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A FINALIDADE QUANTITATIVA DO JUDICIÁRIO E A AUTODEFENSIVIDADE DO EXECUTIVO COMO FUNDAMENTOS DA INEFETIVIDADE DA PREVIDÊNCIA

67 EMENTA: RECURSO EXTRAODINÁRIO DIREITO PREVIDENCIÁRIO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL (RGPS) REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO.

2.5 A FINALIDADE QUANTITATIVA DO JUDICIÁRIO E A AUTODEFENSIVIDADE DO EXECUTIVO COMO FUNDAMENTOS DA INEFETIVIDADE DA PREVIDÊNCIA

SOCIAL

Nos subitens anteriores apresentou-se a posição atual do Poder Judiciário e da Administração pública em face da Previdência Social, demonstrando-se que os dois poderes em questão vem sobrepondo os seus interesses aos interesses dos

69 DA CUNHA JÚNIOR, DIRLEY. Curso de Direito Constitucional. 6ª ed., Salvador: Editora Juspodivm, 2012, pg. 620.

70 SILVA, Almiro do Couto e. O princípio da segurança jurídica (proteção à confiança) no direito público brasileiro. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 237, p. 271-316, jul. 2004. ISSN 2238-5177. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/44376., p. 273/274, Acesso em: 28 Jan. 2019

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beneficiários das prestações previdenciárias e assistenciais, desvirtuando, portanto, a finalidade do próprio sistema previdenciário, quando os seus respectivos interesses não atingem, por coincidência, a finalidade da política pública de previdência.

De um lado o Poder Judiciário privilegia o atingimento de metas, ocupando a celeridade processual um lugar de sobreposição em face da efetividade e do caráter satisfativo da tutela jurisdicional. Não por culpa ou interesse próprio dos membros do Poder Judiciário, mas sim pela política instaurada no âmbito desta função estatal, com a exigência absoluta do atingimento de metas e da entrega rápida da prestação jurisdicional, em uma relação de importância na ordem de rapidez-efetividade.

Do outro lado, o Poder Executivo, através da Administração Pública Previdenciária, ocupa uma conduta de constante crise, sendo esta a justificativa, a base, para todo o vetor comportamental do referido poder. Através do INSS, autarquia federal, o Estado deixa clara a intenção de subordinar o princípio do in dubio pro misero em face da proteção ao erário, da reserva do possível, da prévia fonte de custeio e do equilíbrio financeiro e atuarial.

A grande questão é: na execução das funções estatais, quem é o atingido? É dizer, quem é o “consumidor final” de toda e qualquer política pública, de todo e qualquer serviço que envolve prestações materiais, capazes de influir diretamente no seio social?.

É o indivíduo como cidadão.

Sobrepor os interesses particulares – no sentido do âmbito do próprio poder – de cada uma das funções, realça e protege a finalidade da Previdência Social, como política pública estabelecida pelo constituinte originário?

Se crê que não.

Bem, não há como explicar a negativa sem trilhar o estudo da separação dos poderes como uma opção do constituinte de 1988, correlacionando esta forma de execução do poder estatal, através de funções, em relação à Previdência Social.

A separação dos poderes não foi somente uma opção do constituinte originário para trabalhar com o exercício das funções decorrentes do poder estatal, que é uno. Mais que isso, a tripartição dos poderes foi erigida ao status de norma

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constitucional intangível pelo retrocesso, ainda que por meio de reforma constitucional71.

Com assentamento histórico a partir do ideal do liberalismo72, como o seu

nascedouro, a separação dos poderes surge a partir da antinomia entre a liberdade individual e os deveres sociais, que limitam aquela. Não se resume a uma técnica de exercício do poder estatal a partir de funções, mas sim de uma garantia, de um limite a este poder73.

Não por acaso o artigo 16 da Declaração do Homem e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789, estabelece que “Qualquer sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos, nem estabelecida a separação de poderes, não tem constituição”.

Por sua vez, a CF/88 estabelece um Título próprio para tratar da formação do princípio em questão no modelo brasileiro, sob a rubrica “Da organização dos poderes”.

O objetivo da normatização constitucional é evitar o esvaziamento do princípio, de forma a impedir que uma função estatal possa ser executada de forma a sobrepor, em absoluto, a outra função, o que permitiria uma dominação e o próprio prejuízo no exercício do poder74.

