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Após a análise formal dos posts que retrataram imigrantes e da recepção do público a partir de reações e comentários expressos na página passamos para a etapa da interpretação e (re)interpretação do material. Esta fasepermite, segundo Thompson (1995), um pensamentonovo, com possibilidades originais de interpretação sobre um novo objeto, pois ela opera pela construção significativa de possíveis resultados.

Apontamos, então, cinco tendências evidenciadas a partir das fases anteriores:

a) As manifestações do público estão relacionadas diretamente com o tipo de conteúdo publicado em Humans of New York

Esta é conclusão mais evidente a partir do que foi estudado até o momento. Brandon publica um conteúdo formatado e o público que acompanha a página sabe o que vai encontrar: uma foto impactante do rosto de um imigrante acompanhado de um relato que apela diretamente para as emoções destes leitores. Como vimos no capítulo “a vida através da tela”, sabemos que existe, no Facebook, uma sobrecarga de informações e o que não chama a atenção é descartado. É muito natural, portanto, que produtores de conteúdo procurem meios

de atingir e fidelizar o maior público possível. Brandon encontrou uma fórmula que tem funcionado nos últimos anos.

O post da imigrante albanesa (p. 113) é um dos mais fortes e tristes em termos de conteúdo. Temos o retrato de uma imigrante que sofre, luta, mas consegue se integrar à sociedade estadunidense (o que é representado por aprender o inglês, pagar a hipoteca, conseguir trabalhos, ter condições de colocar o filho em uma escola privada), em amenizar as diferenças que tornam ela um Outro. O ponto de virada acontece quando ela conta sobre a descoberta da doença do filho. Os usuários torcem por ela. O público, muitas vezes, dialoga diretamente com ela, a retratada. Há uma discussão, no espaço de comentários, sobre as poucas reações que o post recebeu – e é interessante como os próprios usuários percebem esta mudança que reflete um valor social. De fato, se compararmos com os três posts de imigrantes publicados anteriormente, o da albanesa é o menos popular: a nível de comparação, o post do brasileiro teve mais de 5 mil comentários e mais de 800 mil reações; o post da liberiana recebeu mais de 9 mil comentários e 800 mil reações; o post da indiana recebeu mais de 5 mil comentários e 444 mil reações. Em contraste, o post da albanesa recebeu apenas 1,3 mil comentários, teve 2.098 comentários e 97 mil reações.

Uma das usuárias respondeu ao questionamento sobre “a falta de reações” defendendo que é “triste demais” e que ela não “curte” o que aquela imigrante está enfrentando. O post da imigrante albanesa foi publicado no início de maio de 2016, menos de três meses após as reações terem sido lançadas pelo Facebook, então é provável que o público ainda não estivesse se sentindo confortável para se manifestar de forma “apropriada” – no caso, “triste” - publicamente.

Já no 12º post, que retratou uma jornalista muçulmana (p. 134) – o conteúdo do seu depoimento é marcado por angústias em relação à vitória de Donald Trump –, observamos muitas manifestações por parte do público: das 536 mil reações, 311 mil “curtiram”, 17 mil “amaram” e 203 mil, quase metade das reações totais, representavam tristeza.

No 7º post, temos um imigrante gabonense (p. 121) com um relato que exprime um misto de raiva e tristeza em relação ao país natal. Na foto, vemos uma expressão séria, ligeiramente irônica. Pela primeira vez, observamos um número expressivo de reações “com raiva”: das reações totais, 165 mil, 19 mil eram de raiva – o que pode ser visto como o público contrário aos abusos de poder no Gabão descritos pelo entrevistado.

A partir disto, é necessário apontar para a importância da incorporação das reações, o que demonstra o quanto o Facebook esteve atento à necessidade de permitir que o seu público pudesse se expressar de uma maneira mais personalizada – indo além do genérico “curtir”.

