários e de qualquer equipamento de armazenamento requerido. Custos de suporte e o tempo médio entre falhas do dispositivo de leitura/gravação também devem ser levados em consideração.

• Susceptibilidade - A mídia deve apresentar baixa susceptibilidade a dano físico e ser tolerante a ampla gama de condições ambientais sem perda de dados. A mídia magnética deve ter alto valor de coercivity90 (preferencialmente até 1.000 Oersteds91), para reduzir as chances de eliminação acidental de dados. Quaisquer medidas requeridas contra susceptibilidades (como requisitos de embalagem ou armazenamento) devem ser acessíveis e viáveis.

3.4.2.2 Aplicação da migração

A migração é atualmente a estratégia mais utilizada pelas instituições que buscam preservar objetos digitais (HEDSTROM, 1997/1998; BULLOCK, 1999; BEAGRIE e JONES, 2002; CCSDS, 2002; NLA, 2003). Consiste do conjunto de atividades, executadas separadamente ou em conjunto, para:

Caso 1: copiar a informação digital de suporte que se esteja tornando obsoleto ou fisicamente deteriorado para suporte mais novo, por exemplo, disco flexível para CD-ROM;

Caso 2: converter de formato ultrapassado para formato mais atual, por exemplo, MS Word 97 para MS Word 2000; e

Caso 3: transferir informação de plataforma de hardware e software em processo de descontinuidade para plataforma mais atual, por exemplo, WINDOWS NT para WINDOWS 2000; pode requerer a re-escrita da aplicação.

A migração preserva a presença física e o conteúdo do objeto digital, mas pode não preservar a apresentação, como no caso de conversão na qual alguns elementos visuais desaparecem; ou não preservar a funcionalidade, como no caso

90 Coercivity corresponde ao campo magnético necessário para anular a magnetização de um material saturado

magneticamente, ou seja, apagar a mídia.

de transferência na qual as conexões a banco de dados deixam de funcionar; ou, ainda, não preservar o contexto, como no caso de conversão na qual os bancos de dados deixam de ser igualmente convertidos. A série de migrações sucessivas pode, eventualmente, resultar em perda inaceitável de dados. O aspecto crucial dessa estratégia é, portanto, restringir as perdas e manter o conteúdo de formas utilizável e prática.

3.4.2.3 Aplicação da emulação

A emulação refere-se à criação de novo software que imite o funcionamento do antigo hardware e/ou software, buscando reproduzir seu comportamento. Dessa forma, não somente a presença física e o conteúdo são preservados como há possibilidade de se preservarem, também, a apresentação original e a funcionalidade disponível no software anterior (ROTHENBERG, 1999; BULLOCK, 1999; BEAGRIE e JONES, 2002; NLA, 2003).

A emulação tem despertado a atenção como estratégia potencial para a preservação, a partir do reconhecimento de que alguns objetos digitais, altamente dependentes de determinado hardware e software, não se prestem à migração. Apresenta, ainda, o apelo fascinante de preservação da aparência e sensação (look

and feel) do ambiente original onde o documento foi produzido.

Bullock (1999), entretanto, aconselha cautela na aplicação da estratégia, uma vez que a emulação só tenha sido usada principalmente para fornecer compatibilidade retrospectiva entre jogos eletrônicos e para modelar futuros sistemas. Embora existam emuladores para alguns sistemas obsoletos, a emulação para preservar objetos digitais por longo prazo ainda não foi suficientemente testada ou avaliada em termos de custo/preço final.

3.4.2.4 Impressão em papel ou microfilme

Produzir cópia impressa do arquivo digital é a solução de preservação simples, que pode resultar em produto bem padronizado com expectativa de vida de centenas de anos (BULLOCK, 1999; NLA, 2003). Certamente, essa estratégia poderia fixar o objeto como um todo, preservar o conteúdo e, de certa forma, o leiaute. Entretanto, cada vez fica mais difícil transformar objetos digitais de naturezas dinâmica e heterogênea em objetos fixos. Por exemplo, a impressão em papel de documentos hipertexto acarreta grande perda de funcionalidade e, no caso de documentos multimídia, se torna impraticável. A estratégia híbrida92, com a produção de microfilme e cópias digitais, apesar de restrições por parte de alguns 'vanguardistas', está ganhando apoio como a solução para reformatar originais em papel. A cópia digital melhora o acesso e a funcionalidade, enquanto a cópia em microfilme funciona como substituto arquivístico.

