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A complexidade da legislação fiscal resulta recorrentemente do facto de contemplar uma grande diversidade de situações com tratamentos significativamente distintos, dificultando tanto o seu conhecimento e entendimento pelos contribuintes, como a sua fiscalização, ou dessa mesma legislação estar sujeita a grande instabilidade fruto de revisões excessivamente frequentes. É, por exemplo, esta preocupação que defende que a tributação indireta se deva resumir a um número muito limitado de taxas diferentes, mesmo quando, em teoria, se aconselha a sua diversificação em função das diferentes elasticidades preço dos bens (Ramsey, 1927).

A complexidade fiscal dificulta ainda uma aplicação rigorosa da lei, facto para o qual alertam continuamente especialistas e empresários, alertando para a necessidade de os sistemas fiscais e respetivos procedimentos associados serem simples, eficientes e bem percecionados pelos contribuintes, minimizando os custos de cumprimento e aumentando a transparência. Para além da taxa de imposto propriamente dita, existe evidência empírica que demonstra a importância que um sistema fiscal simples, eficiente e estável tem, na tomada de decisão dos agentes económicos que, entre outros aspetos, esperam estabilidade e confiança que os ajudem a tomar decisões económicas de médio/longo prazo.

A teoria também evidência que a tributação dos rendimentos é capaz de introduzir distorções significativas na afetação dos recursos económicos, nomeadamente quanto à opção entre ser trabalhador por conta de outrém ou empresário (Pestieau e Possen, 1991), quanto à decisão de um trabalhador estar ou não no sector informal da economia, ou qual o investimento que faz no seu nível de instrução (Kolm et al., 2003).

Devido ao efeito introduzido pela evasão e pela fraude, estas decisões são afetadas pelo rigor com que são aplicadas as leis fiscais. Se houver rigor na sua aplicação é menor o incentivo para um trabalhador se estabelecer por conta própria, bem como o incentivo para estar na economia informal, aumentado o incentivo para apostar na sua formação e qualificação.

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Efetivamente havendo esse rigor, a utilização de veículos para fugir à tributação de rendimentos, como seja o exercício do trabalho independente, ou a entrada no sector informal torna-se menos atrativo e, no mercado de trabalho formal, as maiores remunerações encontram-se naturalmente nas atividades de maior valor acrescentado e que exigem maiores níveis de investimento em capital humano.

Resumidamente, e à luz da teoria económica, são cinco os princípios que compõem um bom sistema fiscal, nomeadamente:12

i. Equidade, ou seja, a necessidade de a tributação dos cidadãos cumprir princípios de justiça;

ii. Eficiência económica, no sentido em que os impostos lançados, para além de não introduzirem ineficiências ou distorções nos mercados, deverão ser utilizados como mecanismos de correção de ineficiências existentes;

iii. Constituir um instrumento de gestão de conjuntura económica;

iv. Transparência, i.e., as suas regras de funcionamento devem ser previamente conhecidas, estáveis e de fácil compreensão para todos os contribuintes, procurando inclusivamente minimizar o desvio da incidência tributária, ou seja, o desvio entre aqueles sobre os quais incide a obrigação legal (incidência legal) do pagamento do imposto e aqueles que efetivamente suportam o custo (incidência económica); e

v. Minimização dos custos de administração e de cumprimento pelos contribuintes.

Adicionalmente, a complexidade fiscal implica também ineficiência económica ao desviar a afetação de recursos produtivos, nomeadamente capital e mão-de-obra, para objetivos não produtivos ou, em terminologia económica, não Pareto eficientes. Efetivamente, as práticas de planeamento fiscal implicam, em regra, elevados custos por exigirem o recurso a técnicos especializados com formação e com conhecimentos efetivos não apenas da realidade da empresa mas, sobretudo, da legislação fiscal de um ou vários países, não estando, por isso, normalmente disponíveis ao cidadão comum que, também por causa do desconhecimento que isso implica, as associa frequentemente a práticas ilícitas.

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Assim sendo, coloca-se a questão de se saber quais os incentivos que os contribuintes singulares e coletivos têm para fugir às suas responsabilidades fiscais e contributivas, incorrendo nos respetivos custos de planeamento fiscal. Naturalmente, e sendo os agentes económicos racionais, a análise assenta em considerações de custo-benefício esperados. No cálculo dos contribuintes é considerado não apenas o valor do imposto que se pretende poupar mas sobretudo todos custos com a contratação de técnicos, empresas especializadas, e, ainda, o risco de a prática ser considerada abusiva, no caso da evasão, ou de ser detetada e considerada ilegítima, no caso da fraude, com as consequentes penalizações civis ou criminais.

Levanta ainda a discussão do desvio do “enfoque” do objetivo primordial dos gestores da empresa. Na realidade, um excessivo planeamento fiscal e o seu impacto ao nível das demonstrações financeiras das empresas pode, a determinado ponto, ocupar tanto a gestão de topo, que esta deixa de estar focada nos objetivos principais da empresa.

Como referimos atrás, o recurso à fraude e à evasão fiscal ocorre, sobretudo, nas empresas e nas classes com rendimentos mais altos. As classes com níveis de rendimentos mais baixos, para além de usufruírem de rendimentos pouco diversificados e provenientes de fontes facilmente identificáveis, não dispõem dos recursos, capitais e humanos, necessários para recorrer a práticas de evasão ou fraude. Porém, tal não significa que estas classes passem incólumes a práticas de fuga fiscal. Efetivamente, nestas classes é frequente o recurso a “pequenas” fraudes fiscais que resultam, por exemplo dos denominados “biscates” em regra não declarados e de compras sem fatura, recorrentes na construção civil ou em pequenas oficinas, permitindo uma poupança fiscal, ao nível do IVA, para o comprador e ao nível de IRC/IRS para o vendedor.

Há que considerar ainda os custos incorridos pela administração fiscal e que podem ser a expressão de algum nível de ineficiência na afetação de recursos económicos. Assim, coloca-se a questão da estratégia a adotar na fiscalização que é efetuada sobre as práticas fraudulentas, cabendo à administração fiscal, seguindo uma lógica de custo- benefício, segmentar os contribuintes e as respetivas transações económicas, quer em termos de risco, quer de potenciais receitas adicionais que fiscalizações sobre as mesmas podem gerar.

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Nestas situações, ao invés do recurso à fiscalização tradicional, medidas de autorregulação como, por exemplo, a possibilidade de dedução de uma parte da despesa ao imposto sobre o rendimento do contribuinte, poderão funcionar como uma ferramenta de controlo com bons resultados práticos. O caso da saúde é um exemplo paradigmático: apesar de existir um limite para a dedução de despesas de saúde, o cidadão comum não controla esse limite ao longo do exercício fiscal, pelo que exige sempre fatura, algo que dificulta aos profissionais de saúde e empresas relacionadas, a fuga fiscal, pelo menos pela via da subfacturação.

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