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CAPÍTULO II Instrumentos do Estatuto da Cidade com potencialidade para

2.3 Os instrumentos eleitos: gênese, recondução à política urbana e potencialidades

2.3.13 Estudo de Impacto Ambiental

A normatização brasileira sobre avaliação de impacto ambiental e licenciamento não caracteriza fato isolado no cenário ambiental, derivando antes de um processo histórico mais amplo, cujas origens remontam à emergência da consciência ecológica mundial e à realização da 1ª Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, em 1972, na Suécia. Motivada, entre outros fatores, pela degradação da qualidade ambiental nos países desenvolvidos, sob o efeito cumulativo da poluição industrial, bem como pela ausência de marcos regulatórios internacionais e pela crítica aos padrões de desenvolvimento estabelecidos - consubstanciada no 1º Relatório do Clube de Roma, Os Limites do Crescimento (Meadows et al., 1971) - a Conferência das Nações Unidas significou um divisor de águas no tratamento das questões de cunho ambiental, até então inseridas no contexto mais pragmático do desenvolvimento econômico indiscriminado.6

O primeiro dispositivo jurídico nacional a incorporar o estudo de impacto ambiental se apresenta na década de 1980, com a promulgação da Lei n° 6.803/1980, que dispôs acerca do zoneamento industrial. Logo após, a Lei n° 6938, de 1981, atribui ao Conama competência para estipular critérios e diretrizes para a elaboração do estudo, para fins de licenciamento ambiental.

O estudo de impacto ambiental, dois anos antes da promulgação da Constituição de 1988, é regulamentado por meio da Resolução 01/1986 do Conama, que, no seu Artigo 2º, lista os tipos de atividades obrigadas a apresentar o EIA, ao solicitar

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Trecho retirado do site oficial do Ministério do Meio Ambiente, no endereço eletrônico: <http://www.mma.gov.br/governanca-ambiental/portal-nacional-de-licenciamento-ambiental/licenciamento-

licenciamento ambiental. A Constituição amplia a obrigatoriedade ao exigi-lo, conforme ressalta Leuzinger e Cureau (2008, p. 52),

[...] para qualquer obra ou atividade que potencialmente possa vir a causar dano significativo, independente de haver ou não expressa previsão legal. Ressalte-se, ainda, que degradação significativa não é aquela extraordinária, excessiva, mas sim sensível. Em outras palavras, havendo dano ambiental de fácil percepção, o EIA será necessário, assim como para os casos em que, embora de difícil percepção, se afigure com dano severo.

O Artigo 6º da lei supracitada define que, dentre as atividades técnicas mínimas a serem desenvolvidas, no Estudo de Impacto Ambiental, incluam-se a caracterização, segundo o inciso I, alínea: c) do meio socioeconômico - o uso e ocupação do solo, os usos da água e a sócioeconomia; destacando os sítios e monumentos arqueológicos, históricos e culturais da comunidade, as relações de dependência entre a sociedade local, os recursos ambientais e a potencial utilização futura desses recursos.

Diante de limitações observadas nesta lei, pela atuação dos órgãos ambientais, em 1997, o Conama revisa o EIA a partir da Resolução no237. No Artigo 3º é definido que:

A licença ambiental para empreendimentos e atividades consideradas efetiva ou potencialmente causadoras de significativa degradação do meio dependerá de prévio estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto sobre o meio ambiente (EIA/RIMA), ao qual dar-se-á publicidade, garantida a realização de audiências públicas, quando couber, de acordo com a regulamentação.

Tal resolução ainda amplia os tipos de atividades obrigadas ao licenciamento ambiental, para além do industrial. Coloca-se como exemplos, atividades turísticas, parcelamento do solo, dentre outras.

Quadro 13 – Síntese conceitual e prática do instrumento estudo de impacto ambiental

ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL - EIA

NATUREZA Estudo técnico prévio para implantação

de empreendimentos.

PREVISÃO NO ESTATUDO DA CIDADE Inserido como instrumento da política de

meio ambiente, pode acontecer também como de política urbana, ao proteger os direitos coletivos no espaço urbano, contribuindo para a função social.

COMO FUNCIONA A resolução 01/86 do Conama lista uma

série de atividades para as quais, para o licenciamento ambiental, deve ser elaborado um estudo prévio, com características da área; diagnóstico; pontos positivos e negativos, diante da implantação da atividade; medidas mitigadoras; forma de controle.

A LÓGICA PARA A PRESERVAÇÃO Para o EIA, a caracterização da área

deve contemplar a realidade socioeconômica local, levantando, inclusive, o patrimônio edificado, e, portanto, incluindo os possíveis riscos a este, no caso da efetiva implantação.

A LÓGICA PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO

O EIA garante a adequada implantação de empreendimentos, quando expõe os pontos positivos e negativos, e, ainda, auxilia na gestão democrática, pois obriga a promoção de discussões com a população local, próxima da área.