Essa dominação impede que a separação dos poderes se porte como uma garantia unicamente da liberdade, em sua acepção clássica, de abstenção estatal, mas também permita, por parte do cidadão, prestações positivas e materiais do Estado, conferindo uma conotação material a liberdade, juntamente com a igualdade, como visto outrora, elementos essenciais para a dignidade e paz social75.

A separação das funções, desta forma, não é somente um limite ao poder estatal, mas uma garantia do cidadão de que em situações que demandem a atribuição de uma acepção material à igualdade, o Estado possa agir de maneira a

71 Neste aspecto, é o que se protege por meio das chamadas cláusulas pétreas, estabelecidas no art. 60, §4º, da CF/88.

72 Obviamente sem se afastar da menção da separação dos poderes em Aristóteles, bem como da sua evolução a partir de Locke, Maquiavel, Montesquieu, dentre outros, já que o objetivo do presente trabalho não é estudar a evolução histórica ou a “origem” desta teoria.

73 PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes como doutrina e princípio constitucional. Coimbra: Coimbra, 1989, p. 143.

74 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2001, p. 545.

75 MEDEIROS, Fabrício Juliano Mendes. Separação dos poderes: De doutrina liberal a princípio constitucional. Revista de Informação Legislativa, nº 45, 178, abr/jun 2008, p. 205.

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“igualar os desiguais”, garantindo sempre um panorama de harmonia social, favorável ao desenvolvimento do indivíduo, com contribuição para si e para toda a sociedade.

Não por acaso que no estudo da separação dos poderes se elenca um sistema de “freios e contrapesos”, onde cada poder/função possui uma esfera de competência autolimitada, isto é, internamente, bem como limitada pela esfera do outro poder/função.

Ocorre que estes “freios” não só limitam, como também conduzem uma situação de auxílio mútuo, de harmonia e diálogo entre cada uma dessas funções, de forma a produzir uma atividade de máxima efetividade, direcionada ao cidadão.

É certo que a CF/88 fornece ao indivíduo um amplo acesso ao Poder Judiciário, permitindo que seja requerida a tutela jurisdicional sempre que presente uma “ameaça ou perigo de ameaça” a um direito, não podendo o Estado limitar este acesso. Contudo, a finalidade do constituinte de 1988, ao permitir essa imensa porta de entrada para o Poder Judiciário, não foi tratar esta função como prima ratio, como o primeiro contato do cidadão em face do requerimento de uma prestação material ou mesmo uma abstenção do Estado, mas sim atribuir a este Poder uma posição de subsidiariedade, de ação somente quando estritamente necessária.

Por esta razão, embora o direito de ação possua grande amplitude, a sua instrumentalização pelo processo pressupõe a verificação de alguns elementos, que podem implicar na impossibilidade de manejo e análise do direito material pelo Poder Judiciário.

Esses elementos são os pressupostos processuais. O direito material, isoladamente considerado, quando violado, impende o exercício do direito de ação por meio do processo, que por sua vez exige o atendimento dos pressupostos processuais. Assim, se o cidadão quer ingressar no Poder Judiciário, deve demonstrar um mínimo interesse, assim como legitimidade, para figurar no polo ativo da ação.

Nas palavras de José Carlos Barbosa Moreira76:

o surgimento da relação jurídica processual, analogamente, depende da presença de determinados elementos, que condicionam, em termos globais, a existência. Tais seriam os pressupostos processuais".

76 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Sobre pressupostos processuais~ Temas de direito processual civil. Quarta série. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 84.

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Como outrora referido, no âmbito do Direito Previdenciário, especificamente na carta de prestações materiais instrumentalizada pelos benefícios, para que o cidadão demonstre o interesse processual, é necessário o prévio requerimento administrativo, de forma que se demonstre que o Estado se nega a fornecer a referida prestação, através do indeferimento ou cessação da prestação material, que o tempo de análise do requerimento administrativo se mostra abusivo, espelhado em demora excessiva, configurando indeferimento tácito, ou, mesmo que não haja indeferimento, o cidadão demonstre que o direito pleiteado é manifestamente contrário ao posicionamento consolidado da Administração pública, isto é, que o requerimento seria inócuo, na medida em que o INSS já possui entendimento firme no sentido de indeferir a prestação material.