No post da imigrante chinesa (p. 115), também vemos um apelo emocional quando a jovem descreve a seguinte cena:“[...] minha mãe ficou muito emocional. Ela começou a chorar e disse: “Nós não podemos brigar, somos só nós duas. Nós temos que ficar juntas”. Naquele momento eu percebi o quanto eu mudei a vida da minha mãe [...]” (HUMANS OF NEW

YORK, 2016). Uma das usuárias contou que, como a retratada, também foi adotada na China, e aquele relato, em suas palavras “aqueceu o seu coração”. Uma das usuárias resumiu bem o impacto que HONY possui entre as pessoas: ela conta não ter nada tangível em comum com a retratada, e, ainda assim, chora ao sentir uma conexão com o relato a foto do post.

A partir do que vimos com Sibilia (2008), Turner (1983) e Schechner (2002), vemos a importância de a pessoa que é o cérebro de HONY ser um produtor de conteúdo como Brandon Stanton, um performer, em um espaço que permite (e estimula) que ele assim o seja. Trata-se de um espaço que, em termos de visibilidade, propicia a publicação de conteúdos com um potencial narrativo que é traduzido em uma série de exibições de intimidades alheias. Quando falamos na expressão de um sentimento, fato tão associado nomundo ocidental à espontaneidade da escolha individual, vemos a capacidade micropolítica das emoções, o que aqui implica um potencial reforçar a dimensão macrossocial em que as emoções são suscitadas e vivenciadas (REZENDE; COELHO, 2010). A partir de HONY, vemos que esta ideia é comprovada: a emoção é o gatilho que estimula as pessoas a reagirem e comentarem, com opiniões que exprimem um significado de inclusão ou exclusão em relação ao imigrante.

Em alguns posts, a questão da diferença fica mais óbvia, o que acaba sendo refletido nos comentários. Como exemplo, temosaqueles observados no post da imigrante boliviana (p. 141). Ela fala, em seu relato, sobre a relação conturbada com os pais, extremamente conservadores e controladores. Os comentários mais populares caem em um senso comum, como “apenas se afaste” ou “você não mora mais com eles, toque a sua vida”. Em resposta, muitos usuários atentaram para as diferenças culturais que podem reger relacionamentos familiares. Uma usuária comentou “depende de onde você é e que tipo de valores familiares você tem” e outra, brasileira: “este foi um dos poucos posts de HONY onde os comentários pareceram bem insensíveis e pouco empáticos ao meu ver. [...] Eu sou brasileira e eu consigo me identificar com boa parte daquilo que essa mulher descreveu”.

No post da imigrante mexicana (p. 149), vamos uma usuária dizendo que “essas pessoas não têm direitos aos nossos serviços públicos!” – exprimindo uma diferença entre nós (americanos) e eles (imigrantes). No post do imigrante kosovar (p. 127), alguns comentários exprimiram a noção de que o imigrante deve sempre se adaptar à cultura local – um dos

comentários falava, inclusive, que “nós temos comunidades gigantescas de mexicanos e chineses nos EUA, e eles são forçados a fazer todas as coisas que você mencionou. [...] Se você quer ser albanês, pule de volta a fronteira para a Albânia”. Este comentário contava com 1,9 mil curtidas, o que indica que um número significativo de pessoas concordava com o que estava sendo dito ali.

Como vimos, as afirmações sobre diferença só fazem sentido se compreendidas em sua relação com as afirmações sobre a identidade. Quando a jovem boliviana afirma que “ela é da Bolívia”, está implícito que ela não é dos Estados Unidos ou da China (SILVA, 2009). Esta classificação, que implica diferença, muitas vezes tem uma conotação negativa por causa da exclusão ou da marginalização daquelas pessoas que são definidas como o Outro ou forasteiro (WOODWARD, 2009). Como vimos em Simmel (1983), o estrangeiro pode ser próximo quando sentimos que entre ele e nós ocorrem igualdades sociais, profissionais ou simplesmente humanas; por outro lado, quando essas igualdades não existem esse estrangeiro é um Outro (SIMMEL, 1983).

Han defende que, hoje, o imigrante não é mais um Outro pois não causa medo (HAN, 2015). Mas para Kristeva (1994), o imigrante, justamente, lança o desafio de ser diferente dentro da nova identidade coletiva onde se encontra – a diferença, que, como vimos, centrada em sistemas classificatórios que permitem a exclusão e, mais raramente, a inclusão (WOODWARD, 2009). Portanto, o imigrante, conforme o contexto que propomos aqui, a partir do clima políticos nos Estados Unidos, a partir de uma página publicada em inglês, que retrata imigrantes em uma metrópole estadunidense, este imigrante é, sim, um Outro, um símbolo da alteridade. Em HONY, este Outro pode assumir muitos personagens e representações. Sob a perspectiva deste trabalho, vemos que a presença de imigrantes suscita, muitas vezes, desconforto e denuncia o preconceito.

