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Exemplos tirados das outras traduções consultadas

Capítulo IV – Proposta de tradução

I. Exemplos tirados das outras traduções consultadas

“He replied in a jargon I did not comprehend.” (1998:121)

“Ele respondeu numa linguagem que não compreendi” (19-:165, vol. I) “O menino respondeu num dialeto que não entendi” (1947:129) “Respondeu-me numa linguagem que não compreendi” (1958:158,v.I) “Ele replicou num jargão que não compreendi” (1963:137)

“Respondeu-me numa gíria que não entendi” (1967:161) “Ele respondeu num linguajar que não compreendi” (1971:167) “Ele respondeu numa linguagem que não entendi” (1980:130) “Ele respondeu numa linguagem que não entendi.” (2002:120) “Replicou num jargão que não entendi.” (2005:158)

“Respondeu-me qualquer coisa em calão, que não percebi.” (s/d:107)

A análise feita na parte III deste trabalho mostra que as alternativas escolhidas pelos tradutores não são adequadas para o contexto em que a frase foi dita; o mesmo pode ser visto nos exemplos acima. O termo jargão70 não pode ser aplicado ao dialeto de Yorkshire, pois este não é um dialeto exótico (qualquer que seja a acepção de exótico dada pelo autor do verbete), tampouco é uma mistura de línguas, como uma língua franca; não é peculiar a uma classe ou profissão, e nem é calão. Tampouco se pode dizer que dialeto é o mesmo que linguagem, pois uma pesquisa em livros especializados em dialetologia nos mostra que lingüistas e estudiosos de dialetologia fazem uma distinção entre linguagem e dialeto; e portanto, essa definição dada pelo dicionário não pode ser usada em um estudo mais profundo como este pretende ser. Linguajar71 também não pode ser usado como definição de dialeto, pois há uma diferença muito grande entre modo de falar (que pode ser usado para definir a maneira particular de falar de cada individuo, independente de ele usar uma variante dialetal de uma língua ou a chamada ‘norma padrão’ na hora de se comunicar com seus semelhantes, e que muitas vezes pode ser influenciada por seu estado de espírito e as circunstâncias nas quais o falante se encontra) e o uso constante de uma variante dialetal de uma dada língua na comunicação entre os seres humanos. Quanto a gíria72, um dialeto não é uma linguagem

70 As definições para jargão e calão podem ser encontradas na parte III deste trabalho. 71

Linguajar: 1. Modo de falar; linguagem; dialeto: O linguajar das crianças. 2. Linguagem popular. (1998:1260)

72 1. Linguagem especial usada por certos grupos sociais pertencentes a uma classe ou a uma profissão. 2. Linguagem usada pelos gatunos, malandros e outras pessoas de hábitos duvidosos, para não serem compreendidos por outras pessoas. (1998:1034)

especial usada por gatunos e pessoas de hábitos duvidosos; nem é característico de um grupo social ou profissional.

“He answered in his vulgar accent” (1998:219)

“Respondeu com aquele sotaque de gente baixa” (s/d:93,v.II) “E ele respondeu com aquele sotaque de gente baixa” (1947:229) “Ao que me respondeu, com aquele sotaque vulgar” (1958:98,v.II) “Ele respondeu com sua pronúncia vulgar que...” (1963:242) “...e ele me respondeu no seu tom vulgar” (1967:288) “Ele respondeu, na sua pronúncia vulgar” (1971:287) “Respondeu no seu tom vulgar” (1980:230)

“Respondeu no seu tom vulgar.” (2002:212)

“Respondeu-me com o seu sotaque vulgar...” (2005:263) “Respondeu-me com o seu sotaque peculiar...” (s/d:188)

A partir da análise dos trechos acima citados, vemos que alguns tradutores encontraram soluções para a tradução que se afastam do texto original, pois ‘sotaque peculiar73’ e ‘tom vulgar74’ não correspondem a ‘vulgar accent’. A pronúncia de Hareton Earnshaw não é exclusiva dele (acepção de peculiar); tampouco pode se dizer que está ligada a seu caráter ou a seu modo de proceder (acepções números 13 e 14 de

tom). A tradução para He answered in his vulgar accent poderia ter sido feita

simplesmente como Ele respondeu com seu sotaque vulgar, pois em português, assim como em inglês, a palavra vulgar está relacionada à língua falada pelo povo (cf. 1998:2220).

