• Nenhum resultado encontrado

e Feeling Checklist

4.4. Estudo preliminar sobre o construto setting terapêutico Metodologia

Tendo em vista a elaboração dos itens para a Escala de Setting Terapêutico (EST), tornou-se necessário realizar um conjunto de procedimentos, desde logo no sentido da operacionalização do constructo setting terapêutico, por ser ainda um conceito com definição pouco clara na literatura. Por outro lado, a inexistência de outros instrumentos com o mesmo fim não permite uma análise dos mesmos, no sentido de, a partir destes, podermos apurar elementos a considerar no instrumento a construir.

Deste modo, iniciámos esta fase do trabalho com a realização de uma pesquisa prévia, com o objetivo de encontrar categorias para melhor definir o conceito e a forma como o psicoterapeuta lida com este elemento, comum às diferentes abordagens psicoterapêuticas. Também no sentido da pesquisa para a construção do instrumento EST, tornou-se essencial a recolha de informação sobre as atitudes e comportamentos do terapeuta, seguindo a metodologia indicada na literatura para a construção de instrumentos.

Assim, em termos do desenvolvimento e evolução dos trabalhos, considerando a metodologia referida, para além da revisão teórica realizada, numa fase inicial de construção da escala eST foram desenvolvidos procedimentos realizados em dois momentos consecutivos. em primeiro lugar foi realizada uma consulta a um painel de especialistas psicoterapeutas sobre o construto setting terapêutico. em segundo lugar foi construído um conjunto de afirmações com o intuito de estabelecer os itens para uma versão inicial da EST.

Consulta ao painel de especialistas sobre o setting terapêutico

Foi levada a cabo uma primeira consulta a um painel de especialistas psicoterapeutas com orientação teórica distinta. A amostra foi constituída por conveniência, resultando do contacto realizado pessoalmente, num primeiro momento, a um grupo de 30 psicoterapeutas de reconhecida experiência, de diferentes zonas geográficas do país, dos quais 18 responderam afirmativamente à participação no estudo, durante os meses de Janeiro e Fevereiro de 2009. Todos os participantes possuem habilitações para a atividade clínica que desenvolvem e a sua prática está creditada por sociedades científicas, instituições de formação, ou outras instituições da rede pública ou privada, devidamente reconhecidas, sendo a sua prática clínica também desenvolvida em contexto privado ou em serviços públicos.

87

Procedimento de recolha de informação

Seguidamente, os psicoterapeutas foram contactados por correio eletrónico, sendo enviada uma carta com uma descrição resumida do projeto e em anexo uma página formato A4 com a seguinte questão: “O que faz para preservar o setting no seu trabalho psicoterapêutico?”. Era ainda referido que, em “nota de rodapé”, nos pudessem sugerir qual a questão (ou questões) que colocariam a um painel alargado de psicoterapeutas para melhor concretizar o conceito e manejo do setting. Assim, foi proposto a cada um dos sujeitos já previamente contactados que, com base na sua experiência (de saber e saber fazer), nos transmitisse os seus comentários sobre a questão colocada em título. Deste modo, as respostas a esta primeira consulta resultam da reflexão de um conjunto de psicoterapeutas devidamente credenciados e com experiência clínica comprovada.

As respostas recebidas foram, primeiramente, trabalhadas de acordo com a metodologia de análise de conteúdo, para identificação das categorias e subcategorias relativas ao manejo do setting referidas pelos respondentes.

A análise de conteúdo é uma técnica de investigação que permite a explicitação, sistematização e expressão do conteúdo manifesto das mensagens/comunicações numa descrição objetiva, tendo por finalidade a sua interpretação (Carmo & Ferreira, 1998; Vilelas, 2009). Mais especificamente, e de acordo com Bardin (1977), a análise de conteúdo corresponde a:

“Um conjunto de técnicas de interpretação da comunicação visando obter, por procedimentos sistemáticos e objectivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas mensagens” (p. 42).

A fim de alcançar este objetivo, o processo de análise de conteúdo foi organizado em três momentos: 1) pré-análise; 2) exploração do material e 3) tratamento dos resultados e interpretação (Vilelas, 2009). De entre as várias técnicas desenvolvidas para a análise de conteúdo, optamos pela análise temática ou categorial. Esta visa desvendar os núcleos de sentido que compõem uma comunicação e preocupa-se também com a frequência desses núcleos, sob a forma de dados segmentáveis e comparáveis (Bardin, 1977), o que, nesta fase cumpre os nossos propósitos. Sob a orientação destes autores e das indicações teóricas, avançámos para a análise categorial das respostas dadas pelo painel de psicoterapeutas participantes nesta fase do estudo.

