• Nenhum resultado encontrado

3.2 Sistema Computacional de Análise

3.2.4 anaRch:Análise dos Dados

3.2.4.3 Estrutura do Trombone

Ao se tentar estabelecer uma definição de trombone como ponto de partida para discutir as possibilidades de se tocar um determinado repertório, a primeira coisa que é preciso definir é de que trombone se está tratando. Uma vez que o repertório envolvido consiste dos Estudos Melódicos de Joannes Rochut, faz sentido direcionar a discussão para o trombone tenor, o tamanho mais comum de trombone de vara, para o qual esses estudos foram adaptados. Embora a percepção de resposta acústica do instrumento possa variar consideravelmente em termos de timbre e clareza sonora de instrumento para instrumento, a produção básica de alturas no trombone simples é a mesma, desde que se mantenham iguais as dimensões e portanto a afinação do tubo. Para tornar o escopo desse estudo razoavelmente manuseável, foi necessário limitar ainda a complexidade do modelo deixando de fora o uso de tubulação extra no instrumento. Assim, foi considerado para o presente estudo um trombone tenor com afinação em SI bemol, sem rotor ou chave adicional. Outra limitação que se impõe é que o estudo pretende observar questões relacionadas às ligaduras entre notas produzidas de forma tradicional, ficando portanto de fora, também, a produção de sons multifônicos e outras técnicas estendidas. Uma vez observadas essas limitações, notamos que, do ponto de vista das transições entre uma nota e outra, pode-se obter um alto grau de abstração na representação da estrutura do instrumento. Desse ponto de vista, a estrutura pode ser resumida à combinação dos harmônicos e posições da vara, combinação essa que permite especificar qualquer nota produzida pelo trombone de vara. Essa abstração fundamental da estrutura do instrumento serviu como base para a construção do modelo de avaliação dos intervalos/pares de notas dos algoritmos de análise incluídos no programa.

Um aspecto importante que se pode observar nessa abstração do trombone é que as diversas possibilidades de posições para um determinado par de notas introduzem variações no número de harmônicos encontrados entre as notas do par. Essas variações ocorrem tanto em intervalos transpostos para regiões (pares de notas) diferentes quanto em intervalos idênticos, ou seja, compostos exatamente das mesmas alturas. Por exemplo, o trombonista pode tocar uma oitava entre o SI bemol grave no segundo harmônico e o SI bemol médio, no quarto harmônico da primeira posição. Como se pode observar pela Fig. 2.13, esse intervalo contém apenas um harmônico entre as duas notas que o compõem, no caso o FÁ médio. Se considerarmos esse mesmo intervalo numa oitava acima, na mesma posição, entre o SI bemol médio e o SI bemol agudo, o número de harmônicos "internos" do intervalo pula para três. De forma semelhante, se observarmos a 5a justa existente entre o mesmo SI bemol médio e o FÁ agudo, ambos na primeira posição, notaremos o RÉ do quinto harmônico entre as duas extremidades do par de notas. Porém, se esse mesmo par de notas for tocado com a segunda nota na quarta posição, teremos dois harmônicos entre elas. Esses detalhes são de extrema importância ao se tomar decisões sobre que posições utilizar porque eles impactam diretamente a dificuldade de execução de um determinado intervalo, principalmente quando essa execução envolve notas ligadas. Como foi mencionado anteriormente, a embocadura tem a tendência de pular naturalmente para o próximo harmônico quando a tensão entre os lábios tende em sua direção, seja para cima ou para baixo. Isso faz com que as conexões entre notas próximas em termos de harmônicos sejam mais facilmente executadas. A sensação para o trombonista é quase que de "escorregar" entre as notas quando se move entre dois harmônicos adjacentes. Saltar mais de um harmônico, entretanto, exige maior coordenação entre a coluna de ar e a embocadura. Nesse sentido, os harmônicos funcionam como pontos de apoio, onde os lábios tendem a fazer uma parada, antes de continuarem a mover para o próximo harmônico. Então, quanto mais harmônicos existem entre duas notas, mais difícil fica de se fazer uma conexão direta sem "esbarrar" nos harmônicos intermediários. A essa questão dos harmônicos, somam-se as diversas técnicas empregadas pelos trombonistas para produzir notas ligadas. Embora, como vimos no início desse trabalho, existam muitas diferenças de opinião sobre como resolver o problema das ligaduras, a maioria dos trombonistas parece reconhecer que existem diferenças estruturais entre notas do mesmo harmônico e notas de harmônicos diferentes, e consequentemente do tipo de ligadura que se pode empregar. Então, outro aspecto a se levar em conta ao se avaliar as possibilidades de ligadura entre duas notas no trombone é a possibilidade de incorrer em glissando entre as notas. Tipicamente, quando um intervalo consiste de um par de notas do mesmo harmônico, algum tipo de articulação

diferenciada precisa ser acrescentada entre as notas, de modo a evitar esse glissando (FRIEDMANN, 1973), particularmente quando as notas estão distanciadas por mais de uma posição da vara.

Uma vez representados os elementos fundamentais da estrutura acústica do instrumento, foi possível então isolar essa parte do modelo construindo uma parte do software que incorporou essa estrutura para representar com precisão o comportamento do instrumento, do ponto de vista das posições, harmônicos e alturas possíveis. Esse módulo, por sua vez pôde interagir com outras partes do modelo, fornecendo a referência necessária para buscar as possibilidades de ligaduras para um determinado par de notas e avaliar as vantagens e desvantagens de cada possibilidade.

Dentro do sistema aqui desenvolvido, coube à classe NCMTabela a implementação dessa abstração da estrutura do trombone e da funcionalidade associada a ela. A classe utiliza internamente uma representação das posições e harmônicos (até o décimo segundo), calculando as características e as possibilidades de movimentação da vara para cada par de notas e as armazena em memória para rápido acesso. No início da pesquisa foi considerada a possibilidade de se construir um grande banco de dados cruzando as listas de ocorrência com as combinações calculadas por esta parte do programa. Entretanto, em função do volume de dados estimado para esse banco, optou-se por produzir essas informações na medida em que fossem demandadas pelo programa. Assim, ao ser consultada, a classe NCMTabela fornece, para cada par, um descritor contendo as possíveis combinações de posições de cada nota do

par, e para cada uma dessas combinações informa: se as notas estão no mesmo harmônico ou

não; quantos harmônicos internos existem entre as notas; se a movimentação é feita por movimento contrário ou direto; um índice de dificuldade de realização da transição. O exemplo descrito na Figura 3.6 mostra as possibilidades para o par [57/53], uma terça menor compreendida entre as notas LÁ natural 2 (lan2) e FÁ natural 2 (fan2).

O Capítulo 5 descreve em detalhe a utilização desta parte do programa e suas implicações para os demais aspectos do estudo. O cálculo do índice de dificuldade de cada par associado a cada combinação de posições é explicado a seguir.