• Nenhum resultado encontrado

Pelotas é a terceira cidade mais populosa do estado do Rio Grande do Sul e está localizada às margens do Canal São Gonçalo. Ela se destacou historicamente por causa da produção de charque3 entre o período dos anos de 1780 e 1890, um

3 É uma carne que não precisa de refrigeração por ser desidratada pela forte salga e ficar exposta ao sol por vários dias.

importante produto da economia escravagista que era vendido para todo o Brasil e que enriqueceu a cidade. Para se compreender o desenvolvimento desse processo, Vieira (2005) é tomado como referência, na medida em que seu trabalho sobre a análise do espaço urbano em Pelotas aponta que a evolução urbana da cidade, das primeiras ocupações até meados da década de 1990, pode ser dividida em quatro períodos socioeconômicos. O trabalho de Soares (2002) também foi considerado, pois descreve os quatro projetos iniciais de urbanização que aconteceram paralela- mente.

Segundo Vieira (2005), o primeiro período (1758–1780) é quando acontece o povoamento inicial, com as terras pelotenses sendo ocupadas e exploradas por portugueses de origem açoriana e madeirense no ano de 1763. A partir disso, Pelotas foi dividida em sete grandes sesmarias, sendo que a de Monte Bonito é onde seriam instalados o núcleo urbano e a manufatura do charque após uma segunda divisão de terras.

No segundo período, iniciado em 1780 e considerado o mais importante para a constituição da cidade, as charqueadas começaram a se instalar ao longo do Canal São Gonçalo. Em 1812 foi criada a Freguesia de São Francisco de Paula e o desenvolvimento urbano se potencializou para dar apoio ao comércio do charque e às atividades decorrentes. Ainda segundo Vieira (2005), existia uma complementa- riedade entre as atividades rurais e urbanas, pois a cidade surgiu para atender as necessidades que a sociedade e a produção local passavam a demandar. A constituição do território se fundamentava nos estabelecimentos de charque às margens de arroios e do canal, no local de comércio de gado (Tablada), no local de comércio de escravos e produtos (Passo dos Negros) e em um núcleo urbano que se instituiu nos terrenos mais elevados da cidade, afastado das charqueadas (VIEIRA, 2005).

Esse período também se caracterizou pela implantação de quatro projetos de urbanização. Em 1815 foi implantado o Primeiro Loteamento da cidade de Pelotas, a partir da demarcação das ruas e da praça em frente à capela. A cidade então começa a crescer rapidamente, consolidando-se enquanto núcleo urbano. Em 1829, as terras situadas ao sul do núcleo urbano inicial se tornaram disponíveis para que a cidade pudesse se ampliar até a margem do Canal São Gonçalo. Foi a ação mais

importante até aquele momento para o desenvolvimento da cidade, permitindo um crescimento mais acelerado, mantendo-se o mesmo traçado e planta quadriculada (SOARES, 2002).

Em 1858, a cidade se expande em direção ao norte em relação ao núcleo urbano inicial. O surgimento deste novo bairro na cidade, chamado de Bairro da Luz, diferenciava-se por seus quarteirões mais retangulares. A próxima expansão aconte- ceu no ano de 1870, nos terrenos úmidos e sujeitos à inundação que pertenciam ao município e ficavam entre a cidade e o porto. O chamado Bairro da Várzea se destinou a uma população de baixa renda e manteve a planta quadriculada em quatro novas ruas que foram projetadas (SOARES, 2002).

Vieira (2005) ressalta que a manufatura do charque que gerou riqueza na cidade, teve a companhia de estabelecimentos industriais que dependiam dos seus resíduos no mesmo período, como curtumes, fábricas de velas, sabões e adubos, o que criou um mercado consumidor na região. Além disso, no segundo período, de- senvolveram-se as instituições de ensino, clubes e associações, destacando a cidade também como polo cultural.

As atividades econômicas vinculadas à manufatura do charque entraram em decadência com a abolição da escravidão, o que contribuiu para a falência de um setor dependente de um único produto e que se fundamentava na utilização da mão de obra escrava em grande escala, sem que os empreendedores locais conseguis- sem se adaptar aos novos tempos econômicos e sociais (VIEIRA, 2005).

A economia da cidade de Pelotas, no terceiro período da evolução urbana elaborado por Vieira (2005), que começa ao redor de 1890, não pode contar mais com a mão de obra escrava e teve que buscar a diversificação na sua produção, pois antes era apoiada nos resíduos da manufatura do charque. A instalação dessas indústrias iniciais na cidade, com outras funções, fez com que elas se localizassem de acordo com os seus interesses, com exceção das que poluíam o meio ambiente. Como naquela época não existia um zoneamento rígido, as áreas próximas ao porto e da estação férrea foram as mais procuradas para o estabelecimento das mesmas (VIEIRA, 2005).

O terceiro período também é definido, segundo o autor, pelo crescimento demográfico em Pelotas. Um dos fatores principais, ainda segundo o autor, foi o

êxodo rural, principalmente de imigrantes das cidades de pequeno porte. A cidade passa a se estruturar a partir do núcleo original nas cercanias do porto e se expande em direção ao oeste, vivenciando o declínio do período do apogeu do charque. Em compensação, a indústria que começou a se desenvolver no terceiro período fez surgir um comércio variado e um setor de prestação de serviços. Foi um período em que a cidade teve que buscar um novo caminho para poder se inserir na economia dos novos tempos (VIEIRA, 2005).

O quarto e último período apresentado no trabalho de Vieira (2005) começa em torno de 1945 e alcança até os dias atuais. O autor mostra que nesse período a população da cidade teve um crescimento significativo, principalmente entre 1950 e 1980, mas o setor produtivo não conseguiu se desenvolver na mesma proporção. A economia pelotense então se desvincula da pecuária e o setor de serviços passa a empregar a maior parte da população, mas é o agronegócio, na produção de alimen - tos e principalmente na industrialização do arroz, que faz com que Pelotas cresça durante grande parte do período (VIEIRA, 2005).

Logo, o crescimento da cidade propiciou a instalação de equipamentos e serviços superiores aos encontrados na região sul do estado (VIEIRA, 2005). Aliás, a cidade se torna importante culturalmente por possuir várias instituições públicas e particulares de ensino superior e técnico, teatros, biblioteca pública, dezenas de museus, jornais impressos e emissoras de televisão. E, além disso, até em âmbito nacional por realizar a Feira Nacional do Doce (Fenadoce) e pelo carnaval, eventos que acontecem anualmente. Em termos de transportes possui um aeroporto e também um porto fluviolacustre localizado às margens do Canal São Gonçalo. Destaca-se, também, porque o comércio atrai compradores da região sul do estado para as lojas localizadas no Centro da cidade ou para um recente shopping center.