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CONDIÇÃO SOCIAL

2.2 SOCIEDADE PROTETORA DOS DESVALIDOS (SPD): HISTÓRIAS E TRAJETÓRIAS

2.2.6 A Estrutura da SPD

Para que dessem conta dos inúmeros serviços que prestavam a seus associados e, também, para que pudessem manter uma organização interna, as irmandades brasileiras, negras ou não, valiam-se de cargos, ocupados pelos seus membros, de modo que fossem distribuídas e executadas as tarefas centrais. Sendo assim, as irmandades se constituíam em estruturas alicerçadas por hierarquias, visíveis, sobretudo, no prestígio ou não dos cargos dos associados.

O número de cargos existente nas irmandades dependia de determinados fatores, quais sejam o seu tamanho, a quantidade de seus sócios, os objetivos a que se destinavam, dentre outros. Os indivíduos que ocupavam os postos mais importantes formavam a mesa diretora, responsável pela condução da irmandade. Parece consenso que, de modo geral, foram os juízes ou provedores os mais representativos, porque quem desses cargos se investia passava a ser o dirigente máximo da irmandade. Os escrivãos e os tesoureiros também tinham grande poder e, junto com os juízes, compunham o corpo dirigente dessas associações. Havia membros ainda que se encarregavam da organização das festas, dos funerais, da coleta das jóias, da coleta das esmolas, da assistência aos doentes, da administração da capela e do culto à padroeira (Reis, 1997, p. 11). Para a escolha dos membros aos postos, o meio mais freqüente a que se recorria eram as eleições. Sabe-se pouco a respeito dos critérios utilizados para a escolha de um sócio para um determinado cargo. Viu-se que, em casos de irmandades em que foram comuns alianças interétnicas, a mesa diretora só poderia ser preenchida por indivíduos reconhecidos como pertencentes às etnias cujo poder fosse maior dentro delas, mas, certamente, contava também a sua dedicação.

Não foi diferente na Sociedade Protetora dos Desvalidos.

Instituída para que prestasse a seus sócios inúmeros serviços, a SPD, desde os seus inícios, já atribuiu a seus membros fundadores funções que passariam a ser desempenhadas

através da nomeação de indivíduos para determinados cargos. Depois, como mostra a documentação, para isso se adotaram eleições realizadas através de escrutínio secreto.

A documentação com a qual se trabalha permite ver que, na SPD, foram muitos os cargos existentes. Saber quais funções desempenhavam os indivíduos que para eles eram nomeados já não é assim tão fácil: os textos mais antigos da irmandade em nenhum momento se refere às atribuições dos seus membros. Será no Estatuto de 1874 que as funções daqueles que ocupavam cargos estão postas em termos claros, contudo, ali já não existem mais alguns postos a que se referem os primeiros documentos escritos na SPD. Desse modo, aqui se valerá do estatuto remanescente e também da leitura dos documentos fundadores para se chegar a alguma caracterização dos cargos havidos na irmandade em questão.

O dirigente máximo da Sociedade Protetora dos Desvalidos era denominado juiz. Nos primeiros anos de sua existência, foi Manuel Vítor Serra quem exerceu tal função, por conta disso, sempre que mencionou o seu posto, colocou ao lado de juiz a expressão fundador, deixando claro ter sido ele quem tomou a iniciativa de fundar a irmandade. Outros nomes também variaram com juiz para se designarem aqueles indivíduos que tiveram a função de dirigir a Sociedade: provedor e presidente. Este último, contudo, só vai aparecer na documentação algum tempo depois. A partir de 1852, presidente substituirá definitivamente juiz e provedor29. Sendo o cargo principal dentro da irmandade, grosso modo era o juiz, provedor ou presidente quem dava ‘a última palavra’ dentro da SPD, afinal cabia-lhe, como o seu cargo sugere, o comando da irmandade. O estatuto de 1872 põe, em termos bastante elucidativos, quais eram as funções do indivíduo que tinha o posto máximo:

TÍTULO V

Das obrigações do presidente

Art. 18 - Ao presidente cumpre fazer o seguinte:

§ 1º. - Fazer reunir no primeiro domingo do mez de Novembro a assembléa geral para

fazer inventariar tudo quanto à Sociedade pertencer.

