Modelos presa-predador: sistemas suaves
2.2 Modelo 2: presa-predador com colheita do predador
2.2.4 Experimentação numérica
Nesta subseção queremos analisar o que acontece com a dinâmica do sistema de colheita (2-4), quando variamos o parâmetro q e deixamos o restante dos parâmetros fixos.
Tomando valores dos parâmetros como na Figura 2.7 e K = 15 temos o seguinte: a Figura 2.9 indica que quando q aumenta continuamente, passando através da bifurcação de Hopf, qestá na região R2ou R3, e o ponto de equilíbrio E1se torna num foco instável.
As Figuras 2.9-(a) e (b) ilustra que aparece um ciclo limite estável depois da transição de estabilidade do ponto de equilíbrio E1. Na Figura 2.9-(a) quando q = 2.2, q está debaixo da curva qK, de modo que só há um ponto de equilíbrio admissível E1 e o ponto de equilíbrio EK é um ponto sela. Na Figura 2.9-(b) quando q = 2.3, mostra que dois equilíbrios admissíveis são possíveis e o equilíbrio EK é um nó estável pois q > qK. As Figuras 2.9-(b) e (c) indicam que quando a taxa de colheita aumenta, o ciclo limite bifurcado se expande e então se torna um laço homoclínico quando q = 2.3639809. A Figura 2.9-(d) mostra que à medida que a taxa de colheita aumenta, o laço homoclínico se rompe e o ponto de equilíbrio E1permanece como um foco instável.
As Figuras 2.9-(e) implica que quando a taxa de colheita aumenta, mais precisamente a q= 2.60218101 aparece novamente um laço homoclínico.
Além disso, na Figura 2.9 é visualizado o aumento da taxa da colheita no plano K− q.
(a) qH1(K) < q = 2.2 < qK(K) (b) q = 2.3 > qK(K)
(c) q = 2.3639809 (d) q = 2.55
(e) q = 2.60218101 (f) q = 2.6028
Figura 2.9: Estabilidade dos pontos de equilíbrio do sistema (2-4) quanto a taxa de colheita aumenta.
Neste capítulo apresentaremos os conceitos básicos da Teoria de Sistemas de Filippov bem como o estudo de algumas bifurcações típicas deste tipo de sistema. Os conceitos aqui apresentados são baseados principalmente nas referências [12] e [8].
3.1 Conceitos básicos
Sejam U ⊂ R2 um aberto contendo a origem e f : U −→ R uma função suave que tenha 0 como valor regular. Definimos a variedade de transição, Σ, como sendo o conjunto
Σ = f−1(0) ∩U = p ∈ R2; f (p) = 0 .
Dessa forma, Σ é uma subvariedade de R2, de codimensão 1, que divide U em duas regiões conexas:
Σ+= {p ∈ U ; f (p) > 0} e Σ−= {p ∈ U ; f (p) < 0} . Um campo vetorial suave por partes é definido da seguinte forma:
Z(p) = (
X+(p), p∈ Σ+,
X−(p), p∈ Σ−, (3-1)
onde os campos vetoriais X±(p) estão definidos num aberto U ⊂ R2, contendo a origem, e são de classe Ck, k ≥ 1, em Σ+ e Σ−. Denotaremos um campo vetorial suave por partes assim definido por Z = (X+, X−).
Um sistema de Fillipov é definido como sendo um sistema
˙z = Z(z). (3-2)
onde Z = (X+, X−) é um campo vetorial suave por partes. Observamos que existem outros tipos de sistemas de Filippov, mas não serão considerados neste trabalho, para mais detalhes veja [9].
Seguindo a convenção estabelecida por Filippov, [9], distinguimos as seguintes regiões em Σ:
• Região de Costura, Σc, que é o conjunto dos pontos de Σ em que os campos vetoriais X+e X− apontam na mesma direção, isto é,
Σc= p ∈ Σ; X+f(p)· X−f(p) > 0 .
Σ Σ
Figura 3.1: Região de Costura, Σc.
• Região de Escape, Σe, que é o conjunto dos pontos de Σ em que os campos vetoriais X+e X− apontam em direções opostas, afastando-se de Σ, isto é,
Σe= p ∈ Σ; X+f(p) > 0 e X−f(p) < 0 .
Σ
• Região de Deslize, Σs, que é o conjunto dos pontos de Σ em que os campos vetoriais X+e X− apontam em direções opostas, aproximando-se de Σ, isto é,
Σs= p ∈ Σ; X+f(p) < 0 e X−f(p) > 0 .
Σ
Figura 3.3: Região de Deslize, Σs.
Observações 3 Dadas as definições acima das regiões de costura, deslize e escape, temos que:
• nas definições usamos a derivada de Lie da função f na direção do campo X±, definida por: X±f(p) = hX±(p), ∇ f (p)i;
• as definições dessas regiões excluem os pontos de tangência, que são aqueles pontos p∈ Σ em que X+f(p) = 0 ou X−f(p) = 0, isto é, aqueles pontos onde os campos vetoriais X+e X− são tangentes à variedade de transição Σ;
• outros pontos que também foram excluídos destas definições são os pontos singu-lares dos campos vetoriais X+ e X− que estão em Σ. Os pontos singulares tam-bém podem ser considerados pontos de tangência, pois satisfazem X+f(p) = 0 ou X−f(p) = 0.
• os pontos de equilíbrio de X± que estão em Σ serão chamados de pontos de equilíbrio no bordo.
Podemos distinguir os tipos de tangência entre um campo suave e uma variedade de-pendendo do modo como se dá o contato entre eles. Destacamos dois tipos que são as tangências quadráticas e cúbicas.
