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ETAPAS DE GESTÃO DE RISCO E FASES DE OBRA

2 ESTADO DA ARTE

2.5 ETAPAS DE GESTÃO DE RISCO E FASES DE OBRA

Para melhorar o controlo da complexidade de estruturas como os túneis, foram introduzidas novas orientações, que visam proporcionar uma base melhor para o respectivo planeamento dos estudos, da construção e do tempo/estimativa de custos. Para cumprir o objectivo principal de limitar os efeitos dos riscos existentes e futuros e propor soluções que contribuam para reduzir as consequências dos eventuais efeitos, foi-se adaptando as etapas de gestão do risco às fases da obra de um túnel.

Schubert (2004) distingue quatro fases de obra e aplica uma gestão do risco designando para cada fase determinadas tarefas (Figura 2.7). Observa-se que são nas fases preliminares de projecto, que é possível obter uma maior redução no nível de risco da obra subterrânea. Na fase de construção o risco deve-se situar abaixo do nível de risco aceitável, por fim, na fase de exploração este risco deve ser ainda menor, relembrando que os riscos operacionais frequentemente são diferentes dos riscos construtivos.

De acordo com a Figura 2.7 e segundo o mesmo autor, para as diferentes fases deve-se empreender as seguintes actividades:

Fase 1: Estudo prévio

Identificar os factores gerais de risco geotécnico;

Efectuar uma primeira classificação do risco, estabelecer prioridades; Optimizar o alinhamento e/ou a localização do túnel;

Avaliar e seleccionar os métodos básicos de construção. Fase 2: Anteprojecto

Melhorar a avaliação do risco e dos métodos de construção seleccionados; Avaliar probabilidades de ocorrência e potenciais danos;

Minimizar o risco através de adaptações no projecto ou medidas adicionais; Definir o risco residual e o comportamento esperado na construção;

Definir os critérios para o MO. Fase 3: Processo de Concurso

Definir a responsabilidade do risco;

Definir métodos comercialmente justos para lidar com as incertezas; Incluir, opcionalmente, o Empreiteiro na avaliação de riscos.

Fase 4: Construção

Desenvolver um PGR;

Especificar e organizar o MO.

Figura 2.7. Gestão e redução do risco durante as diferentes fases da obra (Schubert, 2004, adaptado). Tomando uma posição um pouco diferente da de Schubert (2004), Caldeira (2005) propõe uma metodologia de gestão cujas etapas estão resumidas da seguinte forma:

A recolha dos dados publicados e não publicados relativos às condições locais do terreno;

A identificação dos perigos e dos riscos geotécnicos para as diferentes fases da obra, com base na informação e na experiência existentes;

A classificação dos riscos geotécnicos de acordo com a sua probabilidade de ocorrência e com o seu impacto na construção;

A identificação de medidas para evitar, gerir, minimizar, partilhar ou transferir o risco, e a verificação de que o nível residual do risco é aceitável;

A atribuição de responsabilidades pelo controlo de cada risco identificado e pelo respectivo encargo económico.

As etapas anteriormente descritas estão em consonância com a estrutura de gestão do risco que tem sido desenvolvida nos Países Baixos por Staveren (2006) desde o início do presente século, resultado de diversos anos de experiência profissional e aplicação de técnicas comprovadas de gestão de risco. Este método, designado de GeoQ (Figura 2.8), onde Q significa qualidade, define-se como um processo cíclico de gestão de riscos do terreno relacionados com as actividades de construção (op. cit.). É um método inovador, apesar de

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os seus elementos serem bastante conhecidos, e consiste num aprofundamento dos processos já existentes de gestão de riscos. Distingue 6 etapas na gestão, constantemente aplicadas e actualizadas, ao longo das 6 fases que complementam a obra; daí ser um método bastante dinâmico e flexível.

Embora as seis fases de obra GeoQ sejam flexíveis, as seis etapas de gestão de riscos GeoQ são bastante rígidas. Estas etapas genéricas devem ser aplicadas, uma a uma, de forma estruturada e estritamente executadas em cada fase de obra, independentemente do número de fases que esta envolva, a fim de se implementar uma adequada gestão dos riscos relacionados com o terreno (Staveren, 2006).

Figura 2.8. Modelo GeoQ de gestão do risco (Brinkman, 2008, adaptado).

Face ao âmbito do trabalho e como já referido, serão tratados com maior ênfase os aspectos associados aos processos de gestão de riscos, principalmente os ligados à fase de construção. Para tal, a presente dissertação pretende implementar uma metodologia intermédia entre o proposto acima por Schubert (2004) e o processo GeoQ (Staveren, 2006), defendendo que todas as 6 etapas desse processo deverão ser aplicadas durante a fase de construção; no entanto, para isso, terá de ser dada maior importância a umas do que a outras. Para isso nos capítulos que se seguem é abordado todo o processo (identificação, avaliação, mitigação e, observação e controlo) que deve ser desenvolvido para se chegar à fase de construção com um risco residual aceitável. Deste modo, é importante distinguir de forma clara os procedimentos de gestão do risco, fase de projecto versus fase de construção (Figura 2.9).

