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EVOLUÇÃO PALEOGEOGRÁFICA DURANTE O MIOCÉNICO, INFLUÊNCIAS NA SEDIMENTAÇÃO

PREFÁCIO

2. ENQUADRAMENTO GEOLÓGICO, GEOMORFOLÓGICO E TECTÓNICO

2.1. ORIGEM TECTÓNICA DA BACIA CONTROLO NA SEDIMENTAÇÃO

2.1.2. EVOLUÇÃO PALEOGEOGRÁFICA DURANTE O MIOCÉNICO, INFLUÊNCIAS NA SEDIMENTAÇÃO

O Miocénico é caracterizado por depósitos continentais alternados por outros marinhos, principalmente na sua parte vestibular, numa alargada planície

aluvial (em forma de estuário) aberta ao Oceano (entre as serras de Sintra e Arrábida) e sujeita a ingressões e regressões do mar, num período que medeia as “Camadas com Venus ribeiroi dos Prazeres” (div. I de COTTER) até à implementação de regime fluvial franco, com episódios marinhos, no Pliocénico. Geram-se ambientes de transição (fluviomarinhos) entre os domínios continental e marinho, alternando acções continentais, fluviais e nitidamente marinhas. Os sedimentos são predominantemente oriundos do continente, sedimentos detríticos (finos) carreados pelos rios, ou resultam da precipitação simples, ou por acção biológica de componentes arrastados do continente para o mar, em solução.

As oscilações eustáticas são marcantes e determinantes durante o Miocénico. Foram responsáveis pelos movimentos regressivos e transgressivos definidos por ANTUNES (1971), para o conjunto do Miocénico e Pliocénico.

Durante estes movimentos transgressivos miocénicos estabeleceram-se ligações, a sul, com a Bacia de Alvalade; ANTUNES, MEIN & PAIS (1986) “demonstram a existência, nas Bacias do Tejo e Alvalade, de sedimentos depositados durante dois movimentos transgressivos, datados do Serravaliano superior ao Tortoniano inferior (Formação de Alcácer do Sal), e do Messiniano final - Zancleano inferior (Formação do Esbarrondadoiro)” (não confirmado entretanto).

O limite entre o Oligocénico e o Miocénico, admitido na passagem à divisão I de COTTER, tem sofrido ajustamentos ao longo dos tempos, consoante se afina a datação desta unidade estratigráfica. Foi inicialmente datada do Burdigaliano (COTTER, 1903/04; ZBYSZEWSKI, 1941; CHOFFAT, 1950) e ulteriormente recuada ao Aquitaniano (ZBYSZEWSKI, 1964). No entanto, segundo observações de ANTUNES (in RIBEIRO et al., 1979), existe a possibilidade de a primeira transgressão marinha pós-”Complexo de Benfica” datar ainda do Oligocénico, dada a continuidade e transição do “Complexo de Benfica” para a base do Miocénico marinho, em Verdelha.

A diferença de espessura apresentada para o Miocénico entre a parte vestibular e o centro da Bacia pode resultar da coincidência de acontecimentos que actuaram, ou não, simultaneamente no tempo:

1) levantamento da Península de Setúbal após a acumulação dos depósitos miocénicos na parte vestibular (estuário);

2) rejogo de falha activa no Vale do Tejo;

3) estabelecimento de redes de drenagem na península, oriundas das colinas de Lisboa e da Arrábida e consequente erosão que poderá explicar a

ausência de Miocénico superior na região de Lisboa, presente no Ribatejo e na Bacia de Alvalade.

Em Lisboa, temos alternâncias de argilas, calcarenitos e areias, numa sequência englobante, para a qual COTTER (1903/04), com base em critérios litostratigráficos, considerou VII divisões. ANTUNES (1971) relaciona a série miocénica com ciclos sedimentares enquadrados por uma transgressão e pela regressão seguinte.

Depósitos marinhos são também conhecidos próximo de Almeirim (Aquitaniano), Alcácer do Sal e Lavre.