‘It’s some damnable writing,’ he answered. ‘I cannot read it.’

‘Can’t read it?’ cried Catherine; ‘I can read it: it’s English. But I want to know why it is there.’

Linton giggled – the first appearance of mirth he had exhibited.

‘He does not know his letters,’ he said to his cousin. ‘Could you believe in the existence of such a colossal dunce?’

[…]

‘There’s nothing the matter, but laziness, is there, Earnshaw?’ he said. ‘My cousin fancies you are an idiot. There you experience the consequence of scorning “book-larning”, as you would say. Have you noticed, Catherine, his frightful Yorkshire pronunciation?’ (1998:194)

73

Segundo o Dicionário Michaelis, peculiar significa: 1. Que diz respeito a pecúlio. 2. Especial, privativo, próprio de uma pessoa ou coisa. (1998:1576)

74 As seguintes definições de tom são dadas pelo Dicionário Michaelis: 1.Grau de elevação ou abaixamento de um som. 2. Inflexão da voz; certo grau ou abaixamento da voz. 3. Modo peculiar de dizer alguma coisa. [...] 13. Caráter. 14. Procedimento. (1998:2078)

As traduções do trecho acima são as seguintes:

– São umas danadas de umas letras – respondeu – Não as sei ler.

– Não sabe ler essas letras? – exclamou Catarina – Eu sei; é inglês. O que eu queria saber é o motivo porque elas ali se encontram.

Linton riu; era a sua primeira demonstração de alegria.

– Ele não sabe ler – disse à sua prima. – Já viu sujeito mais ignorante? [...]

– Preguiça apenas é o que ele tem, não é, Earnshaw – Minha prima imagina que você é idiota. Aí tem o resultado de seu desprezo pela leitura dos livros, como você diz. Já notou, Catarina, a sua acentuada pronúncia do Yorkshire? (19-:61, v.II)

– É um diabo dum escrito, mas não sei ler o que diz.

– Não sabe? – exclamou Cathy. – Eu sei, é inglês. Mas quero saber porque está lá em cima.

Lintou riu-se. Era a primeira manifestação de alegria que dava.

– Ele não conhece nem as letras do alfabeto – explicou à prima. – Você já imaginou camarada mais ignorante?

[...]

– Não há nada com ele: o que tem é indolência, não é, Eanshaw? – volveu Linton. – Minha prima imagina que você seja um idiota. Por aí se medem as conseqüências da sua atitude de escárnio em relação à “ciência dos livros”, como você diria. Já lhe notou, Cathy, o horrível sotaque de Yorkshire? (1958:63-4, v.II)

Que inscrições danadas! Não sei lê-las.

Não sabe lê-las? – gritou Catarina. – Eu sei lê-las: são em inglês. Quero apenas saber porque estão aí.

Linton começou a rir: era a primeira manifestação de alegria de sua parte.

Ele não sabe ler – disse à prima. – Já imaginou que pudesse haver alguém tão ignorante como esse lorpa?

[...]

Não passa de uma questão de preguiça, não é verdade Earnshaw? – disse. – Minha prima pensa que você é idiota. Isto ensinará você a desprezar “o escritório dos livros”, como diz você. Já reparou na sua terrível pronúncia do Yorkshire? (1967:255)

– É qualquer coisa – respondeu. – não consigo ler.

– Não consegue ler? – exclamou Catherine. – Pois eu posso: está escrito em inglês. Só quero saber por que está aí.

Linton riu – pela primeira vez, para mim.

– Ele não conhece nem as letras – disse para a prima. – Não é de espantar que exista alguém tão burro?

