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Fatores que influenciam a acústica do violino e o seu timbre

2. OUVINDO FÍSICA NA MELODIA DAS CORDAS

2.6. Fatores que influenciam a acústica do violino e o seu timbre

Ao começar a me envolver com os estudos de Física e Música, aconteceu-me a confirmação de algumas ideias que já tinha sobre o funcionamento dos instrumentos musicais e o envolvimento entre essas duas ciências. A abordagem que farei a seguir almeja propiciar essa reflexão e explanar os

aspectos físicos presentes no funcionamento dos instrumentos musicais alvo desta pesquisa.

O violino é um dos instrumentos que mostra muito bem o vínculo que a Física tem com a Música pelo som que emite. Aqui é importante levar em consideração o entendimento do fenômeno da ressonância presente na caixa do violino e na função que têm os orifícios em forma de f que possibilitam que ele seja considerado um ressoador de Helmholtz.

Na acústica do violino, cada um dos elementos que o formam tem um papel fundamental na sonoridade, inclusive aqueles que não estão à vista. Assim, faz-se necessário, em um estudo acústico do violino, ter presente o problema das vibrações produzidas numa corda friccionada e, já que falamos sobre vibração, devem-se levar em consideração também os modos normais de vibração dos tampos superior e inferior e a função do cavalete.

A acústica do violino tem sido objeto de estudo de destacados cientistas reconhecidos em outras áreas da Física, tal é o caso do francês Félix Savart (1791-1841) reconhecido pela Lei de Biot - Savart, criada em conjunto com Jean-Baptiste Biot que viveu entre os anos de 1774 a 1862, que versa sobre o campo magnético produzido por elementos de corrente. Savart realizou estudos de acústica baseado no método Ernst F. Chladni (1756- 1827) para obter uma visualização dos modos normais de vibração dos tampos do violino e observou que as vibrações que o arco produz na corda são ricas em harmônicos. Donoso et. al. (2008)

Segundo estes autores na montagem da caixa acústica, as madeiras dos tampos são arqueadas para o exterior, provocando dessa forma um aumento das frequências dos modos normais de vibração deles. Os orifícios que estão presentes no tampo superior comunicam ao exterior as vibrações que se sucedem dentro da caixa acústica do violino influenciando o seu timbre. Vale ressaltar que isso não se refere à beleza do instrumento, mas à sua qualidade sonora.

Nesse mesmo nível de importância, encontra-se o cavalete, pois é por meio dele que se faz o acoplamento, segundo Donoso et. al. (2008), dos modos normais de vibração das cordas e corpo ressoador do instrumento, eliminando também aquelas frequências que resultam indesejáveis ao ouvinte.

O violino também possui, como mencionado acima, outros elementos que não são visíveis que contribuem para a sua resposta acústica. Esse é o caso da barra harmônica (Figura 7) – colada embaixo do tampo superior, justamente abaixo da perna direita do cavalete e dirigida no sentido das cordas – que dá suporte à estrutura do instrumento. Esse elemento tem a função de transmitir as vibrações a todo o corpo do instrumento, provocando oscilações em fase, que têm uma influência considerável nos sons graves.

Outro elemento conformador da base interna do violino é a alma: um cilindro de madeira que tem a função de transmitir as vibrações entre os tampos, alterando os modos de vibração entre ambos impondo um ponto nodal, que se poderia considerar quase estacionário nos pontos de contato entre eles. Além disso, é também a responsável por distribuir parte da ação exercida pelas cordas sobre o tampo superior ao tampo inferior. O seu posicionamento na parte interna do violino tem uma repercussão significativa no seu timbre e na sonoridade do mesmo.

Na resposta acústica, os tampos deixam de ser meras peças de madeiras para se comportar como tábuas harmônicas e seus modos de vibração possuem frequências que formam uma série harmônica. Os orifícios em forma de f possibilitam que a caixa do violino possa ser considerada como um ressoador de Helmholtz. O violino se comporta como um ressoador desse tipo na medida

em que o ar dentro dele se movimenta através das aberturas em f produzindo oscilações na pressão interna. A ressonância de Helmholtz é também denominada de f-hole ressonance e sua frequência, medida em ambas as f do violino, está ao redor dos 270 Hz. (DONOSO et. al., 2008)

No que diz respeito ao som emitido pelo violino, é oportuno apontar aqui que, na corda vibrante, a quantidade e a intensidade dos harmônicos presentes na vibração têm uma dependência direta com a forma como ela é excitada. O fato de acionar a corda com o arco faz com que a excitação seja diferente da vibração que se produz quando uma corda é tangida como no caso do violão. Ao ser beliscada, os parciais são ligeiramente inarmônicos.

No violino, a oscilação se dá de uma forma autossustentada, porque o arco fornece energia de forma contínua e assim a vibração da corda se mantém durante o tempo que o intérprete segure o movimento do arco. Além disso, a relação entre o tom fundamental e seus parciais pode ser considerada harmônica. Essa é uma das diferentes formas de produzir som numa corda. A forma da onda excitada pelo arco é dente de serra. Esse tipo de onda pode ser representado como uma série de Fourier de ondas senoidais e tem como característica a sua riqueza em harmônicos. Tanto harmônicos ímpares como pares estão presentes no espectro sonoro e as suas intensidades sofrem uma queda mais lenta que aquela experimentada pela corda que é tangida.

Donoso et. al. (2008) apresenta outras duas formas de produzir som, a saber: na corda friccionada por um arco, a intensidade do n-ésimo harmônico é 1/n da intensidade do tom fundamental; já na corda tangida, tal relação é do tipo 1/n2 de forma que a queda da intensidade é muito mais rápida. Dessa maneira, a combinação dessas formas de acionar as cordas do violino tem influência também no timbre do instrumento.