Como pondera Capurro (2010): o que significa a transformação da humanidade em uma totalidade mediatizada e diferenciada digitalmente? (CAPURRO, 2010). No contexto da Web 2.0, o Outro se torna um humano 2.0, dependente de ume tela para ser (auto)representado e, como veremos no último item desta etapa, de algoritmos para ser percebido.

b) As pessoas respondem de forma empática ao sofrimento alheio – e isto é traduzido em forma de reações e comentários

No primeiro post analisado, aquele que retrata um imigrante brasileiro, percebe-se que a maioria dos comentários é caracterizada por ter uma carga positiva, com mensagens de apoio e de incentivo a Bruno, o retratado (p. 106). Várias pessoas comentaram frases como “bem-vindo” e “tudo vai dar certo”. No post do imigrante ganês (p. 138), empregado da CVS, um dos comentários deixados dizia: “você é mais do que bem-vindo aqui, senhor”. No post da jovem bahamense, muitos comentários exprimiam frase como “nós estamos ao seu lado.”

No post que retrata a imigrante indiana (p. 111), outros imigrantes também se sentiram tocados pelo relato e compartilharam a sua experiência, dizendo que história dela era “inspiradora” e que elas também viveram vidas programadas como a sua. Já no post do imigrante coreano (p. 118), no qual ele conta sobre a força da comunidade local – que personifica uma referência cultural em um país estrangeiro – e sobre as dificuldades básicas, como pagar o aluguel e alimentar a família. Uma pessoa, ao comentar no post, escreveu: “como uma imigrante, eu posso dizer que isto são todos nós”. No 15º post (p. 143) que retratou um imigrante não identificado (que tinha Forrest Gump como ídolo), um usuário comentou: “eu vim para esse país com 12 anos e não falava inglês básico tampouco. Eu completei o meu mestrado dois anos atrás!”.

Através das reações, as pessoas expressam publicamente o que sentem ao ler aquela história. É algo rápido, que acontece em uma deslizada de tela, o que pode ser uma manifestação “fácil” frente a um imigrante que representa diferença e alteridade. Não há como saber ao certo o “quanto” as pessoas foram afetadas por aquele conteúdo. A partir de comentários, isto é mais fácil de ser “qualificado”. Muitas pessoas expressam apoio às pessoas ali retratadas. É necessário, contudo, levar em conta a questão do capital social. Como vimos no capítulo 1, isto pode influenciar a genuinidade de uma expressão: sendo um comentário que agrada a maioria, e receber curtidas, o comentário é deslocado para o topo, se tornando relevante e popular.

Esta questão enfrentada sobre “dosar” a empatia frente à alteridade é um desafio quando temos um objeto digital, com atores que se expressam através da tela. A empatia é um conceito essencial quando tratamos de relações interpessoais (KANDO, 1977). Mas se a empatia acontece, justamente a partir de uma “experiência do Outro”, de cultura estranha (HUSSERL, 1980), em HONY, a empatia do público é incorporadae traduzida através de reações e comentários.

Exemplo disto é o comentário no post da jornalista muçulmana (p. 134) que recebeu 42 mil curtidas – destas, metade eram “amei”. O comentário falava em manter o amor e ser gentil uns com os outros e não acreditar que o país seria “engolido” por ódio e intolerância.

Temos um exemplo, contudo, de comentários que foram recebidos com manifestações negativas por parte do resto do público: no post da imigrante bahamense (p. 160), uma usuária criticou a jovem dizendo que ela era ilegal e teve mil reações de “raiva” e apenas 55 curtidas.

É interessante, neste sentido, observar que as pessoas reagem - com curtidas, amor, graça,tristeza, raiva ousupresa–aos comentários umas das outras. É uma forma de endossar aquela ideia ou protestar, significando: não concordo com você. Isto também é uma forma de medir a empatia. Esta possibilidade de “reação” no Facebook, de manifestação pública, é algo que também impacta as nossas identidades digitais – múltiplas, fragmentadas e cambiantes - uma vez que estas interações na rede assumem um novo peso que impacta a própria constituição do Eu online (BAYM, 2010; TURKLE, 1997).

