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Estudos sobre concepções dos professores acerca das visualizações

3. CONCEPÇÕES DE PROFESSORES

3.2 Estudos sobre concepções dos professores acerca das visualizações

Todavia, estas considerações sobre concepções emergem, nomeadamente da área de pesquisa das concepções de ensino ou concepções sobre ciência dos professores Tradicionalmente a pesquisa sobre o uso de visualizações no ensino de ciências tem sido focada no aluno. Como já referido, anteriormente, são bem menores os trabalhos que têm como foco os professores e não encontramos trabalhos que tenham como foco específico as concepções dos professores sobre recursos visuais. No entanto, entendemos que as concepções destes sobre o uso de visualizações são reflexo de outras concepções que fazem parte do ser profissional docente. Os trabalhos encontrados e que passaremos a descrever têm como foco o uso de recursos multimídia ou TIC e dividem-se em dois grupos. No primeiro grupo, discute-se teoricamente, através de uma revisão da literatura, a importância dos conhecimentos, valores, crenças e atitudes que os professores têm acerca destes recursos e, por consequência, que tipo de concepções devem ter os professores para que o seu uso em sala de aula seja adequado (FROST, 2005; PONTE, 2000; ROGERS; FINLAYSON, 2004; WEBB, 2005). No segundo grupo, apresentam-se dois trabalhos empíricos que descrevem alguns pensamentos, crenças e atitudes de professores face a estes recursos (COX; PRESTON; COX, 1999b; HENNESSY; DEANEY; RUTHVEN, 2006; ROBBLEE et al., 2000).

Numa era em que a linguagem, como recurso na aprendizagem, se estende para além do texto escrito para diagramas e textos e, ainda, para modelos, o uso de recursos TIC tem-se

51 expandido muito rapidamente (FROST, 2005). Para esta autora encontrar atualmente recursos não é um problema de disponibilidade, mas acima de tudo de excesso, o que traz problemas de escolha e de adequação. Os recursos selecionados devem atender as necessidades dos alunos e promover a sua aprendizagem. Sendo assim, a forma de selecionar e utilizar estes recursos vai refletir tanto o modelo que o professor tiver de aprendizagem, como o papel do professor nesse modelo (FROST, 2005). Esta autora salienta, ainda, que as decisões sobre o que escolher, ou como construir recursos é feita, em parte em razões pragmáticas, mas deve também ser realizada com base em contributos teóricos, como os da psicologia cognitiva, ou aqueles preocupados com diferentes estilos de aprendizagem e motivações. Colocando o foco na linguagem e na sua importância na aprendizagem, esta autora menciona que os professores devem ter a noção deste papel para compreenderem a natureza da aprendizagem e os recursos relevantes. Desta forma, torna-se importante perceber quais são as concepções dos professores acerca dos recursos visuais, nomeadamente os incorporados em tecnologia.

No que diz respeito às tecnologias de informação e comunicação (TIC), as atitudes dos professores são muito diversas (PONTE, 2000). Para este autor, coexistem três tipos de comportamento perante estes recursos. Alguns professores procuram evitar, adiar ao máximo o seu uso, mostrando um sentimento de desconfiança. Outros, apesar de as utilizarem na sua vida diária não sabem muito bem como as integrar na sua prática letiva. Outros, ainda, procuram usá-las nas suas aulas sem, contudo, alterar as suas práticas. Por fim, um grupo minoritário procura introduzir estes recursos, superando dificuldades, explorando novos recursos e ideias. No entanto, este cenário parece estar a alterar-se, muitos estudos mostram que os professores apresentam atitudes mais positivas em relação às TIC devido à participação em cursos de formação e, também, devido às intervenções governamentais de alguns países, no sentido de facilitar o acesso dos professores a computadores pessoais (através de incentivos econômicos) e apetrechamento das escolas com internet de banda larga, lousas interativas, salas de informática, etc. (BALANSKAT; BLAMIRE; KEFALA, 2006).

Noutro estudo (WEBB, 2005), igualmente focado no uso de TIC, a autora apresenta uma análise detalhada de como os benefícios de ambientes ricos em TIC, identificados a partir de uma revisão da literatura, podem suportar a aprendizagem de ciências dentro de um quadro teórico para a prática pedagógica em educação em ciências. A autora identifica quatro principais benefícios do uso de TIC para a aprendizagem: promoção de uma aceleração cognitiva; permitir uma diversidade de experiências de forma aos alunos relacionarem a