Por mais que, em um primeiro momento, o posicionamento acima – ressalte-se, editado pelo STF em palco de Repercussão Geral, como outrora informado – se mostre limitativo do direito de ação, é certo que a sua questão de fundo não é reduzir o acesso à justiça, ou mesmo reduzir as demandas no Poder Judiciário, mas sim dar ao cidadão a melhor resposta possível do seu pleito.

No direito de petição, não importa se o cidadão se dirige ao Poder Executivo, Legislativo ou Judiciário, pois, em última análise, ele se dirige ao Estado. O que ele quer, na realidade, não é precipuamente o deferimento total do seu pleito, mas sim uma resposta satisfatória, um convencimento, pois, quando se pede, se busca uma resposta para um conflito, uma “crise”, uma insatisfação social77.

E mais, como já afirmado, e reconhecido pela processualística contemporânea, mesmo o processo individual é uma resposta para toda a sociedade. Por mais particular e subjetivo que seja o direito discutido no âmbito de uma relação processual, o seu objetivo é a solução do conflito, independentemente desta solução implicar no indeferimento da prestação material pretendida.

Nas palavras de Fredie Didier78:

O Direito passa a ser construído a posteriori, em uma mescla de indução e dedução, atento à complexidade da vida, que não pode ser totalmente regulada pelos esquemas lógicos reduzidos de um legislador que pensa abstrata e aprioristicamente. As cláusulas gerais servem para a realização da justiça do caso concreto; revelam-se, em feliz metáfora doutrinária, como "pontos de erupção da equidade".

77 BONIFÁCIO, Artur Cortez. Direito de petição: Garantia constitucional. São Paulo: Editora Método, 2004, p. 76-77

78 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Introdução ao Direito Processual Civil, parte geral e processo de conhecimento. 19ª Ed., Salvador: Jus Podivm, 2017, p. 61

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Por mais que isso, aparentemente, seja lógico, não é o que conduz, atualmente, a atividade Estatal no que se refere ao exercício das funções Executiva e Judiciária, que são o objeto do presente trabalho.

A Previdência Social não é um problema do cidadão e do Poder Executivo, mas de todo o Estado, pois tem sido a fonte de massificação de demandas judiciais e pleitos administrativos, assoberbando o índice de atividade administrativa, o que implica, como já demonstrado, na precarização do serviço que, por sua vez, implica em mais litígios. É um círculo vicioso, e tende a piorar.

O pensamento aqui é que existe um “abismo” entre o Judiciário e o Executivo, no que se refere à cooperação. Já em relação ao indivíduo, existe um “muro”, um afastamento material, disfarçado por uma abertura meramente formal. E isto é perigoso.

Em sede de prestação jurisdicional, para garantir a sua imperatividade e autodeterminação como “poder”, reside o instituto da coisa julgada. Mais prejudicial do que a ausência de tutela jurisdicional, é a tutela jurisdicional mal prestada, deficitária e “fria”, sem a aproximação devida ao indivíduo, pois, enquanto não prestada, a tutela jurisdicional não implica em definitividade, mas havendo a prestação, ainda que deficitária, incide a sua definitividade, através da coisa julgada, implicando na imutabilidade do provimento, contudo, com a eternização do conflito na sociedade.

Mais uma vez, nas lições de Fredie Didier79:

A coisa julgada é situação jurídica que diz respeito exclusivamente às decisões jurisdicionais. Somente uma decisão judicial pode tornar-se indiscutível e imutável pela coisa julgada.

Isso não quer dizer que só haverá jurisdição se houver coisa julgada. A existência de coisa julgada é uma opção política do Estado; nada impede que o legislador, em certas hipóteses, retire de algumas decisões a aptidão de ficar submetida à coisa julgada; ao fazer isso, não lhes tira a "jurisdicionalidade". A coisa julgada é situação posterior à decisão, não podendo dela ser sua característica ou elemento de existência: não se condiciona o "ser" por algo que, no tempo, lhe é posterior.

Ora, o objetivo do Judiciário, através do STF, ao reconhecer a necessidade de prévio requerimento administrativo para a caracterização do interesse processual no palco do processo previdenciário, foi permitir que o primeiro contato com o conflito, decorrente da necessidade da acobertamento do risco social,

79 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Introdução ao Direito Processual Civil, parte geral e processo de conhecimento. 19ª Ed., Salvador: Jus Podivm, 2017, p. 184

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seja da Administração Previdenciária, para que lá seja solucionado o problema, palco onde foi desenvolvida e efetivada a política pública de Previdência Social.