LIMITAÇÕES O estudo é de obrigação do solicitante do

licenciamento. Assim, pode haver indução de resultados, tendendo a positivar, mais que negativar, os aspectos da implantação. A análise desse estudo deve ocorrer por uma equipe técnica multidisciplinar, o que, muitas vezes não acontece.

2.3.14 Instrumentos tributários e financeiros (Iptu, contribuição de melhoria, incentivos e benefícios fiscais e financeiros)

A tributação extra-fiscal é um incentivo de indução de melhorias/compensações desejáveis em áreas degradadas pela desigualdade na distribuição de ônus pela urbanização. Por essa via, há dois modos de atuação pela administração pública: a indução positiva e a indução negativa. Para Melo e Teixeira (2008, p. 437):

A indução positiva, para ser alcançada, deve haver, por parte do Estado, um incentivo fiscal, sob a forma de isenção, redução de alíquota ou de base de cálculo, anistia, remissão, etc.

[...]

Por outro lado, a indução negativa opera-se com a exasperação (aumento da alíquota ou da base de cálculo) da carga tributária sobre processos produtivos que não sejam recomendáveis, do ponto de vista ambiental, embora não sejam considerados ilegais.

Os instrumentos fiscais, nesse sentido, possuem um caráter regulatório, estimulando ou desestimulando práticas individuais a partir dos interesses e da qualidade de vida do coletivo. Apesar de prevista na Constituição Brasileira de 1934, sob a condição

de Contribuição de Melhoria, o Estatuto da Cidade reconduz para o viés de extrafiscal, o que, em tese, garante a função social pela sua aplicabilidade.

É um novo instrumento disposto do ECi (2001), sem antecedentes brasileiros encontrados para a síntese histórica de seu desenvolvimento conceitual. A isenção ou redução de IPTU para os casos de incentivo a preservação do patrimônio é consideravelmente utilizada nos municípios nacionais, como São Paulo, Curitiba, Florianópolis, Niterói, Rio de Janeiro, Angra dos Reis, Vitória, Belém, etc. Destaca-se aqui a postura de Pelotas (RGS) que, desde 1982, utiliza este instrumento para a preservação do seu patrimônio construído. Apesar de alguns entraves políticos, que culmina em desistência de seu uso por determinado período, desde 2002, esse município reinstaura o uso da isenção do IPTU e, em 2006, relata Almeida e Bastos (2006, p. 105) que:

[...] em apenas quatro anos de vigência da lei já existe um número expressivo de imóveis inseridos no processo de recuperação e conservação, via isenção de IPTU. [...] A intenção é simples e tem funcionado: o recurso do imposto deve ser revertido em melhorias do imóvel e como incentivo à recuperação do prédio, todas as solicitações encaminhadas pela primeira vez têm o benefício concedido. Nos casos em que as recomendações não são cumpridas, a equipe técnica faz contato direto com o responsável pelo imóvel e, quando há interesse de recuperação do imóvel, concede novamente o benefício, que fica condicionado ao cumprimento das recomendações expressas em um termo de compromisso assinado pelo proprietário; caso contrário a isenção não é concedida para aquele exercício, podendo no ano seguinte, novamente ser solicitada; devendo, então, passar pelo mesmo processo de avaliação.

Quadro 14 – Síntese conceitual e prática do instrumento IPTU, contribuição de melhoria, incentivos e benefícios fiscais

IPTU/CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA/ INCENTIVOS E BENEFÍCIOS FISCAIS

NATUREZA Tributária – indução de desenvolvimento

urbano

PREVISÃO NO ESTATUTO DA CIDADE IPTU, Contribuição de melhoria,

incentivos e benefícios fiscais

COMO FUNCIONA São reduções/isenções/aumentos e/ou

outros tipos de tratamentos aos tributos fiscais, como forma de extrafiscais. No caso de incentivos, pode-se reduzir, anistiar, ou qualquer outro tipo de benefícios que corroborem à indução positiva. Já, para induções de cunho negativo, o acréscimo de valores desestimula uma situação indesejável.

QUAL A LÓGICA PARA A PRESERVAÇÃO

Podem servir como estímulo ao proprietário de bens protegidos a exercerem manutenções possibilitadas pelo não pagamento, ou pela redução do pagamento de tributos fiscais urbanos e econômicos (IPTU, ISS, ITBI). O contrário pode ser também utilizado, quando o uso do imóvel não se faz necessariamente compatível com o ato de proteção, mas sua atividade não é necessariamente ilegal.

QUAL A LÓGICA PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO

Servem de reajustes de valor da terra, por meio de incentivos ou punições fiscais que visam, em ambos os casos, redirecionar a arrecadação em prol da igualdade de condições de acesso à urbanização.

LIMITAÇÕES No caso da preservação, a isenção de

IPTU, muitas vezes, se torna irrisória em detrimento do alto custo de manutenção de um imóvel antigo.

OBSERVAÇÕES Se utilizado de maneira complementar a

outras formas de incentivo ou de proteção ligadas às manutenções de edifícios preservados, pode contribuir de maneira mais eficaz.