[...]

– Não há nada com ele, a não ser preguiça; não é, Earnshaw? Minha prima pensa que você é idiota. Aí tem você a conseqüência do seu desprezo pelos “estudo”, como você diz. Já reparou, Catherine, no horrível sotaque dele? (1971:256)

– Não sabe lê-las? – exclamou Catarina. – Pois eu posso. É inglês. Mas eu desejava saber por que elas estão ali.

Linton escarneceu. Era a primeira manifestação de alegria de sua parte. – Ele não sabe ler – disse ele à sua prima. – Poderia você imaginar que houvesse asno maior?

[...]

– É preguiça só, não é, Earnshaw? – disse Linton. – Minha prima está pensando que você é idiota. Agora você está vendo o que custa desprezar a “estudação de livros”, como você diz. Notou você, Catarina, sua terrível pronúncia do Yorkshire? (1980:205)

– São umas danadas dumas letras – respondeu ele. – Não sei lê-las.

– Não sabe lê-las?! – exclamou Catarina. – Pois eu posso. É inglês. Mas eu desejava saber por que elas estão ali.

Linton escarneceu. Era a primeira manifestação de alegria de sua parte. – Ele não sabe ler – disse ele à sua prima. – Poderia você imaginar que existisse asno maior?

[...]

– É preguiça só, não é, Earnshaw? – disse Linton. – Minha prima está pensando que você é idiota. Agora você está vendo o que custa desprezar a “estudação de livros”, como você diz. Notou você, Catarina, o seu terrível sotaque de Yorkshire? (2002:187-88)

– Que letras mais arrevesadas! – murmurou. – Sou incapaz de as ler. – É incapaz? – volveu Catherine. – Eu leio-as: é inglês. O que queria saber é porque estão lá.

Lintou soltou um riso de mofa, a primeira expansão de hilaridade que até aí tivera.

– Nem sabe ler o seu nome – explicou à prima. – Imaginava que existisse um ignorante desta ordem?

[...]

– Não é nada senão mandriice, hem, Earnshaw? – disse o filho de Heathcliff. – A prima supõe que és idiota. Conseqüências de fazer pouco dos estudos... Notou, Catherine, o seu horrível sotaque do Yorkshire? (s/d:167-8)

Nas traduções estudadas na parte III, vemos que houve uma descaracterização do texto original, presente nos exemplos acima: não houve a tentativa de introduzir vocábulos pertencentes à linguagem não-padrão, a não ser na tradução feita por Oscar Mendes – que parece ter sido aproveitada por Silvana Laplace e aparece também na tradução de Renata Cordeiro e Eliane Alambert – já que a palavra estudação não é dicionarizada e pode dar ao leitor a idéia de que Hareton não é um falante do inglês padrão, bem como na de Vera Pedrosa, que coloca ‘os estudo’, usando uma única marcação de plural, característica da fala das pessoas que não dominam a norma considerada ‘culta’ da língua – embora não se possa dizer que é exclusiva dessa camada da população, pois muitas vezes, em ocasiões informais, pessoas que dominam a ‘norma culta’ usam apenas um marcador de plural também. A alternativa proposta por Celestino da Silveira, escritório dos livros, além de não remeter ao dialeto de Yorkshire, não faz

muito sentido para o falante do português padrão, sem contudo dar ao leitor a noção de que Hareton Earnshaw não domina o inglês standard.

O adjetivo frightful, usado para designar o modo como Hareton Earnshaw falava, só foi deixado de lado por José Maria Machado – acentuada pronúncia – e nas demais traduções encontramos terrível ou horrível, escolhas compatíveis com o original inglês; porém, a referência ao condado de Yorkshire foi deixada de lado na tradução de Vera Pedrosa. Conforme foi comentado na parte III deste trabalho, essa omissão apenas impede que o leitor entre em contato com a diversidade lingüística e cultural da Inglaterra, e tal descaracterização do texto deveria ser evitada sempre que possível.