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CAPÍTULO 2 QUADRO DE REFERÊNCIA

2.3.1 Continuidade e progressão referencial

2.3.1.3 Expressões nominais definidas

As expressões nominais definidas são sintagmas nominais formados por um artigo definido ou pronome demonstrativo mais um nome (que pode ser a repetição de um nome anteriormente apresentado, uma hiponímia, hiperonímia, metonímia.) Pode haver também, nesses sintagmas, a presença de um modificador adjetivo, ou oração relativa. O uso de uma expressão nominal definida indica ou que o referente já foi previamente introduzido ou que ele pode ser inferível pelo contexto. Indica também que uma entre outras tantas propriedades do referente está sendo escolhida em uma dada situação, em função das condições de enunciação (Koch, 1998:43).

Essas expressões podem assumir características que as tornam diferentes entre si e exigem uma subcategorização para que se possa observar mais de perto seu funcionamento. Na tipificação dessas expressões aqui são considerados os mesmos critérios usados por Koch (1998 e 2002); destaco as descrições definidas, as nominalizações, as associações27.

A) Descrições definidas

Ao usar uma descrição definida, o escritor está fazendo mais do que simplesmente nomear um referente identificado. Está intencionalmente sinalizando que há propriedades do referente que são relevantes num contexto particular de enunciação. Essas propriedades devem ser consideradas pelo leitor ao distinguir um indivíduo específico dentro do universo do discurso. A utilização de uma descrição definida implica uma recategorização lexical, que pode implicar, isolada ou cumulativamente, rotulação e avaliação (Koch, 1998). Francis (1994:83) chama de labelling esse tipo de grupo nominal que é usado para organizar o discurso escrito e que revela um ato lingüístico, um argumento, um ponto ou

26 Ver Lyons, 1977 v. I

uma declaração. Dito de outra forma, esse tipo de grupo nominal indica fases de um argumento que o autor desenvolveu em seu discurso e por meio do qual apresenta (rotulação) e avalia (avaliação) proposições. Observem-se os exemplos:

(13) Itamar Franco anunciou ontem o aumento do funcionalismo. O governador afirmou que não é possível conceder nenhum percentual a mais para todas as categorias.

(14) Itamar Franco anunciou ontem o aumento do funcionalismo. O intransigente representante de Minas Gerais afirmou que não é possível conceder nenhum percentual a mais para todas as categorias.

Em (13) e em (14), apesar de se referirem a uma mesma pessoa, as descrições definidas operam de forma diferente e trazem ao leitor informações distintas acerca do referente. Observe-se que em (13) o uso da expressão definida indica que uma entre as propriedades do referente está sendo destacada. Pressupõe-se que o interlocutor reconheça essa propriedade como característica do referente e perceba que o locutor está tentando realçá- la. Nesse exemplo, o referente é referido sob um novo rótulo e, mesmo se o interlocutor não souber que Itamar Franco é o governador, ele tem como descobrir isso, pois nesse caso o artigo definido da expressão nominal aponta para o antecedente, mas ao mesmo tempo o item lexical da expressão traz uma nova informação. Em (14), a descrição definida traz uma informação sobre a opinião do produtor do texto acerca do referente. Além de recategorizar, atribuindo um novo rótulo, a descrição definida também acrescenta uma predicação atributiva sobre o referente. Isto é, traz ao leitor informações sobre o que o produtor do texto pensa sobre o referente. Nota-se, então, que, nesse caso, há uma operação dupla: a referenciação propriamente dita e aporte de informação nova (cf. Koch, 1998:03).

O uso de uma descrição definida quando esta traz para o leitor uma avaliação da informação dada anteriormente28 estará imprimindo uma determinada orientação

argumentativa. Pode-se notar isso nos exemplos (15) e (16) emprestados de Koch (2000: 04)

(15) Muitas pessoas acreditam que existam outros planetas habitados. Essa hipótese é digna de uma averiguação científica.

(16) Muitas pessoas acreditam que existam outros planetas habitados. Esse absurdo não é digno de qualquer credibilidade.

Nos exemplos citados, as descrições essa hipótese e esse absurdo comunicam impressões diferentes acerca da informação dada. No exemplo (15), tem-se apenas uma recategorização do referente, atribui-se o status de hipótese à crença de que haja outros planetas habitados. No exemplo (16), porém, há uma avaliação claramente expressa de que a crença é um absurdo, há implicado um juízo de valor.

B) Nominalizações

Chama-se nominalização a operação discursiva que consiste em referir, por meio de um sintagma nominal, a um processo ou um estado que anteriormente foi significado por uma proposição (Apothéloz, 1995:144). Em outras palavras, há uma operação de nominalização, quando uma expressão nominal atribui um status de referente ou de objeto-do-discurso a uma informação que anteriormente não possuía tal status.

(17) Os médicos declararam que o seqüestrador já chegou morto ao hospital. A declaração dos médicos pode complicar a situação dos policiais que o prenderam.

É preciso, todavia, como faz Apothéloz (1995:144), ter o cuidado em distinguir a operação propriamente dita, que é de natureza anafórica, da expressão utilizada para efetuar essa operação. Como operação, a nominalização, ao mesmo tempo que atribui status de referente ou de objeto-de-discurso a informações que anteriormente não tinham esse status, vai marcar uma mudança de nível e uma condensação da informação.

C) Associação

A associação é uma estratégia que consiste no emprego de expressões nominais definidas anafóricas (anáforas associativas) que não possuem referente explícito no texto, referente esse que pode ser inferível a partir de elementos do co-texto. A associação, como já se viu, aponta para uma certa dependência interpretativa em relação a um referente anteriormente introduzido. São exemplos dessa estratégia:

(18) As crianças visitaram uma pequena cidade. A igreja estava fechada.

Não há uma relação de correferência entre cidade e a igreja, isto é, o segundo SN não se refere à mesma entidade que o primeiro. Nesse caso, a relação anafórica é induzida pelo

definido: O SN definido é não-saturado, ou não-autônomo referencialmente, sua definitude só se explica pela relação que mantém com a expressão que o precede. A referência só pode ser fixada se se compreende que o segundo SN se refere a uma parte da entidade denotada pelo primeiro que lhe serve de fonteNesse tipo de relação, o segundo SN pode se referir tanto a uma parte da entidade denotada pelo primeiro, quanto a uma entidade que é um componente da ação ou do acontecimento ao qual reenvia a frase sobre a qual se apóia (Charolles, 1994:67). Na compreensão da anáfora associativa, o leitor age inferencialmente. Precisa possuir conhecimentos necessários para realizar a interpretação referencial, caso contrário corre o risco de não compreender.