De ver-se que ao reconhecer essa necessidade, por parte do INSS, seria necessário o estabelecimento de uma “ponte” entre o Poder Judiciário e a própria Autarquia Federal, em sede de Previdência Social, para que se permitisse uma integração entre os entendimentos acerca da aplicação e garantia das prestações. É dizer, dar uma maior previsibilidade ao cidadão no momento em que pleiteia a concessão de um beneficio previdenciário, tendo este que buscar a tutela jurisdicional somente em situações imprescindíveis, onde não haja entendimento firmado entre as duas funções, o que deveria ser a exceção.

Para tanto, se faz necessário o desenvolvimento de mecanismos que imponham uma conduta dialógica, mas não impositiva na relação Judiciário- Executivo, ambientes “extrajudiciais” neutros, que permitam que questões sensíveis à Previdência Social sejam discutidas sem as amarras da relação processual e sem o envolvimento direto, em primeiro plano, de interesses subjetivos.

Ao contrário, deve-se evitar a conduta automática de judicialização da negativa de prestações materiais previdenciárias, o que implica, justamente, no estabelecimento de um ambiente de previsibilidade por parte do cidadão, através da prévia definição para problemas correntes no cotidiano das discussões administrativas e judiciais acerca da Previdência Social.

A massiva propositura de ações judiciais também não deve conduzir para uma preponderância da celeridade em face da qualidade da prestação jurisdicional. É certo que em um mundo tão pequeno como o nosso, do ponto de vista das comunicações e relações sociais, cada problema apresentado ao Judiciário deve ser tratado de forma individual e específica. Como bem prelecionam Teresa Arruda Alvim Wambier e Luiz Rodrigues Wambier80:

O mundo hoje caminha mais rapidamente. Com a Internet, sabe-se o que aconteceu do outro lado do mundo, imediatamente. Com isso, a expectativa das pessoas quanto à duração de tudo se altera. Todavia, nem tudo pode ser encolhido no tempo, sem prejuízo. O processo, por exemplo, não pode. Há procedimentos que devem ser, sim, respeitados, sob pena de fissura no tecido constitucional, o que é ruim para todos, em qualquer circunstância. Romper a ordem constitucional custa caro à Nação, e os reflexos dessa conduta desbordam para diversas áreas da vida social. (...) convém fazer

80 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; WAMBIER, Luiz Rodrigues. Anotações sobre o julgamento de processos repetitivos. Revista IOB de direito civil e processual civil. Porto Alegre: Síntese, v.9, n. 49, set/out, 2007, p. 45

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referência, ainda que breve, ao pensamento de Eduardo Couture, para quem “O tempo se vinga de tudo o que é feito sem a sua colaboração”

Assim, com um ambiente dialógico, somente se estabeleceria na relação processual, a qual implica na aderência do regime da preclusão e da coisa julgada, bem como da limitação probatória, muitas vezes não correspondendo a verdade real, situações de conflito efetivo, onde não há satisfatividade na atividade administrativa. É preciso acabar com a posição “confirmadora” do Poder Judiciário no que se refere aos conflitos em matéria de Previdência Social.

Da forma que se desenha o panorama atual de conduta do Poder Judiciário, acaba que o Executivo tem boa parte da condução da Política Pública, certa ou errada esta condução, vinculada à resposta jurisdicional, isto é, a uma função que não possui as amarras orçamentárias e administrativas que a Administração possui, as quais devem ser observadas. Por outro lado, a Administração, sabendo do distanciamento e da imposição decorrente da coisa julgada, tenta ao máximo dificultar o acesso do indivíduo às prestações materiais previdenciárias, através do enrijecimento de requisitos para a concessão dos benefícios, sobreposição da proteção ao erário em face da hipossuficiência do cidadão em matéria previdenciária, atuação pro forma em processos judiciais previdenciários, dentre outras condutas que não se volvem para o cidadão, mas sim para o interesse da própria Administração, como visto, secundário.