Na Bacia, longe da influência do mar, acumulavam-se depósitos carreados por rios e seus tributários com origem no Maciço Calcário Estremenho, a poente, no Paleozóico, a norte e a este. A natureza dos sedimentos dependeria das litologias atravessadas e da competência do rio, o qual poderia, em certos casos, dar passagem a lagos ou lagunas intermédias. Como resultado formam-se depósitos com acentuadas variações laterais de fácies.

A drenagem na margem direita processava-se de norte, e oeste, pelos rios Zêzere, Nabão e Almonda, (a norte e a noroeste), Ota e Maior, até ao actual Vale do Tejo. Na drenagem norte as influências dos calcários jurássicos são menos marcantes do que na restante área, no entanto, estão presentes nos níveis gresosos com intercalações calcárias e margosas. A escassez de bancos calcários pode atribuir-se à predominância de acarreios detríticos vindos de norte, do Maciço Hespérico, ou à ausência de gradientes favoráveis à formação de ambiente lacustre, na dependência do qual se precipitaram os carbonatos.

Para o Vale de Cartaxo-Santarém convergiam águas drenadas essencialmente do Mesozóico, com alguma carga sólida e elementos em solução, via rio Maior, Ota, ribeiras de Almoster e Alcobertas e, provavelmente, do Alviela. O afundamento do vale (desenvolvimento em graben), por acção de rejogo de falhas de orientação NW-SE, poderá ter levado, no Miocénico médio a superior, à implementação de ambiente lacustre e à formação de grande desenvolvimento de níveis carbonatados com intercalações arenosas.

A série neogénica continental é representada, na base, pelos conjuntos detríticos da Ota (arenitos de granularidade média a grosseira, argilosos, às vezes margosos com intercalações de cascalheiras) e Archino (com assentadas ainda paleogénicas, ANTUNES, 1979), ambos com intercalações de ostras na parte superior (camadas fossilíferas de Vila Nova da Rainha). Sobre estes assenta possante conjunto de areias, mais ou menos grosseiras, às vezes

alternando com margas e argilas, com níveis de lignito e ostras, onde se situam importantes jazidas de vertebrados (Idade do Serravaliano/Astaraciano ao Tortoniano/Valesiano, ANTUNES, 1984). Dão passagem aos calcários do Cartaxo-Almoster-Santarém, datados do Tortoniano/Valesiano por ANTUNES (1984), após estudo dos vertebrados encontrados nos leitos argilosos intercalados nos calcários de Freiria de Rio Maior e Asseiceira.

Durante muito tempo prevaleceu a convicção de que o Neogénico, na margem esquerda do Tejo, diferia bastante do da margem direita, pela ausência marcada de níveis carbonatados. Porém, pelo que foi observado nas sondagens, tal não acontece. Escasseiam, sim, os afloramentos carbonatados, que se restringem à região de Lavre (margas com concreções calcárias) e Cano (calcários brechóides).

Calcarenitos e calcários nunca deixaram de ser observados nas sondagens mais profundas, por toda a margem esquerda do Tejo, por baixo das areias finas a médias esbranquiçadas, que admitimos pertencerem ao Pliocénico. Na margem esquerda do Tejo, nas camadas pós-calcários e calcarenitos de admitida idade miocénica, prodomina a fracção argilosa sobre a arenosa que, pela semelhança litológica às argilas de Tomar, levou BARBOSA (1995) a incluiu-las numa única unidade designada por “Argilas de Tomar”. Estas argilas passam lateralmente, em direcção ao centro da Bacia, aos arenitos de Ulme (fracção detrítica predominante), que em algumas situações são sobrepostas por estes, daí o mesmo autor considerá-las mais antigas. A idade miocénica para estas argilas não é garantida ou, a sê-lo, representarão o Miocénico médio-superior, ausente na Península de Setúbal (em afloramento), e correlativo dos calcários de Cartaxo-Almoster-Santarém e das Argilas de Tomar. São talvez superiores aos depósitos marinhos de Cerrado da Pedra com fáunula contemporânea da encontrada nos depósitos fossilíferos de Azambuja, Archino, Senhora da Saúde, Vale de Carros do Valesiano inferior (ANTUNES, 1983) e inferiores aos depósitos carbonatados de Almoster-Santarém, datados do Valesiano inferior.