É assim que se conseguem os diferentes efeitos no instrumento que propiciam a mudança timbrística do mesmo. Dentro dessas mudanças, posso mencionar o pizzicato que é o efeito quando se tange a corda com os dedos, o tremolo quando se movimenta rápido o arco sobre a corda e o glissando que propicia a criação de um efeito sonoro diferente. Este consiste no deslizamento de um dos dedos da mão esquerda sobre uma das cordas do violino.

É frequente, segundo Benade (1990), pensar que os instrumentos de cordas ou simplesmente cordas de uma orquestra – fazendo referência ao violino, viola,

cello e contrabaixo – estejam caracterizados por três distinções fundamentais: i) o som é gerado numa porção do instrumento através do atrito que se cria entre o arco e a corda; ii) o corpo do instrumento cuja ressonância influi fortemente na forma como o som é irradiado dentro de uma habitação; iii) a ponte medeia entre as oscilações das cordas e o corpo do instrumento.

Cada um desses instrumentos consta com os tampos superior (top) e inferior (back plates). Eles formam uma caixa sonora cuja forma está bem adaptada para suportar a tensão das quatro cordas de forma que exista uma decomposição da força exercida sobre a ponte. Benade (1990) encontrou durante o estudo realizado com os instrumentos de corda uma característica que diz respeito aos picos e vales que aparecem nos espectros sonoros desses instrumentos que podem divergir em certa medida de um violino para outro ou de um cello para outro. Essas diferenças, porém, que em geral acontecem nos quatro não impedem que exista entre eles uma tendência a terem um comportamento similar.

As cordas do violino são afinadas, tendo entre elas um intervalo de quinta: G3, D4, A4 e E5 (sol3, ré4, lá4 e mi5). Para um bom instrumento, a frequência de ressonância se encontra ao redor dos 290 Hz também chamada de frequência fundamental. Quanto às violas, elas variam nas suas dimensões. Neste instrumento, as cordas são afinadas a uma quinta daquelas: C3, G3, D4, e A4 (dó3, sol3, ré4, e lá4).

O primeiro modo de ressonância da viola está situado ao redor dos 230 Hz. As características musicais dela levam a pensar numa reminiscência das notas do violino a partir do G3. A semelhança está na colocação das ressonâncias relativas às notas desses dois instrumentos. A diferença entre violinos e violas se deve ao segundo modo de vibração (ressonância) da viola que é maior em relação ao violino. O som da viola se situa entre os graves do violino, o agudo do cello e o contrabaixo.

No caso do cello, as cordas estão afinadas uma oitava abaixo das cordas de uma viola (1/12 abaixo das do violino) em C2, G2, D3 e A3 (dó2, sol2, ré3 e lá3). A frequência de ressonância está situada na vizinhança dos 125 HZ entre o B2 e o C3 (si2 e dó3). Outra distinção é a questão da altura da ponte de um cello que provoca uma forte resposta do corpo do instrumento ao serem excitadas as cordas, tendo uma frequência próxima à do material do corpo

sonoro. Esta resposta pode em ocasiões desafinar as próprias cordas do instrumento, interferindo na formação de um regime normal de vibração.

O contrabaixo – instrumento de maior tamanho na família das cordas, medindo normalmente 1,80 m – tem as suas cordas afinadas por quartas ascendentes. Na orquestra, funciona como base harmônica; trabalhando em concordância com os cellos, dá às cordas o corpo sonoro necessário para que o som dos quatro instrumentos resulte compacto. Todos eles podem produzir grande variedade de sons em dependência de como sejam executados. Seja utilizando a técnica do pizzicato – tangendo a corda com o dedo – ou com o glissando, todas essas formas de execução provocam mudanças no timbre desses instrumentos.

Essa abordagem sobre as cordas de uma orquestra tem o intuito de convidar ao leitor para o entendimento da homogeneidade do timbre destes instrumentos. Os intervalos de afinação desses instrumentos e as frequências – consideradas graves para alguns deles – estão situados na faixa aguda para outros da família. Esses instrumentos oferecem excelente homogeneidade no timbre o que faz com que possa funcionar desde uma simples linha monofônica até a riqueza de polifonia. Segundo Benade (1990), a família das cordas ganha realce pelas seguintes características:

 Grande faixa de frequências que abrange sete oitavas entre os violinos e os contrabaixos;

 Homogeneidade do timbre;

 Grandes possibilidades de dinâmica que podem ir desde o pianíssimo até o fortíssimo;

 Possibilidades de funcionarem em múltiplas tonalidades os quatro em conjunto;

 Versatilidade na produção de sons;

 Riqueza na qualidade do tom, criando uma sutil cordialidade entre os quatro.

No terceiro experimento da pesquisa, utilizo esses quatro instrumentos em uma das composições para mensurar o impacto emocional causado pelo trecho musical. Essa homogeneidade das cordas constitui uma exceção na hora de analisar o timbre instrumental.

Como sabido, sons compostos por muitos harmônicos resultam em sons ricos musicalmente falando. No caso do violino, esses harmônicos são afetados pela resposta acústica de elementos como o cavalete e o próprio corpo de instrumento. O cavalete possui dois modos normais de vibração ou ressonâncias: 3000 Hz e 4500 Hz; tais frequências reforçam os componentes do som com as frequências existentes nessas regiões (DONOSO et. al., 2008). Essas ressonâncias oferecem reforço nos harmônicos que coincidem com as dos modos normais. Dessa forma, a diferença de intensidades observada no espectro acústico é devido à influência das várias ressonâncias existentes. Sendo assim, o som (timbre) resultante do violino se constitui em uma confluência dos aspectos desses elementos: a influência dos tampos, a fricção que se cria entre a crina do arco com as cordas e as ressonâncias das vibrações devido à excitação das cordas.