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2. Definição da Problemática

2.1. Estrutura da tese e objectivos dos estudos.

Com este propósito apresentam-se quatro estudos divididos por três etapas: 1ª) Exploração da relevância e adequação do conceito de BEE em populações AFO; 2) Adaptação de instrumentos mensuração; 3) Teste de um modelo de equações estruturais sobre as relações entre o FD e o BEE.

2.1.1. 1ª Etapa – Exploração do conceito de BEE e relevância da temática.

Como os estudos de Fisher (1999; 2010a) demonstraram, as pessoas têm diferentes perspectivas sobre o conceito de BEE. Diferentes valores pessoais, sociais e culturais podem modelar a nossa representação do conceito (Moberg, 2008). O modelo conceptual de Fisher é uma das definições mais abrangentes para o construto, permitindo diferenciar quatro domínios de BEE (pessoal, comunitário, ambiental e transcendental). Simultaneamente, permite identificar e descrever perspectivas sobre a representação do conceito que realçam maioritariamente um destes domínios ou que abordam o BEE como um conceito exclusivamente racional, excluindo os aspectos inspiracionais e transcendentes de cada domínio. Este aspecto pode ser especialmente relevante para algumas populações, nomeadamente em grupos que rejeitem visões da espiritualidade assentes em perspectivas deístas ou teístas. Trata-se portanto de um modelo particularmente útil para estudar diferentes representações de BEE em diferentes populações.

O primeiro estudo visa então explorar qualitativamente, através de entrevistas exploratórias e semi-estruturadas, a representação do conceito de espiritualidade em especialistas de actividades de exercício de movimento meditativo (mestres e instrutores de yoga e Tai Chi). Pretende-se perceber se a sua conceptualização do conceito de bem-estar espiritual será coerente com o proposto no modelo de Fisher (1998/2010a) e cuja operacionalização (SWBQ; Gomez & Fisher, 2003) será utilizada para medir o construto em estudos posteriores desta tese. O estudo 1 também permite perceber a adequação da temática nesta população e ajuda a delimitar a amostra de forma mais adequada para o teste final do modelo de relações entre o FD e o BEE, no estudo 4. O estudo apresenta-se aqui como foi submetido para publicação (Gouveia & Pais-Ribeiro, 2011a).

2.1.2. 2ª Etapa – Adaptação de instrumentos.

Foi necessário proceder à adaptação para a língua portuguesa dos instrumentos de mensuração dos dois principais construtos do trabalho e realizar a sua validação em amostras de praticantes deste tipo de exercício físico. Com esse propósito apresentam-se 2 estudos, um sobre a adaptação do Spiritual Well-being Questionnaire (SWBQ; Gomez & Fisher, 2003) e outro relativo à validação do Dispositional Flow Scale-2 (DFS-2; Jackson & Eklund, 2002).

O estudo 2 envolve a tradução do SWBQ e testa a validade das estruturas factoriais propostas pelos autores originais, numa amostra da população geral. Testam-se dois modelos

estruturais. Um modelo de primeira ordem com os quatro factores de BEE inter-relacionados (pessoal, comunitário, ambiental e transcendental) e um modelo hierárquico que assume o total de BEE como um factor de segunda ordem (BEE). Os resultados desta versão portuguesa foram reconfirmados posteriormente numa amostra específica de praticantes de actividades físicas de inspiração oriental-AFO. Esta amostra incluiu praticantes de exercício de movimento meditativo (yoga, Tai Chi e meditação activa) e de uma arte marcial com origem japonesa, o Shorinji-Kempo (Gouveia, Pai-Ribeiro & Marques, 2009). Para evitar repetições desnecessárias, este estudo não fará parte do corpo da tese. Ambos os trabalhos foram já parcialmente publicados mas apenas com os resultados do modelo de quatro factores correlacionados (Gouveia, Marques & Pais-Ribeiro, 2009; Gouveia, Pais-Ribeiro & Marques, 2009).

O estudo 2 apresenta-se aqui em grande medida tal como foi publicado mas acrescentam-se os os resultados da Análise Factorial Confirmatória (AFC) ao modelo hierárquico e outros elementos de validade convergente, discriminante e concorrente desta versão portuguesa do SWBQ.

O estudo 3 visa adaptar para português o instrumento mais relevante para a mensuração do flow disposicional (FD) em contexto de desporto e exercício (DFS-2; Jackson & Eklund, 2002, 2004) e valida-o numa amostra em grande medida coincidente com a do estudo final que testa o modelo causal. Testam-se os dois modelos de medida propostos para a estrutura factorial do DFS-2: um modelo de 1ª ordem, com os nove factores de flow inter- relacionados e um modelo hierárquico com o FD como factor de 2ª ordem. Analisam-se também outros indicadores de validade com a análise das relações das escalas do flow com a percepção de competência e o gosto pelo exercício. A DFS-2 tem sido amplamente utilizada para avaliar o flow no contexto desportivo. Mas em amostras exclusivamente de exercício, os dados disponíveis são mais escassos e por vezes contestados (Vlachopoulos et al., 2000). A confirmação da estrutura factorial do DFS-2 neste tipo de população reforçará a validade da medida e incentivará a investigação do flow em contextos de exercício, onde tem sido menos investigado. Estudar o flow e outras experiências óptimas na prática de exercício é importante, não apenas para compreendermos as respostas afectivas positivas associadas à prática mas também para identificarmos os processos psicológicos envolvidos na adesão e persistência no exercício que é um importante comportamento de promoção de bem-estar.

