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ESTRUTURA INAUGURAL DO CEB E PRIMEIRAS RODADAS DO JOGO Todo campo social compreende um conjunto de agentes dominantes

No documento O JOGO DAS POSIÇÕES SOCIAIS: (páginas 146-151)

Com efeito, para que sejam favorecidos os mais favorecidos e desfavorecidos os mais

MODOS GERAIS ESTRATÉGIAS TÍPICAS DE CONSTRUÇÃO SIMBÓLICA

3.3 ESTRUTURA INAUGURAL DO CEB E PRIMEIRAS RODADAS DO JOGO Todo campo social compreende um conjunto de agentes dominantes

desenvolvendo estratégias para se manter nas melhores posições e agentes aspirantes com suas estratégias de subversão (BOURDIEU, 1998). A dinâmica relacional entre os agentes é o jogo propriamente dito. Portanto, a complexidade que envolve a constituição do CEB, como em qualquer outro campo, diz respeito ao jogo relacional entre os agentes na dinâmica de ocupação de posições no espaço social em função da acumulação de capital cultural.

A estrutura de campos complexos revela muitas relações explícitas, as quais expressam a organização material e hierárquica21 entre os diferentes seguimentos do campo (subcampos) e outras implícitas que evidenciam, mediante análise, a dinâmica de tramas simbólicas. Estas últimas, embora se efetivem sutilmente, se constituem de muita força social capaz de mover – ou tornar estático dependendo do olhar – o contexto a favor dos grupos dominantes do campo em questão. O mesmo acontece com o CEB. A figura 4 ilustra uma representação esquemática do CEB.

21 Genovese (2014, p. 69) defende que “há uma hierarquia entre esses subcampos do Campo Educacional Brasileiro que determina as relações de forças entre um e os outros e dos outros sobre um”.

Figura 4

Estrutura do Campo Educacional Brasileiro em consideração às relações explícitas e hierárquicas.

Fonte: Genovese (2014, p. 67)

No CEB os agentes tanto podem ser os professores, alunos e gestores quanto as escolas, secretarias e demais entidades vinculadas diretamente com a educação formal. Nesse campo também estão presentes os demais agentes cuja formação profissional é distinta da docência. Em outras palavras, todos aqueles devidamente matriculados e frequentes em algum nível ou modalidade da educação brasileira podem ser considerados agentes do CEB. A “moeda” específica do campo em questão é resultante da associação dos três estados do capital cultural, sendo eles: incorporado; objetivado; institucionalizado.

O capital incorporado se refere às disposições duráveis incorporadas ao corpo do agente. Em outras palavras, o agente tem seu corpo condicionado à sua posição no campo e ao seu patrimônio hereditário. Portanto, em seu estado fundamental consiste em “um ter que se tornou ser, uma propriedade que se fez corpo é tornou-se parte integrante da pessoa, um habitus” (BOURDIEU, 2015, p.

83). A predisposição hereditária, sobre a qual o agente não tem autonomia alguma para intervir, o encaminha fortemente para a aquisição essencialmente dissimulada e inconsciente do capital cultural incorporado (Ibidem).

Desde muito cedo, os agentes são simbolicamente forçados a adquirir esse tipo de capital em correspondência às suas determinações hereditárias em seu sentido social tornado natural/biológico. Na escola, por exemplo, é comum observar as crianças organizando a si mesmas com base nos padrões socialmente estabelecidos para meninos e meninas. Isso inclui a forma pela qual os agentes da infância reconhecem seus corpos e como os projetam no mundo. Esse tipo de acumulação demanda muito tempo e é “investido pessoalmente pelo investidor”

(BOURDIEU, 2015, p. 82). Associado ao capital em estado incorporado estão os elementos que compõem o habitus: ethos (estruturas mentais e morais) e hexis (aspectos corporais e fisiológicos) (FREITAS, 2012, p. 12).

O capital cultural no estado objetivado se refere à posse de bens materiais sobre os quais incidem as propriedades do capital cultural incorporado. As obras de arte, os gostos materializados em objetos/bens da cultura erudita são exemplos típicos. Trata-se de um capital “transmissível em sua materialidade” na forma de propriedade juridicamente comprovada. A aquisição do capital cultural objetivado está condicionada ao capital econômico. Todavia, a apropriação se dá

proporcionalmente ao saldo de capital cultural incorporado (BOURDIEU, 2015, p.

85).

O estado institucionalizado do capital cultural existe sob a forma de diplomas, certificado e certidões. A posse desses documentos “confere ao seu portador um valor convencional, constante e juridicamente garantido [...]” (BOURDIEU, 2015, p.