88

Painel de psicoterapeutas

Conforme já referido, 18 psicoterapeutas aceitaram participar nesta tarefa. Estes pertencem maioritariamente ao género feminino (n = 12; 66.7%) sendo os restantes (n = 6; 33.3 %) do género masculino. Todos os sujeitos possuem formação académica em psicologia, à exceção de 1, do sexo feminino, com formação em medicina. Quanto à sua distribuição por orientação terapêutica de base, 5 (27.8%) são terapeutas cognitivo- comportamentais, e 13 (72.2%) reportam-se à teoria psicodinâmica.

Categorias e subcategorias identificadas

Depois de uma primeira triagem/mapeamento, passámos a um segundo momento em que algumas subcategorias foram agregadas e integradas numa mesma categoria (podendo estas ainda ser reajustadas). Neste caso, e ensaiando apropriar um método de análise de conteúdo das respostas, fomos construindo categorias e subcategorias, em função dos termos, expressões ou conceitos abordados pelos inquiridos.

O conjunto de categorias construído diz respeito à primeira tentativa de categorização do material encontrado nas respostas dos participantes, relativas a esta fase da construção do instrumento de avaliação do setting. Com base nestas respostas, e utilizando a análise temática ou categorial, identificámos 5 categorias, cada uma delas integrando subcategorias, que apresentamos na Tabela 4.1.

Tabela 4.1. Categorias e subcategorias identificadas

Questão colocada: o que faz para preservar o setting no seu trabalho terapêutico? Categorias e subcategorias identificadas nas respostas

Categoria Subcategoria

Regras/contrato

Características do terapeuta

Características do paciente

Uso do telefone durante a sessão

Faltas, trocas, férias e horários das sessões Pagamentos

Contactos extrasessão

Tolerância a alterações das regras do contrato Continente/suporte

Contratransferência Verbalização

Comentário/interpretação Reflexão com pares/supervisão Paciente como protagonista Transferência

89 Espaço terapêutico Relação terapêutica Conforto e segurança Manutenção/mudança Ambiência Decoração Gratificação Frustração empatia

Comunicação não verbal Total = 5 categorias e 21 subcategorias

Apresentamos, de seguida, a descrição da distribuição dos nossos inquiridos pelas categorias e subcategorias identificadas, fazendo apenas um breve comentário relativamente à sua frequência e percentagem de respostas encontradas.

A categoria “Regras/contrato” subdivide-se em “uso do telefone durante a sessão” (n = 6; 15,8%), “faltas/trocas/férias/horários das sessões” (n = 13; 34,2%), “pagamentos” (n = 5; 13,2%), “contactos extra sessão” (n = 4; 10,5%) e “tolerância a alterações das regras e do contrato” (n = 10; 26,3%).

A categoria “Características do terapeuta” subdivide-se em 5 subcategorias: “continente/ suporte” (n = 4; 30,8%), “contratransferência” (n = 3; 23,1%), “verbalização” (n = 2; 15,4%), “comentário/ interpretação” (n = 3; 23,1%) e “reflexão com pares/supervisão” (n = 1; 7,7%).

Quanto à categoria “Características do paciente”, esta assume 3 subcategorias: “paciente como protagonista” (n = 7; 77,8%), “transferência” (n = 1; 11,1%) e “acting” (n = 1; 11,1%).

Na categoria “Espaço terapêutico” encontramos 4 subcategorias: “conforto e segurança“ (n = 5; 25,0%), “manutenção/mudança” (n = 6; 30,0%), “ambiência” (n = 4; 20,0%) e “decoração” (n = 5; 25,0%).

Relativamente à categoria “Relação terapêutica” identificamos 4 subcategorias: “gratificação” (n = 6; 31,6%), “frustração” (n = 5; 26,3%), “empatia” (n = 5; 26,3%) e “comunicação não verbal” (n = 3; 15,8%).

Verificamos nestes dados que três das categorias encontradas são idênticas aos fatores comuns encontrados por Grencavage e Norcross (1990) e expostos na revisão teórica desta dissertação (“Características do terapeuta”, “Características do paciente” e “Relação terapêutica”). As outras duas categorias encontradas, são estabelecidas de forma mais dirigida ao conceito “tradicional” de setting terapêutico (“regras/contrato” e “espaço terapêutico”).

90