O distanciamento entre estas duas funções não só prejudica a própria prestação de cada uma das suas atribuições em face da sociedade, mas implica também em menor aceitação de eventuais reformas legislativas planejadas pela Administração para trabalhar com o ambiente de crise.

Mais do que nunca, no panorama atual, em palco de reforma da Previdência, se observa a dificuldade de aceitação das reformas estabelecidas pelo Governo, através do Poder Executivo, tanto por parte do Parlamento, como pela própria população.

Sendo o Poder Legislativo a esfera estatal mais democrática e popular, onde há efetiva representação – ainda que muitas vezes meramente formal – do povo, se não há aceitação popular, esta negatividade vai implicar diretamente na própria aceitação pelo Parlamento. Muitas das propostas que compõem as reformas estabelecidas pelo Governo, divergem de entendimentos jurisprudenciais já

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consolidados, os quais, ao invés de serem encampados pelo Executivo, pois construídos por meio de uma profunda discussão no ambiente processual, são afastados através de pretensões legislativas.

Um exemplo claro disso é a já citada Medida Provisória 871/2019, que em seu art. 25, alterou o art. 16, §5º, da Lei 8.213/91, passando a exigir, para a comprovação da união estável, com a finalidade de demonstração da relação de dependência e concessão de pensão por morte previdenciária, o início de prova material, não se admitindo prova exclusivamente testemunhal, salvo no caso de motivo de força maior ou caso fortuito, os quais terão suas hipótese definidas por regulamento.

A modificação estabelecida por parte do Executivo, no exercício da sua função legislativa extraordinária, através de Medida Provisória, foi de encontro a jurisprudência consolidada no âmbito da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência – TNU, que é o órgão jurisdicional responsável pela consolidação e harmonização da jurisprudência no âmbito dos Juizados Especiais Federais, onde o procedimento abarca a esmagadora maioria de ações previdenciárias. Ressalte-se, inclusive, que a jurisprudência do referido órgão resta objetivada em súmula, ainda em vigor, o enunciado nº 63, publicado no Diário Oficial da União em 23 de agosto de 2012, afirmando que “a comprovação de união estável para efeito de concessão de pensão por morte prescinde de início de prova material”.

O preceito sumular foi elaborado após amplas e inúmeras discussões81

acerca da necessidade ou não de início de prova material para o reconhecimento da união estável e comprovação do vínculo de dependência no processo previdenciário em que se discutia o direito ao recebimento de pensão por morte. Na consolidação dos debates, o Judiciário entendeu que a prova exclusivamente testemunhal robusta, por si só, seria capaz de comprovar a relação jurídica mencionada.

Dois pontos merecem destaque.

O primeiro é que a modificação, diga-se de passagem, profunda, empreendida pelo Executivo, por Medida Provisória, afirme-se, precária e desprovida dos requisitos da relevância e urgência, mais da urgência do que da

81 A este respeito, vide os seguintes precedentes PEDILEF 2003.51.01.500053-8, julgamento: 24/4/2006, DJ de 23/5/2006; PEDILEF 2004.70.95.007478-7, julgamento: 14/8/2006, DJ de 11/9/2006; PEDILEF 2007.72.95.002652-0, julgamento: 24/4/2009, DJ de 13/10/2009; PEDILEF 2008.39.00.701267-8, julgamento: 24/11/2011, DJ de 2/12/2011; PEDILEF 0010108- 12.2009.4.01.4300, julgamento: 27/6/2012, DOU de 27/7/2012.

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relevância, ocorreu sem discussão no ambiente democrático, sem que isto fosse submetido prima facie, ao Parlamento, onde poderia ocorrer um ambiente de diálogo aproximado ao ambiente processual, onde diversos precedentes serviram de base para a construção da jurisprudência.

O segundo ponto é que a modificação foi de encontro direto ao entendimento consolidado do Poder Judiciário, o qual desenvolveu a sua posição em meio a diversas discussões em ambiente processual dialógico. A jurisprudência, por ser sumulada, merece ser frisado, é vinculante no que se refere aos Juizados Especiais Federais, implicando em aplicação obrigatória por todos os juízos, através deste procedimento, sob pena de impugnação da decisão que não o aplica, sem a realização do pertinente distinguishing, por meio de reclamação82.

Ganha destaque, neste aspecto, a efetivação de modificações legislativas por meio da atividade legiferante excepcional do Poder Executivo. Não se questiona