87). As instituições outorgantes são autorizadas somente pelos agentes que se encontram em posições privilegiadas no jogo social. Dessa forma, o certificado só é legítimo quando emitido por quem tem o poder de legitimar. Ademais, Bourdieu (2015, p. 87) sinaliza que o

certificado escolar permite, além disso, a comparação entre os diplomados e, até mesmo, sua “permuta” (substituindo os uns pelos outros na sucessão); permite também estabelecer taxas de convertibilidade entre o capital cultural e o capital econômico garantindo o valor em dinheiro de determinado capital escolar.

O valor do diploma está etiquetado em sua raridade e no grau de dificuldade para adquiri-lo (Ibidem). As oportunidades de aquisição, bem como as orientações fundamentais para esse tipo de investimento são distribuídas disformemente aos agentes, como forma de certificação prévia para garantir que as posições sociais sigam o mais inalteradas possível. No caso das licenciaturas, especialmente no Brasil, o rendimento tende a não corresponder ao tempo e esforço investidos. No mercado de bens simbólicos, os diplomas são valorados de acordo com as instituições emissoras e as áreas de atuação profissional.

Conforme Cordeiro (2015), a constituição do CEB está relacionada a três distintos períodos. De início, entre 1920 e 1930, a formação dos primeiros intelectuais que se dedicaram à investigação o fenômeno educacional como no caso de Anísio Teixeira e Lourenço Filho. Posteriormente, na década de 1980, dispondo de maior estruturação, o CEB conquistou mais autonomia com o movimento de redemocratização brasileira. Na década de 2000, a expansão dos programas de pós-graduação stricto sensu subsidiou a produção crescente de corpo teórico da área. Cordeiro (2015, p. 6) constatou que no período houve

uma forte interpenetração entre os campos político e da educação. Mas data desse mesmo momento o início da consolidação da pós-graduação no Brasil, com as ações desenvolvidas pela Capes no sentido de induzir o crescimento e a expansão dos programas de Mestrado e Doutorado por meio do estabelecimento de exigentes critérios de qualidade e de produtividade. Os primeiros programas de pós-graduação em educação são

estruturados a partir do final da década de 1970 e em torno dessa criação se reforça o setor de publicações especializadas.

A estrutura das relações objetivas revela a existência de diferentes subcampos condicionados à perspectiva pela qual são observados. A mais geral contempla o subcampo da Educação Básica e o subcampo da Educação Superior regimentalmente definidos pela Lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996 (LDB). Outros possíveis subcampos podem ser revelados a partir da objetivação das relações a ponto de se reconhecer a autonomia relativa de um espaço relacional para com outro. É o caso do subcampo da Educação em Ciências. Sobre a relatividade da autonomia dos subcampos, Genovese (2014, p. 69) destaca que

apesar de demonstrarem relativa independência, complementaridade e respeitabilidade uns em relação aos outros no que se refere aos espaços de atuação, linguagem, público, objetivos, leis, valores, responsabilidades, etc, não deixam de lutar entre si visando manter ou alcançar maior reconhecimento e autonomia social via estratégias diversas: redefinição de fronteiras; aumento de recursos; estabelecimento de parâmetros e fins educacionais parceria entre a universidade e a escola.

Embora seja possível pensar em um campo cuja estrutura se dá a partir da relação entre elementos representativos da educação enquanto prática institucionalizada, bem como daqueles com os quais as práticas acontecem no âmbito da informalidade, a legitimação do ato educativo é efetuada pelos agentes que ocupam a posição dominante. Em outras palavras, nem todos os agentes envolvidos com o processo educativo tem autonomia para interferir legitimamente na formação do cidadão. Esse efeito distintivo está expressamente anunciado em dispositivos legais como estratégia de conservação da dominação ao mesmo tempo em que define os limites do campo e regras para se ingressar no jogo. A figura 5 ilustra uma possível interpretação na qual a educação básica e a educação superior são vistas como campos.

Figura 5

Emergência do subcampo Educação em Ciências e subcampo Políticas Educacionais.

Fonte: autoria própria

Para efetivamente fazer parte do jogo concorrencial, o agente precisa demonstrar interesse, aceitar as regras e reconhecer o valor atribuído às posições e benefícios a elas vinculados, algo que configura a illusio (BOURDIEU, 1996a). Se considerarmos o CEB, por conta da legitimidade, todos são forçados a jogar, ainda que não percebam esse caráter compulsório, dada a natureza simbólica dessa força social. A Emenda Constitucional nº 59 de 2009 tornou a matrícula um ato compulsório no por parte dos responsáveis legais daqueles entre 4 (quatro) e 17 (dezessete) anos de idade. Ora, para que um jogo se efetive é necessário um contingente de jogadores. A referida compulsoriedade anuncia que há uma relação de subordinação entre os agentes.

A condição inicial de ingresso no Subcampo da Educação Básica (SEB) é a obtenção do grau universitário de licenciatura, algo que os censos do INEP denominam de indicador de adequação da formação docente. A referida entidade age em consonância com outras que comportam grupos de agentes em posições

Educação

No documento O JOGO DAS POSIÇÕES SOCIAIS: (páginas 146-151)