Este estudo 3 já foi aceite para publicação e apresenta-se aqui na versão revista (Gouveia, Pais-Ribeiro, Marques & Carvalho, in press).

2.1.3. 3ª Etapa – Teste modelo estrutural.

Por último, o estudo 4 procura explorar e testar, através de modelos de equações estruturais (MEE), um modelo sobre as relações entre a frequência de flow no exercício (FD) e o bem-estar espiritual. Apesar da repetida associação teórica na literatura científica, entre o conceito de flow e a espiritualidade (e.g., Watson & Nesti, 2005), a ainda escassa informação empírica disponível sobre ela implicou que o modelo proposto fosse em grande medida, exploratório.

Sendo o flow um estado psicológico positivo com consequências para o bem-estar dos indivíduos (e.g., Asakawa, 2004; Csikszentmihalyi, 1997; Csikszentmihalyi & Csikszentmihalyi, 2006) a nossa expectativa é de que uma maior frequência de experiência de flow no exercício possa estar associada a maiores níveis de BEE. O bem-estar espiritual pode ser conceptualizado como um resultado de saúde podendo estar também associado a outros indicadores mais globais de saúde (Heintzman, 1999b). Nessa medida incluiu-se no modelo um indicador de saúde geral e exploraram-se as relações do flow e BEE com esse resultado. Sendo a percepção de competência na actividade física, um dos precursores do flow mais solidamente reconhecidos na literatura (e.g., Jackson et al., 1998), esse indicador foi introduzido no modelo causal já que pode também influenciar, directa ou indirectamente, os outros resultados psicológicos positivos associados à prática (Ryan &Deci, 2000). O modelo explorado procurou ainda destrinçar o eventual contributo diferenciado do flow e do prazer/gosto pela prática (Markland & Ingledew, 1997) para os resultados de bem-estar avaliados.

Neste último estudo, procura-se também avaliar o impacto do tipo de exercício nas relações propostas no modelo através da análise da invariância do modelo estrutural nos praticantes de exercício de movimento meditativo (Sámkhya Yoga e Tai Chi), artes marciais (e.g., Aikido, Shorinji-Kempo) e no exercício tradicional de ginásio (cardio-fitness e aulas de grupo). Como atrás explicámos e argumentaremos adiante na introdução deste estudo 4, em contraste com as formas mais tradicionais de exercício, as práticas que se inserem no EMM envolvem um conjunto de características que têm sido associadas ao flow e à espiritualidade (e.g., Hodges, 2003; Ravizza, 2002a,b). Também foi sugerido que algumas das suas

características (e.g., mindfulness ou relaxamento) ou as práticas como um todo, poderão ter impactos acrescidos no bem-estar, comparativamente a outras formas de exercício (La Forge, 2005; Larkey et al., 2009; Rogers, Larkey & Kelley, 2009). Por estes motivos é nossa expectativa que as relações entre o flow e o BEE sejam mais pronunciadas no EMM do que nos outros dois tipos de AF, especialmente face ao GIN. As AM podem servir de comparação nesta análise já que possuem características que as colocam numa posição intermédia entre o exercício tradicional e o EMM. Por um lado, envolvem frequentemente interacção com um oponente e em alguns casos mesmo competição ou exibição pública, implicando portanto objectivos extrínsecos à experiência que poderão impedir uma maior focalização da mente na experiência vivida e no processo (La Forge, 2005). Mas simultaneamente incluem uma forte componente de significado e valores associados à prática (e.g., Barreira & Massimini, 2003), características distintivas das AFO a que atribuímos relevância na sua relação com as variáveis psicológicas positivas que medimos (e.g., Emmons, 2005; Maddux, 1997).

Apresenta-se aqui o artigo correspondente a este estudo na versão submetida para publicação (Gouveia & Pais-Ribeiro, 2011b).

Em cada um dos estudos é justificada a pertinência directa, são discutidos os resultados e as principais limitações e implicações.

O capítulo final da tese apresenta um resumo global dos estudos, as principais conclusões e implicações para a prática.

Uma vez que os estudos foram já publicados ou submetidos a publicação de forma independentemente, alguma informação pode surgir repetida.

3. Estudo 1: Representações de bem-estar espiritual em mestres de Swásthya Yoga e Tai