Figura 2.9. Fluxograma de risco fase de projecto versus fase de construção (Wagner, 2006, adaptado).

Seguidamente será apresentado um caso de obra em que as metodologias atrás apresentadas foram de facto implementadas e cuja eficácia foi demonstrada.

Projecto:

Construção:

Completar identificação de perigos e avaliação de risco

P ro ss eg u ir c o m a c o n st ru çã o

Identificar perigos durante a construção

Rever formulário de decisão de construção com risco residual

Completar registo do risco

Completar identificação de perigos e avaliação de risco Identificar perigos

Verificar se mais algum risco pode ser evitado

Completar formulário de decisão de projecto

Completar registo do risco

Informar Dono de Obra Informar Empreiteiro

Identificar riscos residuais

Rever formulário de decisão de projecto com risco residual

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Caso de sucesso: Túnel de San Diego State University (SDSU), Califórnia, 2002.

Um bom exemplo da aplicação dos procedimentos pró-activos de gestão de riscos, realizada com sucesso, é o caso da construção do túnel SDSU.

Revestido a betão projectado, este é um pequeno túnel com 330 metros de comprimento, que passa sob o campus da Universidade do Estado de San Diego, composto por uma linha dupla de metro ligeiro (Thomas et al., 2003 in Silverton et al., 2004). O túnel, com 11 metros de vão, encontra-se envolvido por um conglomerado (i.e., um depósito denso de cascalheira numa matriz arenosa). Poucos túneis foram construídos nesta área, daí que o comportamento do conglomerado ainda não estivesse bem definido. Apresenta-se em seguida e de forma sucinta a gestão de riscos efectuada.

Identificação dos riscos

Uma avaliação inicial dos riscos identificou quatro focos de problemas: a presença de água no conglomerado que poderia levar à perda de resistência por amolecimentodo material; a existência de profundas lentículas de areia solta; o fraco recobrimento dos emboquilhamentos e a potencial actividade sísmica da área. Também fora constatado que o método de construção, utilizando betão projectado, era novo na região. Foram examinadas diferentes sequências de construção em cada uma das secções chave, usando um modelo numérico e com base nos resultados foram especificadas uma série de classes de suporte. Para estudar o comportamento algo complicado do conglomerado, foi utilizado um sofisticado modelo numérico não-linear, validado com base em ensaios de carga em placa realizados in situ (Pound et al., 2003 in Silverton et al., 2004).

Medidas de mitigação

A partir da modelação numérica verificou-se que, subdividindo a semi-secção superior do túnel numa galeria e posteriormente procedendo ao seu alargamento (Figura 2.10), o túnel permanecia estável, mesmo na presença de água. Esta seria drenada de maneira a reduzir as pressões na envolvente do túnel. No projecto estavam incluídas uma série de medidas adicionais de suporte, que poderiam ser aplicadas no caso de se encontrar lentículas de areia. Nalgumas secções o recobrimento chegou a atingir apenas 7 m acima dos 11m de vão do túnel. Mais uma vez, a subdivisão da frente mostrou-se suficiente para manter a estabilidade. A rápida conclusão de todo revestimento com o fecho da soleira foi importante para minimizar os assentamentos devidos ao terreno ser brando. Contudo, o conglomerado

era suficientemente resistente para ser executado o desmonte da semi-secção superior, ao longo de todo o comprimento do túnel e só depois se proceder à escavação da soleira. O projecto sísmico foi baseado em modelos numéricos de comportamento dinâmico, confrontados com simples orientações analíticas para a rigidez relativa da estrutura em relação ao terreno.

Figura 2.10. Secção transversal adoptada para o túnel SDSU (Silverton et al., 2004, adaptado).

Gestão dos riscos na fase de construção

Um representante da equipa de projectistas esteve presente durante todo o período de construção para auxiliar o Empreiteiro e avaliar as mudanças propostas nas medidas de sustimento. Os resultados da monitorização desenvolvida no túnel e no terreno foram avaliados e revistos, diariamente, em reuniões, onde eram também definidas as medidas de sustimento a adoptar para o dia seguinte. Dentro das classes de suporte especificadas no projecto, o sustimento poderia variar de modo a adaptar-se às condições reais encontradas. Sem dúvida que um benefício adicional foi a presença de um elemento da equipa de Projectistas no local que promoveu, assim, o diálogo entre Projectistas e Empreiteiro. Desta maneira, os problemas foram identificados precocemente e as soluções adoptadas foram desenvolvidas em conjunto

.

Em suma, como resultado do trabalho de equipa, o túnel foi concluído com sucesso, em Dezembro de 2002, dentro do prazo previsto. O solo provou ser tão rígido como os ensaios o tinham sugerido, havendo pouca afluência de água. Foram registados assentamentos muito pequenos, de acordo com as previsões iniciais do projecto. A optimização do sustimento e da sequência de escavação possibilitou minimizar custos, bem como atenuar os efeitos de outros atrasos na obra.

Contributo para a gestão do risco geotécnico na construção de túneis