3.4.2.5 Conservação da tecnologia

Outro método para garantir o acesso continuado aos objetos digitais é simplesmente manter disponível para uso a tecnologia que os criou (BULLOCK, 1999; NLA, 2003). Embora esse procedimento permita preservar o conteúdo e possibilite que futuras gerações visualizem os objetos digitais em seu formato nativo com a apresentação e a funcionalidade originais, a criação de 'museus' de hardware e software implica requisitos de custo, espaço e suporte técnico impraticáveis. Na melhor das hipóteses, esse método pode ser medida transitória, enquanto não seja possível a implementação de outra estratégia mais duradoura.

92 A estratégia híbrida envolve a utilização de suportes convencionais, como o papel e o microfilme, e suportes

3.4.2.6 Aplicação da arqueologia digital

Arqueologia digital é um neologismo que significa restaurar, através de trabalho altamente especializado, fontes digitais que se tornaram inacessíveis como resultado da obsolescência tecnológica e/ou degradação de mídia. De fato, não se trata de uma estratégia em si mesma, uma vez que será aplicada sempre que objetos digitais ficarem fora do programa sistemático de preservação digital. (BEAGRIE e JONES, 2002)

Ainda que se reconheçam nas organizações alguns movimentos no sentido da preservação digital, materializados através da utilização de algumas estratégias específicas, não se pode afirmar que as instituições em geral estejam preparadas para enfrentar os riscos associados à perda de objetos digitais que necessitem de preservação por longo prazo.

4 METODOLOGIA

Esta investigação insere-se com maior propriedade no contexto da investigação transdisciplinar em que, a partir do campo teórico da arquivologia, iluminado de maneiras nova e fecunda pelo conhecimento da ciência da computação, se buscam identificar fatores que devam ser monitorados em ambiente de guarda de documentos eletrônicos de caráter arquivístico, com vistas à preservação da informação digital por longo prazo.

Dado o pouco aprofundamento das questões na literatura, uma investigação descritiva, que faça aflorar tais fatores do ponto de vista de empresas brasileiras, objetos desta investigação, não só é indicada e recomendável, como imprescindível para a discussão nos campos científicos, tanto da arquivologia quanto da computação. Saliente-se que o próprio método qualitativo escolhido para o processo de pesquisa, o estudo de casos múltiplos, termina por dotar a investigação também de caráter explicativo, ainda que sem pretensão de diagnosticar causalidades ou tecer generalizações.

Para cercar a pesquisa do desejável rigor metodológico, buscou-se amparo teórico em importantes autores de metodologia científica (BABBIE, 2003; BELL, 1989; DEMO, 1995; GLAZIER e POWELL, 1992; GALLIANO, 1979; GIL, 1999; HAGUETTE, 1992; CASSEL e SIMON, 1994; KERLINGER, 1980; LAKATOS e MARCONI, 1991; LAVILLE e DIONNE, 1999; MILES e HUBERMAN, 1984; MILLER, 1991; MINAYO, 1996; MYERS, 2000; PATTON, 1980; RUDIO, 1980; TRUJILLO FERRARI, 1974; VAUS, 1991), sobretudo nos campos do planejamento e da

execução de pesquisas qualitativas descritivas, adequando suas recomendações às necessidades específicas de cada fase desta pesquisa. Assim, antes de apresentar as fases e descrever os procedimentos da presente pesquisa, viu-se a necessidade de se precisarem com maior exatidão os termos utilizados e expor os conceitos teóricos acerca dos métodos e técnicas adotados, organizando este capítulo em três seções. Na seção 4.1 descrevem-se os termos mais significativos, na seção 4.2 os conceitos metodológicos e na seção 4.3 o processo de desenvolvimento da presente pesquisa.