52 ciência como o seu cotidiano; aumentar a autonomia dos alunos e facilitar a recolha e apresentação de dados. Para esta autora estes benefícios destes recursos poderão ser, ainda, mais potencializados quando integrados com outras inovações pedagógicas (por exemplo, abordagens construtivistas). Desta forma, a autora salienta e discute o papel do professor no uso destes recursos, reconhecendo-se que os professores estão na linha da frente no que diz respeito à sua prática (ROGERS; FINLAYSON, 2004). Lin e Hsi (2000 apud WEBB, 2005), referem que para cada classe o professor precisa pesquisar qual o entendimento dos alunos, analisar o seu pensamento e identificar questões (argumentos) essenciais para construir em cima das ideias dos alunos, inspirando-os a refletir e a reestruturar as suas visões. A introdução destas questões essenciais deve ser feita em momentos apropriados da discussão com os alunos, sendo o papel do professor questionar e promover a interação entre os alunos. Analogamente, Webb (2005) sugere que com o uso de recursos multimídia (simulações), e por forma a incorporá-los efetivamente nas suas práticas pedagógicas, os professores devem conhecer o leque de possíveis concepções alternativas dos alunos, identificar os benefícios providenciados pelos recursos e avaliá-los em relação aos benefícios providenciados por outras atividades, como, por exemplo, experimentos de laboratório. A autora menciona, igualmente, que a partir das evidências apresentadas ao longo do trabalho, os professores têm um papel crucial no planejamento de atividades de aprendizagem dos seus alunos com o uso destes recursos e que este papel nem sempre tem sido enfatizado. Rogers e Finlayson (2003) referem que ainda existem professores que incorporam TIC com a expectativa errada que estes recursos podem funcionar sem uma orientação pedagógica.

Sendo assim, as crenças (beliefs) dos professores acerca destes recursos têm uma importância na sua escolha e na forma como são integrados em sala de aula, existindo, inclusivamente, casos em que se verifica uma rejeição em relação ao uso destes recursos (ROGERS; FINLAYSON, 2004). De acordo com estes autores, esta rejeição acontece inevitavelmente quando há falta de tempo para os professores aprenderem a usar as TIC e devido à falta de suporte técnico nas escolas para os casos em que se verifica pouca confiança nas suas competências digitais. Quando estas condições estão minimamente asseguradas o uso e a escolha destes recursos assentam na visão que estes têm da aprendizagem (ROGERS; FINLAYSON, 2004). Por exemplo, nos casos em que os professores se veem como transmissores do conhecimento, a tendência será para usar estes recursos para demonstrar/explicar algo para a toda classe, nos casos em que o professor se vê como um

53 mediador na construção do conhecimento pelo aluno, a tendência será para os alunos utilizarem estes recursos em pequenos grupos, se as escolas apresentarem condições para isso. Face ao exposto, os professores precisam não só de acreditar que os benefícios destes recursos podem suportar a aprendizagem dos alunos, mas que eles próprios têm um papel importante no planejamento e gestão das aulas, de forma a que estes benefícios vão ao encontro das necessidades dos alunos, e que estes os percebam e os utilizem (WEBB, 2005). Neste trabalho sugere-se que seria proveitoso considerar em conjunto tanto conhecimento pedagógico dos professores, como o conhecimento pedagógico dos alunos. Este conhecimento pedagógico dos alunos poderá ser avaliado em situações em que é dado um maior controle ao aluno durante a aula, isto é, em situações em que o aluno avalia o que sabe, e procura estratégias para aprender o que não sabe, escolhendo a atividade e o tempo necessário para realizá-la. Estas relações são expostas pela autora no seguinte esquema (Fig. 3.1) que foi traduzido e adaptado por nós.

Figura 3.1 – Enquadramento teórico para práticas relacionadas com ICT (WEBB, 2005)

Conhecimentos, crenças e valores dos professores Conhecimentos, crenças e valores dos alunos Conhecimento pedagógico dos alunos Conhecimento pedagógico dos professores Papel dos professores Benefícios de ICT Papel dos alunos Planos de aula Participação em atividades de aprendizagem Conhecimentos, compreensão e habilidades dos alunos

54 Em Cox, Preston e Cox (1999b), os autores apresentam os motivos mais importantes que levam os professores a utilizarem TIC. Os principais motivos apresentados são: tornarem as aulas mais interessantes, mais fáceis, mais divertidas para eles e, para os alunos mais diversificadas, mais motivantes e mais agradáveis. Além destes motivos, os professores adicionam outros fatores pessoais para o uso destes recursos: permitir o acesso a computadores para uso pessoal, dar maior poder ao professor na escola, dar ao professor maior prestígio, tornar a gestão do professor mais eficiente e providenciar suporte profissional através da internet. Estes autores terminam concluindo que estes resultados têm implicações na formação de professores, referindo a necessidade de estes terem formação nesta área e de esta focar não só os aspectos técnicos, mas também aspectos pedagógicos. Só desta forma poderemos “convencer” os professores da utilidade destes recursos no ensino.