Neste ponto, também é possível unir as ideias de performance com as ideias acerca das emoções. A noção de Brandon como performer, um fotógrafo que “recorta” à sua maneira os acontecimentos ao seu redor (DUBOIS, 1993), corresponde aos sentidos conferidos por Schechner (2002), de que, entre muitas funções, as performances podem entreter um determinado público e marcar identidades. Além disso, é possível estabelecer uma conexão entre a ideia de performance a conceitos relacionados à antropologia das emoções. Para Rezende e Coelho (2010), a recepção do público a certos conteúdos performáticos vão ocorrer de acordo com as experiências emocionais dos receptores. Inclusive, as dinâmicas de inclusão/exclusão que regem as relações entre os grupos sociais dependem “mapas de navegação emocional” (REZENDE; COELHO, 2010), que, por sua vez, dependem do modo como certas informações são passadas adiante (permeadas por emoções ou não).

c) Os posts que receberam mais reações não foram, necessariamente, os posts que receberam mais comentários

É interessante observar, por exemplo, que o post da imigrante chinesa (p. 115) é um dos mais populares em reações, mas não em comentários. Isto se contrapõe ao post do imigrante não-especificado 2 (sobre o garoto fã de Forrest Gump, p. 143), classificado entre os cinco mais populares em comentários, mas não em reações. Neste sentido, podemos inferir que o público, em alguns posts, tem a necessidade de transmitir a sua opinião em forma de palavras – ao contrário de uma manifestação direta ou simples a partir de uma reação, uma apertada em um botão durante uma deslizada de tela. A interação, porém, ocorre justamente a partir de comentários. Em certos pontos, as pessoas não estão mais falando apenas com

Brandon ou com a pessoa da foto, mas começam a falar entre si, transformando aquele espaço em um chat de discussão. Como exemplos, vemos os debates no post da imigrante mexicana (p. 149), a favor e contra o DACA, e debates polêmicos entre pessoas indignadas devido aos Sonhadores estarem “roubando” vagas de americanos e por não serem legalizados (em contraponto, pessoas os defendem e empatizam com a situação enfrentada por eles).

Martino (2016) sugere que em meio ao encontro do Outro online, ao invés de aprofundarmos este encontro e aprender sobre as diferenças existentes, acabamos por colocar o “eu” no centro de qualquer discurso. Temos vários exemplos disto acontecendo em HONY. No post do imigrante guianês (p. 146), o entrevistado discorre sobre como a falta de afeto é algo comum em seu país de origem. Um dos usuários fala sobre aquilo ser uma “bobagem total”, uma vez que ele também foi criado na Guiana e ele ama os seus pais e gosta de voltar para a casa. Um dos usuários resumiu bem a teoria de Martino (2016) a partir do seu comentário:

Usuária 138: Mas isso não é sobre *você* e a *sua* experiência, Usuário 137. Isso é sobre ele e a esposa dele e as famílias “deles”. Em nenhum momento este homem disse “isso é como *todos* os guineses são criados”. (HUMANS OF NEW YORK, 2017, tradução nossa314)

O post da imigrante boliviana (p. 141) também serviu para que muitas pessoas contassem as suas próprias experiências com familiares abusivos e relacionamentos tóxicos. É interessante observar, inclusive, que este post foi classificado entre os cinco com menos reações – entretanto, recebeu 5 mil comentários, o que é um número bastante significativo. Ainda que seja o caso desta “alteridade digital” que Martino (2016) descreve – uma que coloca o Eu no centro ao invés do Outro a partir dos comentários – as pessoas quiseram ir além das reações. No post imigrante guatemalteco (p. 124), o caso é inverso: ele está classificado entre os cinco com menos comentários – mas recebeu 252 mil reações. As pessoas sentiram que não havia muito o que expressar em forma de palavras – frente a um homem que adotou Nova York como o seu lar e que aponta os latinos como os novos bodes expiatórios da vez no que tange o assunto imigração – mas isso não as impediu de “reagir” frente a sua história.

d) Os posts que retrataram os “Sonhadores” instigaram comentários de ódio na página

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But this isn't about *you* and *your* experience, Conrad. This is about him and his wife and *their* families. At no point did this man say "this is how *all* Guyanese are raised".