Definição 20 Um campo vetorial suave X possui uma dobra ou tangência quadrá-tica com Σ = p ∈ R2; f (p) = 0 em um ponto p ∈ Σ se X f (p) = 0 e X2f(p) = hX, ∇X f i(p) 6= 0. Diremos ainda que a dobra é visível se X2f(p) > 0 e invisível se X2f(p) < 0.
Definição 21 Um campo vetorial suave X possui uma cúspide ou tangência cúbica com Σ = p ∈ R2; f (p) = 0 em um ponto p ∈ Σ se X f (p) = X2f(p) = 0 e X3f(p) = hX, ∇X2fi(p) 6= 0.
Nas regiões de deslize e escape se pode definir um novo campo vetorial, onde, nestas regiões Σse Σc, a órbita local é dada pela convenção de Filippov, veja [9].
Definição 22 Seja Z = (X+, X−) um campo vetorial suave por partes dado como na equação(3-1). O campo vetorial deslizante, denotado por Zs, para p∈ Σs∪ Σeé dado por uma combinação linear convexa de X+(p) e de X−(p) de modo que Zs(p) seja tangente à Σ em p Σ+ Σ Σ− p X+(p) X−(p) Σ+ Σ Σ− p X+(p) X−(p)
Σ é região de deslize Σ é região de escape
Zs(p) Z
s(p)
Figura 3.4: Definição do campo vetorial deslizante Zs.
Deste modo, Zsé dado por:
Zs(p) = X
−f(p) · X+(p) − X+f(p) · X−(p)
X−f(p) − X+f(p) . (3-3)
Dados os campos vetoriais X±, para p ∈ Σ denotamos seu fluxo por ϕ±(t, p), e para o campo vetorial suave por partes Z = (X+, X−) denotamos seu fluxo por ϕZ(t, p), então temos a seguintes definições.
Definição 23 As trajetórias locais associadas ao campo vetorial (3-1) por o ponto p podem ser definidas como segue:
a) para p ∈ Σ+∪ Σ− com X+(p) 6= 0 e X−(p) 6= 0. O fluxo de Z por p será dado por ϕ+(t, p) se p ∈ Σ+ou por ϕ−(t, p) se p ∈ Σ−.
b) Para p ∈ Σc, definimos o fluxo do campo vetorial Z da seguinte maneira: • Se X−f(p) > 0 e X+f(p) > 0, então ϕZ(t, p) = ϕ−(t, p), se t < 0 e ϕ−(t, p) ∈ Σ−, p, se t = 0, ϕ+(t, p), se t > 0 e ϕ+(t, p) ∈ Σ+,
• Se X−f(p) < 0 e X+f(p) < 0, então ϕZ(t, p) = ϕ+(t, p), se t < 0 e ϕ+(t, p) ∈ Σ+, p, se t = 0, ϕ−(t, p), se t > 0 e ϕ−(t, p) ∈ Σ−.
c) Para p ∈ Σe∪ Σs, tal que Zs(p) 6= 0 o fluxo de Z por p é dado pelo fluxo do campo vetorial deslizante, ϕZs(t, p).
d) para p ∈ ∂Σc∪ ∂Σs∪ ∂Σe tal que as definições de trajetórias para pontos em Σ em ambos os lados de p podem ser estendidas para p e coincidem, a trajetória por p é esta trajetória. Chamaremos estos pontos de pontos detangência regulares. e) para os pontos que não foram contemplados nos itens acima, definimos ϕZ(t, p) = p,
∀t ∈ R. Aqui estão os pontos de tangência não regulares, chamados tangência singulares, os pontos de equilíbrio de X+e X− em Σ±e os pontos de equilíbrio do campo deslizante Zs em ∂Σs∪ ∂Σe.
Definição 24 Denominamos p ∈ Σ+∪ Σ− um ponto de equilíbrioreal para o sistema de Filippov (3-2) se X+(p) = 0 e p ∈ Σ+. No caso em que X+(p) = 0 e p ∈ Σ−, então denominamos p um ponto singularvirtual do campo vetorial de Filippov (3-1).
Uma definição análoga pode ser feita para o campo vetorial X−.
Definição 25 Denominamos o ponto p ∈ Σe∪ Σs pseudo-equilíbrio se Zs(p) = 0. Além disso, chamaremos de pseudo-nó estável qualquer ponto p ∈ Σs tal que Zs(p) = 0 e (Zs)0(p) < 0, de pseudo-nó instável qualquer ponto p ∈ Σe tal que Zs(p) = 0 e (Zs)0(p) > 0, e de pseudo-sela qualquer ponto p ∈ Σs tal que Zs(p) = 0 e (Zs)0(p) > 0 ou p∈ Σe tal que Zs(p) = 0 e (Zs)0(p) < 0.
Qualquer outro ponto que não esteja nos casos citados acima é um ponto regular.
Definição 26 Uma curva fechada contínua Γ é chamada um ciclo do campo vetorial Z = (X+, X−), se for composto por uma união finita de segmentos de órbitas regulares e pontos singulares de Z= (X+, X−), γ1, γ2,..., γn. Além disso, Γ é um ciclo deslizante, se existe i∈ {1, 2, ..., n} tal que γi é um segmento de órbita deslizante e, para quaisquer duas curvas consecutivas, os pontos de partida ou chegada em Σ não são os mesmos. Ver Figura 3.5.
Σ+
Σ
Σ− Figura 3.5: Exemplo de um ciclo deslizante.