§ 2º. - Rubricar os livros da mesma Sociedade, assignar as actas e mais papeis em que

constarem as decisões do conselho e da assembléa geral e diploma dos socios.

§ 3º. - Abrir e encerrar as sessões, conceder a palavra aos socios que pedirem, por tres

vezes em regra, na materia que estiver em discussão.

§ 4º. - Marcar antes de encerrar a sessão as materias que se tiver de tratar na sessão

seguinte.

§ 5º. - Por em discussão a materia de que se deve tratar e por em votação as que estiverem

sufficientemente discutidas.

§ 6º. - Dirigir bem os trabalhos, e manter a ordem, declarando o que houver ocorrido ao

conselho e à assembléa geral.

§ 7º. - Nomear as commissões que o conselho julgar conveniente para dar algum parecer

sobre o objecto que a Sociedade necessitar, devendo ellas ser compostas de tres ou cinco membros.

§ 8º. - Convocar as sessões do conselho ou da assembléa geral a requerimento de algum

socio.

§ 9º. - Suspender as sessões quando nos argumentos não guardem os socios o respeito

devido, e moderação.

§ 10º. - Mandar retirar da sala das sessões o socio que perturbe a ordem dos trabalhos e no

caso de resistência ficará suspenso digo sujeito ao art. 13 e seus paragraphos.

Existiram também, para que com os dirigentes máximos fossem divididas tantas tarefas, os cargos de 2º. juiz, vice-provedor e vice-presidente.

Logo abaixo do juiz, estava o procurador geral. Esse cargo, porém, só parece existir nos primeiros anos da Sociedade. No estatuto de 1872, ele não consta. Provavelmente, era função do procurador geral representar a Sociedade em atividades cuja execução requeria autorização de instituições externas. Um dos meios mais recorrentes utilizados pela Sociedade para arrecadar dinheiro era a feitura das designadas loterias. Para que elas ocorressem dentro da legalidade, era necessário que o juiz de paz do bairro desse o seu aval. Em documento de 04 de agosto de 183330, coube ao procurador geral José do Nascimento cumprir “com aformalidade exegida” para

esse fim. Já em 1834, dois indivíduos passaram a ocupar esse posto: os 1º. e 2º. Procuradores gerais.

Ao escrivão ou escrivão de junta ou, ainda, escrivão de mesa, cabia redigir os documentos feitos dentro da irmandade. Algum tempo depois, o indivíduo que tinha essa função passou a ser designado de secretário. O estatuto de 1872 elenca as atribuições do secretário e do 2º. secretário dentro da SPD:

Art. 21 - As obrigações dos secretários são as seguintes:

§ 1º. - Ao primeiro secretário cumpre fazer todas as correspondências da Sociedade. § 2º. - Receber e dirigir ao conselho requerimentos dos candidatos que lhe forem entregues

para serem admittidos socios.

§ 3º. - Participar aos candidatos sua approvação e admissão.

§ 4º. - Fazer em ordem alphabetica a lista dos socios em um livro que haverá para esse

effeito.

§ 5º. - Lançar e assignar conjunctamente com os mais socios os termos de admissão, e

fazer nestes as notas à margem que o conselho determinar, e assim pela mesma forma os termos de demissão em um livro, que haverá para todos estes termos, e bem assim assignar com o presidente os diplomas dos socios, que forem admittidos.

§ 6º. - Servir de escrutador nas eleições junctamente com o presidente.

§ 7º. - Lançar as entradas e sahidas em outro livro contendo a receita e despeza da

Sociedade.

§ 8º. - Entregar ao cobrador a lista dos socios que se forem admittindo para delles cobrar-

se as contribuições respectivas, quando elles socios não tragão de prompto, como lhes cumpre, ao cofre da Sociedade, carregar no livro dos mensaes dos socios os pagamentos que tiverem sido feitos.

Já a atuação do 2º. secretário era mais restrita; a ele cabia:

§ 1º. - Lançar as contas do thesoureiro depois de approvadas em um outro livro, que para

isso haverá, e assignal-as junctamente com o thesoureiro.

§ 2º. - Fazer as actas das sessões; e sendo approvadas lançal-as em um livro, que para isso

terá em seu poder e que apresentará nas sessões para serem tiradas quaesquer duvidas que houver.