A partir do dia 20 de setembro de 2017, Brandon inicia a série dos Sonhadores, e isto implica mudanças em relação aos posts anteriores. Há todo um contexto político por trás, e este contexto fica mais evidente do que nunca. Como visto anteriormente, a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais de 2016 nos Estados Unidos representou um novo período na política estadunidense que contrasta fortemente com os anos de Barack Obama, visto como um presidente tolerante e humanista. A imigração foi pauta central da campanha de Trump, que nunca escondeu o seu desapreço por imigrantes muçulmanos e latino-americanos (MCKAY, 2017).

Brandon já havia se mostrado atento a questões políticas, como vimos no capítulo 3, apoiando publicamente Hillary, criticando Trump e retratando os habitantes de um distrito que votou de forma decisiva para a vitória do republicano. Esta última iniciativa foi uma clara tentativa de mostrar “o outro lado” e tentar entender quem são as pessoas que pensam de acordo com o mais novo presidente dos Estados Unidos. Dando continuidade a este movimento, postar sobre imigrantes quando os Sonhadores estão ameaçados com o fim do DACA é uma decisão política.

Desta forma, começamos a observar que o imigrante é visto como alguém que “incomoda”, pois não se trata mais do imigrante que apenas luta e sofre ou o do imigrante integrado, mas, sim, de um estrangeiro que ocupa um lugar na sociedade mesmo sendo ilegal. Mesmo não tendo os documentos que denotam “você pertence aos Estados Unidos”, estas pessoas têm acesso a benefícios e educação (prestes a serem tirados por Trump). E isto é um gatilho para pessoas atacarem os Sonhadores e beneficiários do DACA. É algo permite inferir que, neste caso, as pessoas encaram a alteridade como algo positivo, desde que não asafete diretamente.

Algo que reforça esta ideia é um usuário que responde um comentário sobre HONY ser um lugar seguro e pacífico no post do imigrante equatoriano (p. 153). “Sinto muito, mas não é verdade. Na última semana eu li muitos comentários odiosos em uma dessas histórias sobre os sonhadores”, ele aponta.

Neste mesmo post, o primeiro da série dos Sonhadores, observamos uma grande quantidade de comentários que criticam o jovem retratado – desde os que dizem “que choradeira. Quem não tem sonhos?” até “Crianças com sonhos? Risos eles não são sonhadores... Eles são pessoas trazidas para este país ilegalmente” e “Ah, por favor, os seus pais vieram e pegaram os nossos trabalhos”. No post da jovem bahamense (p. 160), temos um comentário que diz: “ela é ILEGAL! [...] eu tenho uma solução, sim, montem uma

universidade nas Bahamas sem qualquer financiamento dos EUA” o que é, em outras palavras, um pedido para deportar a imigrante para o seu local de origem.

Neste ponto, é possível evocar a ideia de Kristeva (1994) sobre a noção do estrangeiro que, além de possuir uma conotação formal, de alguém que não possui a cidadania do país, pode ser visto com um Outro, um intruso, alguém que ocupa o lugar da diferença e desafia a identidade do grupo (KRISTEVA, 1994). Isso explicaria os comentários que associam a ilegalidade do retratado a um contexto negativo/pejorativo.

É interessante observar que nem todos os que criticam os Sonhadores são tão explícitos e não afirmam ser contra os jovens pelas suas nacionalidades, mas, sim, porque acham que eles estão “roubando” lugares de estadunidenses de nascença. Neste sentido, temos uma hospitalidade condicional em HONY: quando há um choque – principalmente de interesses – as pessoas se tornam odiosas e os imigrantes são vistos com uma carga negativa e tratados com preconceito.

Anterior à série dos Sonhadores, contudo, o post do imigrante guatemalteco (p. 124), em julho de 2016, já havia recebido um comentário odioso: “os meus ancestrais imigraram para cá legalmente – que pena que esse idiota não tem a mesma integridade”, uma usuária