Hennessy, Deaney e Ruthven (2006) apresentam um estudo que explora as estratégias pedagógicas dos professores para o uso de simulações multimídia no ensino médio de ciências. Apresentam dois estudos de caso, em que se verificam duas abordagens distintas. Num dos casos o professor utiliza o recurso visual (simulação) para promover uma discussão com toda a turma com o objetivo de elaborar significados conjuntamente com os alunos, o que pressupõe uma concepção de ensino construtivista. No outro caso, o professor promove um uso individual da simulação por cada aluno suportado por um roteiro. Todavia, as interações do professor servem, essencialmente, para manter os alunos focados na tarefa do roteiro. Em outras situações, as interações são usadas para explicar os conceitos subjacentes às visualizações dos alunos, o que pressupõe uma concepção mais tradicional de ensino. Os autores terminam concluindo que, de uma forma geral, os professores referem que usam (motivos) as simulações quando há dificuldades laboratoriais. Mencionam, igualmente, que estes usam diferentes estratégias para explorar os benefícios das simulações que adaptam o uso da simulação para os respectivos contextos levando em conta (critérios): o nível técnico de competência dos alunos, as abordagens pedagógicas preferidas, familiaridade dos alunos com os conteúdos (conhecimentos prévios), tempo disponível, fatores físicos e organizacionais e outros fatores culturais inter-relacionados. Estes resultados evidenciam o conhecimento das potencialidades destes recursos, ideias quanto à forma como estes recursos devem ser explorados e critérios amplos para a sua seleção, ou seja, um conjunto de concepções alargadas sobre estes recursos.

55 Robblee et al. (2000) conduziram um estudo em que procuravam identificar o papel das crenças dos professores no uso de softwares de modelagem molecular para ensinar estruturas moleculares e atômicas segundo a perspectiva da mecânica quântica. Foram analisados quatro professores, considerados quatro casos, com elevada experiência profissional (entre dezoito e vinte e nove anos de serviço) que receberam previamente formação para se familiarizarem com os softwares disponibilizados pelos pesquisadores. Foram utilizados diversos instrumentos de coleta de dados (observação de aulas, entrevistas informais e semiestruturadas e questionários), tendo-se observado cada professor, na respectiva escola, por um período de três a quatro meses. Durante o período de observação cada professor foi encorajado a utilizar a sua experiência profissional e conhecimentos específicos acerca dos seus alunos para determinar qual o uso mais apropriado destes recursos em sala de aula.

Através dos resultados obtidos os pesquisadores concluem que, as crenças relacionadas com a visão que os professores têm da aprendizagem dos alunos e do seu papel como professores tiveram uma grande influência nas suas decisões pedagógicas. Embora o software utilizado fomentasse a utilização de atividades de aprendizagem por investigação, cada professor utilizou o software de acordo as suas abordagens preferidas. Em dois casos foram utilizadas abordagens consistentes com visões construtivistas da aprendizagem, e nos outros dois casos foram utilizadas abordagens mais coerentes com modelos de aprendizagem por transmissão de conhecimentos. Nos primeiros dois casos prevaleceram estratégias que fomentavam a aprendizagem dos alunos por investigação, orientadas pelo professor. Aos alunos era permitida autonomia para criar imagens, compará-las, desenvolver hipóteses e testá-las. Nos outros dois casos, embora um dos professores tenha concebido uma atividade de investigação, após os alunos terem recolhido os dados, foi o professor que explicou os resultados obtidos em vez de encorajar os alunos a elaborarem hipóteses e a testarem as suas ideias. As estratégias utilizadas nestes dois casos centraram-se em possibilitar aos alunos a criação de imagens de átomos e identificar as formas das nuvens eletrônicas, etc.

Apesar de, por vezes, surgirem alguns estudos (DUSCHL; WRIGHT, 1989; LEDERMAN; ZEIDLER, 1987) que não encontram necessariamente uma ligação entre as concepções dos professores e as suas práticas, verifica-se algum consenso (ERNEST, 1989; FANG, 1996; GUSKEY, 1986; JONES; CARTER, 2007; PAJARES, 1992; RICHARDSON, 1996) no sentido de admitir que em vários casos essa influência existe, sendo inclusivamente

56 “consideradas críticas para entender a prática dos professores” (LUFT; ROEHRIG, 2007, p. 40). Nesta ótica proliferam estudos, alguns tentam perceber o que impede a transposição das concepções dos professores para as suas práticas, enquanto outros indicam que as concepções dos professores acerca da natureza da ciência não são as mais adequadas e que estas acabam por influenciar o tipo de ensino, reconhecendo-se que cada linha de pesquisa “é uma como uma peça de um puzzle para entender este fenômeno” (LEDERMAN, 1992, p. 21). Como consequência destes estudos, Lederman (1992) apresenta já nesta década outra linha de pesquisa que tenta entender como se podem alterar as concepções dos professores que será discutida no ponto seguinte deste trabalho.