Estes depósitos parecem ter alguma semelhança com os depósitos continentais de fácies fluvial da “Formação de Marateca”, constituída por conglomerados, areias grosseiras, médias e finas, geralmente argilosas e argilas cinzentas ou esverdeadas.

A este grupo podem associar-se talvez, os calcários do Cano, datados do Quaternário recente por ROMAN (1917), devido à presença de fauna límnica comum na fauna actual da Península (talvez miocénica seg. ANTUNES). CARVALHO (1968), com base em critérios geomorfológicos, prefere

correlacioná-los com o planalto do Ribatejo e, como tal, do Quaternário, mas antigo. PAIS (informação oral, Julho de 1997) considera duvidosa tal datação, que segundo ele, deve ser muito mais antiga. Verificamos, pela observação das sondagens, que os calcários que afloram no Cano e em Casa Branca, onde atingem reduzida espessura (2 m a 3 m em afloramento e 13 m na sondagem na Tapada da Roca, furo da CMS), continuam para a região de Ponte de Sor (sentido NW) por baixo das argilas arenosas (Argilas de Tomar), onde adquirem maior expressão, atingindo aí espessuras pelo menos de 55 m (dos 20 m aos 75 m). Resultaram provavelmente da drenagem dos Calcários cristalinos de Estremoz para a Bacia. A associação faunística indica (ROMAN, op. cit.) clima de tendência quente e seco.

Na composição dos conglomerados da base dos arenitos da Ota (Aloformação de Almoster), parece ser clara a herança ou a remobilização de detritos provenientes dos “Grés Grosseiros Inferiores do Cretácico” (CARVALHO, 1968) e sílex do Bajociano (BARBOSA, 1995).

A ausência de sequências ou gradações na arrumação dos sedimentos sugere transporte de fonte de alimentação situada próxima (BARBOSA, op. cit.), no Mesozóico, a oeste, muito provavelmente. O transporte processava-se através de linhas de água que drenavam provavelmente os calcários, relacionadas com os cursos hídricos subterrâneos que alimentam as nascentes dos rios Nabão, Almonda, Alviela e Maior que, apesar da penetração no Maciço calcário continuam a drenar para a Bacia através de ressurgências.

As Argilas de Tomar integram a parte inferior do “Complexo MP” que, sob esta designação, na margem esquerda do Tejo, foi cartografado na Carta Geológica de Portugal. A distribuição geográfica é significativa. A norte, surge na zona de Asseiceira (Tomar) e no vale da ribeira de Ulme, entre Medroa e Abrantes. Na margem esquerda do Tejo aparece em Bemposta, Coruche e Mora. A sul, na margem direita, na região de Vila Nova da Rainha-Azambuja e, na margem esquerda, em Lavre.

São em grande parte correlativas dos calcários de Almoster, do Miocénico superior. A datação desta unidade baseia-se nos vegetais fósseis da Quinta das Figueiras e Ulme (GONÇALVES et al., 1979) e em Vale de Carros, atribuída ao Miocénico superior (ZBYSZEWSKI, 1946; TEIXEIRA, 1952; ZBYSZEWSKI & TEIXEIRA, 1979), mais precisamente ao Valesiano (PAIS, 1981).

A litologia é fundamentalmente silto-argilosa de cor vermelho-alaranjada, podendo aparecer intercalados arenitos finos. O quartzo domina na fracção grosseira superior a 75 %, enquanto o feldspato e a mica, nas fracções fina e média. Por vezes, aparecem concreções Fe/Mn.

A espessura na margem esquerda é considerada abaixo dos 200 m, sendo inferior a uma dezena de metros, na margem direita, onde passa gradualmente aos arenitos da Ota e aos calcários de Almoster. Na margem esquerda sucedem-lhe os arenitos de Ulme.

2.1.3. EVOLUÇÃO PALEOGEOGRÁFICA DURANTE O PLIOCÉNICO E O